quarta-feira, 19 de novembro de 2008

"Quem abrir o jogo leva pedrada", diz FHC sobre Serra x Aécio


DEU NO VALOR ECONÔMICO

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em palestra no Senado, defendeu medidas de fortalecimento do Congresso Nacional em relação ao Poder Executivo, como "limitar a fúria das medidas provisórias" e adotar medidas de controle do Orçamento da União. "Se o Congresso abdica do controle do orçamento e das MPs, evidentemente haverá uma hipertrofia do Executivo", afirmou.

Na primeira vez que retornou ao Senado após deixar a Presidência da República (2002), FHC defendeu um "equilíbrio maior" entre os três Poderes, alertando também para o risco de "hipertrofia também do Judiciário" e diminuição do Legislativo.

Em entrevista, FHC afirmou ser cedo para apontar quem vai ser o candidato do PSDB à Presidência da República: José Serra ou Aécio Neves. "(Eles) Não são políticos inexperientes e sabem que, se começar abrir o jogo agora, vai levar pedrada o tempo todo. Temos de ter calma", afirmou.

A idéia de aprovação de uma proposta que abra um prazo para que parlamentares troquem de partido (a chamada "janela") foi criticada pelo ex-presidente. Ele, no entanto, acha que o político não deve ficar "enjaulado". Defende um mecanismo que possibilite a mudança de partido, mas submeta o político a uma sanção, como torná-lo inelegível temporariamente, caso troque de legenda.

"Se abrir a janela, muita gente pula fora. Essas coisas têm de fazer com muita seriedade, acho que dar um jeitinho não é bom. Evidentemente, não se pode criar um sistema como agora, em que você muda de partido a toda hora por razões puramente pessoais, por outro lado você não pode enjaular as pessoas. É preciso encontrar um ponto de equilíbrio".

O ex-presidente abriu o ciclo de debates sobre o Poder Legislativo, promovido pelo Interlegis - órgão do Senado criado para modernização e integração do Poder Legislativo em seus três níveis, federal, estadual e municipal. Antes de FHC, o presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), fez um rápido pronunciamento, em que voltou a criticar o excesso de MPs editadas pelo Executivo. E disse que a cobrança incluía o ex-presidente. FHC lembrou que as MPs foram criadas pela Assembléia Nacional Constituinte para dar "agilidade" ao presidente da República.

Disse que a falta de limites à reedição era arbitrário, mas a situação agravou-se com a mudança constitucional durante sua gestão, que proibiu a reedição de MPs e criou o mecanismo de obstrução da pauta. "O presidente, agora sim, pára o Congresso".

Em sua palestra, FHC também citou o "poder político" concedido pela Constituição ao Supremo Tribunal Federal (STF), que agora começa a exercê-lo. Citou, como um dos instrumentos que dão ao STF esse poder, o "mandado de injunção", por meio da qual representantes da população podem se queixar de um dispositivo constitucional não regulamentado. "Criamos a possibilidade de o Supremo exercer um papel político maior do que jamais houve no Brasil e ele começa a exercer isso".

FHC disse que está faltando ao Congresso uma "agenda de transformação". Segundo ele, quando há uma agenda, o Congresso promove debate na sociedade e passa a ter força. Mas o que está acontecendo, na sua opinião, é que o Congresso está a reboque do Executivo. "Quando o Executivo perde a agenda, o Congresso se perde, fica sem saber para que rumo vai." (RU)

O tempo de cada um


Nas Entrelinhas :: Luiz Carlos Azedo
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE


As chances de Serra e Aécio estão numa espécie de meio-termo: um cenário de crise que impeça a alavancagem de Dilma, sem ao mesmo tempo arrasar São Paulo e Minas

Mudou o paradigma da política brasileira. A crise mundial, com seus reflexos no Brasil, condiciona a sucessão presidencial de 2010. Ainda não levou de roldão as candidaturas já existentes nem possibilitou o surgimento de um salvador da pátria, mas já aparecem interessados em desempenhar esse papel, como o delegado federal Protógenes Queiroz, que conversa com o PSol.

Queda-de-braço

Há uma corrida contra o relógio. O governo pisa no acelerador para executar seus programas, tenta segurar o dólar e garantir o crédito para amortecer os impactos da crise na vida do cidadão. A oposição administra o discurso contra o governo Lula e endossa as medidas anticíclicas. Está com um olho no emprego, outro na inflação. A grande incógnita é saber até onde irá a redução da atividade econômica. Essa variável determinará se a equação gastos públicos versus arrecadação tributária será resolvida antes ou depois das eleições de 2010.

O xis da questão é a taxa de juros. Para muitos, chegou a hora de eliminar uma taxa de juros excessivamente elevada. A crise de liquidez fortaleceu o grupo do ministro da Fazenda, Guido Mantega, na sua queda-de-braço com o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Depois de capitalizar a operação de salvamento do setor financeiro, Meirelles começa a sofrer o desgaste provocado pela redução da atividade econômica.

Para a cozinha do Palácio do Planalto, há espaço para redução da taxa de juros. Seria a maneira de evitar uma recessão mais grave e a alta da inflação. Meirelles resiste. Argumenta que para isso é necessário austeridade fiscal, o que não está acontecendo. Ou seja, se o governo continua gastando, é preciso manter uma taxa de juros que torne os títulos públicos atrativos para os investidores estrangeiros; para reduzir os juros, seria indispensável reduzir os gastos públicos na proporção igual ou superior à queda da arrecadação. É uma escolha de Sofia, que o presidente Lula está empurrando com a barriga. Baixas taxas de juros, câmbio estável e competitivo e inflação sob absoluto controle são tarefas para o futuro governo.

Sucessão à vista

Lula mira na própria sucessão. Administra a crise de maneira a viabilizar a candidatura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Nada de cortes nos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que a ministra comanda. Nada de redução dos gastos sociais do governo com as parcelas mais pobres da população. A palavra de ordem é poupança zero, consumir para preservar empregos e salários. Se o governo surfar a crise dessa forma, a sucessão de 2010 estará no papo. O problema dessa estratégia é o tempo. Com forte viés eleitoral, não pode ser mantida a longo prazo. Seu sucesso depende da velocidade do impacto da crise mundial na economia brasileira.

Na crise, a oposição se finge de morta. Onde tem o poder regional, está no mesmo barco do governo Lula. Os governadores de São Paulo, José Serra, e de Minas, Aécio Neves, os dois presidenciáveis do PSDB, procuram ganhar tempo. Os dois estados serão os mais atingidos pela crise. Seus governos terão problemas se a situação sair do controle e a recessão for para valer.

As chances de Serra e Aécio estão numa espécie de meio-termo: um cenário de crise que impeça a alavancagem de Dilma, sem ao mesmo tempo arrasar São Paulo e Minas. Eis uma situação clássica da política, já descrita por Maquiavel, na qual a fortuna escolhe a virtude que mais lhe interessa.

Arroz de sapo


Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Agora que o ministro José Gomes Temporão já se nivelou por baixo, está tudo de volta aos eixos: ele fica na Saúde, o PMDB fica quieto para não correr o risco de perder a “cota” e não se fala mais em corrupção, insuficiência de desempenho, muito menos se averigua o que a Fundação Nacional de Saúde faz com as verbas que recebe para cuidar das populações indígenas.

Conforme mostrou ontem a repórter Lígia Formenti no Estado, a Funasa recebe o quádruplo dos recursos per capita (R$ 900) destinados ao restante da população (R$ 270) e apresenta os piores resultados: enquanto a taxa de mortalidade geral por desnutrição em bebês com menos de um ano é de 2%, a média nas aldeias é de 12%; entre crianças de até cinco anos a relação é de 5% para 35%.

Uma pequena mostra da ineficiência do serviço de que falou o ministro Temporão na semana passada. No mesmo debate, abordou o tema da corrupção, a respeito da qual falam inúmeros relatórios do Tribunal de Contas da União e do Ministério Público: 157 auditorias e 83 sindicâncias em 2007 e 149 verificações de irregularidades e 41 inquéritos até julho deste ano.

O cenário de óbvia anomalia que o ministro resumiu em algumas frases num momento de irritação é avalizado pelos números e corroborado por sanitaristas especializados na área indígena, o que por si já justificaria alguma providência.

Quando nada, uma atenção especial ao conteúdo da fala e à forma de desabafo, sinal evidente da existência de uma “blindagem” do PMDB em torno da Funasa para mantê-la imune à influência do ministro.

Ali quem manda é o partido. E, pelo visto, com a anuência do presidente da República, cuja prioridade é a preservação do equilíbrio ecológico em sua base parlamentar, na qual o PMDB é o espécime mais vistoso, poderoso e guloso.

Os deputados do partido saíram em defesa do feudo, pedindo a cabeça do ministro com argumentos absurdos, tais como a ausência de apresentação de provas e falta de consciência de José Gomes Temporão de que sua função inclui abrir a agenda para “interagir” com parlamentares e franquear-lhes com mais generosidade as verbas indicadas nas emendas ao Orçamento.

Não sofreram maiores admoestações. A única interferência do Palácio do Planalto foi no sentido de que amenizassem o tom, desistissem do ato público de desagravo ao atual presidente da fundação e de agravo à figura do ministro, marcado para ontem.

No lugar do protesto, realizou-se uma reunião do gabinete de Temporão, para “discutir as insatisfações” do titular da pasta. O ministro acertou ao evitar a cena da foto com todos sorridentes ao final. Não apareceu, deixando o relato ao encargo do líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves, e do presidente do partido, Michel Temer.

O líder saiu todo feliz. Nem parecia o indignado da semana passada. Chamou Temporão de “grande ministro”, anunciou que haviam fumado o “cachimbo da paz” e feito um “entendimento” sobre as questões da Funasa.

O ministro tem a intenção de “aperfeiçoar” a fundação, informou o deputado, a título de cessão pública de direitos sobre a administração do órgão. Era o bocado do sapo que cabia ao PMDB engolir: sugerir que Temporão saiu ganhando poder com a criação da Secretaria de Atenção Básica e Proteção à Saúde que ficaria com a administração da política de saúde indígena, por enquanto apenas uma idéia.

Ao ministro coube engolir o desabafo feito, os desaforos ouvidos e os brios perdidos. Tudo em público. Em particular, na reunião de ontem, a julgar pelo relato do deputado, engoliu também a falta de escusas e ainda estabeleceu com o partido um “entendimento” para mudanças na estrutura da Funasa.

Traduzindo: a situação por lá, de fato, anda a requerer alterações. É difícil compreender em que bases teria ocorrido o referido entendimento, se o comando continua o mesmo que até outro dia era defendido como o mais probo e eficiente já existente.

Ademais, que acerto é possível quando se fala em corrupção e ineficiência?

Ou fica combinado que um pouquinho de cada não altera a ordem dos fatores nem tampouco abala os interesses envolvidos?

Um teatro, isto sim foi o que se armou a fim de propiciar o recuo das partes sem grandes traumas. Demitisse o ministro, o presidente Luiz Inácio da Silva estaria entregando o mandato ao líder do PMDB na Câmara.

Se desse a ele respaldo para entrar de pau e pedra na Funasa, o PMDB lhe arrancaria pedaços em outras áreas. Feito o acerto, só Temporão ficou no prejuízo, porque era o único a dispor de algo a perder com o pacto de boa convivência com uma dose de corrupção e ineficiência.

Para o PMDB não poderia haver solução mais satisfatória. Não conseguiu se livrar de Temporão, mas pôde assistir com deleite à autodestruição de uma boa imagem de homem público que a partir de agora passa a se integrar de corpo e alma aos estatutos daquela gafie...quer dizer, agremiação partidária.

A candidata Dilma e a nuvem


Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL

A candidatura da ministra Dilma Rousseff foi lançada com grande antecedência e pouco a pouco, nas intencionais inconfidências do presidente Lula, quando o céu de brigadeiro da plena euforia com o maior governo, etc confirmava que, com a sua popularidade, ele elegeria um poste.

O êxito é a mais perfeita mesinha que cura todos os males e imuniza o beneficiado contra os imprevistos do destino. Mas, a política, como ensina o conselheiro, é uma caixinha de surpresas. Lula aperfeiçoou a tática para empurrar a candidatura da sua escolha pessoal, sem consultar ninguém ou dar a mínima atenção ao PT e seus dirigentes embrulhados em denúncias que nem foram apuradas para valer ou desmentidas com provas definitivas.

Para ligar a ministra-candidata aos êxitos estatísticos oficiais, passou a incluí-la como presença obrigatória nas suas viagens domésticas e internacionais do campeão de milhas voadas no aerolula. Dona Dilma passou a ser a sombra do Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC, que nos dois últimos anos úteis do mandato da reeleição – 2010 é ano de campanha e de eleição para presidente, governadores, senadores, deputados federais e estaduais – promete inaugurar obras em todos os estados, em milhares de municípios, resolvendo problemas crônicos, desatando todos os nós que embaraçam a nossa milagrosa passagem pelo túnel do passado para o futuro.

Sem contestação séria no bloco aliado e com o PT mudo, sem soltar um pio, a ministra foi avançando no terreno baldio e a sua candidatura pousando no consenso do fato consumado.

A nuvem da crise financeira internacional não deu tempo para ser percebida no céu da euforia e pegou o mundo de surpresa. O governo fez o que pôde para fingir que a ignorava, com Lula alternando adjetivos e substantivos para distrair a platéia: "Se chegar ao Brasil, será quase desapercebida", depois promovida a marola e admitida na sua evidente gravidade.

É de cristalina evidência que o presidente continua com o controle político do esquema que montou sem poupar a viúva para manter viva a chama dos compromissos. Lula foi de uma generosidade sem limites. Para adquirir o apoio do PMDB, que estava em oferta na praça, entregou ministérios, autarquias, fatias do bolo, pacotes de caramelos, a transposição do rio São Francisco para acudir a sede do Nordeste.

Mas, como a roda da ambição não pára, com os sacolejos da crise, velhas e novas cobranças chegam ao balcão. A presidência do Senado, valorizada pelo desempenho do senador Garibaldi Alves, que martela as críticas e cobranças, é reivindicada pelo PT, enquanto a presidência da Câmara está escorregando para os braços do presidente do PMDB, deputado Michel Temer.

Enfim, entre arranhados e feridos, salvam-se todos. O ano está acabando e a carga passa para o decisivo 2009. Cada qual com o seu lote de dúvidas. O desafio da oposição passa e termina com a acomodação dos governadores de São Paulo, José Serra e Aécio Neves, de Minas, na chapa com duas vagas de peso diferente.

A ministra Dilma, sem concorrente com cacife para enfrentar o padrinho da sua candidatura, dissimula as apreensões e vem fazendo o possível para domar o seu temperamento e conquistar as simpatias da base.

Mas, é a nuvem da crise que escurece o horizonte e não abre a brecha para que se enxergue mais do que um palmo adiante do nariz.

Esquerda: uma armação limitada


Rosângela Bittar
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Numa rápida conversa, ontem, em seu gabinete, minutos antes de discursar em sessão solene de registro dos 100 anos da morte do escritor Machado de Assis, o que fez sem preparação prévia pois é assunto que conhece profundamente, o deputado Aldo Rebelo, um dos principais políticos do bloco de esquerda que integra a aliança do governo Lula, traçou o perfil da ação que deve orientar os passos do seu grupo a caminho da sucessão presidencial. Ou seja, como serão ensaiados os passos de um bom número de partidos que já vinham marcando seus sinais particulares, desde três anos atrás, tendo como último fato as eleições municipais de 2008.

Estas eleições não significaram, ao contrário de avaliações que podem ter se precipitado a partir da experiência em São Paulo, uma rasteira para o bloquinho, em geral, e para Aldo, em particular. Ele vinha construindo uma candidatura a prefeito da capital, a partir de uma concepção de fortalecimento político da esquerda e do bloco que reúne PCdoB, PSB, PDT e PRB. Teve que recuar, por instâncias do presidente Lula, para uma candidatura a vice-prefeito, na chapa derrotada de Marta Suplicy, numa campanha em que acabou aparecendo pouco e os partidos que o apoiaram menos ainda. Ele próprio não achava esta a melhor solução, mas as quatro legendas a que estava ligado, na pré-candidatura a prefeito, evoluíram para a composição com o PT, que acabara isolado depois de recusar estas históricas parcerias.

Fora São Paulo, e até mesmo neste caso específico, porque permaneceu unido e não se fragmentou como outros partidos, o bloquinho, segundo a análise de Aldo, saiu-se muito bem. As eleições municipais levaram estes partidos a serem o segundo grupo em número de vereadores, só perdendo para o PMDB, mesmo assim por pouco. O bloco conseguiu ainda cerca de 15 milhões de votos, mais de 700 prefeitos, e prestígio em regiões inteiras, como no Nordeste.

"A eleição para prefeito é necessariamente fragmentária, ela impõe um movimento de dispersão", afirma Aldo. E foi, ao seu ver, o que aconteceu, com praticamente todos os partidos. O PMDB saiu forte da disputa, se for considerado isoladamente, mas viu naufragar, inclusive, a principal aposta política que fez pós- 2006, que foi a aliança de centro-esquerda com o PT, que resultou na eleição de um petista para a presidência da Câmara, em troca do revezamento com os pemedebistas, ano que vem. Esta aposta incluía a união interna do PMDB para ampliação dos seus espaços no governo Lula. Tudo combinado para dar frutos em 2008, mas o fracasso da empreitada foi total, em todo o Brasil, havendo uma ou outra exceção, muito sofrida, a confirmar a regra, como foi o caso da capital de Goiás, Goiânia, onde a aliança PT-PMDB subsistiu por apenas um voto.

O PSDB, na avaliação de Aldo, saiu das municipais com menos prefeitos do que entrou e, em São Paulo, ficou fora das mais importantes cidades. O DEM, praticamente desapareceu do país, opina. Assim, crê que o desempenho da esquerda nas eleições de 2008, na comparação, foi muito bom.

Agora cuidam os partidos do bloco de armar o futuro, porque até sob este ponto de vista as eleições municipais não foram pródigas para muitos. José Serra, governador de São Paulo, saiu delas como um candidato forte de partidos frágeis, no ponto de vista que Aldo, hoje, traduz. "É um candidato das forças de oposição à espera de um adversário", resume. Aécio Neves, nesta análise, saiu enfraquecido, a não ser que vá para o PMDB, transferência que continua claramente nas suas cogitações. A ministra Dilma Rousseff, apontada como candidata do presidente Lula e do PT é, até o momento, "uma incógnita".

Isto porque, na opinião do líder de esquerda, o candidato se revela a partir do momento que as pessoas o percebem como candidato, em que deixa notar os traços de sua personalidade, suas aptidões, que vão se revelar na campanha. "O que era o Obama? Foi a campanha que o revelou", afirma, sobre o presidente eleito dos Estados Unidos.

O candidato a suceder Lula, nesta perspectiva da esquerda, pode, sim, ser do PT. Mas também pode não ser, pode ser do próprio bloquinho. Ciro Gomes, por exemplo, é um nome, que já demonstrou suas potencialidades e limites, está afastado da política no momento, levou uma refrega nas municipais, mas se tiver uma oportunidade, volta à cena. Outra hipótese para a esquerda é construir uma alternativa de unificação do PT e do bloco, "mas não podemos transformar isto em cláusula pétrea", diz Aldo, provando que tudo está, de novo, em aberto.

O tempo certo de engajar-se nesta construção será determinado, na sua opinião, por dois fatos concretos. "A esquerda tem que se armar na apreciação da crise, e é o que está fazendo, em estudos e seminários internos. O bloco tem uma posição segundo a qual a crise não pode ser enfrentada com a redução de investimentos e desprezo pelo mercado interno", assinala.

Para Aldo Rebelo, a crise é que vai definir o que será 2010 para Lula, para a base do governo, para os governadores dos partidos aliados. O segundo aspecto desta armação do futuro é a posição a ser adotada diante da eleição para a Mesa da Câmara. O bloco tem o compromisso de ter posição conjunta, mas também aqui não há cláusula pétrea nem sinal ainda de decisão, o que só deverá ocorrer em meados de janeiro.

Tanto pode a esquerda lançar candidatura própria - o nome do deputado Miro Teixeira, que se revela um especialista em legislação eleitoral e em Legislativo, entrou na roda - ou definir apoio a Ciro Nogueira, ou até ficar com orientação de Lula, embora, pessoalmente, ele vá apoiar Ciro Nogueira (PP), por quem foi apoiado quando disputou contra a aliança PT-PMDB.

A única real dificuldade que se coloca para a opção dos partidos, na avaliação de Aldo, será uma solução que entregue ao PMDB o comando das duas Casas, Câmara e Senado. "Fechar o círculo nas duas pontas, ficando tudo com o PMDB, das decisões sobre Medidas Provisórias, sobre crédito, às emendas à Constituição, ensejará uma insegurança muito forte entre os deputados e os partidos".

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

São Paulo, cidade conservadora?


Leôncio Martins Rodrigues
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Confirmada a derrota de Marta Suplicy para a Prefeitura da capital paulista, alguns intelectuais petistas atribuíram a vitória de Gilberto Kassab (de “direita”) a suposto conservadorismo e preconceitos do eleitorado paulistano. Na interpretação petista, esses setores conservadores e preconceituosos estariam localizados basicamente nas classes médias e altas, porque, como se sabe, as classes populares não têm preconceitos nem são conservadoras. Em outras palavras: transferiu-se a responsabilidade pela derrota a um segmento do eleitorado que não teria nenhum motivo válido para rejeitar a candidata do PT. Está implícito que os paulistanos não saberiam votar. Na visão petista, a cidade mais cosmopolita, moderna e dinâmica do País seria fundamentalmente conservadora e preconceituosa.

Entendem-se a frustração e o ressentimento dos que são derrotados, mas a interpretação petista parece-nos dificilmente sustentável e não ajudará o PT em futuras disputas. Façamos em breve retrospecto dos resultados anteriores nas disputas pelo controle do Poder Executivo paulistano. Tanto em termos das fontes sociais de recrutamento para a classe política como do ponto de vista dos partidos e coligações vencedoras, as elites paulistas quatrocentonas foram perdendo espaço no sistema de poder para elites vindas das classes empresariais de imigração recente e das classes médias e trabalhadoras. Em outros termos: o sistema político paulistano vem-se tornando mais democrático e mais plural. As disputas tornaram-se mais competitivas, mais “técnicas”, mais “profissionais” e dominadas pelo marketing político. Fortuna pessoal, origem familiar, cor da pele, status social e outros signos dignificantes, em São Paulo, não são mais garantia de êxito para nenhum político.

Não há nada de extraordinário nessa evolução do sistema político paulistano. De modo geral, a distribuição do poder na cidade de São Paulo seguiu a rota habitual da circulação das elites analisada por muitos sociólogos e cientistas políticos. Repete-se aqui o movimento observado em outras democracias. À medida que nos encaminhamos em direção a uma sociedade de massas e a um sistema eleitoral de participação total, o poder tende a passar do círculo restrito das famílias patrícias para os empresários self-made men, os homens de negócios. Numa terceira etapa, o sistema político abre-se para os ex-plebeus vindos das classes médias ou das classes trabalhadoras - uso aqui os termos de Robert Dahl usados em sua pesquisa sobre a circulação do poder na cidade de New Haven, EUA, (Who Governs? Democracy and Power in an American City), Yale University, 1961.

Em São Paulo, com exceção do caso de Antônio da Silva Prado - indicado prefeito pela Câmara Municipal e que governou de 1899 a 1911 -, houve cinco prefeitos eleitos por voto “popular”, todos vindo de famílias da chamada oligarquia paulista. A Revolução de 30 pôs fim à prática de eleições para o governo da cidade. De 1930 até 1953 os prefeitos foram nomeados pelos interventores e, depois, pelos governadores. Mas continuaram a vir das famílias paulistas tradicionais.

Em 1953 o Congresso restabeleceu o sistema de eleição popular para a Prefeitura. Jânio Quadros, do PDC, venceu a eleição com o apoio de um pequeno partido, o PSB. A vitória de Jânio, político vindo das classes médias, que nem paulista era, representou a primeira brecha no poder oligárquico e inaugurou, em São Paulo, o estilo populista de fazer política, com muita demagogia orientada para capturar principalmente eleitores de baixa renda.

Depois de 1953, o voto popular vigorou até 1969, quando, sob o regime militar, os prefeitos voltaram a ser escolhidos formalmente pelo governador. Paulo Salim Maluf foi o primeiro prefeito nomeado (1969) e Mário Covas, o último (1983). O enfraquecimento do poder oligárquico paulista prosseguiu sob o regime militar. A presença de prefeitos de famílias paulistas tradicionais diminuiu, enquanto ascendiam os de origem sírio-libanesa e italiana. Mas todos vinham das classes ricas. De 1955 a 1986, revezaram-se no poder municipal patrícios e empresários, para seguir com os termos do cientista político norte-americano. Citemos alguns nomes, sem preocupação de ordem cronológica: Figueiredo Ferraz, Olavo Setúbal, Reynaldo de Barros, por um lado; Paulo Salim Maluf, Miguel Colasuonno, Salim Curiati, por outro.

Localizando sociológica e ideologicamente (e de modo extremamente esquemático) os que foram vencedores, o resultado é uma lista política e socialmente heterogênea: um professor de colégio, mato-grossense de nascimento, de classe média e difícil definição ideológica e partidária (Jânio da Silva Quadros); uma candidata de “esquerda”, de classe média pobre, solteira, nascida em Uiraúna, na Paraíba (Luiza Erundina de Souza); um rico empresário paulistano de “direita”, de origem árabe (Paulo Salim Maluf); um candidato negro de classe média alta, também de “direita” (Celso Roberto Pitta do Nascimento); uma candidata de “esquerda”, de classe alta tradicional (Marta Teresa Smith de Vasconcelos Suplicy); um candidato de “centro”, de classe média baixa, de origem italiana (José Chirico Serra); e por fim um candidato de “direita”, de classe média alta, de origem árabe (Gilberto Kassab).

O exame da relação dos políticos eleitos depois do retorno da eleição popular para prefeito não revela a predominância, na capital paulista, de um eleitorado preconceituoso e conservador, mas sim de um eleitorado politicamente volátil, que tem passado por cima das classificações ideológicas usuais e de preconceitos vinculados às características pessoais dos políticos, como etnia, gênero, renda, origem familiar, local de nascimento, etc. Esse eleitorado, que tem variado em suas escolhas, pode ser tudo, menos conservador ou preconceituoso, a não ser que esses termos fiquem reservados para classificar os que não votam nos candidatos petistas.

Leôncio Martins Rodrigues é professor aposentado dos Departamentos de Ciências Políticas da USP e da Unicamp

Poderes mancos


Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


NOVA YORK. Há uma perigosa conjunção de fatores políticos, que leva à paralisia, rondando o Congresso e a Casa Branca nos últimos 60 dias do governo Bush e nas últimas sessões legislativas do ano. O governo do presidente Bush, depois de ter conseguido aprovar um programa de US$700 bilhões após muita negociação com a maioria democrata, parece satisfeito com o fato de, como salientou ontem o secretário de Tesouro Henry Paulson, ter estabilizado o sistema financeiro internacional, prevenindo o que poderia ter sido um "colapso". Na reta final da despedida, a administração Bush não parece disposta a ajudar a indústria automobilística, não apenas para reafirmar posições econômicas conservadoras dos republicanos, como principalmente para atender ao reclamo da opinião pública, que vê na ajuda à indústria de Detroit um exemplo do desperdício de dinheiro público.

Também o Congresso de maioria democrata está perdendo o fôlego para assumir a aprovação do plano de US$25 bilhões para as três grandes de Detroit - GM, Ford e Chrysler -, cujas diretorias e mais o sindicato representativo se mudaram para Washington para tentar aprovar nas sessões "pato manco" que faltam a ajuda de que necessitam.

A presidente da Câmara, Nancy Pelosi, que estava disposta a atender ao pedido do presidente eleito Barack Obama e aprovar a ajuda às montadoras, já está em dúvida se haverá tempo e energia suficientes para fazer isso em final de mandato.

Na primeira entrevista que concedeu como presidente eleito, Barack Obama voltou a falar da necessidade de ajudar as fábricas de Detroit, sem, no entanto, dar-lhes "um cheque em branco", mas falou também de um programa para ajudar a resolver o problema das hipotecas, renegociando com os bancos.

Esse era um dos objetivos específicos do programa de ajuda que foi aprovado em setembro no Congresso dos Estados Unidos, e isso foi relembrado ontem pelos democratas ao secretário de Tesouro Paulson, em mais um de seus depoimentos no legislativo americano.

Ele voltou atrás em sua declaração peremptória do dia anterior, de que não usaria o dinheiro para resolver a questão das hipotecas, mas disse que ainda está muito em dúvida sobre se deve dar dinheiro diretamente, como um subsídio, ou se deve usá-lo para incentivar bancos e outras financiadoras a restabelecer o sistema de crédito.

A situação das hipotecas das moradias, que está na origem da crise financeira, parece ter sido considerada não-prioritária pela atual administração, ao mesmo tempo em que é tida como de prioridade máxima pela futura. Um descompasso de prioridades que pode causar mais estragos ainda à já combalida economia americana, com reflexos nas finanças internacionais.

Com relação à indústria automobilística de Detroit - já que as demais indústrias, de empresas japonesas e alemãs instaladas especialmente no Alabama, alegam não precisar de ajuda - o próprio Obama disse que não fazer nada no momento poderia ser um desastre pior do que organizar um salvamento sob determinadas circunstâncias.

A crise ontem deu mostras de ser maior do que prevista, pois a Chrysler também anunciou que não tem condições de fechar o ano sem um plano de ajuda. O prejuízo para o governo, com a redução da arrecadação de impostos e o aumento do desemprego, afetando não apenas as indústrias automobilísticas, mas também a de autopeças, seria dez vezes maior do que o pacote de salvação de US$25 bilhões.

À medida que o tempo passa, e que a crise parece ter ultrapassado a fase aguda em que havia um risco real de quebradeira generalizada, técnicos como Ben Bernanke, do Banco Central americano, e o próprio Paulson, parecem ganhar mais confiança e voltam a raciocinar mais em termos técnicos do que políticos.

Ao contrário da futura administração, que, a começar por Obama, continua pensando da mesma maneira que anunciou na campanha: resolver o caso das hipotecas que estão sendo cobradas, mantendo os proprietários em condições de pagar seus empréstimos sem ter que devolver suas casas, é o objetivo principal de um projeto democrata.

Já Bernanke e Paulson voltam a estar mais preocupados em recuperar o mercado de crédito, que eles acreditam estar melhorando, embora longe da situação ideal. Nessa briga de bastidores, volta à tona a discordância entre democratas "populistas econômicos" e os republicanos conservadores, que gostariam de ter visto o governo Bush deixar os bancos quebrarem, e a indústria automobilística pedir concordata, para que o próprio mercado ajustasse a situação.

Os republicanos mais ortodoxos, derrotados largamente para o Congresso, começam a procurar recompor sua identidade, enquanto a ala mais moderada, representada pelo candidato derrotado McCain, se dispõe a ajudar o governo democrata nas reformas no Congresso. Sairá dessa ala o convidado para fazer parte do secretariado suprapartidário de Barack Obama.

A ala mais radical, que por enquanto tem na governadora do Alasca Sarah Palin sua referência, já se refere ao convite feito à senadora Hillary Clinton para ser a futura secretária de Estado como uma indicação de que Obama não pôde resistir às pressões do establishment do Partido Democrata, e não terá força para honrar seus compromissos de mudança.

O QUE PENSA A MÍDIA

Editoriais dos principais jornais do Brasil
http://www.pps.org.br/sistema_clipping/mostra_opiniao.asp?id=1152&portal=