terça-feira, 30 de junho de 2009

O PENSAMENTO DO DIA - Obama

"Peço a todos os atores sociais e políticos em Honduras que respeitem as normas democráticas. Qualquer tensão ou disputa deve ser resolvida pacificamente por meio de um diálogo livre de interferência externa. Não queremos retornar ao passado obscuro. O presidente Zelaya foi eleito democraticamente e não havia terminado ainda seu mandato. Para nós, ele segue como presidente de Honduras."

(Obama – Presidente do Estados Unidos)

Sem controle

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


Quem o conhece sabe que o presidente Lula não prega prego sem estopa ou, usando uma imagem dos portugueses no Brasil Colônia, Lula costuma "sangrar em saúde", um hábito naquele tempo para prevenir doenças, quando a sangria era remédio para tudo. Portanto, quando Lula diz, como fez recentemente, que um Estado com carga tributária pequena não tem condições de fazer políticas sociais, defendendo a alta carga tributária brasileira de cerca de 40% do PIB, o que ele está fazendo é se adiantando às críticas que certamente receberá pela situação das contas nacionais, cada vez mais perigosamente descontroladas.

O aumento do funcionalismo, previsto para entrar em vigor em julho, terá um impacto ainda este ano de R$29 bilhões nas despesas, e as indicações são de que o governo manterá o reajuste, mesmo diante da crise.

Especialistas acreditam que o governo já havia perdido o controle da despesa mais importante, que é justamente a de pessoal, antes mesmo da crise, que veio arranjar uma justificativa para aumentos acima da capacidade de arrecadação, como se fizessem parte de uma política contracíclica.

O que se esperaria diante da crise é que houvesse um movimento forte de investimento, e o que aconteceu é que eles perderam o controle do custeio.

As decisões anunciadas ontem seguem o modelo de desoneração de impostos para alguns setores que movimentam mais a economia, como os eletrodomésticos e a indústria automobilística, mas com a novidade de dar incentivos ao investimento, que não havia sido contemplado pelo governo desde o início da crise. Mesmo assim, o grosso dos incentivos vai para a desoneração dos bens de consumo, ficando apenas a menor parte, cerca de 10%, para para máquinas e equipamentos.

Quem investe mais no país são estados e municípios, assim como são eles os que investem mais em educação e saúde. Para se ter uma ideia, o total investido pelos três níveis de governo no ano passado ficou em torno de R$67 bilhões, e apenas 21% foram executados pela União.

O total de obras realizadas, e de equipamentos comprados pelos municípios, foi mais que o dobro do que gastou o governo federal. Dados oficiais mostram que os estados fazem o dever de casa, ao contrário da União.

O superávit primário dos estados vem sendo semelhante ao da União, apesar de a receita deles ser mais de 60% inferior à federal, fato que nunca havia acontecido antes.

A situação registrada no primeiro bimestre do ano, no auge da crise, única desde que a Lei de Responsabilidade Fiscal foi editada, em 2000, está pouco alterada até maio.

Ano passado, o superávit nos primeiros dois meses do ano foi de 4,7% do PIB, e este ano foi de 1,2%. O superávit do governo central até maio ficou em 1,27%, quando a meta era de 1,4%.

O investimento federal cresceu 25% nos últimos meses, mas vinha de uma base muito pequena. Além do mais, o custeio cresceu 23%, e o gasto com pessoal cresceu 17%, o que demonstra quais são as prioridades do governo.

A crítica que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, fez aos governadores de maneira geral, e em especial ao governador de São Paulo, José Serra, na abertura da solenidade de anúncio das novas medidas, mostra bem como o governo não está brincando com a questão eleitoral.

Com a queda do ICMS devido à crise, alguns governos estaduais anteciparam o pagamento de tributos para recompor seus caixas, e ontem o ministro Mantega criticou a medida, dizendo que ela não ajuda a superar a crise.

Foi uma resposta ao discurso do dia anterior do governador de São Paulo, potencial candidato do PSDB à Presidência na sucessão de Lula, que acusou o governo de não ter uma política de crescimento para o país para enfrentar a crise.

O problema é que mais um "pacote de bondades" distribuído ontem pelo governo, sem que se saiba de onde vai sair o dinheiro para bancar isso, deixa a oposição em uma verdadeira saia justa, pois o discurso do governo agrada aos dois grupos, tanto o do Bolsa Família quanto o da Bolsa de Valores.

O fato é que, diante de uma tendência fiscal muito frouxa, o mercado financeiro continua achando que está tudo bem, acreditando que dá para levar nessa toada até o próximo governo, em 2011.

A relação dívida/PIB cresceu porque a Petrobras saiu das contas públicas, e a aposta do governo é que a situação melhorará com a redução dos juros.

Mas o receio de que o governo venha a ter necessidade de aumentar novamente os juros em médio prazo, para segurar uma alta da inflação previsível pelos gastos crescentes, fez com que os juros futuros para 2011 já subissem ontem na Bolsa.

A arrecadação tributária caiu 11,4% graças à desoneração do IPI, a compensações de tributos como a Cide, à queda da lucratividade das empresas e ao arrefecimento brusco da atividade econômica e da produção industrial. E deve cair mais ainda com as novas reduções anunciadas ontem.

O superávit primário, segundo analistas econômicos, tem que chegar a 2,5% este ano, descontando 0,5% do PPI, e voltar a 3% do PIB no ano que vem, para que o equilíbrio fiscal não se perca.

De qualquer maneira, seja quem for o sucessor de Lula, ele quase certamente receberá uma verdadeira "herança maldita", com compromissos permanentes de aumentos salariais e a necessidade de cortar custos de um Estado que cresceu muito sem a contrapartida de serviços mais eficientes, apenas programas assistencialistas.

A alternância redundante

Wilson Figueiredo
DEU EM OPINIÃO E NOTICIAS

De passagem pela Bahia, o presidente Lula aproveitou o dia reservado ao meio-ambiente, que não tinha a ver com o caso, para anunciar que iria reunir a famosa base de sustentação (dele ou dela?) e expor as razões superiores de recusar seu nome e seus votos à campanha pelo terceiro mandato, que entrou em compasso de espera. À espera de não se sabe bem o que, além do que se fala e do que se deixa de providenciar para garantir eleições normais. Ele, Lula, ficaria por conta das prioridades ocultas. E, para antecipar resultados, deu um passo atrás ao debitar ao Congresso a tarefa de desemaranhar a questão do terceiro mandato, subjacente na sucessão sem começo e, em conseqüência, sem fim. Se operasse como tal, a oposição diria que, entre o começo e o fim, é mais conveniente ficar no meio, com a ilusão de vir a ser o fiel da balança. E assim vai ficando onde nunca esteve à vontade, o lado de fora do governo. Até que se desate o nó, o terceiro mandato estará suspenso sobre a cabeça da República como a espada de Dâmocles.

Não é por formalismo que o presidente mantém distância em relação ao problema, nem por escrúpulos supérfluos. Diz, sem corar, que não vê “sentido em que as pessoas fiquem discutindo o terceiro mandato” , depois que _ com dois nas costas _ “ já cumpriu o seu papel” na peça em questão. Chegou, por mérito próprio, aonde está, e gostaria de aproveitar a oportunidade em que a oposição se nivelou por baixo, para encerrar bem esta etapa.E, mesmo sem convencer, Lula se dispôs a arquivar a candidatura por perceber que a alternância pode ser a mola da democracia e encaminhar a saída honrosa para ganhar tempo sem ficar de mãos amarradas.Não é candidato e troca o terceiro mandato dele pelo terceiro governo do PT. Fez-se arauto do terceiro governo, no qual despontará como primeiro ministro de fato.

É a palavra dele, Lula, contra o fato de que o tempo ficou mais curto para a tramitação, em condições normais, da emenda constitucional no prazo regimental para aprovação no Congresso. Para as condições anormais, porém, ainda é cedo, e o que pode acontecer vai depender tanto das motivações de fora para dentro do Brasil, quanto das de dentro para dentro mesmo, porque ainda não as exportamos. Por esse lado, Lula capta o essencial: o que vai acontecer independe até dele. No entanto, ainda não se deu conta de que, cada vez mais, número maior de cabeças se nega a acreditar no que ouve ou lê sobre a equação presidencial para 2010. Tudo tem o toque provisório.

A razão, porém, está com o presidente quando também acha que “o Brasil é um país que tem pouco tempo de democracia” e que “a alternância de poder é muito importante” . Decidiu, por esta ou por outra razão, retirar-se da linha de especulação. Deixa subentendido que a questão geral deve tomar outras formas, desde que o terceiro mandato não pegou nem de muda nem de semente, que é a teoria. A prioridade passa a ser a alternância, mas não uma qualquer. Terá de se processar dentro da coalizão, mas – que fique claro - PMDB à parte e PT apenas por intermédio dele.

Do ponto de vista presidencial, na moldura da sucessão, Lula aceita abrir mão da oportunidade em 2010 em favor da reserva de seu nome para a eleição seguinte, em 2014. Com isto, reafirma a fé na continuidade constitucional, contando certo que a oportunidade lhe será devolvida _ um mandato de quatro anos depois _ por Dilma Rousseff. A fé na democracia avaliza a desistência do terceiro mandato e, para se recuperar do desgaste e garantir que tudo lhe seja favorável, inclusive as pesquisas, precisa congelar a soma total de dificuldades como se apresentam. Que assim é, já que lhe parece, mesmo sem ter lido Pirandelo.

Se tivesse desfrutado de um mandato mais normal, que não lhe exigisse tanta intromissão nos fatos, teria consumado o que prometia antes, qual seja, cortar o mal pela raiz. Nada de reeleição. Aí, sim, erradicaria o segundo mandato, que herdou do seu antecessor Fernando Henrique Cardoso. O segundo mandato não disse a que veio senão em caráter pessoal para alguns vivos que se fingem de mortos. Antes da gripe de origem suína, o vírus da reeleição já era difícil de curar, da presidência da República a prefeituras municipais, sem privilegiar governadores. Não há vacina obrigatória contra a reeleição que contamina o candidato assim que é diplomado. Em qualquer nível, o mandato passa a ser exercido em termos de campanha eleitoral.

Esvazia-se de qualquer sentido essa parlapatice, com todo o respeito léxico, de que o presidente esteja realmente preocupado com a alternância: alter (outro, em latim) quer dizer um, de dois. E Lula, etimologicamente incorreto, só pensa no mesmo. Mas é outra questão. Durante bom tempo, Dilma guardou lugar para ele, mas já está decolando. Assim, a emenda _ o elogio da alternância _ foi melhor para Lula do que o soneto, a reeleição única, produzido por Fernando Henrique. A discussão sobre o terceiro mandato, no modo presidencial de ver o futuro, acabou centrada no referendo popular ao qual ficaria reservada a última palavra, e com reticências para alimentar a incerteza.

Desculpe o presidente, mas por que, logo agora, teoriza sobre um assunto que não diz respeito à sucessão já antecipada por ele, e tão deslocada? Vai gostar de contradição assim lá no ABC, onde aprendeu política sem teorias. Ou - por que não? – sob uma bandeira por ele desfraldada, mas recolhida depois de eleito, uma empreitada parlamentar para arquivar a reeleição e liderar no continente a implantação do parlamentarismo, de índole universal. Este presidencialismo que os EUA inventaram e exportaram para consumo latino-americano não tem jeito.

Ai Lula estaria entrando para a História, mas aquela com inicial maiúscula, e ainda posaria para pintores num quadro de dimensões convincentes - com o toque épico de Pedro Américo – em que apareceria montando um cavalo à maneira napoleônica e, na mão, a Constituição dos 300 picaretas de 1988.

Socialização do prejuízo

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Uma análise da professora de literatura argentina da Universidade de Buenos Aires, Beatriz Sarlo, sobre o comportamento do eleitorado e dos políticos argentinos durante a campanha para as eleições parlamentares do último domingo, guarda traços de perfeita semelhança com o cenário político brasileiro.

Ao analisar as razões da apatia de uma população habitualmente ativa em questões políticas, a professora acaba (involuntariamente, pois não é esse o propósito dela) trocando em miúdos o ambiente político-eleitoral no Brasil, onde a sociedade é por tradição quase indolente.

A leitura do artigo, reproduzido pelo Estado na edição de domingo no caderno Aliás, leva à suspeição de que a simplificação das abordagens, o nivelamento por baixo da qualidade das demandas, a mistificação, a celebração do demérito, a sagração da ignorância e a despolitização das relações entre representantes e representados não tem fronteiras e já não respeita diferenças culturais.

Ainda antes do resultado e sem o dado da abstenção altíssima, Beatriz Sarlo constata que a campanha eleitoral deu ganho de causa à falta de substância nas propostas dos candidatos e à baixa exigência por parte dos eleitores. Um acordo tácito em prol da desqualificação.

"Dominou o covarde paradoxo de que os políticos, ao almejarem cargos representativos, não devem jamais dar a impressão de estar mais bem qualificados do que seus eleitores, porque, se algum deles se mostrar muito capacitado, correrá o risco de perder o elo com a massa de potenciais eleitores, que não deseja votar nos melhores entre os pares, mas nos seus idênticos."

Segundo ela, entre os políticos e os eleitores houve uma espécie de pacto perverso pautado pelo seguinte entendimento: "O chamado ?povo? não estaria disposto a se envolver com raciocínios que não possam ser traduzidos na linguagem simples do mais simplório senso comum." A simplificação.

Um contrassenso, na realidade, pois, como aponta Sarlo, "ninguém escolhe um médico, um arquiteto ou músico" de sua preferência pela lógica contrária ao mérito. Mas, no caso da política, na Argentina (a professora refere-se apenas ao seu país) "os políticos fizeram dela a base de sua elegibilidade". A mistificação.

Abraçam causas populistas não para subverter as hierarquias socioculturais, mas para atender aos ditames da "vulgaridade midiática que fareja tendências do mercado audiovisual".

Na campanha argentina, prossegue a professora da Universidade de Buenos Aires, "prevaleceu a ideia de que o político não deve oferecer seu diferencial intelectual e profissional como qualidade de uma boa representação, mas dissimulá-la como se fosse um defeito". A celebração do demérito.

A maioria dos políticos argentinos, diz Beatriz Sarlo, adotou a premissa da baixa capacidade de compreensão dos cidadãos. "Resignados de antemão a não se interessar pela política institucional, convencidos de que todas as pessoas vivem afundadas na rotina cotidiana sem possibilidade de levantar a cabeça e carecendo de instrumentos intelectuais para acompanhar uma exposição de complexidade média, armou-se um esquema que não visava a superar uma situação, mas fortalecê-la em nome de um realismo oportunista".

Familiar. E, portanto, didático.

Arrasa quarteirão

Em resumo, o líder do PSDB no Senado, Artur Virgílio, disse o seguinte ontem da tribuna: que senadores foram coniventes com os atos do ex-diretor Agaciel Maia; que parlamentares manipulam medidas provisórias para obter vantagens financeiras; que há senadores calados com medo de ser denunciados; que Agaciel Maia guardava montanhas de dinheiro vivo em armário no gabinete de trabalho; que o presidente do Senado fez tráfico de influência, usou indevidamente o patrimônio público em benefício privado e afrontou a Constituição e o Supremo Tribunal Federal ao praticar o nepotismo.

Não obstante, ninguém no colegiado deu sinal de ter se espantado.

Brecha

O governador de São Paulo, José Serra, já há algum tempo introduziu em suas conversas a possibilidade de não se candidatar à Presidência, optando pela reeleição.

Pura marola, ao molde exato dos interesses de Serra: aliviar a pressão dos aliados pelo lançamento da candidatura agora, cumprir o ritual da composição interna com simpatizantes de Aécio Neves e deixar consignada como de iniciativa própria a hipótese - hoje completamente inexistente - do recuo, caso a necessidade um dia se apresente.

Pane geográfica

Provável futuro presidente do PT, o ex-senador por Sergipe José Eduardo Dutra foi identificado aqui, no sábado, como ex-presidente do PT do Acre.

Por primário, o erro é inexplicável.

Entre o governo e a campanha eleitoral

Raymundo Costa
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Com exceção de Itamar Franco, todos os governos civis desde José Sarney perderam gás na reta final do(s) mandato(s). Itamar e seu candidato Fernando Henrique Cardoso estavam em lua-de-mel com o Plano Real, que completa amanhã 15 anos. A um ano e meio de encerrar sua estadia no Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva trafega por índices de popularidade inéditos, mas setores do PT já identificam sinais de paralisia típicos de final do governo.

Os mais preocupados não hesitam em afirmar, talvez com certo exagero, que o governo está parado e que os únicos setores funcionando são o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, que periodicamente envia uma proposta de renúncia e isenção fiscal para o Ministério da Fazenda, e os burocratas da Fazenda, que se encarregam de arredondar os pedidos. E é só.

Renúncia e isenção. Nada mais estaria funcionando segundo visitantes habituais dos ministérios.
Antes havia uma Casa Civil a todo vapor. O governo tomava a iniciativa e coordenava todos os atos. A situação mudou com o engajamento maior da ministra Dilma Rousseff em sua campanha eleitoral e o tratamento de saúde ao qual teve de se submeter. Em resumo, só Guido Mantega (Fazenda) é quem aparece para anunciar medidas classificadas de anticíclicas, mas de evidente motivação eleitoral, e sempre com o deslumbramento de quem acha que se sai melhor em relação à crise, comparado a outros emergentes (sem esconder uma ponta de disputa com Henrique Meirelles, do BC).

Há também apreensão no PT com a avaliação de que o presidente está de salto alto, embevecido com o apoio e os aplausos internacionais. É o cara. Deixa assim o governo correr solto, o que pode levar o quadro atual - que é favorável politicamente, na avaliação petista - a degringolar até a eleição presidencial de 2010. São 18 os ministros pré-candidatos à eleição de 2010.

É possível que o PT, vendo se tornar real a chance de manter o poder, se preocupe em excesso.

É verdade, no entanto, que governar dá trabalho, e hoje o que Lula aparenta gostar mesmo é de fazer campanha. Alguns dos pilares do governo petista para a eleição do próximo ano estão evidentemente com o cronograma atrasado; outros parecem ter erros de concepção. O que preocupa é a execução do PAC, que deveria ser prioritário para sustentar a campanha da ministra.

Um exemplo são as obras de revitalização e transposição do Rio São Francisco, que poderiam ter sido feitam por trechos, mas que o governo resolveu tocar tudo de uma vez e começou sem o projeto executivo indispensável para sua segurança. A transposição propriamente dita é tocada às pressas a fim de assegurar a inauguração até as eleições. Já a revitalização, que muitos críticos considera pré-condição para a transposição, caminha lentamente.

Cálculos de empreiteiros e governadores dão conta que nem 2% das obras do DNIT estão efetivamente andando.

A apreensão petista encontra correspondência na oposição, atenta ao desenvolvimento das obras. Um projeto sob minuciosa análise é o "Minha Casa, Minha Vida", que o PSDB chama de "estirolena eleitoral" - seria inviável nos grandes centros urbanos e a conta ficará para o novo governo.

Em São Paulo, para dar como exemplo a maior cidade do país, o sistema de cadastramento das subprefeituras chegou a entrar em colapso, nos primeiros dias após o anúncio do programa. Todo mundo queria a "casa do Lula". Mas a realidade paulistana é que nem 1% dos pedidos poderá ser atendido. Não há terrenos próximos. E a oposição não tem dúvidas: culpa, na eleição, será atribuída às prefeituras, como já ocorreria com o PAC.

O problema básico na grande São Paulo não é casa nova. É urbanizar a favela, porque a necessidade das pessoas é morar próximo ao local de trabalho. Existe a promessa de que será realizada infraestrutura, mas os precedentes históricos não são dos mais animadores: estação de tratamento, escola, centro de saúde fica tudo depois para o Estado. É só olhar para Cidade Tiradentes.

Um amigo de Dilma, porém, destaca: pode ter havido queda, mas o governo está mais de 50% ativo; a saída de cerca de 18 ministros podem ser uma vantagem - muitos teriam uma bola de chumbo no pé -, o comércio varejista se expandiu, as finanças estão equilibradas. "Estamos muito melhor do que qualquer outro momento de nossa curta experiência democrática".

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

Itamar se filia ao PPS para concorrer em 2010

DEU EM O GLOBO

BRASÍLIA. Ausente da vida partidária desde 2006, quando desfiliou-se do PMDB, o ex-presidente e ex-governador de Minas Gerais Itamar Franco vai se filiar ao PPS na próxima segunda-feira, com festa e pompa, numa cerimônia no salão nobre da Assembleia Legislativa, em Belo Horizonte.

Ainda não está definido qual será o cargo ao qual ele concorrerá nas eleições de 2010, mas, segundo o presidente nacional do PPS, Roberto Freire, uma coisa está certa: ele não será candidato a deputado federal. Sua aspiração são cargos majoritários: governador ou senador. Freire disse, no entanto, que ele tem potencial para disputar a Presidência da República.

Para o PPS, que vinha tentando filiar o ex-presidente desde o ano passado, a entrada de Itamar ajudará o partido a crescer - atualmente, o PPS tem 13 deputados federais e 132 prefeitos. Governadores que estavam no partido, como Blairo Maggi (MT) e Ivo Cassol (RO), se desvincularam.

Segundo Freire, Itamar vai integrar a executiva nacional do PPS e será um dos dirigentes da legenda em Minas.

Lula pede ao PT mais empenho por Sarney

Gerson Camarotti e Luiza Damé
DEU EM O GLOBO


O presidente Lula pediu ao PT e a aliados mais empenho em defesa do presidente do Senado, José Sarney (PMDB), envolvido nos escândalos da Casa. Senadores querem a saída de Sarney, mas o Planalto, não. "O apoio ao presidente Sarney é absoluto", afirmou o ministro José Múcio. O senador Tião Viana (PT) disse que o ex-diretor Agaciel Maia oferecia empréstimos a fundo perdido a parlamentares.

Lula quer PT ao lado de Sarney
O CONGRESSO MOSTRA SUAS ENTRANHAS

Presidente tenta neutralizar ameaça do DEM e manda aliados apoiarem senador

Preocupado com a desestabilização do mandato do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está operando pessoalmente para assegurar o apoio do PT e dos partidos de esquerda ao aliado. A operação tem como objetivo neutralizar o impacto da ameaça feita pelo DEM de retirar o apoio a Sarney, o que poderá se concretizar hoje, e que fragilizaria ainda mais sua posição. A determinação de Lula é para que os integrantes da bancada petista passem a explicitar o apoio a Sarney em pronunciamentos e entrevistas.

Nos últimos dias, Lula disse a Sarney para ficar tranquilo em relação ao PT. O senador também conversou, na última sexta-feira, com o ministro de Relações Institucionais, José Múcio Monteiro. A estratégia de reforçar a blindagem de Sarney foi avaliada ontem como a mais correta, na reunião de coordenação política de governo.

Pela segunda semana consecutiva, a crise no Senado foi tema da reunião, comandada por Lula. O presidente insistiu que a crise tem de ser resolvida pelos senadores, mas manteve a solidariedade a Sarney. No final do encontro, Múcio disse que Sarney tem o apoio "absoluto" do Planalto.

- O apoio do governo ao presidente Sarney, já foi dito, é absoluto.

Segundo Múcio, o governo não trabalha com a possibilidade de Sarney se afastar da presidência do Senado:

- Em hipótese nenhuma. Isso nem sequer foi tratado. Todo mundo torce para que isso não aconteça. Isso não passa pela cabeça de ninguém.

- O governo vai aguardar as providências tomadas, mas confia plenamente no presidente do Senado - reforçou o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR).

Mercadante convoca reunião da bancada

No Senado, o petista Tião Viana (AC), que disputou a presidência da Casa com Sarney, em fevereiro, reconheceu que a posição do presidente Lula de defender publicamente o senador deve influenciar a bancada. Ontem, o líder do partido, Aloizio Mercadante (SP), que preferiu não comentar a orientação do governo, convocou a bancada para reunião, hoje.

- Mercadante pediu calma para a bancada. A ideia é ter uma decisão conjunta. Agora, a posição do presidente Lula vai influenciar os senadores petistas - admitiu Viana.

Na reunião, Lula considerou que a ameaça do DEM de retirar a sustentação a Sarney está relacionada à posição do próprio senador de apoiar antecipadamente a candidatura presidencial da chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, em 2010. Daí o dever de o governo e o PT apoiarem sua permanência no comando do Senado.

A determinação de Lula é que todos os setores do PT, inclusive a bancada da Câmara, manifestem-se em favor de Sarney, para pressionar publicamente a bancada do PT no Senado.

Além de retribuir o apoio recebido de Sarney ao longo dos últimos anos, Lula tem uma preocupação pragmática: o enfraquecimento ou a saída de Sarney do comando do Senado poderia resultar numa crise de governabilidade, fatal para a conclusão de seu mandato, que termina em um ano e meio.

- A solução é do Senado. Somos solidários. O presidente Lula tem conversado com o presidente do Senado. Nós nos preocupamos e desejamos, inclusive o presidente do Senado, que todas as coisas sejam apuradas - afirmou Múcio.

Segundo auxiliares, Lula está convencido que Sarney não teria praticado tráfico de influência em relação ao caso de seu neto José Adriano Sarney, que atuou no mercado de crédito consignado do Senado.

Líder do PSDB pede saída de Sarney, que se apoia no DEM

Valdo Cruz, Andreza Matais e Adriano Ceolin
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Presidente do Senado envia carta sobre ação do neto antes da reunião dos democratas

Líder do DEM, José Agripino Maia, diz que o partido "não vai dar nenhum passo para afundar Sarney, mas não vai oferecer rede de proteção"

Em mais um dia de pressões para deixar o cargo, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), desencadeou ontem, ao enviar carta aos 80 senadores, uma estratégia destinada sobretudo a manter o apoio do DEM, fundamental para garantir a sua sobrevivência no comando da Casa.

Já o líder tucano Arthur Virgílio (AM) enviou ao Conselho de Ética da Casa uma lista com 18 acusações divulgadas na imprensa contra Sarney para que sejam investigadas. O PSOL anunciou que ingressa hoje com representação por quebra de decoro parlamentar por causa dos atos secretos.

Só a Mesa Diretora e partidos com representação no Congresso podem pedir abertura de processo no Conselho de Ética -quenão está funcionando porque o PSDB e o PMDB ainda não indicaram seus representantes para o órgão.

Virgílio, também sob pressão por ter recebido um empréstimo do ex-diretor-geral Agaciel Maia, disse que Sarney perdeu as "condições morais" para permanecer no cargo.

Sarney foi avisado por amigos no DEM de que o partido precisa de um bom argumento -ou seja, explicações sobre a empresa de seu neto e o crédito consignado- para evitar que seus senadores comecem a engrossar o coro que pede ao menos sua licença do cargo.

Daí a decisão de distribuir a carta com esclarecimentos sobre a atuação da empresa de seu neto José Adriano Sarney, destacando que ela havia sido descredenciada para operar com crédito consignado na Casa quando assumiu a presidência. Informou ainda ter pedido à Polícia Federal investigações sobre todas as operações de crédito consignado.

A preocupação de Sarney com o apoio do DEM começou na semana passada, quando democratas como Demóstenes Torres (GO) passaram a criticá-lo publicamente. Hoje a bancada de 14 senadores democratas vai se reunir para discutir a situação do peemedebista.

O líder do DEM, José Agripino Maia (RN), disse que o partido "não vai dar nenhum passo para afundar o [senador] Sarney, mas não vai oferecer nenhuma rede de proteção".

Agripino afirmou que vai defender que Sarney se licencie da presidência enquanto as denúncias no Senado estiverem sendo apuradas. "Para mostrar que há isenção."

Segundo o senador, a principal questão a ser discutida pela bancada é a do neto de Sarney.

"Nós defendemos o afastamento do [ex-diretor de Recursos Humanos João Carlos] Zoghbi por conta de negócios suspeitos com crédito consignado. Se Sarney não conseguir explicar que o caso de seu neto é diferente do de Zoghbi, não poderemos ser incoerentes", disse.

Por enquanto, o peemedebista conta com o apoio de boa parte dos senadores do DEM -como o primeiro-secretário da Casa, Heráclito Fortes (PI). Os democratas, porém, começam a ficar incomodados com queixas vindas de eleitores.

Outra saída articulada pelo DEM é solicitar que Sarney se distancie da investigação sobre Agaciel, evitando assim pressionar pelo seu afastamento.

Indicado por Sarney, Agaciel, ficou 14 anos no cargo, o qual deixou após a Folha revelar que ele escondeu da Justiça uma casa de R$ 5 milhões.

O governo manterá o discurso de apoio e de ampla defesa do peemedebista. Ontem, após reunião da coordenação política, o ministro José Múcio Monteiro (Relações Institucionais) disse que o governo "em hipótese nenhuma" trabalha com a saída dele. "O apoio do governo a Sarney é absoluto."

Sarney também foi defendido pelo tucano Aécio Neves, governador de Minas Gerais. Aécio disse que o senador "tem história política" para enfrentar problemas que precisam ser sanados na Casa.

Sarney e Aécio mantêm boa relação política desde a morte de Tancredo Neves, avô do tucano, no lugar de quem Sarney assumiu a Presidência em 1985.

PPS repudia golpe, plebiscito e intervenção militar em Honduras

Valéria de Oliveira
DEU NO PORTAL DO PPS

O PPS divulgou nota oficial repudiando o golpe militar em Honduras e também a tentativa do presidente deposto, Manuel Zelaya, de tentar manter-se no poder. O partido defende o "imediato retorno" de Zelaya à Presidência, o cancelamento do plebiscito para alterar a Constituição, ao mesmo tempo em que rechaça intervenções armadas, conforme propôs o presidente da Venezuela, Hugo Chávez. Leia íntegra da nota abaixo:

"Em defesa do processo democrático em Honduras

O PPS – Partido Popular Socialista – manifesta sua enorme preocupação com a situação política criada em Honduras e decorrente, de um lado, da iniciativa do presidente Manuel Zelaya de tentar mudar a Constituição do país, a fim de manter-se no poder, fora das regras constitucionais e contra decisões do Congresso e da Suprema Corte, e, de outro, pela ação das Forças Armadas de Honduras que o destituíram.

O Brasil e demais países do continente devem trabalhar nos fóruns multilaterais por uma solução pacífica e negociada para o impasse entre as instituições hondurenhas, sem ceder à tentação de fazer uma intervenção armada externa como ameaça o presidente venezuelano, Hugo Chávez. O único caminho democrático para a solução dos impasses naquele país é o do estrito respeito à sua Constituição.

A consolidação do processo democrático no continente é etapa fundamental para enfrentar os graves problemas sociais e econômicos que historicamente assolam a região, não havendo mais espaço para as violações constitucionais e outros expedientes de triste memória, como os golpes militares, as quarteladas de qualquer tipo e as intervenções externas.

Roberto Freire
Presidente nacional do PPS

Mais opiniões sobre o tema: Leiam os editoriais dos principais jornais do Brasil.

Golpe isola Honduras e une EUA e Cuba

DEU EM O GLOBO

Membros da Alba, aliados do governo Zelaya, retiram seus embaixadores e OEA pode decidir hoje a exclusão de país

MANÁGUA. O golpe de Estado ocorrido domingo em Honduras promoveu uma pausa nas diferenças entre os países do continente, que condenaram a ação por unanimidade. Líderes de tendências tão diferentes quanto o venezuelano Hugo Chávez e o americano Barack Obama afirmaram que só reconhecem Manuel Zelaya como o presidente de Honduras, isolando politicamente o novo governo. Expulso do país ainda de pijama, Zelaya foi convidado a participar hoje dos encontros da Organização dos Estados Americanos (OEA), e da ONU.
Zelaya - que havia desacatado a Suprema Corte, o Congresso e as Forças Armadas ao manter ilegalmente uma consulta sobre reforma Constitucional - fora enviado à Costa Rica pelos militares. Ele chegou à Nicarágua, onde 15 chefes de Estado, convocados pelo aliado Hugo Chávez, discutiram o problema.

- Estamos diante de um fato com o qual concordamos independentemente das ideologias. É uma prova dos passos positivos que vem dando a América Latina - disse Chávez.
Em Honduras, Roberto Micheletti, empossado presidente pelo Congresso, disse que a deposição de Zelaya foi uma forma de evitar que o governo se tornasse de esquerda radical.

- Zelaya estava levando o país ao chavismo - disse.
Alba afirma que apoiará rebelião popular
O tom, no entanto, variou de país a país. À reunião dos países do Sistema de Integração Centro-Americana (Sica), juntarem-se os membros da Alternativa Bolivariana das Américas (Alba), que mais tarde se encontraram com o Grupo do Rio. As discussões reuniram do presidente mexicano, Felipe Calderón - que chegou acompanhado pela chanceler hondurenha, Patricia Rodas, que fora expulsa do país - ao cubano Raúl Castro.

Guatemala, El Salvador e Nicarágua decidiram suspender o comércio terrestre com Honduras.
Além de condenar o golpe, os líderes da Alba decidiram retirar seus embaixadores de Honduras - numa medida que deve ser acompanhada pela Sica - e apoiar a insurreição popular.
- Estamos prontos a apoiar a rebelião popular. O povo tem o direito de recorrer à insurreição em defesa da ordem constitucional - afirmou Chávez.

Também em Manágua, o secretário-geral da OEA, José Miguel Insulza, fez um duro pronunciamento e anunciou o envio de uma delegação a Honduras.
- Foi um golpe e devemos manter a pressão sobre o governo ilegítimo - disse Insulza, destacando que a reunião de hoje da OEA poderá decidir pela exclusão de Honduras.

Embora a princípio Chávez e Zelaya tenham sugerido que os EUA pudessem estar envolvidos no golpe, o presidente Barack Obama disse que o ocorrido "pode abrir um precedente se o golpe não for revertido e Zelaya reconduzido ao poder".

- Vamos trabalhar com a comunidade internacional para restaurar Zelaya de forma pacífica, mediando um acordo entre as partes - disse Obama.
A secretária de Estado, Hillary Clinton, pediu o restabelecimento da ordem democrática: - As tensões em Honduras evoluíram para o que parece ser um golpe e vamos nos posicionar a favor do restabelecimento da democracia - disse Hillary, que negou planos de suspender a ajuda de US$43 milhões.

As declarações geraram situações raras, como o elogio do ex-presidente cubano Fidel Castro a Hillary, em artigo. "Com esse comando golpista não se pode negociar. Até a senhora Clinton declarou que Zelaya é o único presidente, e os golpistas hondurenhos sequer respiram sem o apoio dos EUA", escreveu.

Zelaya negou novamente que houvesse renunciado:

- Quero voltar ao meu país. Sou presidente de Honduras.

Colaborou Marília Martins, de Nova York

Revés histórico enfraquece os Kirchner para eleição de 2011

Janaína Figueiredo
DEU EM O GLOBO
A antecipação das eleições legislativas na Argentina, aprovada em março, numa manobra do governo para ganhar o pleito, acabou se transformando na maior derrota já sofrida pelo casal Kirchner desde que chegou ao poder, em 2003. Numa eleição fundamental para a sucessão presidencial de 2011, sete de cada dez eleitores votaram contra os candidatos kirchneristas, enfraquecendo a liderança de Néstor e Cristina pelos próximos dois anos. Depois de ter governado o país durante seis anos com maioria na Câmara e no Senado, o casal K ficou sem o controle do Congresso, perdendo 17 deputados e pelo menos quatro senadores. Embora eleito deputado, Néstor Kirchner foi o maior derrotado e renunciou à presidência do Partido Justicialista. Cristina admitiu que seu governo será forçado a negociar com a oposição.

Derrota abala os planos dos Kirchner

Governo argentino perde a maioria no Congresso e presidente Cristina é forçada a buscar aliados na oposição

Aantecipação das eleições legislativas, aprovada em março passado pelo Congresso argentino por iniciativa da Casa Rosada, não impediu o pior revés eleitoral já sofrido pelo casal Kirchner desde que chegou ao poder, em maio de 2003. A primeira vítima da derrota foi o próprio ex-presidente Néstor Kirchner que, apesar da agressiva campanha contra seus adversários, da qual participou a presidente, Cristina Kirchner, teve sua lista derrotada na eleição para deputados da província de Buenos Aires (o ex-presidente foi eleito, mas sua lista ficou em segundo lugar). Ontem, ele renunciou à presidência do Partido Justicialista (PJ), e seu projeto de retornar à chefia do governo nas eleições presidenciais de 2011 ficou enfraquecido.

Segundo analistas locais, a crise em que está mergulhado o governo argentino nasceu em março do ano passado, quando começou o conflito entre a Casa Rosada e os produtores rurais do país, que durante quase meses paralisou a Argentina. De acordo com dados oficiais, numa eleição considerada decisiva pelo governo e pela oposição, sete de cada dez eleitores votaram contra os candidatos kirchneristas.

- Os argentinos votaram contra uma forma de fazer política, contra um estilo autoritário que ficou muito claro na crise com o campo - disse o deputado eleito Francisco de Narváez, líder do peronismo dissidente, cuja lista ficou em primeiro na província de Buenos Aires, com 34,58% dos votos.

Embora a presidente tenha tentado minimizar o impacto da derrota eleitoral, afirmando que em termos do número total de votos do país o governo ficou em primeiro lugar, os candidatos kirchneristas perderam na capital, na província de Buenos Aires e nos principais distritos eleitorais argentinos, entre eles as províncias de Córdoba, Santa Fé, Entre Rios e Mendoza. Depois de ter governado o país durante seis anos com maioria em ambas as Câmaras do Congresso, o casal presidencial perdeu 17 deputados e pelo menos quatro senadores (o número poderia chegar a cinco), passando a ser minoria na Câmara e no Senado. Apesar de tentar transmitir uma mensagem de vitória, Cristina admitiu que a partir de dezembro, quando assumirão os novos congressistas, seu governo deverá negociar com a oposição.

- (O resultado) Vai exigir exercícios de consenso, de acordos para obter governabilidade. Deveremos negociar, acordar, alcançar consensos - declarou a presidente.

Oposição critica reação de Cristina

Cristina se mostrou de bom humor e afastou mudanças no Gabinete. Perguntada sobre as razões da derrota, disse que "foi a vontade do povo".

- Essa vontade é irrefutável, se perde ou se ganha por um voto. Certamente cometemos erros e eles serão analisados - limitou-se a dizer a presidente, que também descartou mudanças no polêmico Indec (o IBGE argentino), acusado pela oposição de manipular as estatísticas oficiais do país.

A atitude de Cristina foi questionada pela oposição, que a acusou de "viver numa realidade paralela".

- Temos de dar uma semana à presidente, foi um golpe muito duro, ela está em estado de choque - disse a ex-candidata presidencial e líder do Acordo Cívico e Social Elisa Carrió, que elegeu-se deputada pela capital.

Para Carrió, "ao negar a realidade, a derrota nas principais cidades do país, Cristina está aprofundando os problemas da Argentina".

- Quem coloca em risco a governabilidade é a presidente e não a oposição - alfinetou a deputada eleita, respondendo à Cristina, que ontem pediu à oposição que ajude a manter a governabilidade no país.

A presidente destacou o bom desempenho do cineasta Fernando "Pino" Solanas na eleição para deputado na capital do país (a lista de Solanas ficou em segundo lugar, com 24% dos votos) e disse que seu partido (Proyecto Sur), que elegeu três deputados, poderia ser um futuro aliado do governo no Congresso.

- Pino nos critica porque fizemos poucas mudanças. Bom, poderia ser um futuro aliado - disse Cristina.

Longe do otimismo da presidente, governadores peronistas e dirigentes do PJ já falam no início de uma era pós-kirchnerista no país.

- A presidente e o ex-presidente deixaram de ouvir o povo - afirmou o ex-chefe de Gabinete, Alberto Fernández, que renunciou em meados do ano passado, em meio à crise entre a Casa Rosada e os produtores rurais do país.

Uruguai define candidatos a presidente

DEU EM O GLOBO

Ex-guerrilheiro de esquerda e ex-mandatário são os favoritos na disputa

MONTEVIDÉU. O Uruguai já tem definidos seus dois principais candidatos à Presidência, que se enfrentarão nas urnas no dia 25 de outubro. O ex-guerrilheiro tupamaro José Mujica, da governista Frente Ampla, e o ex-presidente Luis Laccalle, do Partido Nacional, saíram vencedores das eleições primárias organizadas por suas legendas no domingo.

Mujica, de 75 anos e considerado por analistas com um pequeno favoritismo na corrida presidencial, obteve 52% dos votos da Frente Ampla e, pouco após o anúncio do resultado, marcou uma reunião com o segundo lugar nas primárias de seu partido, Danilo Astori. O objetivo, segundo fontes ouvidas pela imprensa uruguaia, é convidar Astori para concorrer à vice-presidência, mantendo assim a unidade do partido. Astori era o candidato preferido do presidente Tabaré Vázquez e o medo era de que sua derrota dividisse o partido, fazendo com que o candidato governista perdesse terreno para o opositor Partido Nacional, que vêm ganhado força na preferência do eleitorado.

- A esquerda virou governo e perdeu um pouco de seu encanto e sua força mobilizadora. Uma divisão durante a campanha pode abrir espaço para rivais. Por isso, a tentativa de se obter um acordo - disse ao jornal uruguaio "El País", o cientista político Juan Carlos Doyenart.

Presidente teme não transferir votos

Lacalle, de 67 anos e que governou o Uruguai entre 1990 e 1995, obteve 57% dos votos do Partido Nacional, contra 39% de seu principal rival, Jorge Larranaga. Os blancos, como são chamados no Uruguai os membros do tradicional partido de direita, ganharam terreno em pesquisas recentes e podem, segundo analistas, tornar acirrada a disputa pela Presidência.

Outro fator que motivou a oposição foi o alto índice de afiliados que compareceram às urnas, bem maior que o registrado na Frente Ampla.

- Se analisarmos somente a mobilização, podemos dizer que os blancos saíram na frente. Mas ainda há muita coisa para acontecer. A corrida presidencial só está começando - disse Doyenart.

Apesar dos bons índices de popularidade do governo de Tabaré Vázquez - eleito em 2004 e o primeiro presidente de esquerda da História do Uruguai -, analistas afirmam que o presidente, que não pode se reeleger, pode não ser bem-sucedido na tarefa de transferir votos para seu candidato. Pesquisas de opinião indicam que muitos dos eleitores do presidente, que aprovam seu governo, poderiam votar na oposição, por não acreditarem que o sucessor de esquerda tenha condições de fazer uma boa administração.

Já o candidato do Partido Colorado, que dominou durante mais de um século a vida política do Uruguai, mas que segundo as pesquisas tem poucas chances de vencer em outubro, será Pedro Bordaberry, filho do ex-ditador Juan Bordaberry, preso por violações dos direitos humanos. Os colorados ocuparam o governo no Uruguai por 150 anos, mas tiveram uma queda vertiginosa nas últimas eleições nacionais de 2004, quando só conseguiram 8% dos votos.

No entanto, devido a grande disputa entre a Frente Ampla e o Partido Nacional, os votos dos colorados podem ser cruciais em outubro para definir o vencedor em um eventual segundo turno. O partido, no entanto, não dá sinais de que poderia fazer alguma aliança com outro partido.

O QUE PENSA A MÍDIA

Editoriais dos principais jornais do Brasil

Clique o link abaixo

A recuperação da crise e as divergências entre os economistas

Yoshiaki Nakano
DEU NO VALOR ECONÔMICO

Há concordância de que existem sinais de que o ritmo de queda nas economias desenvolvidas está reduzindo. Alguns analistas já se apressam em afirmar que já estamos chegando ao "fundo do poço" e que no final deste ano aquelas economias vão iniciar a recuperação cíclica. Outros analistas mais críticos afirmam que não há nenhuma indicação de que o "pior já passou", ou de que recuperação virá, ou de que a recuperação se iniciará ainda neste ano. Em relação aos emergentes, não dá para fugir do fato de que a China e a Índia estão conseguindo manter o crescimento forte em 2009, ainda que num ritmo bem menor do que dos anos precedentes, e de que o demais vão sofrer contração nas suas economias em 2009. Da mesma forma, alguns analistas acreditam que já em 2010 estas economias voltarão a crescer, enquanto outros pintam um quadro mais difícil em que a recuperação não virá sem mudanças estruturais e reformas.

É natural que as opiniões dos economistas sejam conflitantes, pois existem divergentes visões de mundo e diferentes percepções sobre a natureza da crise e, consequentemente, da saída da crise. Existem também interesses divergentes e diferentes capacidades de fugir da ditadura das velhas ideias às quais se referia Keynes, ao revolucionar a macroeconomia na década de 30.

É fundamental entender o que está por trás das divergências para podermos interpretar corretamente as previsões sobre a recuperação da crise. Vamos entender estas divergências colocando foco numa questão central, que é se as medidas já tomadas e anunciadas serão suficientes para que as economias voltem a se recuperar em 2010, ainda que timidamente, e retomem em algum momento a trajetória de crescimento.

De uma forma bastante esquemática, para termos referência, podemos agrupar os economistas em dois grupos. De um lado, aqueles que acreditam, em maior ou menor grau, que a teoria econômica convencional, a teoria neoclássica, descreve corretamente as leis de funcionamento dos mercados. Como nos mercados interagem agentes racionais, os textos com a orientação da teoria neoclássica estabelecem como leis que os mercados tendem a se auto-equilibrar e se auto-ajustar, autorregulam-se e são eficientes, isto é, os preços determinados pelos mercados são corretos e refletem os fundamentos. Assim, desequilíbrios e crises seriam fenômenos transitórios causados fundamentalmente por fatores exógenos, ou seja, por interferência de elementos externos, principalmente as ações do governo ou outros choques, causados sempre por fatores exógenos.

De outro lado estão os economistas que rejeitam a teoria neoclássica em maior ou menor grau. Este grupo entende que, na realidade dos fatos, os mercados são instituições criadas e desenvolvidas pela sociedade humana, e nem sempre se comportam de forma racional, pois são antes seres morais, agem emocionalmente, cometem erros e têm interesses conflitantes. Assim, os mercados, como qualquer outra instituição humana, têm falhas. Eles nem sempre se equilibram ou se autorregulam, portanto a qualidade da regulação pelo governo é fundamental para o seu bom funcionamento, que também pode falhar. Os mercados podem gerar "bolhas" de preços descoladas dos fundamentos, particularmente no mercado financeiro, onde os preços dos ativos não têm referência clara dos fundamentos e dependem de fatores como liquidez e crédito.

Nestes mercados podemos ter comportamentos de manada, manias e pânicos. Assim, as crises são inerentes ao sistema de mercado e inevitáveis.

Se você for economista do primeiro grupo, esta crise financeira foi causada por um choque exógeno, houve erro na política monetária de Alan Greenspan [ex-presidente do Fed], de juros excessivamente baixos, e é um fenômeno cíclico e passageiro. Como os mercados tendem a se auto-equilibrar e se autorregular, a recuperação acontecerá em breve e não será necessária uma maior regulação, ou reformas estruturais no sistema financeiro, ao contrário. Para os menos fundamentalistas, a ação do governo foi necessária e já dá sinais de seus efeitos, assim a recuperação e volta à normalidade deverão ocorrer no final deste ano.

Se você for do segundo grupo, esta crise financeira é fenômeno endogenamente gerado pelo próprio funcionamento dos mercados. A desregulação e introdução de inovações financeiras permitiram o desenvolvimento de um sistema bancário paralelo que promoveu uma expansão excessiva de crédito e liquidez, bolhas especulativas e, por fim, a crise que causou o colapso do crédito, preferência pela liquidez, colapso nos preços dos ativos, grandes prejuízos e perdas patrimoniais. A crise num segmento pode contaminar outros, provocando prejuízos e criando diversos circuitos de realimentação e afetando todo o sistema financeiro. Portanto, a crise é sistêmica e estrutural. A gigantesca injeção de liquidez pelos bancos centrais foi necessária para evitar o colapso de todo o sistema bancário e paralisia do sistema econômico, mas não põe de pé o sistema financeiro, nem mesmo com taxa de juros zero e oferta infinita de crédito do banco central. O sistema financeiro precisa ser reconstruído com nova regulação para a economia real se recuperar. Como a política monetária torna-se ineficaz para reestimular a economia, só a política fiscal ativa pode evitar maior queda na demanda agregada. Entretanto, as políticas monetária e fiscal são insuficientes pois, sem a reconstrução do sistema financeiro, a verdadeira recuperação não ocorre.

Nesta última visão, não há sinais de recuperação nas economias desenvolvidas e a crise financeira pode ter novos desdobramentos, pois o próprio remédio, a injeção de liquidez massiva pelos bancos centrais, não é propriamente terapêutico - só evitou o pior, e pode causar novas bolhas e crises se o sistema financeiro não for reconstruído com novas regras rapidamente. A recuperação das economias emergentes depende da capacidade de antever as consequências da crise e fazer reformas e ajustes estruturais para se ajustar ao novo quadro pós-crise.

Certamente, um quadro global em que os fluxos de capitais serão menores, as exportações já sofreram forte queda e as importações alimentadas pelo consumismo e crédito dos americanos não serão fonte de crescimento dos emergentes via aumento das exportações. Será preciso tanto aumentar a poupança doméstica, como gerar dinamismo do mercado interno.

Yoshiaki Nakano, ex-secretário da Fazenda do governo Mário Covas (SP), professor e diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas - FGV/EESP, escreve mensalmente às terças-feiras.

O grande pacotão de Lula

Vinicius Torres Freire
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Governo ofereceu centenas de bilhões em créditos e subsídios e evitou crise pior; mas, agora, conta começa a ficar pesada

DESDE O INÍCIO da crise, o governo federal ofereceu cerca de R$ 96 bilhões em créditos extras a taxas de juros e outras condições especiais, sem contar os R$ 100 bilhões de crédito extra do Tesouro Nacional para o BNDES e o programa "Minha Casa, Minha Vida", que mal engatinha. Os subsídios fiscais diretos, as reduções de impostos, devem chegar a R$ 22 bilhões no final do ano. A redução do compulsório, o dinheiro que os bancos devem deixar parado no Banco Central, chegou a uns R$ 90 bilhões.

Os vários fundos garantidores de crédito (FGCs) bancados em parte pelo governo também implicam um subsídio implícito, pois ajudam a reduzir a taxa de juros para o tomador que não dispõe de bom crédito. Um FGC é uma espécie de fiador.

No fim das contas, deu quase para todo mundo. Para pessoas físicas, houve redução de Imposto de Renda, de IOF, de IPI para veículos, materiais de construção, eletrodomésticos, dinheiro extra para o consignado, para a compra de casas de servidores etc. Entre as empresas, levaram algum as de infraestrutura, de construção civil, montadoras, "ruralistas" e agricultura familiar, grandes varejistas etc. Seria possível colocar na conta também operações de venda de dólares do Banco Central, que acabaram por aliviar empresas exportadores, as endividadas no exterior e aquelas que enfrentavam problemas e/ou aventuras cambiais.

Não dá para somar tudo porque: a) trata-se de alhos e bugalhos: créditos, subsídios fiscais, expansão do dinheiro no caixa dos bancos, dólares das reservas etc.; b) nem toda oferta de crédito vira empréstimo de fato e, de resto, é difícil separar exatamente crédito novo de velho.

A medida mais impressionante de ontem foi o aumento do subsídio do Tesouro (de impostos) para todas as empresas que tomam dinheiro do BNDES, que recebeu R$ 100 bilhões extras do governo neste ano. Sobre esse dinheiro, o governo vai cobrar do banco estatal só a TJLP (a taxa "básica" do BNDES, 6% ao ano). O custo para o governo arrumar esse dinheiro é de, no mínimo, uns 9%, 10% ao ano. Outra medida forte foi um subsídio que pode chegar a meio bilhão de reais por ano, talvez ao longo dos próximos dez anos, para quem comprar máquinas, equipamentos e tiver programas de inovação produtiva. Em alguns casos, crédito a juro zero.

Não houve dinheiro novo para linhas de crédito, apenas juros subsidiados.

De onde veio todo o dinheiro? De repasses diretos ou indiretos para bancos públicos, vindos do Tesouro (que fará dívida para financiar tudo isso, pois é deficitário). Dos trabalhadores (do FGTS e do FAT). Das reservas internacionais (compradas com dívida pública).

Em suma, o grosso das medidas do governo Lula aumentou os fundos dos bancos públicos, que assim puderam emprestar mais e sustentar o crédito. Também subsidiou o consumo de bens duráveis (o que evitou o pânico de desemprego que se via entre dezembro e janeiro, tumulto que, se não tivesse freio, levaria o país a uma recessão profunda). Por fim, aumentou os recursos livres no caixa de bancos privados e as garantias para seus empréstimos. Assim, evitou-se um desastre. Mas, agora, chega. Há uma conta a pagar, na forma de aumento da dívida pública.

Bolsa Juros

Míriam Leitão
DEU EM O GLOBO

O anúncio de medidas anticrise perdeu a sobriedade e virou ato de campanha. O Bolsa Juros, que o governo chama de "programa de equalização", vai custar, segundo ele mesmo, R$42 bilhões. Ou o número está exagerado ou é um absurdo custo fiscal. O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, proclamou que o Brasil superou a crise graças à "visão estratégica do nosso timoneiro, o presidente Lula".

Ao todo, R$45 bilhões serão transferidos - pelos dados do governo - para as empresas através de redução de impostos e juros subsidiados. Haverá juro zero - em termos reais - em algumas linhas, segundo anunciaram as animadas autoridades. Quanto mais o governo subsidia juros, e cria grupos de privilegiados que pagam menos, mais distorções se acumulam no mercado de crédito do país.

O ministro Guido Mantega disse que a queda dos preços dos produtos da linha branca é prova de que a redução do imposto foi repassada para o consumidor. Só que neste período houve queda forte do preço da matéria-prima. O aço ficou mais barato, por exemplo, porque a cotação caiu no mercado internacional.

Parte do aumento das vendas se deve, claro, às reduções dos impostos e à informação de que eles são temporários, mas ninguém compra uma geladeira nova apenas porque o imposto caiu. A pessoa antecipa a decisão de comprar o produto diante do risco de ter que pagar mais caro amanhã. Isso tem um efeito de reativar a economia: limitado e temporário.

Renúncia fiscal é gasto. Quanto custa exatamente o pacote de ontem é difícil saber. A tendência do governo é valorizar o que concede; a dos empresários é minimizar para pedir mais. No caso de bens de capital, o ministro Mantega anunciou que a desoneração será de R$414 milhões. O setor contesta o dado, até porque o principal pedido que estava sendo feito era outro. De acordo com o vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Velloso, o anúncio do governo para o setor foi perfumaria. Ele afirma que a principal reivindicação não foi atendida, que era a devolução imediata de PIS/Cofins que hoje acontece num prazo de 12 meses.

- Praticamente não houve desoneração tributária para máquinas e equipamentos porque cerca de 90% do faturamento do setor já é isento de IPI. Não sei como o governo chegou a esse valor de R$414 milhões. A impressão que fica é que o governo deu tanta desoneração para outros setores que agora faltou caixa para a gente - afirmou.

A reação do governo à crise teve boas medidas e outras discutíveis, mas não se pode dizer que toda a melhora do clima econômico se deva a essas decisões. O mundo melhorou. O pânico que se instalou logo após a quebra do Lehman Brothers foi vencido, e isso permitiu a volta do interbancário no mundo. Na hora do pânico, a ação rápida do Banco Central diminuiu a tensão. Mas o ritmo de atividade está fraco, a confiança ainda é baixa. É cedo para dizer que o Brasil crescerá 4,5% no ano que vem ou que o "saldo do emprego já é positivo nos últimos meses", como fez o ministro Mantega. O saldo ainda é negativo.

O anúncio de ontem foi transformado em peça de campanha política, mas o ministro da Fazenda foi sóbrio perto do presidente do BNDES, que garantiu ao "timoneiro" que "o nosso barco ultrapassou a borrasca".

Luciano Coutinho disse que "alguma coisa" lhe dizia, em agosto do ano passado, que o país teria uma crise. Na verdade, inúmeros analistas tinham certeza que a crise internacional bateria no Brasil. O governo é que, imprudente, achava que não. O presidente do BNDES garantia que o Brasil estava descolado da crise externa. O erro naquela época foi subestimar o problema. O erro agora é superestimar a melhora.

O maior erro é a falta de visão estratégica dos timoneiros. O programa de estímulo econômico do Brasil não tem cálculos precisos de custo, não tem senso de direção e não exige contrapartidas dos empresários.

Veja-se o caso dos incentivos dados aos caminhões, inclusive à revenda de caminhões velhos. Por anos, os fabricantes de caminhões e ônibus no Brasil se recusaram a cumprir a determinação do Conama de trocar seus motores por modelos novos que usam o diesel de baixo enxofre. A Petrobras não cumpriu a determinação alegando que os motores não estavam disponíveis.

Agora era a hora de dar com uma mão e pedir com a outra. A contrapartida mínima das montadoras era a de apressar o programa de mudança de motores para reduzir o número de brasileiros que morrem contaminados pelo enxofre expelido por eles.

Dinheiro público em programa de subsídios se usa da seguinte forma: primeiro, dando transparência ao gasto, para que o país não volte ao tempo do orçamento paralelo; segundo, aproveitando o subsídio para induzir avanços nas decisões das empresas para não se ficar na situação da política industrial que aumentou o dinheiro para frigoríficos que desmatam a Amazônia; terceiro, evitando o tom histriônico de campanha eleitoral em momentos que exigem sobriedade.

Mais R$8 bi em incentivos

Martha Beck, Eliane Oliveira, Gustavo Paul e Luiza Damé
DEU EM O GLOBO

EMPURRÃO OFICIAL

Governo prorroga reduções de IPI e Tesouro vai bancar crédito mais barato para bens de capital

Num esforço para garantir a retomada do crescimento este ano, o governo anunciou ontem incentivos de cerca de R$8 bilhões para setores como bens de capital, inovação, automotivo, linha branca, construção civil e trigo. Foram prorrogadas as desonerações do Imposto sobre Produtos (IPI) feitas no auge da crise mundial, além da redução a zero de PIS/Cofins para motos e para a cadeia do trigo. Juntas, as medidas terão impacto de R$3,342 bilhões nos cofres públicos em 2009. Além disso, o Tesouro Nacional vai bancar a redução dos juros para financiamentos do BNDES para o setor de bens de capital e inovação, o que terá custo de R$500 milhões e de até R$4,5 bilhões em oito anos.

- São medidas importantes, que desoneram o custo das empresas e ajudam o país a crescer - disse o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Para Mantega, o Brasil estará em condições de crescer 4,5% em 2010, retomando o ritmo pré-crise e avançando para mais de 5% em 2011. A ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, que estava no lançamento das medidas ao lado do presidente Lula e dos ministros Miguel Jorge (Desenvolvimento) e Paulo Bernardo (Planejamento) comemorou:

- Acho que demos um passo muito grande que é uma política de incentivo ao investimento, através da ampliação da produção de bens de capital e do incentivo a que os empresários entrem nessa nova perspectiva, que é o caminho de saída da crise.

Venda de carros deve bater recorde

Segundo Dilma, as medidas fazem parte de um conjunto de ações adotadas desde o início da crise para garantir crédito e ampliar investimentos. Além do pacote anunciado ontem, o governo já promoveu, desde 2008, desonerações em diversos setores que somam R$20,7 bilhões.

- Todas as medidas são necessárias. Elas compõem uma parte do quadro. Nunca achamos que as medidas são suficientes. O governo está sempre atento, poderá sempre tomar novas medidas - afirmou Dilma.

No caso de veículos, o governo prorrogou por 90 dias o IPI reduzido. Para os carros de mil cilindradas, por exemplo, significa alíquota zero até 30 de setembro. Depois, o IPI volta a subir gradativamente e será completamente recomposto em 1º de janeiro de 2010. A medida terá um custo de R$1,405 bilhão este ano. Já para caminhões, o IPI zero será prorrogado por seis meses, ao custo de R$388 milhões.

- A indústria automobilística brasileira foi uma das que se recuperaram mais rapidamente no mundo - disse Mantega.

Com a redução do IPI, as vendas de carros no país em junho deverão atingir o melhor resultado mensal e contribuir para que o primeiro semestre também seja recorde. Até sexta-feira, foram vendidas 251.740 unidades (entre automóveis e comerciais leves) no mês, 15,1% a mais do que em maio. A previsão é de que a alta no semestre seja de 3%. Se as previsões se confirmarem, serão vendidos 1,437 milhão de veículos, contra 1,407 milhão no primeiro semestre do ano passado.

No caso da linha branca, foi prorrogado o IPI reduzido para fogões, geladeiras, máquinas de lavar e tanquinhos por três meses, com um impacto fiscal de R$203 milhões. Segundo Mantega, a desoneração significou queda entre 5% e 10% nos preços e um aumento nas vendas. O ministro ressaltou que os preços só não caíram mais porque muitos estados - entre eles São Paulo - decidiram praticar a substituição tributária com o ICMS (quando a cobrança do tributo é feita no início da cadeia produtiva), o que antecipa receitas para o governo estadual e reduz a margem de sonegação. Mas a prática reduz o capital de giro das empresas.

Para os materiais de construção, os 35 itens já contemplados pelo governo terão o imposto reduzido por mais 180 dias, com renúncia fiscal de R$686 milhões. A conta inclui um novo material, vergalhão de cobre. O governo também ampliou a lista de bens de capital que têm alíquota zero de IPI em 70 máquinas e equipamentos. A renúncia estimada é de R$414 milhões.

O caso da subsidiária brasileira da Yaskawa, multinacional japonesa do segmento de automação industrial, resume as dificuldades da cadeia que alimenta o setor de máquinas no país. Com a queda de pedidos, o faturamento da companhia caiu 50% no primeiro semestre e não passou de US$6,5 milhões. Seis funcionários - do total de 66 - já foram demitidos e a empresa cortou à metade os investimentos. O diretor-geral da empresa, José Luiz Rubinato, diz que as medidas anunciadas ontem pelo governo poderiam ter chegado antes, o que evitaria maior prejuízo ao setor:

- O governo deveria ter percebido que empresas de diferentes setores simplesmente não estão investindo no aumento da industrialização.

Pão terá benefício prorrogado até 2010

Ontem, o governo prorrogou ainda a isenção de PIS/Cofins sobre motos. O impacto fiscal será de R$54 milhões. A fabricação de motos já é isenta de IPI, por estar na Zona Franca de Manaus.

Além disso, foi anunciada a prorrogação da desoneração de PIS/Cofins de pães, trigo e farinha por um ano e meio, até 2010. A medida, com custo de R$192 milhões, visa a manter os produtos mais baratos em meio a problemas no abastecimento mundial.

Colaboraram: Lino Rodrigues e Aguinaldo Novo

Prelúdio no. 1 - Villa-Lobos interpreta Villa-Lobos

Vale a pena ouvir

Clique o link abaixo
http://www.youtube.com/watch?v=KLbZLmIhggA

segunda-feira, 29 de junho de 2009

O PENSAMENTO DO DIA - Jamin Jahanbegloo

Os protestos em curso nas ruas do Irã e os desdobramentos sociais e políticos que se seguiram às eleições presidenciais são lembranças de uma busca secular pela democracia e de três décadas de luta por valores republicanos contra o domínio teológico na esfera pública iraniana. Desde a Revolução Iraniana de 1979 demonstrações em larga escala desse tipo não tiveram lugar no Irã. Dezenas de milhares de jovens, mulheres, artistas, intelectuais, artistas e gente comum juntaram-se e manifestaram-se nas cidades iranianas, desafiando as restrições governamentais, as forças de segurança e os grupos paramilitares. Isto não significa que outra revolução está à vista, apesar do ilusório pensamento de alguns não-iranianos. Mas significa, de fato que a República Islâmica do Irã agora enfrenta uma profunda crise de legitimidade, estando em questão os fundamentos do domínio teocrático e todo o sistema político estabelecido há trinta anos.


(Ramin Jahanbegloo, 18 de junho de 2009)
Fonte: Dissent.

O discurso do Capiberibe

João Cabral de Melo Neto

Aquele rio
está na memória
como um cão vivo
dentro de uma sala.
Como um cão vivo
dentro de um bolso.
Como um cão vivo
debaixo dos lençois,
debaixo da camisa,
da pele.

Um cão, porque vive,
é agudo.
O que vive
não entorpece.
O que vive fere.
o homem,
porque vive,
choca com o que vive.
Viver
é ir entre o que vive.

O que vive
incomoda de vida
o silêncio, o sono, o corpo
que sonhou cortar-se
roupas de nuvens.
O que vive choca,
tem dentes, arestas, é espesso.
O que vive é espesso
como um cão, um homem,
como aquele rio.

Como todo o real
é espesso.
Aquele rio
é espesso.
Como uma maça
é espessa.
Como um cachorro
é mais espesso do que uma maçã.
Como é mais espesso
o sangue do cachorro
do que o próprio cachorro.
Como é mais espesso
um homem
do que o sangue de um cachorro.
Como é muito mais espesso
o sangue de um homem
do que o sonho de um homem.

João Cabral de Melo Neto, fragmento de O CÃO SEM PLUMAS. Diplomata, como noticia O Globo de ontem, punido pelo regime de 1964. Como diz Moacyr Felix, no seu livro dedicado à obra do permambucano, poeta do "materialismo dialético", alusão esta que, segundo observadores, lembra nos versos de Cabral o Prefácio marxianos à Contribuição Crítica da Economia Política, de 1857.

Serra critica política econômica de Lula

Rose Mary de Souza, Jaguariúna
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Citado por Roberto Freire como nome forte para concorrer à eleição de 2010, governador de São Paulo ataca governo petista

Reunidos no XVI Congresso Estadual do Partido Popular Socialista (PPS-SP), partidários da candidatura do governador de São Paulo, José Serra (PSDB), criticaram, na cidade de Jaguariúna, no interior paulista, a gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

No painel de abertura, o ex-governador de São Paulo e atual secretário estadual do Desenvolvimento, Geraldo Alckmin, fez uma apresentação com base no tema do congresso, Brasil: sem mudança, não há esperança. Os tucanos Aloysio Nunes Ferreira e José Aníbal também se inspiraram na proposta do evento para conduzir suas falas em tom de crítica ao governo petista.

Eleições 2010

As críticas ao presidente Lula tiveram discurso exaltado do presidente do PPS, Roberto Freire, ao afirmar que a campanha eleitoral começou mais cedo. "O grande responsável é o presidente Lula, que desrespeitou a legislação iniciando campanha já há algum tempo". Na opinião dele, "há dois grandes nomes no PSDB neste momento para disputar a presidência nas eleições de 2010: José Serra e Aécio Neves".

O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), também prestigiou o evento. Em sua fala, ele destacou que os democratas estão juntos com o PSDB, PPS e PV. "Já temos uma definição de caminharmos juntos sob o comando do governador Serra. A partir de janeiro vamos discutir os nomes dos candidatos com a liderança dele."

Convidado mais aguardado do evento, o governador paulista foi recebido na quadra de esportes do Jaguar Tênis Clube. Serra referiu-se ao PPS como um partido irmão, que colabora com o governo do Estado. Por isso, não poderia deixar de prestigiar o congresso.

Em seu discurso, fez vários comentários com alusões claras ao governo do atual presidente da República. Disse, por exemplo, que Índia e China estão indo bem, "mas o Brasil não tem uma política econômica de desenvolvimento".

Em outra parte de sua fala,Serra salientou que a indústria não está mais contratando. "O Poupatempo tem 32 mil ofertas de emprego, mas a grande maioria é da área de serviços", declarou, acrescentando que houve uma época em que o País exportava muito. "Vamos voltar a exportar", disse, em tom de campanha. "Isso é a questão número 1, é estrutural".

COMPARAÇÕES

No decorrer de sua palestra, o governador destacou o que considera os pontos fortes de seu governo e repetiu basicamente o que foi veiculado no último horário gratuito do PSDB veiculado na TV. "O seguro desemprego é criação minha. Lá no Poupatempo, de maio do ano passado até este ano, cresceram em 28% os pedidos do seguro desemprego", afirmou.

Com críticas indiretas à administração petista, Serra lembrou que Fernando Henrique Cardoso fez vários assentamentos da reforma agrária. "Até hoje vemos que isso não evoluiu."

O próximo encontro estadual do PPS ocorrerá em agosto. Desta vez, no Estado Rio.

Serra ataca PT e "loteamento" no governo

DA AGÊNCIA FOLHA, EM JAGUARIÚNA
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


De olho em alianças para a eleição de 2010, tucano promete atender aos pedidos dos prefeitos do PPS

Disposto a garantir alianças com vistas às eleições, o governador de São Paulo e potencial candidato à Presidência, José Serra, disse anteontem, em discurso no 16º Congresso Estadual do PPS, em Jaguariúna (134 km de São Paulo), que fará "o possível para atender aos pedidos dos prefeitos do PPS".

Serra e o presidente nacional do PPS, o ex-deputado federal Roberto Freire, aproveitaram o encontro para criticar o governo federal e o PT.

"O PT usa o governo como se fosse propriedade privada. Quando o PT foi para o governo, incorporou esse patrimonialismo do partido. Em São Paulo, não existe esse loteamento governamental, ao contrário do governo federal", atacou o governador.

Freire, por sua vez, afirmou que o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) -vitrine do governo sob responsabilidade da ministra Dilma Rousseff- "não anda no país, o que anda é a corrupção".

Na disputa

Além de Serra, o ex-governador e secretário estadual Geraldo Alckmin (Desenvolvimento) e o chefe da Casa Civil, Aloysio Nunes Ferreira, também participaram do encontro. No partido, os dois postulam o direito de representar o PSDB na disputa pelo governo em 2010.

Também acalentando o sonho de concorrer, o prefeito Gilberto Kassab (DEM) esteve no encontro, que contou com a presença de cerca de 300 representantes do PPS estadual, entre prefeitos, secretários e vereadores.

De acordo com uma nota do PPS paulista, o congresso estadual teve como objetivo "debater as estratégias para as eleições de 2010".

Durante discurso, Serra disse ainda que conseguiu mudar a data do congresso do PPS -que estava marcado para a semana passada- para que pudesse participar. O governador contou que fez o pedido ao presidente do Diretório Estadual do PPS, deputado estadual David Zaia, porque estaria em viagem na data anterior. O governador ficou cerca de 45 minutos no evento e deixou o local de helicóptero.

No encontro do PPS/SP Serra critica o PT

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Na tentativa de garantir alianças com vistas às próximas eleições, o governador José Serra (PSDB-SP), disse ontem em discurso no 16º Congresso Estadual do PPS, em Jaguariúna (134 km de São Paulo), que fará "o possível para atender os pedidos dos prefeitos do PPS" no Estado.
Serra e o presidente nacional do PPS, o ex-deputado federal Roberto Freire, usaram o encontro para criticar o governo federal e o Partido dos Trabalhadores.

"O PT usa o governo como se fosse propriedade privada. Quando o PT foi para o governo, incorporou esse patrimonialismo do partido. Em São Paulo, não existe este loteamento governamental, ao contrário do governo federal", disse o governador. Roberto Freire afirmou que "o PAC [Programa de Aceleração do Crescimento] não anda no país, o que anda é a corrupção".

Além de Serra, participaram do congresso o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), o ex-governador e secretário estadual Geraldo Alckmin (Desenvolvimento), e o secretário estadual Aloysio Nunes Ferreira (Casa Civil). Cerca de 300 representantes do PPS estadual estavam no evento, entre prefeitos, secretários e vereadores.

Serra e Kassab não chegaram a se encontrar. Ambos permaneceram menos de uma hora no congresso. Membros da Executiva do PPS disseram que a presença dos dois no evento reforça ainda mais a intenção de uma possível aliança entre as duas siglas nas eleições de 2010.

Durante discurso, Serra disse ainda que conseguiu mudar a data do congresso do PPS -que estava marcado para a semana passada- para que pudesse participar. O governador contou que fez o pedido ao presidente do Diretório Estadual do PPS, deputado estadual David Zaia, porque estaria em viagem na data anterior.

Serra também usou parte de seu discurso para enaltecer obras do governo estadual. O governador ficou cerca de 45 minutos no evento e deixou o local de helicóptero por volta das 14h30.

Serra diz que só decide em 2010

Raymundo Costa e Cristiano Romero, de Brasília
DEU NO VALOR ECONÔMICO


O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), disse ao presidente Lula que só em março decidirá se será ou não candidato à sucessão. A decisão do governador deixa os outros partidos na defensiva, inclusive o maior deles, o PMDB. Há dúvidas até se a ministra Dilma Rousseff, a escolhida de Lula, será a candidata do PT.

O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), disse ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante encontro há duas semanas, que só tomará uma decisão sobre uma possível candidatura presidencial em março de 2010, quando expira o prazo para desincompatibilização. Serra, segundo apurou o Valor, disse a Lula que pode, inclusive, optar por não sair candidato.

O governador paulista deixou a impressão, no Palácio do Planalto, de que só lançará sua candidatura se concluir que tem condições de bater o candidato de Lula - até o momento, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, cuja candidatura ainda é vista com desconfiança até por aliados. Serra não está disposto a perder o mandato de governador do Estado mais rico do país para entrar numa "aventura". Neste momento, ele lidera todas as pesquisas de opinião, mas sabe que o presidente Lula vai fazer tudo para eleger Dilma.

"Posso ser candidato?", indagou recentemente o governador em conversa com uma pessoa de suas relações. Ele mesmo respondeu positivamente, mas com uma ressalva: "Posso, sim, mas é uma balela essa história de que sou candidato de qualquer maneira". Fez uma pausa e depois enfatizou, segundo relatos feitos ao Valor: "Isso não existe". O comentário, feito a mais de uma pessoa, chegou a petistas e pemedebistas, que procuraram caracterizá-lo como receio de enfrentar um candidato apoiado por um presidente forte. Entre os tucanos acredita-se que Serra está apenas fazendo jogo de nervos, pois considera que pode bater Dilma tanto quanto bateu Marta Suplicy em São Paulo em 2004.

Na avaliação que faz da crise econômica aos tucanos, Serra diz que "a queda forte" da economia já aconteceu, mas que em 2009 o crescimento será negativo. Melhora, mas apenas um pouco, no próximo ano. Trata-se de uma avaliação inteiramente diferente da feita pelo governo, que aposta em crescimento acelerado em 2010, fato que beneficiaria Dilma Rousseff. A crise teve reflexos negativos na arrecadação de São Paulo, mas, enquanto outros Estados tiveram de cortar investimentos, o cronograma de obras paulistas mantém o ritmo - São Paulo, alega Serra dispõe de recursos provenientes de concessões, financiamentos externos, venda da Nossa Caixa e da folha-salário, portanto, não depende apenas da receita corrente.

Serra sempre se recusou a antecipar a disputa sucessória. Para governar, ele precisa ter um bom relacionamento com o governo federal. Em dois anos e meio de mandato, teve a maioria dos seus pleitos atendida pelo presidente Lula e pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. Obteve, por exemplo, três autorizações para elevar o endividamento do Estado e, assim, aumentar a capacidade de investimento em obras.

Serra prima por uma política de boa vizinhança com Brasília, fazendo oposição discreta a Lula, algo que durante algum tempo parecia uma estratégia de Aécio Neves, governador de Minas Gerais e seu concorrente na briga interna do PSDB para ver quem enfrentará o candidato de Lula em 2010. Quando critica publicamente o governo, Serra se limita às políticas monetária e cambial, das quais discorda desde o primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso, seu colega de partido e um de seus mentores políticos. Nas conversas reservadas, Serra revela um visão do governo Lula muito menos condescendente.

O governador acha que a campanha presidencial foi antecipada em demasia pelo presidente Lula. Ainda assim, ele quer que a decisão do PSDB fique para 2010. Para Serra, a antecipação da campanha não significa que as análises são mais ricas. O raciocínio é que, a mais de um ano da eleição, é difícil saber como estarão os principais atores da sucessão no início do próximo ano.

Em política, um ano é muito tempo, diz Serra a seus aliados do PSDB. De fato, um retrospecto da história recente do país dá razão ao governador. Em abril de 1988, o que se sabia sobre a eleição de 1989? Era impossível imaginar, na ocasião, que o pleito seria decidido no segundo turno entre os dois candidatos mais improváveis - Fernando Collor de Melo e Lula. O mesmo se deu nas eleições seguintes (excetuadas as duas reeleições, de 1998 e 2006).

No PSDB, as opiniões estão divididas sobre a antecipação da campanha presidencial. Há quem considere, como Aécio Neves, que os tucanos devem dinamizar o processo para ocupar espaço. Mas há também quem considere isso absolutamente secundário. Os tucanos, na verdade, tiraram proveito do programa eleitoral, na semana passada, e farão isso a partir desta semana com a celebração dos 15 anos do Plano Real.

Os defensores do adiamento da campanha acham que Lula poderia fazer tudo o que está fazendo agora em três meses de 2010 - a partir de julho de 2010, por exemplo, a TV Globo entrevista todos os dias os candidatos no "Jornal Nacional", o programa de maior audiência no país. Em seguida há o registro das candidaturas e, por fim, o horário eleitoral gratuito na TV, eventos mais do que suficientes para tornar conhecidos os candidatos. Serra é partidário dessa tese, mas, como já é visível a olho nu, os tucanos preferiam combinar as duas estratégias.

Um exemplo sempre citado é o do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), que partiu de um baixo patamar de conhecimento e chegou ao segundo turno da eleição de 2008 à frente da ex-prefeita Marta Suplicy. Alguns tucanos avaliam inclusive que a longa exposição de Dilma, pelo contrário, pode até ser pior e causar um desgaste prematuro de sua candidatura. Principalmente se o PT, temendo uma derrota, repita erros do passado recente.

O empenho dos tucanos, neste primeiro semestre, foi começar a pavimentar o caminho para fazer boas alianças para 2010. Há uma explicação para essa estratégia. O Rio de Janeiro, por exemplo, pode ser uma pedreira para o PSDB, se o julgamento ficar por conta dos números que ele teve no Estado em 2002 (pior, só no Ceará de Ciro Gomes, então candidato do PPS). Naquele ano, além da onda vermelha, Serra enfrentou o candidato local à sucessão, o ex-governador Anthony Garotinho. Tinha um palanque fraco. Agora, pode contar com os palanques do deputado Fernando Gabeira (PV) para o governo ou para o Senado e do ex-prefeito César Maia. E até de Sérgio Cabral, se o PT tiver candidato próprio para governar o Estado ou não apoiar a sua reeleição.

Serra prefere dedicar a maior parte do seu tempo à administração de São Paulo, adotando medidas que ele acredita que darão substância ao discurso de uma possível candidatura em 2010. Ele vê no embate da eficiência um grande diferencial com a possível candidata do presidente. O governador acredita que fez, em menos de três anos, muito mais do que o governo Lula em quase sete anos.

Embora esteja dedicado à administração de São Paulo, Serra não descuida do projeto político. Está sempre com Aécio, para desfazer intrigas dos adversários, mas sobretudo dos próprios correligionários. Aos poucos, vai sedimentando uma relação de confiança com o neto de Tancredo Neves. Recentemente um interlocutor perguntou a Serra se, a exemplo de Lula, Aécio também não antecipara a corrida sucessória. Serra foi elegante: para ele, foi "uma coisa de muito menor peso", se comparada à movimentação de Lula.

Com gestos assim o governador paulista tenta assegurar que os eleitores de Minas ficarão efetivamente com a sua candidatura, caso haja um acordo com Aécio - no PSDB diz-se que é só uma questão de tempo. Serra quer evitar o que aconteceu em 2002, quando foi apoiado por Aécio, mas o governador mineiro ficou com um pé em cada canoa. A situação de Aécio em Minas também aconselha Serra a adiar a decisão sobre sua candidatura: como pretendente à vaga de candidato do PSDB, o governador mineiro mantém mais controle sobre a sucessão no Estado em 2010.

O PSDB, especialmente o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, insiste na tese de que uma chapa pura com Serra na cabeça e Aécio na vice é imbatível. Aécio tem dúvidas que devem ocorrer também a Serra, só que o paulista evita comentá-las mesmo entre os mais íntimos por entender que de modo algum pode ferir suscetibilidades que o afastem do governador de Minas.

Serra passou a acompanhar Aécio nas viagens aos Estados e também concordou com a proposta de realização de prévias para a escolha do candidato do partido, duas exigências de Aécio. Nada impede que os dois voltem a se bicar, mas a relação política entre eles está melhor do que em janeiro e fevereiro passados. Ambos estão empenhados nas articulações para a formação dos palanques regionais.

O PSDB acha que vai manter a votação que Alckmin teve nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Em São Paulo acredita que Serra será mais votado do que Alckmin foi em 2006. A avaliação é que, apesar do esforço do governo para penetrar no Sul, a região é naturalmente refratária ao PT, como demonstrariam as pesquisas encomendadas pelo partido. Agora os tucanos tentam equilibrar o jogo no Nordeste, um território predominantemente lulista.

Os recados de Serra ao Palácio do Planalto - de que só decide em 2010 e pode até não ser candidato - embaralham o quadro eleitoral, pois todos os partidos esperam uma solução definitiva para mapear seus movimentos - entre os atuais aliados de Lula ainda há quem duvide até de que Dilma será a candidata do PT. Confiante na recuperação da saúde da ministra, o presidente não tem dúvida de que ela será a candidata do partido.

UFJF: Livro resgata política social do governo Itamar Franco

A Editora da UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora), em co-edição com a Fundação Astrogildo Pereira, lança no dia 1º de julho o livro Era outra História ? Política Social do Governo Itamar Franco, de autoria de Denise Paiva. Denise foi assessora de assuntos sociais da presidência durante o governo Itamar Franco, e nesta obra promove um resgate da história recente do Brasil com a visão de quem participou diretamente desta história.

O livro mostra como o governo Itamar Franco inaugurou um novo contexto da política social, dando vez e voz à sociedade civil e fortalecendo a governabilidade em um período delicado, no qual havia se retomado recentemente a democracia. De acordo com a autora, o livro oferece uma importante etapa da história brasileira que os meios acadêmicos e políticos relegaram ao limbo. "É um momento sobre o qual o país precisa se debruçar e estudar melhor. A política social colocada em prática naquela época deu base inclusive para se implantar um plano econômico vitorioso, como o plano real".

Denise explica que sua idéia de contar esta "outra história" surgiu de uma responsabilidade ética e cívica de se compartilhar um momento tão importante para o país, até hoje pouco analisado e do qual teve o privilégio de participar.A autora reaviva o momento de forma compartilhada, trazendo, para contar a história, outras pessoas que participaram do governo Itamar Franco, nas mais diversas áreas. Para desenvolver a presente obra, a autora dedicou dois anos a um intenso trabalho de pesquisa, entrevistas e análise de documentos da época.


Denise conta que realizou a primeira entrevista para o livro no dia 7 de junho de 2007, com Plínio de Arruda Sampaio. "Dessa entrevista saí com a certeza de que tinha a história e o roteiro na mão". Denise ressalta que o livro mostra as contradições deste momento político: "Todo processo político é contraditório e eu procurei me debruçar também sobre estas contradições".

A obra tem uma linguagem acessível e coloquial, além de transpirar emoção. As entrevistas são registradas no livro em forma de diálogo, o que contribui para uma maior aproximação entre leitores e personagens. Esta linguagem escolhida é uma forma de aproximar a obra dos jovens. O livro é de importância para todos que se interessam pela História do Brasil, bem como estudiosos de áreas específicas como comunicação, serviço social, administração, política, direito e ciências sociais, por descrever todo um sistema de governo que empreendeu esforços em todas essas áreas para alcançar um bem comum.

O lançamento ocorre no dia 1º de julho, às 19h, no Museu de Arte Murilo Mendes, localizado na Rua Benjamin Constant, 790, centro, Juiz de Fora - MG.

Fonte: Assessoria de imprensa da UFJF.

A política boa ou má

Fábio Wanderley Reis
DEU NO VALOR ECONÔMICO


A edição eletrônica da revista "Newsweek" exibe, desde 18 de junho, matéria de Jeremy McCarter ("Reagan Was Wrong") sobre Henry Fairlie, escritor e jornalista britânico radicado nos Estados Unidos a partir de 1966 e falecido em 1990. Fairlie, que se definia como conservador mas criticou duramente o Partido Republicano e o mitificado Ronald Reagan, via na esfera política "o único lugar em que um povo livre pode lutar contra as tiranias das outras esferas - especialmente a econômica". A política era, para ele, "essencialmente boa", e os políticos eram os mensageiros a justificar a esperança no empenho de uma sociedade em apefeiçoar-se e melhorar.

É evidente o contraste dessa perspectiva com a "repugnância" pela política, na expressão usada há pouco até em editoriais da imprensa brasileira, que parece prevalecer entre nós. Esse contraste inclui ou disfarça várias coisas.

Para começar, temos a correspondência, quanto à qual Fairlie representaria clara exceção, entre posições conservadoras ou "progressistas" (ou de direita ou esquerda), de um lado, e, de outro, o ânimo favorável ou desfavorável à ação política e ao Estado: o rechaço à política e ao Estado seria característico de um conservadorismo inclinado a santificar a esfera privada e o mercado.

Mas os valores que aí se revelam costumam reclamar também um fundamento analítico "realista". Contra as ilusões e o "sonho" das esquerdas, que respaldam a concepção da política como a esfera da luta nobre contra as tiranias privadas, cabe ver o enfrentamento dos interesses ou egoísmos privados como natural ou mesmo bom.

De parte a parte, há fatores diversos de confusão, alguns dos quais tenho aqui apontado às vezes. Assim, a desqualificação da política (a "repugnância") pode nascer precisamente da sua idealização. Tratando-se com ela da busca do bem público, supõe-se que o fato de que o interesse próprio seja motivação importante também na política não possa ser visto senão como inaceitável, em contraste com o realismo leniente quanto à conduta guiada pelo interesse na esfera econômica e privada. Seria preciso contar, portanto, com gente feita de massa especial e singular propensão à virtude para dedicar-se à política.

À esquerda, por seu turno, temos a frequente satanização do mercado e a vilificação do interesse como tal, contraposta à utopia da solidariedade e do altruísmo que seria possível pretender como orientação na ação política. O que se tende a esquecer aqui é a complicada relação do valor da solidariedade com o valor da autonomia. Trata-se, com este último, de trazer a cada um a possibilidade de afirmar-se e realizar-se, o que, compondo o ideário tradicional da esquerda, redunda em redefinição ambiciosa da ideia mesma de interesse. Em abstrato, a complicação envolvida pode ser expressa no que alguns têm descrito como a precedência lógica do egoísmo sobre o altruísmo: se alguém não goza pura e simplesmente os frutos do altruísmo solidário, para quê (ou, na verdade, como) ser altruísta? Num plano talvez mais comezinho, não há como favorecer a autonomia dos cidadãos e começar por negar-lhes a autonomia na fundamental esfera econômica, vale dizer, por negar o mercado.

Essa acolhida ao interesse e ao mercado não tem por que deixar de ir além de um liberalismo restrito ao mero plano econômico. Não queremos a sociedade em que a ameaça a interesses ou valores importantes, ou a nossos direitos, exija a permanente mobilização política. Queremos, ao contrário, a sociedade em que nos seja facultado ir para casa em paz, precisamente porque nossos valores (nossos direitos e mesmo interesses) estão garantidos.

Mas essa sociedade tem de ser construída - politicamente. E tal construção, onde surge a política "essencialmente boa" de Fairlie em que a sociedade se empenha em tornar-se melhor, tem necessariamente de valer-se da conciliação, tão hábil quanto possível, da inspiração nobre com interesses diversos cuja simples coexistência tende a produzir conflito, mas cuja capacidade de afirmar-se consistentemente no plano político são um componente indispensável do processo.

A boa política de Fairlie obviamente supõe um Estado suscetível de transformar-se no instrumento eficaz da neutralização ou minimização das tiranias privadas e das desigualdades e antagonismos que as propiciam, sem com isso incapacitar-se para regular com equilíbrio o jogo dos interesses. Se o Estado autoritário, o "sujeito" de políticas que se identifica de vez com certos interesses e desígnios, é um dos extremos negativos a evitar, o outro é o Estado tornado pura "arena", que ele próprio se "balcaniza" e se deixa transformar numa espécie de mercado, aberto a ser usado fragmentariamente para o acesso direto a ganhos privados.

Resta a ponderação de que as condições gerais da sociedade impedem ou facilitam, elas próprias, o êxito do esforço de construção adequada. Em nosso caso, elas parecem, bem ou mal, ter permitido exorcizar o perigo autoritário. Já o do Estado-mercado...

Fábio Wanderley Reis é cientista político e professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais. Escreve às segundas-feiras