domingo, 28 de junho de 2009

Dolorosa decisão

Eliane Cantanhêde
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


BRASÍLIA - José Sarney perdeu a guerra da opinião pública e enfrenta agora outra guerra, em que ele é estrategista há meio século: a política. Trata-se de vida ou morte para este quase octogenário, último grande coronel da política brasileira com a saída de cena de ACM.

Sarney sabe guerrear e tem tropa e armas para evitar a renúncia à presidência. A mais poderosa delas é o apoio de Lula, a quem ele gritou por socorro na última quinta, quando soltou nota dizendo-se vítima de um complô político por (imagine!) ser aliado do governo e de Lula.

Parece piada, ou um contorcionismo esquizofrênico, já que Sarney é apoiado pelo oposicionista DEM e se sente apunhalado pelos petistas Tião Viana e Aloizio Mercadante. Mas é uma clara tentativa de usar Lula para aglutinar PT, esquerdas e aliados em geral no seu exército da salvação.

A segunda grande arma de Sarney é a falta de opções para substituí-lo. Ele próprio foi eleito por eliminação. Não havia outro. E não há. Uma regra na política é nunca deixar o vácuo para o adversário, para o azar, para surpresas. Até Collor só caiu depois de Itamar estar maduro no meio político, na mídia, no empresariado e até na área militar. Primeiro, constrói-se o sucessor. Depois, abre-se a vaga.

A situação, pois, está no seguinte ponto: Sarney não tem condições de ficar, mas quer e tem de ficar, enquanto Lula se move para garantir-lhe sustentação e a dupla PMDB e DEM tenta salvar sua hegemonia de muitos anos no Senado, rezando por uma trégua do "inimigo" invisível que devassa as velhas práticas patrimonialistas dos Sarney. A munição acabou? Improvável.

Se, ao contrário de ACM, Jader e Renan, Sarney resistir, deve saber que mudar o final do filme é mudar também o papel do protagonista. O risco é deixar de ser presidente de fato e se contentar com a constrangedora posição de fantasma rondando a própria cadeira. Com todo o respeito, ele jamais será o mesmo.

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