sábado, 6 de junho de 2009

Lula e o PT em caminhos cruzados

Coisas da Política - Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL

Em política, a desculpa da coincidência geralmente esconde o arrependimento da atitude estabanada ou a tentativa de dissimular a crise miúda dos interesses. Agora, por exemplo, é curiosa a birra do PT com o presidente Lula, o notório dono da legenda que sem ele não existiria e talvez nem sobreviva. Mas não é por simples acaso que o PT entrou com 32 assinaturas de deputados na jogada patrocinada pelos insaciáveis aliados do PMDB para ressuscitar a proposta de emenda constitucional que escancara a porteira do terceiro mandato consecutivo para o presidente da República, governadores e prefeitos. O seu autor é o mesmo deputado Jackson Barreto (PMDB-SE) que insiste em reabrir a brecha para escapar do esconderijo do anonimato.

E deve estar mergulhado numa banheira morna e com água cheirosa. Merece: a primeira emenda morreu na praia com a retirada de assinaturas de arrependidos e cautos. O autor voltou à colheita dos jamegões de deputados e chegou a 182, 11 a mais das 171 necessárias.

O repeteco não parece ter fôlego para ir longe. É mais uma cutucada no presidente para adverti-lo da necessidade de atender aos pedidos dos aliados, que só pensam na reeleição para garantir mais quatro anos de um dos melhores empregos do mundo.

Certamente o presidente não recuará, sob pena de liquidar com a sua credibilidade. No seu penúltimo giro pelo mundo e na última excursão pela América Latina, aproveitou uma entrevista a um grupo de repórteres para reiterar, em termos que não admitem recuo, que "não é, nem será candidato a um terceiro mandato". E lembrou a sua enfática declaração que correu o país que "não se brinca com a democracia". Na gangorra da calamidade que assola o Norte, Nordeste e o Sul das enchentes que inundam municípios, com milhares de desabrigados que só saltaram a vida e perderam tudo mais, inclusive parentes e a sua consolidada popularidade internacional, a insolência de petistas já recebeu a resposta indireta.

Mostrando que manda quem pode, Lula comunicou ao presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP) que não vai liberar o seu chefe de gabinete, Gilberto Carvalho, para presidir o partido a partir de novembro. E, na mesma toada, indicou o ex-senador sergipano José Eduardo Dutra para substituir o atual presidente, que não pode mais ser reeleito. A decisão deve ser referendada neste fim de semana, em São Paulo, no seminário da corrente com o tonitruante nome de Construindo um Novo Brasil.

Com o PT não há mais nada a fazer: ordens dadas e obedecidas.

Não se deve esperar maiores danos, além de alguns arranhões, com a crise que o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, vinha cultivando com a bancada ruralista e demais interessados no desmatamento para a formação de pastos para a criação de gado. Lula teve uma conversa dura com o ministro Carlos Minc, mas decidiu mantê-lo no cargo, devidamente enquadrado, sem recuar das suas posições. É briga que rola há dezenas de anos e que continuará enquanto tiver uma moita de capim na região amazônica. Lula assinou o manifesto do movimento Amazônia para Sempre, encabeçado pelos atores Vitor Fasano e Christinane Torloni, que defende o fim do desmatamento na imensa região. E ficou bem com os dois lados.

A ministra Dilma Rousseff, candidata escolhida e lançada por Lula para substituí-lo nas eleições de 5 de outubro de 2010, embora em posição consolidada, foi mais a ser beneficiada pelo enquadramento do PT. A candidata está na metade das sessões de quimioterapia para a cura do câncer linfático, detectado a tempo. Esta semana submeteu-se à terceira sessão de fisioterapia. E em meio ao tratamento com 90% de probabilidade de cura, os novos rebeldes mansos do PT cometeram a indelicadeza de ressuscitar a especulação sobre o terceiro mandato de Lula.

A desenganada reforma política é que parece não ter salvação. O que é a melhor das saídas no momento, pois é evidente que o pior Congresso de todos os tempos não tem autoridade para uma reforma para valer, que começasse por acabar com as mordomias escandalosas, com as vantagens, muambas e mutretas que a cada reforma encontram saídas para driblar os cortes e a mágica para transformá-los em novas regalias.

Transferida para este mês, a esquálida reforma deve ficar reduzida a miudezas, ficando o financiamento público das campanhas e a extravagante votação em lista para outra oportunidade. No dia de são nunca.

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