domingo, 15 de novembro de 2009

Para ex-petistas, a decepção venceu a esperança

DEU EM O GLOBO

Companheiros de 1989 criticam novos aliados e políticas do governo Lula; outros elogiam e dizem que fariam de novo

Tatiana Farah

SÃO PAULO. Companheiros do palanque de 1989 e petistas de carteirinha abandonaram o partido e o amigo Luiz Inácio Lula da Silva por discordarem das políticas do presidente, dos métodos de campanha ou dos novos aliados do PT. Outros ainda sentem a esperança de quando animavam os comícios apinhados de militantes em 1989, quando Lula quase chegou lá, e dizem que fariam tudo de novo.

Para o economista da Unicamp Ricardo Antunes, petista de 1983 a 2003, a vitória de Lula é a derrota cabal das forças de esquerda. O jurista Plínio de Arruda Sampaio, fundador do PT e agora no PSOL, afirma: — O governo petista é uma traição à classe trabalhadora.

“É o governo que é possível fazer”, diz ex-sindicalista

Amigo de Lula dos tempos do ABC, o metalúrgico aposentado Djalma Bom preserva o companheiro, mas conta que doeu ver o presidente abraçado a Fernando Collor de Mello. O ator Paulo Betti, que em 89 apresentava o programa do PT, diz que Lula faz “um belíssimo governo”: — É um belíssimo governo do jeito que é possível fazer, diante de uma elite grosseira. O povo identifica nele um aliado.

Foi a política de alianças que aposentou Djalma Bom da vida pública. Em 89, ele era vice-prefeito de São Bernardo, depois foi parlamentar. Continua petista, mas deixou a política.

— Fico chateado com a desfiguração do PT, que deixou seu aliado, a classe trabalhadora, para procurar a tal base. Sarney era contra os trabalhadores.

Para ele, ver Lula e Collor abraçados foi o que mais doeu.

A decepção começou com o mensalão, em 2005: — O desvio com o financiamento das campanhas é a escolha que o PT fez pela porta mais larga. Ninguém dá jantar de graça a ninguém.

Amigo de Lula, Bom defende o companheiro e seu governo: — O governo tenta fazer com que os mais pobres tenham oportunidades. Tem falhas, mas é um avanço. Lula continua sendo a mesma figura, sem vaidade.

Meu amigo continua. Por isso deixei a política: porque a gente tem de ceder muito.

O jurista Hélio Bicudo não preserva a amizade com o presidente.

Em 2006, anulou o voto e, este ano, no primeiro turno deve escolher Marina Silva (PV).

Em um eventual segundo turno entre Dilma Rousseff e o tucano José Serra, vai de Serra: — Eu não tucanei. Se alguém mudou de lado foram eles (os petistas). O Bolsa Família é um programa eleitoreiro. Nada foi feito em direitos humanos.

Quando olho esses 20 anos, não fico desanimado, mas lamento.

Plínio, que pode ser lançado como pré-candidato à Presidência pelo PSOL, diz que o PT deu uma guinada para a direita.

— O PT faria diferente se Lula tivesse sido eleito em 89, mas o país escolheu a direita. Foi a possibilidade perdida de transformação capaz de quebrar o subdesenvolvimento.

Era um programa anticapitalista porque o PT era socialista. Hoje o PT é o que chamam de capitalista-social.

É capitalista envergonhado.

Plínio diz que não se sente culpado, mas preocupado: — Tenho certa preocupação por ter colaborado com o governo, mas eu estava enganado.

“O governo Lula mantém a boa-vida dos ricos”

O economista Paul Singer, secretário de Economia Solidária do Ministério do Trabalho, elogia o Bolsa Família. Dirigente do PT, Singer continua com Lula: — Valeu a pena. Os avanços aconteceram. O PT tornou-se governante e os dirigentes tornaramse políticos profissionais.

Acontece na esquerda no mundo todo, lamento.

Para Ricardo Antunes, se os petistas tivessem ganhado a eleição 20 anos atrás, o governo teria sido melhor: — O PT de 89 faria no mínimo um governo democrático e popular.

Não tenho dúvidas de que aquele seria um governo melhor para os trabalhadores. O governo Lula minimiza o sofrimento dos que são muito pobres e mantém a boa-vida dos ricos.

"O Bolsa Família é um programa eleitoreiro. Nada foi feito na área de direitos humanos "Hélio Bicudo, jurista

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