sexta-feira, 17 de julho de 2009

Estadista pelo avesso

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Reza a boa norma da política que o estadista até leva desaforo, mas não carrega mágoas para casa. Sobrepõe as questões de Estado a ofensas pessoais. Sacrifica o individual em nome do coletivo.

É sábio para distinguir situações e, mediante o cotejo de perdas e ganhos, calibra suas atitudes de modo a equilibrar responsabilidades e necessidades.

O presidente Luiz Inácio da Silva, a despeito da celebração de suas habilidades no ramo, não possui esses atributos.

Antes, exibe características opostas e age exatamente no sentido contrário ao do governante cujo objetivo primeiro é o zelo pelo bem-estar físico, espiritual, cultural e moral dos governados.

O presidente é hábil no terreno da autoajuda de efeito imediato, comanda como ninguém o espetáculo do crescimento da própria popularidade, mas mostra-se desprovido da noção do que seja a construção de um legado de avanços de longo prazo em benefício de toda a sociedade.

Há exemplos anteriores às mais recentes exorbitâncias que agora, tardiamente, depois de um longo período de celebração de tais atos como manifestação de genial pragmatismo político, provocam reações gerais de desagrado.

Quando se sentiu pessoalmente atingido por uma reportagem do correspondente do New York Times, Lula não hesitou em confundir-se com o Estado e expor o País ao ridículo ordenando a cassação do direito do jornalista ao visto de permanência no Brasil.

Sofreu pesadas críticas e pôs o pé no freio do autoritarismo que se delineava no início do primeiro mandato. Os mesmos reparos, no entanto, não sofreu nas inúmeras vezes em que confundiu a necessidade altiva de passar por cima de idiossincrasias ideológicas com a pequenez da irresponsabilidade de passar a mão na cabeça de infratores.

Distribuiu "cheque em branco", avalizou práticas criminosas, deu abrigo a gente expulsa do poder público por desrespeito ao bem público, afrontou o Judiciário, chamou de hipócritas as restrições ao uso eleitoral da máquina administrativa, reclamou que o excesso de fiscalização faz mal ao Brasil, ignorando o mal que a impunidade secular faz ao País.

Com isso, esvaziou o valor dos princípios, aos quais costuma tratar com zombaria chamando de "principismo" e, assim, tudo se tornou permitido e as críticas ao esfacelamento ético perderam o sentido. Ou pior, adquiriram um caráter de puro farisaísmo.

Lula não fez isso sozinho. Contou com a colaboração de um razoável consenso segundo o qual os vencedores, principalmente se populares, são inimputáveis.

O presidente se sentiu à vontade e, portanto não há razão para surpresa quando Lula acelera na defesa de tudo e todos cuja representação é a desonra, imaginando que isso lhe garantirá ganhos eleitorais e um lugar privilegiado na História.

O que surpreende é que não consiga enxergar o perigo do exagero. Cumprir um dever de solidariedade a um aliado como o senador José Sarney é uma coisa. Poderia fazê-lo dentro do limite da sóbria moderação de Estado.

Mas, não, optou por jogar-se nos braços da impostura ao ponto de produzir aquela frase sobre Sarney não ser uma pessoa comum, que não lhe rende nada além de perdas.

Sarney, nesta altura com muito pouco ou quase nada a perder, fica bem. Ele, Lula, dono de um enorme capital, desperdiça patrimônio à toa.

Da mesma forma, é perdulário na derrama de elogios e afetos para Fernando Collor.

Para quê? O estadista que engole desaforos em nome de um projeto compartilha palanque em Alagoas, não hostiliza o antigo adversário e dá por cumprido o ofício da boa convivência e do respeito ao voto do eleitorado local.

O governante que exacerba e perde a medida é o mesmo que confessa a "mágoa" com o Senado pela derrubada da CPMF, porque, por falta do dinheiro do imposto do cheque, não pôde "melhorar a saúde".

Na realidade, Lula não se conforma é com a derrota política. A ajuda à saúde pública poderia ter dado apoiando o projeto do ministro José Gomes Temporão, de modernização da gestão do setor, largado no Congresso à posição contrária dos corporativistas de plantão, petistas à frente.

As pessoas percebem essas coisas. Pois é como diz o outro: não se engana todo mundo o tempo todo.

Em vão

Um dos principais, senão o principal motivo pelo qual o senador José Sarney resolveu ser presidente do Senado pela terceira vez, foi o de acreditar que no cargo teria influência sobre a Polícia Federal, na investigação envolvendo um de seus filhos.

Pois Fernando Sarney foi indiciado pela PF sob acusação de organizar quadrilha para atuar dentro do aparelho de Estado em prol de empresas privadas interessadas em ter acesso privilegiado a contratos com estatais.

Sarney achou que ao presidente do Senado ainda seriam devidas velhas reverências. Mais um de uma série de equívocos cometidos a partir da ultrapassada premissa de que o poderoso tudo pode. Foi-se o tempo.

Ataque a senadores desagradou ao Planalto

Maria Lima, Adriana Vasconcelos e Gerson Camarotti
DEU EM O GLOBO

O CONGRESSO MOSTRA SUAS ENTRANHAS: Oposição se refere a Lula com adjetivos mais pejorativos, diz Almeida Lima

BRASÍLIA. O plenário do Senado foi palco de reação irada contra as declarações do presidente Lula, que, na véspera, chamara alguns senadores de "bons pizzaiolos". Onze senadores de vários partidos, inclusive da base, subscreveram requerimento de Cristovam Buarque (PDT-DF) pedindo um voto de censura.

No governo, a avaliação feita é que o presidente cometeu um erro político com seu "deslize verbal", no dizer de um ministro. As declarações, feitas ao comentar a CPI da Petrobras, reacenderam a crise no Senado, e isso é tudo o que o governo quer evitar agora. O próprio presidente Lula teria mostrado arrependimento, por não ter avaliado a repercussão da frase.

Já o presidente José Sarney (PMDB-AP) manteve-se indiferente ao debate em plenário e às novas denúncias conta ele. Passou o dia trancado em seu gabinete se preparando para o recesso que começa hoje.

O líder do PSDB, Arthur Virgilio (AM), protocolou nova denúncia contra Sarney no Conselho de Ética, para investigar informação de que gravação da Polícia Federal mostra o envolvimento de Sarney na nomeação do namorado de sua neta Maria Beatriz em cargo do Senado,por meio de ato secreto. Sarney não comentou essa nova denúncia.

Tucano teme ação de Paulo Duque durante o recesso

Para Virgilio, essa era a prova que faltava para ligar Sarney aos atos secretos nomeando parentes. Ele teme que o presidente do Conselho, Paulo Duque (PMDB-RJ), engavete as denúncias contra Sarney no recesso:

- Deixamos cinco requerimentos para levar qualquer decisão do senador Paulo Duque ao plenário do Conselho, apesar de ele ter dito que só tratará do assunto em agosto. No plenário do Conselho o voto é aberto.

O voto de censura, previsto no regimento da Casa, tem que passar pela Comissão de Constituição e Justiça e pelo plenário para ser aprovado, antes de ser endereçado ao presidente.

Demóstenes Torres (DEM-GO) apresentou voto idêntico. Tramitam na Casa outros quatro pedidos de votos de censura: um contra o "top top" do assessor Especial da Presidência Marco Aurélio Garcia e outros três contra discursos de Lula - Ninguém está aqui querendo dar um golpe. Mas se Lula fosse primeiro-ministro, cairia. O que vai acontecer é uma consequência histórica e moral. Vai ficar registrado para a História. Daqui a 100 anos vão saber que protestamos contra um gesto de desprezo do presidente pelo Senado - disse Cristovam.

- Se Lula tivesse dito que existem alguns pizzaiolos eu avalizaria, porque são os impostos pelo governo nas CPIs que enterram as investigações. São os pizzaiolos governistas, os fieis escudeiros que se comportam como cães de guarda - apoiou Álvaro Dias (PSDB-PR).

Da tropa de choque do PMDB, Almeida Lima (SE) atacou:

- E eu achei até pouco, porque os senadores da oposição se referem a Lula com adjetivos muito mais pejorativos.

É puro deboche

Clóvis Rossi
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


SÃO PAULO - Uma vez, quando se discutia se o mandato do então presidente José Sarney deveria ser de quatro ou cinco anos, escrevi que o Brasil havia se transformado em uma república bananeira, vistas as manobras sórdidas em favor do mandato mais longo.

Hoje, sou obrigado a pedir desculpas às repúblicas bananeiras. O Brasil é pior. Ou pelo menos sua política é pior. Virou deboche. Só pode ser deboche a eleição de Paulo Duque para presidir o Conselho de Ética do Senado, a julgar pela entrevista que deu à Folha. Espremendo bem as declarações, seu conceito de ética é mais ou menos assim: roubar pouco é ético.

Só se roubar muito pode, assim mesmo eventualmente, ser investigado pelo Conselho de Duque. Aliás, o conceito de muito ou pouco também é relativo, já que o ínclito senador orgulha-se de ter nomeado 5.000 pessoas para cargos públicos e ainda acrescenta que todas estão felizes. Pudera.

Trata-se, claramente, de um caso único no mundo de caçador de talentos republicanos, um disseminador de felicidade às custas do seu, do meu, do nosso dinheirinho.

Na véspera, aquela foto do abraço Lula/Collor já era um deboche. Deu nojo, mas nem escrevi a respeito primeiro porque nojo é mau conselheiro, segundo porque sabia que o leitor dispensaria intermediários para julgar a debochada cena. Estava certíssimo, como dá prova o "Painel do Leitor" de ontem, em que Silvério Oliveira diz tudo: "Eles se merecem".

Como se o deboche fosse pouco, ainda ficamos sabendo que o presidente não sabe o que diz. Não, não é alguma iniciativa golpista da oposição. Trata-se de avaliação de um dos sumo-sacerdotes do culto à personalidade de Lula, o senador Aloizio Mercadante, para quem o que o presidente disse (sobre os senadores) "não expressa o que ele efetivamente pensa". Ou seja, não sabe se expressar.

O primeiro a ligar o forno

Editorial
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Mesmo no clima geral de achincalhe da política e da atividade parlamentar, consequência inevitável da parceria entre o presidente Lula e o coronelato que controla o Senado da República, ele passou da conta ao dizer que "todos eles (os senadores da oposição) são bons pizzaiolos". Lula respondia à pergunta de um jornalista sobre a possibilidade de a CPI da Petrobrás - a seu ver, "uma irresponsabilidade" - acabar em pizza. A grosseria incomodou até os seus companheiros, como o líder petista Aloizio Mercadante, que se viu constrangido a soltar uma nota para criticar a "frase infeliz". Mas o que chama a atenção no episódio, além da absoluta naturalidade com que o presidente se permite ofender uma instituição legislativa, embora apequenada, é o fato de ser ele o primeiro a ligar o forno onde pretende ver incinerados os derradeiros vestígios de autonomia do Senado, no que possam contrariar os esquemas de poder do Planalto.

O comportamento rombudo da maioria governista na imposição dos nomes do presidente e do relator do inquérito parlamentar sobre a Petrobrás é um exemplo disso. Outro, na mesma linha, está na escolha do novo presidente do Conselho de Ética, no qual 10 dos 15 membros integram o bloco da situação. Comprovando que o governo está determinado a não deixar aberta nem uma fresta sequer para o exame, no colegiado, das denúncias contra o senador José Sarney - de quem Lula se tornou arrimo -, o líder do PMDB, Renan Calheiros, fez eleger um pau-mandado, o seu correligionário do Rio de Janeiro Paulo Duque. Ele chegou ao Senado como segundo suplente do atual governador Sérgio Cabral e não pretende se candidatar em 2010. Nas últimas semanas, ninguém o superou na defesa de Sarney, nem em ênfase nem em primarismo.

O maranhense, Duque chegou a dizer, "é diferente dos outros senadores" por ter criado a TV Senado, "que permite que eu me dirija a todo o povo brasileiro". E arrematou: "Isso não tem preço." Tudo se faz com a maior desfaçatez. Calheiros, obviamente de comum acordo com Lula, vetou o nome de Antonio Carlos Valadares, do PSB de Sergipe, indicado pela liderança petista, porque este, que deverá disputar a reeleição, poderia se mostrar menos propenso a bloquear um processo por quebra de decoro parlamentar contra Sarney. O presidente do Senado mentiu ao negar que tivesse responsabilidades administrativas na fundação que leva o seu nome e que desviou R$ 500 mil do patrocínio cultural de R$ 1,3 milhão recebido da Petrobrás. Sarney é também suspeito de envolvimento na edição dos famigerados atos secretos, nos 14 anos em que a diretoria-geral da Casa foi ocupada pelo seu apadrinhado Agaciel Maia.

Essas suspeitas se adensaram com a revelação, na edição de ontem deste jornal, de que gravações da Polícia Federal (PF) autorizadas pela Justiça captaram telefonemas do empresário Fernando Sarney, primogênito do senador, para Agaciel. As interceptações foram feitas no curso da Operação Boi Barrica, que levou a PF a indiciar o empresário, que cuida da rede de comunicação da família, por lavagem de dinheiro, tráfico de influência e formação de quadrilha. A operação foi desencadeada para apurar o uso de recursos ilícitos nas eleições de 2006, quando Roseana Sarney era candidata ao governo do Maranhão. Dois dias antes do segundo turno, Fernando teria sacado R$ 2 milhões em dinheiro vivo. Há outras acusações escabrosas.

Entre março e abril de 2008, a filha do empresário, Maria Beatriz, tratou com o pai e com o avô da nomeação do namorado Henrique Bernardes para o lugar do meio-irmão Bernardo que tinha se demitido. Sarney é instruído a encaminhar o currículo do namorado da neta a Agaciel. Pouco depois, ele foi nomeado por ato secreto. O detalhe que vale por um tratado sobre a mentalidade do clã, pela qual os seus membros têm uma espécie de direito natural sobre o patrimônio comum dos brasileiros, é o argumento usado por Maria Beatriz para justificar a nomeação de Bernardes: afinal, a vaga pertencia à família. É o caso de dizer que, se o filho de Sarney cometeu o crime de formação de quadrilha, o senador, a parentela e os agregados passaram anos formando família, compulsivamente, sob o teto do poder público. Pelo menos 10% dos 663 atos secretos no Senado favoreceram parentes e aliados políticos do seu tripresidente por quem Lula assará pizzas de todos os tamanhos e sabores.

Senado avalia voto de censura a Lula

Eugênia Lopes, Brasília
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Frase “bons pizzaiolos” usada pelo presidente resulta em requerimento

Um dia após derrotarem o governo na indicação de um diretor da Agência Nacional de Águas (ANA), os senadores voltaram a retaliar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que criticou a oposição pela criação da CPI da Petrobrás e os chamou de "bons pizzaiolos". O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) apresentou requerimento de voto de censura contra Lula.

Pelo menos 11 senadores assinaram o requerimento que, agora, será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), antes de ser levado a plenário. "Esse voto de censura visa à história. Daqui a 50 anos, os historiadores vão ver essas declarações que Lula deu", disse Cristovam. "Existem aqueles que podem ser pizzaiolos e ele sabe quais são. Em geral, são os que estão mais próximos a ele hoje. E existem aqueles que não são. Ele generalizou e ofendeu toda a nossa instituição."

Indignados, os senadores fizeram questão de observar que Lula chamou de "pizzaiolos" os parlamentares que são da base aliada. Na CPI da Petrobrás, a maioria governista é expressiva, são oito votos do governo contra apenas três da oposição.

"Na medida em que o Lula diz que vai dar pizza, está criticando os próprios companheiros de governo. Só vai dar pizza se a maioria quiser e a maioria está com ele", disse o senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE).

Às vésperas do recesso parlamentar e com o plenário praticamente vazio, Cristovam conseguiu assinaturas de parlamentares não só de oposição. Membros do PTB, do PDT e do PMDB apoiaram o voto de censura, além do DEM e do PSDB.

"Esse requerimento mostra a nossa indignação", comentou o senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR). "Normalmente se censura um filho, uma pessoa subalterna. Aqui, como somos iguais, são poderes iguais. Estamos censurando o chefe do Executivo, porque realmente não soube se comportar como tal."

O único a defender Lula foi o líder do PTB, Gim Argello (DF). "O negócio é que o presidente fala a linguagem popular, mas ele não teve intenção de ofender os senadores", afirmou.

PSDB vai ao Conselho de Ética contra Sarney pela 4ª vez

Eugênia Lopes, Brasília
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Motivo agora é um grampo da PF que levanta a suspeita de envolvimento do senador em negociações para nomeação de namorado de sua neta

O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio Neto (AM), anunciou ontem que vai apresentar na semana que vem nova denúncia ao Conselho de Ética contra o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP). O tucano quer que o conselho investigue a participação de Sarney nas negociações que levaram o então diretor-geral do Senado, Agaciel Maia, a nomear o namorado da neta do senador para um cargo na Casa, conforme publicou ontem o Estado. Às vésperas do início do recesso parlamentar, Sarney preferiu não aparecer ontem no plenário, frustrando a expectativa de que fizesse um balanço sobre as atividades do Senado no primeiro semestre.

"Vamos ver se a água mole em pedra dura tanto bate até que fura", afirmou o líder tucano. É a terceira denúncia que ele apresenta contra Sarney no Conselho de Ética. O ceticismo de Virgílio em relação ao conselho tem motivos. Dos 15 integrantes do colegiado, dez são da base aliada e estão dispostos a salvar Sarney.

Além disso, o recém-eleito presidente do conselho, senador Paulo Duque (PMDB-RJ), já sinalizou a disposição de mandar arquivar tanto as denúncias quanto a representação do PSOL contra o presidente do Senado por falta de decoro. Pelo regimento, Duque tem poderes para barrar a investigação logo no início, mas a oposição já avisou que vai recorrer.

NA BERLINDA

Os cinco senadores de oposição já deixaram assinado recurso na eventualidade de Duque determinar, durante o recesso, o arquivamento das denúncias e da representação. "Tomamos essa precaução porque como vamos estar em recesso e cada senador é de um Estado diferente, seria difícil reunir as assinaturas da oposição", disse o líder do DEM, José Agripino Maia (RN). Em sua avaliação, a nova denúncia torna a situação de Sarney mais grave.

Agripino está certo de que as férias parlamentares irão "acalmar" a pressão sobre Sarney, mas avalia que o peemedebista continuará na berlinda. "Os fatos contra Sarney continuam consistentes, mesmo havendo recesso. O que irá apenas ocorrer é um lapso de tempo nessa pressão", disse.

Virgílio, que foi ontem para Manaus, pretende entrar com a representação na próxima segunda-feira no Conselho de Ética. Reportagem publicada ontem pelo Estado revela gravações reunidas pela Polícia Federal durante a Operação Boi Barrica, com telefonemas entre Fernando Sarney, um dos filhos do senador, para o ex-diretor Agaciel Maia. Nas escutas telefônicas, existem referências diretas a nomeações de parentes e agregados do clã Sarney por ato secreto.

A primeira reunião do Conselho de Ética está marcada para 5 de agosto. O órgão terá de analisar as denúncias apresentadas pelo líder tucano e a representação do PSOL contra Sarney. Em duas denúncias, Virgílio solicita ao Conselho que apure a suposta responsabilidade de Sarney na edição dos 663 atos secretos, além da suspeita de ter usado o cargo para favorecer a Fundação José Sarney. O PSOL pede a punição de Sarney por quebra de decoro no caso dos atos secretos. O partido também pediu a abertura de processo contra o ex-presidente Renan Calheiros.

PROTESTO

Estudantes da Universidade de Brasília (UnB) promoveram um protesto ontem no Senado. Eles trajavam camisetas brancas com letras da frase "Fora Sarney". Seguranças arrancaram o aluno que vestia o "S" - a frase ficou "Fora Arney".

UNE, com verba oficial, festeja Lula

Lisandra Paraguassú e Tânia Monteiro, Brasília
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Evento anual da entidade recebeu apoio de sete ministérios, da Caixa, dos Correios e da Petrobrás

Aos gritos de "Dilma presidente" e "Lula, guerreiro do povo brasileiro", os cerca de 3 mil estudantes que se reuniram ontem na abertura do 51º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) mostraram uma adesão inquestionável ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com algumas poucas reivindicações e vários elogios, deixaram claro de que lado estão. Algum desavisado poderia pensar tratar-se de uma convenção petista.

Ovacionado ao se levantar para fazer seu discurso, o presidente chegou a pedir que parassem. "Vocês vieram aqui para trabalhar ou para gritar?", brincou o presidente.

As vozes dissonantes foram poucas. De um lado, um grupo minoritário contrapunha ao nome da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, para a presidência em 2010 o do deputado Ciro Gomes (PSB-CE) - que integra a base aliada do governo. Mas mesmo esse grupo de estudantes se entusiasmou e começou a tirar fotos de Lula assim que o presidente entrou no auditório do Centro de Convenções Ulysses Guimarães, ontem, em Brasília.

"O presidente Lula é o primeiro a participar de um congresso da UNE em 71 anos de história", destacou a presidente da entidade, Lucia Stumpf, ligada ao PC do B. Não há registros, no entanto, de outro presidente que tenha sido convidado para a cerimônia. Lula e o ministro da Secretaria Geral da Presidência, Luiz Dulci, foram convidados a pôr a mão no gesso em um molde que ficará exposto na nova sede da UNE, no Rio. Como Lula e Dulci demoraram muito, o gesso endureceu e os dois tiveram dificuldades para tirar a mão da massa.

APOIO

Dominada há décadas pelo PC do B, que elegeu a maioria dos presidentes desde a reconstrução da entidade, em 1979, e pelo PT, que tem o segundo maior grupo, a UNE virou base do governo desde a primeira eleição de Lula, em 2002. Nunca antes a entidade teve uma relação tão próxima com o governo federal.

Essa proximidade se traduz em recursos. Desde 2004, a UNE já recebeu R$ 10 milhões da União. Desses recursos, R$ 7 milhões foram repassados somente nos últimos 14 meses. O 51º Congresso da entidade, que começou ontem em Brasília, foi organizado com o apoio de sete ministérios, além de instituições como a Caixa Econômica Federal, Correios, o Programa Nacional de Segurança com Cidadania (Pronasci) e a Petrobrás. Um projeto de lei que tramita no Congresso ainda vai liberar recursos federais para financiar a reconstrução da sede da entidade no Rio de Janeiro.

Em seu discurso, que durou pouco mais de meia hora, o presidente Lula elogiou a independência da UNE. "A Lucia (Stumpf) fez seu discurso como se eu não estivesse aqui. E fez mais forte porque eu estava aqui. Numa relação democrática,civilizada, ninguém pode ser dependente de ninguém", afirmou o presidente.

"Eu sou amigo de vocês e vocês meus amigos. Vocês são uma entidade com autonomia e no momento em que vocês não concordarem comigo é para dizer na minha cara ?não concordo, sou contra? e vão para rua fazer passeata. Não tem nenhum problema", completou.

Com os estudantes concentrados em pedir mais investimentos na área da educação, defender o petróleo encontrado na camada pré-sal e exigir a abertura de um número maior de vagas no programa Universidade para Todos (ProUni), não se ouviu durante as cerca de duas horas em que Lula e seus 11 ministros estiveram no centro de convenções gritos de "Fora Sarney". A manifestação contra o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), que tem contado com o apoio do presidente para se manter no cargo, só ocorreu mais tarde, em frente ao Congresso.

A presidente da UNE aproveitou para dizer que a entidade não compartilha alguns pontos de vista do presidente Lula, que além de liderar a movimentação em defesa de Sarney até abraçou no início desta semana o hoje senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL), removido da Presidência da República com a ajuda de estudantes que ficaram conhecidos como os "caras-pintadas".

"Nós não nos somamos a ele (Lula) na defesa de Fernando Collor nem de Sarney. Nós repudiamos o que Collor representa na história do Brasil", afirmou Lucia. "Por isso vamos convocar um grande debate para exigir uma reforma política que dê acesso ao jovem ao Congresso Nacional. Os jovens que estão lá hoje são os filhos, os netos, os juniores (das oligarquias políticas)", completou.

O QUE PENSA A MÍDIA

Editoriais dos principais jornais do Brasil

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Mediador propõe governo de reconciliação em Honduras

Gustavo Chacra, Nova York
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Sugestão de Arias para resolver crise será levada amanhã à mesa de diálogo; Micheletti diz que rejeitará proposta

Enquanto simpatizantes do presidente deposto Manuel Zelaya intensificaram as ações contra o governo de facto em Honduras - ao bloquear estradas de acesso a Tegucigalpa e outras cidades importantes do país -, em San José, na Costa Rica, o presidente costa-riquenho e mediador do conflito, Oscar Arias, declarou ontem que a saída para o impasse deve incluir necessariamente a volta de Zelaya à presidência e propôs a criação de um governo de reconciliação.

A proposta foi feita após o presidente de facto de Honduras, Roberto Micheletti, dizer que estava disposto a deixar o cargo que assumiu após o golpe do dia 28, desde que o governante deposto não reassuma a presidência.

No entanto, Micheletti rejeitou estabelecer um governo de "reconciliação nacional" para resolver a crise política. "Não aceitamos que nenhum país nos faça imposições. Nós temos uma posição firme e não mudaremos de modo algum", disse o presidente de facto.

Segundo declarações feitas por telefone ao Estado desde Tegucigalpa, não há clima internamente para que Zelaya retorne. As Forças Armadas, a Suprema Corte e o Congresso ainda estão unidos na oposição ao presidente deposto, apesar de estarem abertos a concessões para aliviar o isolamento de Honduras, um dos países mais pobres da América Latina.

"Micheletti está disposto a renunciar ao cargo para dar o poder a outra pessoa (que não seja Zelaya). Mas essa não é uma solução, pois o restabelecimento constitucional passa pela volta de Manuel Zelaya ao poder", afirmou Arias a um programa de rádio.

Para ele, Zelaya deve também abandonar sua pretensão de levar adiante o projeto de uma consulta sobre a convocação de uma Assembleia Constituinte. Amanhã, comissões representando os dois lados devem ser reunir para prosseguir com as negociações, iniciadas uma semana atrás, quando Micheletti e Zelaya se reuniram separadamente com Arias.

Em Tegucigalpa, a tensão continua a se acentuar. Após Zelaya ter conclamado seus partidários à insurreição contra o governo de facto, manifestantes bloquearam as estradas e sindicatos ameaçaram iniciar uma greve geral se não houver acordo até domingo. O governo restabeleceu o toque de recolher. Cresce o temor de que se iniciem conflitos armados caso Zelaya tente entrar por terra em Honduras.

"O que se fala é que Zelaya poderia voltar com a ajuda (do presidente nicaraguense, Daniel) Ortega", disse o professor da Universidade Nacional Autônoma de Honduras, Benjamin Santos.

Segundo o analista, tudo dependerá de quem o presidente deposto está disposto a ouvir. Se seguir aliados como o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, pode tentar voltar. Já o governo de Barack Obama e Arias aconselham Zelaya a esperar por uma solução. O jornal El Heraldo, mais importante de Honduras e contrário a Zelaya, informou ontem ter tido acesso a planos para "desestabilizar o país mediante ações armadas de grupos irregulares, ligados ao narcotráfico e provenientes da Venezuela".

O analista hondurenho Graco Pérez afirma que provavelmente "Zelaya não retornará". O consenso, acrescenta Peter DeShazo, diretor de América Latina do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais em Washington, "é que qualquer solução passa pelas eleições". A votação está prevista para novembro.

Tigre de papel

Míriam Leitão
DEU EM O GLOBO


Nem a China está comemorando o crescimento chinês. O instituto oficial de estatísticas disse que o crescimento é desigual e instável e que a retomada não foi para todo o país, nem todos os setores. O Congresso do Povo disse que o governo tem que evitar o “crescimento extraordinário” do crédito. Na China, nem o governo acha que a crise acabou por causa dos 7,9% do PIB do segundo trimestre

Não se pode ser superficial com crise tão grave. Ela continua sendo a pior em 80 anos. O que está acontecendo é uma redução das previsões de queda da maioria dos países, e uma ligeira melhora no crescimento chinês.

Mas a China cresceu 13% em 2007, e deve crescer entre 7% e 8% este ano e no próximo.

Parece muito para o mundo não chinês, mas para os padrões do país esse resultado é ruim. O economista Nouriel Roubini faz uma série de ponderações sobre o desempenho da China que vale a pena registrar. As importações foram dominadas por commodities neste primeiro trimestre e se aproveitaram dos preços baixos. Agora, os preços subiram; a demanda internacional dos produtos manufaturados chineses continua fraca; os estoques aumentaram; e a tendência é o país reduzir a compra de commodities. A China aumentou tanto o incentivo à exportação quanto as barreiras às importações. Isso contribuirá para um dos riscos atuais: o protecionismo.

Houve aumento de investimentos, mas depois de forte apoio do governo e pelo uso de lucros retidos. Isso pode tirar fôlego das empresas para investimentos em 2010.

A China está em melhor posição do que a maioria dos países para estimular a demanda, diz Roubini. O consumo das famílias é baixo, 36% do PIB, e o nível de poupança é reconhecidamente alto. Só que, paradoxalmente, parte da compulsão de poupar vinha de um problema: uma rede social deficiente em saúde, educação e aposentadoria. Investindo nessas áreas, o governo poderá reduzir a tendência à poupança na população.

O país continua correndo os riscos de deterioração fiscal, reservas altamente concentradas em dólar, câmbio quase fixo e crescimento abaixo do potencial. Esse último item afeta diretamente países da América Latina, Ásia e África. Se a China crescer menos, também importará menos commoditites. No Brasil, os efeitos são imediatos no setor de mineração.

Gráficos enviados ao blog (http://www.miriamleitao.com.br/) pelo Banco Fator mostram claramente os efeitos da crise sobre a China. Apesar das taxas serem altas quando comparadas com o resto do mundo, elas representam desaceleração no contexto chinês.

A produção industrial teve alta acumulada no primeiro semestre de 7%, mas no mesmo período de 2008 a taxa estava acima de 15%. As vendas no varejo que chegaram a crescer 23% desaceleraram para 15% no acumulado até junho.

“Não se espera que o ritmo (do PIB) observado entre 2003 e 2007 (acima de 10% ao ano) volte a vigorar rapidamente”, diz relatório do banco.

O secretário-executivo do Conselho Empresarial BrasilChina (CEBC), Rodrigo Maciel, disse a Bruno Villas Bôas, do blog, que a desaceleração da economia tinha duas origens: uma externa, fruto da crise, e outra interna, que era o colapso do setor imobiliário.

O governo elevou impostos, reduziu crédito e tirou benefícios no ano passado para conter a expansão do setor e evitar o superaquecimento da economia.

— O governo chinês também pediu para os bancos segurarem crédito, entre outras medidas. Mas a partir do final de 2008, com a crise, o governo chinês adotou uma política de explodir investimentos — disse Maciel.

Entre as medidas voltadas ao setor imobiliário, o governo reduziu o tamanho da entrada necessária para compra do imóvel, que caiu de 35% para 20% do total. Também reduziu o volume de capital que as construtoras precisam ter em caixa para executar uma obra. Na compra de imóveis, o imposto foi reduzido de 1,5% para 1%: — O governo investiu pesado em grandes obras de infraestrutura, como rodovias, portos, usinas de energia.

São investimentos em ativo fixo, que cresceram 33% na primeira metade do ano, maior taxa em cinco anos.

Isso incentiva a indústria de base, responsável por uma grande fatia da economia.

Mas nada disso é capaz de eliminar os desafios que a China tem pela frente. Como explicou o diretor da Câmara de Comércio e Indústria BrasilChina, Kevin Tang, desde a crise, cerca de 20 milhões de empregos foram eliminados.

Mais desemprego é sinal de aumento de tensões sociais.

Além disso, a China terá que suprir a redução do consumo americano. As economias americana e chinesa tinham uma relação de mútua dependência: os americanos aumentavam o consumo e produziam déficit, os chineses produziam para atender esse consumo e poupavam. Com a poupança, financiavam o endividamento americano. Agora, as famílias americanas voltaram a poupar. Têm dívidas e medo do futuro. A China terá que estimular seu próprio consumo e alterar a base da indústria, focando internamente.

Não é trivial: — Algumas mudanças são culturais e não acontecerão de uma hora para a outra — explicou Tang.

É isso que o próprio governo alerta, quando o escritório de estatísticas avisa que o crescimento não chega a todas as partes, é desigual e instável, e quando o Congresso do Povo afirma que bolhas de crédito são perigosas.

Quem discordaria?

Com Alvaro Gribel

Crise faz criação de empregos formais no país despencar 78% no semestre

Geralda Doca
DEU EM O GLOBO

Foram abertas 299 mil vagas com carteira, pior resultado da última década

BRASÍLIA. A crise econômica levou o mercado formal de trabalho brasileiro a registrar, no primeiro semestre de 2009, seu pior desempenho nos últimos dez anos. Foram criados 299.506 empregos, o que representou queda de 78% na comparação com o registro de igual período do ano passado (1,36 milhão). Segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), em junho foram abertas 119.495 vagas - abaixo das 136 mil anunciadas anteontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e das projeções do ministro do Trabalho, Carlos Lupi, de um número superior ao de maio (131.557).

O motivo para o desempenho aquém do imaginado, explicou o ministro, foi a indústria de transformação, que contratou menos que o esperado. Este é o setor mais atingido pela crise, com uma queda de produção no semestre superior a 13%.

- Em maio, esperávamos uma recuperação melhor da indústria, principalmente em São Paulo e no setor de produção de alimentos, o que não ocorreu - lamentou Lupi.

Com apenas duas mil contratações no mês passado, a indústria ficou atrás dos setores agropecuário, que registrou saldo de 57.169 vagas, e de serviços, com 22.877. Também perdeu para a construção civil (18.321) e o comércio (17.522). Os subsetores do parque fabril mais prejudicados são as indústrias metalúrgica, mecânica, de materiais de transporte e de borracha, fumo e couros.

Indústria fecha 144 mil postos. Serviços contratam

No acumulado do ano, a indústria também foi o segmento que mais fechou postos de trabalho, com saldo negativo de 144.477 vagas. O comércio aparece em segundo lugar, com a eliminação de 32.978 postos. O setor que está puxando o emprego formal neste ano é o de serviços, que respondeu pela contratação líquida de 235.435 trabalhadores com carteira assinada, com destaque para ramos ligados ao turismo.

Apesar da desaceleração do mercado formal de trabalho no semestre, Lupi prevê que 2009 fechará com saldo positivo de um milhão de vagas, apostando na recuperação da produção industrial a partir deste mês. Segundo ele, há indicativos nesta direção, como a redução no nível dos estoques industriais na esteira dos incentivos dados pelo governo, como a redução do IPI para automóveis e artigos da linha branca.

Pela segunda vez consecutiva, o Caged mostrou elevação no nível de emprego formal em todas as regiões do país, com destaque para o Sudeste, com abertura líquida de 72.002 postos. Na região, Minas Gerais respondeu pela maior geração de empregos com carteira, 45.596 contratações, devido principalmente à safra do café. São Paulo ficou em segundo lugar, com 27.602, seguido pelo Rio de Janeiro, com 5.455 vagas.

Já no Espírito Santo houve a eliminação de 6.651 mil postos de trabalho. O Distrito Federal e o Rio Grande do Sul também registraram saldos negativos.

Interior emprega mais. Renda da mulher é menor no país

Devido ao desempenho do setor agropecuário, as maiores oportunidades de emprego no mês passado se concentraram no interior do país, que respondeu por 80.406 postos de trabalho, contra 25.535 no conjunto das nove áreas metropolitanas pesquisadas (Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre).

Ao divulgar os dados do Caged, Lupi aproveitou para informar que o salário médio do mercado formal de trabalho subiu 0,57%, na comparação entre os primeiros semestres de 2008 e 2009, saindo de R$741,57 para R$745,80. As mulheres, no entanto, recebem 89% do valor auferido pelos homens com carteira assinada. Sem entrar em detalhes, Lupi revelou que os números mostram que os salários pagos aos admitidos são inferiores aos dos demitidos.

Retração em São Paulo foi de 15,06% em junho

Paulo Justus
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A queda na arrecadação federal em São Paulo foi mais acentuada que a média do País. Relatório apresentado ontem pela Receita Federal mostrou que os R$ 21,2 bilhões arrecadados em junho no Estado representam uma queda real (descontada a inflação) de 15,06% em relação ao mesmo período do ano passado. No primeiro semestre, o recuo foi de 8,17% comparado a igual período de 2008.

De acordo com o superintendente da Receita Federal em São Paulo, Luiz Sérgio Fonseca Soares, a queda maior na arrecadação se deve ao alto grau de industrialização do Estado. "Também sofremos uma redução da carga tributária neste ano, ao contrário do que ocorreu em 2008", disse.

As informações foram repassadas em coletiva de imprensa anunciada às pressas pela Receita ontem, dois dias depois da demissão da secretária do órgão, Lina Vieira. De acordo com Soares, a divulgação dos resultados já estava prevista antes da demissão da secretária.

O superintendente paulista, que foi colocado no cargo por Lina em setembro do ano passado, negou que o evento para os jornalistas fosse um ato de desagravo à ex-secretária. "Admiro muito a atuação de Lina Vieira, mas o trabalho é mais importante que as pessoas",afirmou, acrescentando que coletivas nunca foram realizadas antes por falta de condições técnicas.

Soares também negou a existência de pressões internas na Receita para a nomeação do substituto da secretária. "Não cabe a nós aprovar ou desaprovar o nome do secretário da Receita. Isso seria deslealdade institucional", disse.

Desde que assumiu o cargo, Soares concentrou a atuação da fiscalização nos grandes contribuintes, conforme diretrizes de Lina Vieira. Como resultado, os créditos das fiscalizações das grandes empresas em São Paulo subiram de R$ 1 bilhão no primeiro semestre de 2008 para para R$ 2,8 bilhões nos primeiros seis meses de 2009. Já os créditos provenientes da autuação de contribuintes pessoa física caíram de R$ 702 milhões para R$ 254 milhões nas mesmas bases de comparação.

Decifrando o enigma da crise

Luiz Carlos Mendonça de Barros
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Se o atual padrão de ajuste de custos se mantiver, teremos um mercado mais forte e um menor nível de pessimismo

OS PRIMEIROS resultados da atividade econômica global na primeira metade de 2009 começam a ser divulgados. Ontem, ficamos sabendo que o PIB chinês cresceu a uma taxa anualizada de 16,5% entre abril e junho passados. Nos três primeiros meses do ano, o gigante asiático havia crescido 6,1%, e, no último trimestre de 2008, apenas 1,5%. Uma recuperação impressionante.

Mas são alguns vetores desse crescimento que chamam a atenção do analista mais cuidadoso.

As vendas no varejo cresceram no segundo trimestre deste ano em relação a 2008 a uma taxa anualizada de 24%. Nesse mesmo período, a China passou a ser o maior mercado mundial de venda de automóveis, superando os Estados Unidos. Ainda do lado da atividade econômica voltada para o consumo interno, é importante ressaltar o crescimento de quase 20% ao ano na construção de imóveis residenciais.

Sabemos que a chave para um crescimento sustentado na China está no aumento do consumo interno e na redução da dependência das exportações industriais. Por isso, os analistas acompanham com lupa essa mudança de dinâmica no crescimento chinês. Os dados divulgados ontem vão nessa direção, embora apenas a manutenção desse movimento em prazo mais longo será prova definitiva de sucesso.

Em uma economia dirigida por um governo central forte e com sólida visão estratégica de longo prazo, a política econômica está direcionada para acelerar a transição para esse novo modelo de crescimento. O susto dos últimos meses de 2008 e da parte inicial de 2009 alertou o governo dos riscos que corre se não tiver sucesso no reequilíbrio agora buscado. Aposto nessa direção e acredito no crescimento chinês nos próximos anos.

Nesse sentido, reproduzo ao leitor da Folha a informação de que o valor de mercado das empresas chinesas, negociadas nas Bolsas de Valores, já supera o das japonesas -e perde apenas para as norte-americanas.

Mas a atenção dos mercados não está voltada apenas para os dados macro das principais economias do mundo. Entramos no período de divulgação dos resultados trimestrais das principais empresas negociadas nas Bolsas de Valores nos Estados Unidos. Em época de crise de confiança na maior economia do mundo, seus lucros e, principalmente, as previsões para o resto do ano são informações decisivas.

A legislação norte-americana nessa questão não foi enfraquecida pela onda ultraliberal dos últimos anos, e as informações passadas aos mercados são vistas com grande credibilidade.

Embora o número de empresas que já divulgaram seus balanços seja ainda muito pequeno, alguns padrões estão aparecendo. O primeiro é a força dos lucros dos bancos, principalmente dos resultados de tesouraria obtidos em razão dos juros baixíssimos nos mercados interbancários e da melhoria nas condições de crédito. Com isso, os prejuízos com a inadimplência crescente de seus devedores estão sendo compensados, sem comprometer ainda mais sua estrutura de capital.

Além disso, outro padrão aparece nos resultados já divulgados das empresas não financeiras. O ajuste de custos nos últimos três meses, principalmente no volume de emprego e no nível dos salários, está sendo maior do que o esperado pelos analistas. Se esse padrão se mantiver até o fim, poderemos ter um mercado mais forte nas próximas semanas, o que pode reduzir ainda mais o pessimismo que vivemos nos últimos meses.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).

Caminhos bloqueados paralisam Honduras

Tegucigalpa e La Paz
DEU EM O GLOBO


Chanceler deposta afirma que Zelaya está a caminho do país para instalar governo alternativo e dirigir insurreição contra golpistas

A chanceler do governo deposto, Patricia Rodas, afirmou ontem na Bolívia que o presidente Manuel Zelaya está a caminho de Honduras para retomar o cargo, do qual foi derrubado no dia 28, e instalar uma sede alternativa de governo. A declaração veio dois dias depois de Zelaya convocar os hondurenhos à insurreição contra o governo golpista - no que parece ter sido atendido: ontem os acessos norte e sul da capital, Tegucigalpa, foram fechados por manifestantes, assim como as principais rotas comerciais do país, nos mais intensos protestos dos últimos dias.

Patricia Rodas chegou à Bolívia junto com o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, para participar das comemorações pelo bicentenário da Revolução de Julho.

- Neste momento, nosso presidente está a caminho de Honduras - disse Patricia, sem dar detalhes de quando e onde a sede alternativa será estabelecida. - A instalação de uma sede alternativa é para poder dirigir de lá o que eu chamaria de a batalha final. Não se trata de um governo no exílio. Existe um governo em Honduras (de Zelaya) que não perdeu sua legitimidade.
Nem o toque de recolher, retomado na véspera, impediu que as ruas fossem ocupadas, chegando a reunir 3 mil pessoas em alguns pontos de Tegucigalpa. O bloqueio dos acessos da capital causou quilômetros de congestionamento. O tráfego foi paralisado também entre San Pedro Sula (a segunda maior cidade do país) e Puerto Cortés. As filas de veículos em direção ao principal porto do país eram enormes. Em Copan, no oeste, os manifestantes bloquearam as rotas de importação e exportação para El Salvador.

- Se tivermos que paralisar o país, nós o faremos - disse a manifestante Yadira Marroquin, funcionária de um hospital.

Foram registrados protestos também em Comayagua, no centro de Honduras, e Yoro, no norte, além de Atlántica e Colón, na costa. Os manifestantes ameaçaram realizar uma greve geral se não houver uma solução na reunião entre representantes do governo deposto e do governo golpista, mediada pela Costa Rica, amanhã.

- Vejam: não há um facão, um revólver ou fuzil. É uma passeata pacífica - destacou o líder camponês Rafael Alegria.

Chávez adverte para risco de guerra civil

A crise hondurenha começou com a insistência de Zelaya em realizar uma consulta popular que poderia abrir caminho para sua reeleição.

Chávez advertiu ontem para o risco de a crise se transformar numa guerra civil e se espalhar pela América Central. O presidente venezuelano é acusado pela imprensa que apoia o governo golpista de planejar uma ação militar com a ajuda da Nicarágua para derrubá-lo. O jornal "El Heraldo" afirmou que estão se formando grupos armados para ajudar Zelaya a entrar no país.

Zelaya já tentou regressar uma vez, no dia 5, mas a pista do aeroporto foi bloqueada. Ele é ameaçado de prisão caso pise no país. O presidente deposto conta com amplo apoio internacional. Mas, em Honduras, as instituições apoiam Micheletti. Os últimos acontecimentos são um mau sinal para a rodada de negociações marcada para amanhã, em San José. O presidente da Costa Rica e mediador, Oscar Arias, pretende propor a formação de um governo de reconciliação, com uma coalizão em ministérios importantes, como Finanças e Interior. Arias não acha necessário adiantar as eleições presidenciais, marcadas para novembro, mas Zelaya teria que renunciar à consulta popular.

Volta de Zelaya é pré-condição, diz Insulza

Gilberto Scofield Jr.
DEU EM O GLOBO

Secretário-geral da OEA chama governo Micheletti de "uma ditadura de fato"

WASHINGTON. O secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza, afirmou ontem que a saída para o impasse sobre Honduras passa, necessariamente, pela recondução do presidente Manuel Zelaya ao cargo, e nenhum acordo sem essa pré-condição deve ser fechado por Oscar Arias, presidente da Costa Rica, que tenta mediar uma solução. Insulza falou ontem a diplomatas e estudiosos da América Latina num fórum sobre a crise hondurenha organizado pelo Inter-American Dialogue, um instituto de estudos sobre a região.

Segundo o secretário-geral - que se diz otimista sobre a nova rodada de conversas, marcada para amanhã -, a OEA tem como horizonte para um acordo as eleições presidenciais marcadas para novembro. Ele evitou falar sobre o que a organização fará caso as conversas não tenham resultados a curto prazo e descartou qualquer operação de caráter militar na região.

- A realização de eleições em Honduras ocorre em cinco meses e precisamos de um acordo até lá. A solução passa, obrigatoriamente, pelo respeito à Constituição, o que significa a recondução de Zelaya ao cargo. Chegarmos às eleições sem isso é inadmissível - afirmou.

O pré-requisito de Insulza se choca com as recentes declarações do presidente interino, Roberto Micheletti, segundo o qual ele poderia abdicar do cargo desde que Zelaya não retornasse ao comando do país. Insulza chamou o governo de Micheletti de "uma ditadura de fato".

- É verdade que Zelaya tentou mudar as regras previstas na Constituição e que proíbem a reeleição, mas tanto o Legislativo quanto o Judiciário tinham alternativas para barrar suas ambições. Um golpe é diferente. É um ataque à democracia e afeta todos os países da região. Estou esperançoso com as declarações de Micheletti, mas a renúncia não pode acontecer com o preço de levar junto Zelaya - afirmou.

Insulza disse que está negociando com o governo interino de Honduras o envio, na próxima semana, de representantes da Comissão de Direitos Humanos da OEA, que irão investigar se ocorrem abusos contra opositores. Mas fez questão de negar que esteja ocorrendo "um banho de sangue" ou haja violência nas ruas. E criticou a Igreja por se meter em assuntos políticos.

Trio Carioca - Mistura e Manda, de Nelson Alves

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