terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Raymundo Costa :: Território demarcado

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Os palanques do tucano José Serra e da petista Dilma Rousseff começam a ganhar forma no eixo São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, no qual se concentra quase 50% do eleitorado nacional. Com destaque para Minas: na terra do "pós Lula", o embate nacional entre PT e PSDB é o que dá o tom dos arranjos pré-eleitoral e pode até levar o governador Aécio Neves a compor a chapa do tucano José Serra como candidato a vice-presidente.

Em mais de uma ocasião, Aécio disse que não cogita a hipótese de ser vice de Serra, chapa que teme ser carregada de soberba. Mas daí a dizer que o governador mineiro vai cruzar os braços na campanha de Serra, há uma grande distância. "É preciso acabar com esse negócio de que o Aécio vai entregar Minas de mão beijada para seus adversários", diz o presidente do PPS, Roberto Freire, aliado do PSDB na disputa presidencial. No quadro que se desenha em Minas, a sucessão estadual passa pela disputa nacional entre governo e oposição.

As opções do presidente Lula em Minas são PT e PMDB. Nenhuma das hipóteses em cogitação na campanha da ministra Dilma Rousseff passa por Aécio Neves, durante muito tempo incensado no Palácio do Planalto numa tentativa de criar ou ampliar desavenças no PSDB - é isso o que faz o ex-ministro José Dirceu quando afirma que Minas Gerais jamais perdoará Serra por não ceder a vez de candidato ao governador mineiro, como fez em 2006 relação a Geraldo Alckmin.

A força de Aécio é Minas. O governador é um nome nacional porque é forte em Minas Gerais. O fato de carregar o sobrenome Neves é um charme a mais na composição biográfica de uma futura candidatura a presidente. E para continuar sendo forte em Minas ele precisa eleger o próximo governador do Estado - o vice-governador Antônio Anastasia, um gestor de biografia densa e reconhecida, mas ainda virgem em campanhas eleitorais. Certamente não é com o PT que Aécio conta para eleger Anastasia e manter a fortaleza mineira.

A tentativa de formatar uma aliança PT-PSDB, empreitada a que Aécio se dedicou em 2008, fracassou na eleição para Prefeitura de Belo Horizonte. Marcio Lacerda (PSB), o candidato apoiado por Aécio e por Fernando Pimentel, então prefeito petista da cidade, ganhou a disputa mas por pouco não soçobrou no primeiro turno. Entre outros motivos, segundo avaliação feita hoje, porque Aécio não pode se empenhar na campanha tanto quanto havia planejado: o PT vetou a coligação formal com o PSDB em Minas, num enunciado claro de que aceitava a aliança desde que ela fosse restrita ao plano local e que, em termos nacionais, tucano era tucano, PT era PT. Fosse outra a decisão da cúpula petista e talvez Aécio pudesse ter entrado em outras condições na disputa interna do PSDB para a escolha do candidato do partido a presidente.

Na eleição de Marcio Lacerda, também um neófito na política, Aécio exercia a governança; agora, terá de ajudar Anastasia fora do cargo, pois deve deixar o Palácio da Liberdade no início de abril.

Em princípio, para concorrer ao Senado. Mas como Aécio costuma dizer que "irreversível" é só a morte, ele dispõe ainda de outras possibilidades para outubro, muito embora tenha renunciado à candidatura presidencial no fim de 2009.

Na lógica natural da política é mais fácil o candidato a governador puxar votos para o candidato a senador que o contrário. Mas Aécio tem uma aprovação "lulista" em Minas Gerais. Há municípios em que supera os 80%, nas pesquisas. Seja como for, ele joga com o tempo a seu favor. Se precisa deixar o cargo no início de abril, tem até o fim de junho próximo para decidir o que for mais conveniente para ele: vice de Serra, se isso ajudar na eleição de Anastasia; senador, como está previsto ou até presidente, se houver uma hoje improvável reviravolta na política em curso.

Aécio precisa de Serra tanto quanto Serra de Aécio. Anima a oposição o fato de o governador demarcar terreno em relação a Lula e ao PT. Após uma conversa ontem com o presidente do DEM, Rodrigo Maia, Aécio fez questão de deixar "absolutamente claro" que está no campo da oposição. Hoje Lula e a ministra Dilma estarão em Juiz de Fora. O governador de Minas não irá. Alegou que o convite chegou tarde e ele já havia agendado outros compromissos para a data. Numa política como a mineira, feita de gestos, Aécio sinaliza um rumo a seus correligionários. Nada pessoal.

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

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