sábado, 6 de fevereiro de 2010

'Eles rasgam a Carta aos Brasileiros'

DEU EM O GLOBO

DEM e PSDB criticam proposta do PT, chamada por eles de retrocesso e populista

Cristiane Jungblut e Martha Beck
BRASÍLIA- Líderes da oposição e economistas receberam com certa desconfiança o tom que tem sido adotado pelo PT, em textos internos e nas declarações de seus dirigentes, sobre a força do Estado na economia. Para DEM e PSDB, há um retrocesso em relação à postura do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva em 2002, quando assinou a “Carta aos Brasileiros”.

O novo líder do DEM na Câmara, Paulo Bornhausen (SC), disse que é a tese defendida pelo PT para o programa de governo de Dilma é mais afinada com países como a Venezuela e que, aos poucos, o governo Lula já a adota, quando, por exemplo, faz críticas a instituições, como Tribunal de Contas da União (TCU), o Ministério Público e a mídia.

— Eles estão tentando apagar a História do país, como se antes deles nada estivesse escrito. É o atraso.

Nem a China aceitaria esse programa.

O PT vai rasgando, a Dilma e o Marco Aurélio “top,top” vão rasgando a “Carta aos Brasileiros”, assinada pelo presidente Lula, que foi o que proporcionou uma dose de acerto para que o Brasil pudesse avançar (nesse período atual) — disse Bornhausen, afirmando, porém, que é preciso reconhecer que houve avanços na gestão Lula.

Para o deputado, é normal uma intervenção do Estado para que não aconteça o pior, nas crises econômicas, mas, depois, a economia começa a tomar o seu rumo, diz.

O economista e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Márcio Holland tem a mesma tese do deputado do DEM e afirma que a estratégia do PT tem um caráter populista, porque acaba omitindo que a intervenção do Estado na economia pode trazer, por exemplo, problemas fiscais.

— Há um aproveitamento do atual momento econômico, em que vários governos tiveram que intervir no mercado para combater os efeitos da crise. Para mim, parece um discurso um pouco populista — disse Holland. — O país carece de investimentos em telecomunicações, saneamento, rodovias e ciência e tecnologia que o governo não tem a menor condição de fazer sozinho. O que houve durante a crise foi algo pontual que não pode ser transformado num programa nacional de desenvolvimento.

— Eles querem manter os empregos deles (com o Estado forte).

Essa é a prioridade deles. É evidente que há retrocesso (quanto a 2002). O discurso mais correto seria o aperfeiçoamento e a evolução (do que já ocorreu) — afirmou Sérgio Guerra, presidente do PSDB.

Para estudiosos, a ação do governo que permitiu a rápida retomada do crescimento após a pior crise financeira, desde 1929, deu ao PT autoridade para trabalhar num programa de governo com essa linha. Mas salientam o viés populista da proposta.

Especialistas ouvidos pelo GLOBO afirmam que esse tipo de tese, do Estado forte, está na moda e vai ser usado pelo PT para ajudar a distanciar a candidata Dilma Rousseff da imagem do governo Fernando Henrique, que defendeu o Estado mínimo e fez privatizações.

Segundo o cientista político da Universidade de Brasília (UnB) Leonardo Barreto, a tese de que os governos precisam atuar diretamente sobre a economia ganhou força em 2008, quando a crise financeira iniciada nos Estados Unidos se espalhou pelo mundo, retraindo o setor privado. Vários países, incluindo o Brasil, injetaram bilhões em recursos públicos e aumentaram a participação do Estado na economia para minimizar a queda na atividade produtiva.

— A linha intervencionista está na moda. Em função da crise internacional, estamos passando por um período que favorece a visão de que é preciso ter mais regulamentação — destaca Barreto. — É também uma ótima forma (para o PT) de fazer antagonismo com o governo Fernando Henrique. Em geral, quando as pessoas lembram das privatizações, elas fazem a associação com um momento ruim em suas vidas.

Barreto alerta, no entanto, para o fato de que os eleitores podem não ser receptivos a uma guinada contrária à privatização: — O eleitor brasileiro não saiu do centro


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