terça-feira, 22 de junho de 2010

Jogada chinesa:: Míriam Leitão

DEU EM O GLOBO

O anúncio da China, uma semana antes da reunião do G-20, de que vai tornar mais flexível sua política cambial foi bem recebido ontem pelo mercado, inicialmente. As avaliações são de que o Brasil pode ser um dos beneficiados pelo efeito favorável nas commodities. A nova política tem a cara da velha, que foi adotada entre 2005 a 2008, e que recuperou um pouco o valor da moeda chinesa

O yuan desvalorizado artificialmente é um fator perturbador na economia internacional. Ele torna mais competitivos os produtos chineses, desequilibra o comércio, provoca inúmeras distorções. Mas ninguém acha que o anúncio chinês seja o início de uma mudança para valer.

Alguns analistas acham que foi só uma jogada de marketing para sair do centro das discussões do G-20, outros acham que mesmo sendo suave a mudança será benéfica.

No seu blog, a economista Monica Baumgarten de Bolle, da Galanto Consultoria, diz que comparado com outros países que saíram de câmbio fixo para uma valorização da moeda, o comportamento cauteloso da China não é muito diferente dos outros. Entre 2005 e 2008, quando teve um câmbio mais flexível, a China valorizou sua moeda em cerca de 7% ao ano. Ao todo, em pouco mais de 20%. Em 2008, voltou bruscamente à política anterior de preço do yuan praticamente fixo em relação ao dólar e a valorização foi interrompida, como se pode ver no gráfico abaixo.

Com o yuan mais fraco, as exportações chinesas ganham competitividade, mas a política cambial é uma distorção num mundo de câmbio flutuante e diante da situação chinesa de grande receptora de capital, grande exportadora.

Com uma política cambial um pouco menos controladora, a moeda já teria ganhado valor diante do dólar. A China vai agora adotar uma cesta de moedas em vez do dólar para controlar sua taxa de câmbio, mas continua com uma política tão misteriosa quanto sempre foi, já que não se sabe a composição da cesta.

Será que essa vai ser uma mudança significativa? Em que vai impactar o mercado? Inicialmente, o mercado reagiu com euforia e depois passou a ver com menos entusiasmo e de forma mais setorial. As bolsas americanas que começaram o dia em alta terminaram no vermelho.

Pela manhã, os investidores estavam confiantes de que a valorização da moeda chinesa iria ajudar o comércio mundial. À tarde, a análise já era outra, mais minuciosa, com as ações das empresas de tecnologia em queda porque a importação de componentes eletrônicos chineses ficará mais cara. O Dow Jones fechou em 0,08%; Nasdaq, -0,90%; e o S&P, -0,39%. No Brasil, o índice Ibovespa depois de subir 1,65% na abertura do pregão perdeu fôlego e fechou em alta de 0,60%.

— A alta no Brasil foi sustentada pelas empresas ligadas a commodities e mineração, que devem ser beneficiadas pelo yuan mais forte. Se tirássemos a influência dessas empresas, o índice Ibovespa também fecharia no vermelho, assim como as bolsas americanas — explicou Rodrigo Moliterno, analista de investimentos da corretora Fator.

As ações da Vale subiram 2,9%; Usiminas, 0,94%; CSN, 1,26%; Gerdau, 1,15%. O índice de commodities CRB fechou com valorização de 0,76 ponto percentual.

Como disse o presidente do Banco Central brasileiro, Henrique Meirelles, é melhor esperar o desenrolar dos acontecimentos, já que com a China tudo é sempre muito pouco transparente.

No atual contexto cambial, a ligação do yuan a uma cesta de moedas pode acabar levando a menos valorização diante do dólar porque o euro tem perdido força diante da moeda americana.

Da perspectiva da China, é um bom momento para introduzir a mudança. A consultoria RGE, do economista Nouriel Roubini, acha que a moeda chinesa terá uma alta de 3% a 4% diante do dólar no próximo ano. É difícil saber em quanto uma mudança assim lenta ajudará o rebalanceamento do comércio global. Do ponto de vista político, pode acalmar alguns ácidos críticos da política cambial chinesa dentro do Congresso americano nesta conjuntura de eleição de meio de mandato e vai tirar essa questão do centro da mesa da próxima reunião do G-20, em Toronto

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