domingo, 13 de junho de 2010

Serra ataca 'neocorruptos' e aparelhamento do Estado

DEU EM O GLOBO

Na convenção que oficializou sua candidatura à Presidência, tucano diz que governo Lula mantém "esquadrões de militantes"

Adriana Vasconcelos e Flávio Freire
Enviados especiais • SALVADOR

Agora na condição de candidato oficial do PSDB à Presidência da República, José Serra fez da convenção nacional do partido, ontem, em Salvador, um palanque para críticas ao PT, ao aparelhamento do Estado, ao uso indevido de dinheiro público e à forma de governar do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Embora sem citá-lo, mas tendo o petista como alvo preferencial, o tucano, depois de lembrar até do mensalão, usou a figura de Luis XIV para mandar um recado aos “luises” que acreditam ser a personificação do Estado: — Acredito que o Estado deve subordinar-se à sociedade, e não ao governante da hora, ou a um partido.

O tempo dos chefes de governo que acreditavam personificar o Estado ficou para trás há mais de 300 anos. Luis XIV achava que o Estado era ele, mas na democracia e no Brasil não há lugar para luises assim — disse Serra, aplaudido pela plateia que lotava o Clube Espanhol.

Com discurso lido com a ajuda de dois teleprompters, Serra não chegou a citar o caso do dossiê supostamente elaborado pelo PT contra sua candidatura. Mas pontuou suas palavras com destaque para a manutenção da democracia.

— Acredito na democracia, e isso não é uma crença de ocasião. Muitos políticos ou partidos que se apresentam como democratas desdenham a democracia nas suas ações diárias, mas ao contrário dos adversários políticos, para mim o compromisso com a democracia não é tático, não é instrumental. É um valor permanente e inegociável — disse Serra, que poucas vezes saiu do script, como ao lembrar do padrinho que morreu, descartando assim que ele possa ser o ex-presidente Fernando Henrique, que não compareceu por estar na Europa, mas mandou uma mensagem gravada.

Crítica a quem ‘elogia ditadores’

Antes de lembrar de sua infância pobre e do pai semi-analfabeto que vendia frutas no Mercado Municipal de São Paulo, Serra concentrou esforços em atingir o governo federal. Atacou quem “elogia ditadores em todos os cantos do planeta” e disse que enxerga o Congresso Nacional como um espaço democrático, “e não como arena de mensalões, compra de votos e de silêncios”. E foi além: — Acredito que são os homens que corrompem o poder, e não o poder aos homens. Quem justifica deslizes morais dizendo que está fazendo o mesmo que os outros fizeram, ou que foi levado pelas circunstâncias, deve merecer o repúdio da sociedade.

São os neocorruptos.

Serra falou por mais de uma hora, e aproveitou para criticar uma das práticas que ele associa ao PT: o aparelhamento do Estado.

— Não tenho esquemas, não tenho máquinas públicas, não tenho patotas corporativas, não tenho padrinhos, não tenho esquadrões de militantes pagos com dinheiro público.

Tenho apenas minha história de vida, minha biografia e minhas ideias — disse.

Numa crítica indireta à adversária Dilma Rousseff (PT), ele destacou seu currículo na vida pública: — Não comecei ontem e não caí de paraquedas. Apresentei-me ao povo brasileiro, fui votado, exerci cargos, me submeti ao julgamento da população, fui aprovado e votado de novo.

E afirmou ainda: — Não tenho duas caras. Posso ser feio, embora minha mulher e minha neta me achem bonito, mas não tenho duas caras. Não defendo um coisa aqui e outra ali.

O ex-governador paulista aproveitou para defender a liberdade de imprensa e disse que não encara adversários como inimigos, como outros partidos fazem, sem citar o PT: — A oposição deve ser considerada competidora, adversária, e não como uma inimiga da pátria. E, num regime democrático, jamais deve ser intimidada e sofrer tentativa de aniquilação pelo uso maciço do aparelho e das finanças do Estado.

Ele também disse que o eleitor quer hoje investimento maior em segurança pública, em combate ao tráfico de drogas, na casa própria, saneamento básico e um meio ambiente saudável: — A maioria dos brasileiros quer ter mais rendimentos, que a prosperidade econômica se expanda no tempo, de forma sustentada. Eu também quero.

Antes de agradecer, fez um resumo de suas iniciativas, como a emenda que criou o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e o segurodesemprego, assim como seus programas na prefeitura e no governo de São Paulo.

Conhecido por sua sisudez, Serra procurou dar leveza ao discurso.

Apontando para o senador Tasso Jereissatti (CE), um dos nomes cotados para ser candidato a vice em sua chapa, o tucano fez uma pausa e disparou: — Acreditem, eu sou bem humorado, viu Tasso? — brincou ele.

À distância, Tasso rebateu algo impossível de entender: — Eu não ouvi o que o Tasso disse mas, com certeza, foi coisa boa.

Do Tasso, só vem coisa boa.

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