quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Dois novos casos com parentes atingem o Palácio do Planalto

DEU EM O GLOBO

EBC sabia que filho de ministro Franklin Martins trabalhava em empresa contratada

Mais dois casos engordam a lista de parentes de funcionários do governo ligados a contratos e cargos públicos. Subordinada ao ministro da Secretaria de Comunicação, Franklin Martins, a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), que administra a TV Brasil, contratou por R$ 6,2 milhões, numa licitação-relâmpago, de 15 dias, a Tecnet, empresa na qual o jornalista Cláudio Martins, filho do ministro, trabalhava como representante comercial. Franklin já era ministro quando o filho entrou na Tecnet. A EBC admitiu que, quando fechou o contrato, sabia que Cláudio era funcionário da empresa, mas não viu conflito de interesses, nem consultou a Comissão de Ética. O ministro negou irregularidades ou pressa no processo. Mas disse que houve "celeridade" para não perder prazos. Num exemplo de nepotismo, cruzado, a ex-chefe da Casa Civil Erenice Guerra e o presidente dos Correios, David José de Matos, fizeram dobradinha: Erenice contratou a filha de Matos - agora exonerada -, enquanto o irmão de Erenice tinha cargo comissionado na Novacap, empresa do governo do DF da qual Matos foi secretário.

A República dos filhos

Novas denúncias envolvendo parentes atingem o Palácio do Planalto

Fábio Fabrini e Roberto Maltchik

Acoleção de casos ligando parentes de altos funcionários do governo a contratos e a cargos públicos chegou à Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e abriu um novo capítulo na atual crise política. Subordinada ao ministro Franklin Martins, a EBC - que administra a TV Brasil - admitiu ontem saber que Cláudio Martins, filho do ministro, era funcionário da Tecnet Comércio e Serviços antes de contratá-la por R$6,2 milhões. O ministro nega haver irregularidade no processo. Num exemplo clássico de nepotismo cruzado, a ex-chefe da Casa Civil Erenice Guerra e o presidente dos Correios, David José de Matos, fizeram uma dobradinha que coroou 30 anos de amizade: puseram os respectivos parentes na folha de pagamentos dos órgãos sob seu comando.

Contratada em dezembro de 2009, após licitação em tempo recorde (15 dias), a Tecnet faturará R$6,2 milhões para gerir os arquivos digitais da EBC, possibilitando à estatal replicar a tecnologia para TVs públicas. O projeto é uma das prioridades da empresa, cuja política de investimentos é avalizada por Franklin Martins. Há dois anos, Cláudio está na Tecnet, ligada à Rede TV, representando a empresa em negócios de software e tecnologia, segundo reportagem do jornal "O Estado de S. Paulo".

Questionado ontem, o secretário-executivo da EBC, Ricardo Collar, disse que, durante o processo de concorrência, os representantes da estatal sabiam da presença de Cláudio Martins na Tecnet, mas não viram conflito de interesse e não fizeram consulta à Comissão de Ética Pública da Presidência:

- Tinha notícias (da presença de Cláudio), mas não é informação relevante, porque era uma licitação. Podia ser qualquer pessoa que estivesse do lado de lá (na Tecnet). Se participasse da licitação e perdesse, perdeu (sic). Não houve ingerência administrativa e política.

MP vai avaliar se investiga o caso

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) avaliará, a partir de hoje, um possível pedido de investigação do caso. O procurador Marinus Marsicus afirma que, aparentemente, o caso é semelhante aos revelados envolvendo a Casa Civil, os Correios, a Eletronorte e outros órgãos.

- Parece que há conflito de interesse, de atuação em duas esferas (privada e pública). Se ficar claro que ele (Cláudio) teve uma participação ativa (na contratação), há um problema ético - declarou.

Ontem, Collar disse que sua equipe "não viu" Cláudio durante a licitação. E que ele não figura como representante da empresa nos documentos do processo de concorrência, um tijolaço de 821 páginas.

- Ele não foi visto por nós no processo - disse, acrescentando que haveria conflito se o filho de Franklin tivesse participação acionária na Tecnet ou fosse da comissão de licitação da EBC.

Por ora, a EBC já pagou cerca de R$1 milhão à contratada e descarta cancelar o negócio. Os repasses são feitos à medida que o serviço é prestado. O contrato prevê o fornecimento de um software com código aberto, o que permitirá à estatal compartilhar a tecnologia com TVs parceiras. Cerca de 400 funcionários serão treinados para lidar com o sistema.

O edital da licitação foi lançado em 16 de dezembro, sem previsão orçamentária. É que, só em 29 de dezembro, o Congresso aprovou crédito suplementar para vários órgãos, o que agregou R$41 milhões ao caixa da estatal. No dia 30, foi realizado pregão, do qual participaram a Tecnet e a Media Portal.

O dono da Media, Fábio Tsuzuki, disse ao "Estado de S. Paulo" que fez sugestões ao edital, a pedido de funcionários da EBC, mas a estatal negou tentativa de direcionamento, sustentando que houve consultas a mais de dez empresas.

- Se houve Control+C, Control+V (copiar, colar), foi do edital da fundação - disse Gerson Barrey, gerente executivo de Tecnologia de Informação da EBC.

Ele explica que o valor inicial (R$16 milhões) baixou a quase um terço após 35 lances, o que seria um indicativo de que houve "elevada competitividade".

Na Casa Civil, a ex-ministra Erenice Guerra deu de presente para a filha do amigo e atual presidente dos Correios, David José de Matos, um cargo que rendia por mês R$6.843,73. O convite, feito em junho numa academia de ginástica de Brasília, permitiu que Paula Damas de Matos ganhasse experiência na gestão pública:

- O tema me interessa. Surgiu convite para ver como é a realidade dentro do governo federal e aceitei.

A tarefa de Paula era "compilar dados dos ministérios e dos governos de Pernambuco e Alagoas" para abastecer a cúpula da Casa Civil sobre os trabalhos de reconstrução das cidades devastadas pelas enchentes. Paula jamais participou de projeto ligado a recuperação de áreas devastadas.

A contratação ocorreu um mês depois de José Euricélio Alves de Carvalho, irmão de Erenice, conseguir um cargo comissionado na companhia Urbanizadora da Nova Capital, a Novacap, empresa da qual o atual presidente dos Correios era o secretário-geral. O irmão de Erenice recebia R$4,1 mil, mesmo depois de ter o nome envolvido no desvio de verbas da Universidade de Brasília (UnB).

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