sexta-feira, 5 de novembro de 2010

CPMF não aumentou recursos para saúde

DEU EM O GLOBO

Governo preferiu utilizar parte do dinheiro arrecadado para fazer superávit primário

Cristiane Jungblut

BRASÍLIA. As reclamações sobre a falta de novos recursos para o financiamento da saúde são recorrentes, mas dinheiro de imposto é o que não tem faltado ao governo, que arrecada cada vez mais. Ainda assim, o governo Lula tem cumprido apenas o que determina a Constituição sobre o orçamento da saúde, ou seja, a aplicação do piso nacional. Mesmo na época da CPMF — que arrecadou no seu último ano de vigência, em 2007, cerca de R$ 50 bilhões —, o governo não aumentou os recursos para o setor, utilizando parte da arrecadação do chamado imposto sobre o cheque para fazer superávit primário.

Os defensores da Contribuição Social para a Saúde (CSS), que já foi aprovada no Senado mas ainda depende de aprovação na Câmara, dizem que a diferença é que agora toda a arrecadação iria realmente para a saúde. Quando foi proposta, em 2008, a CSS iria arrecadar cerca de R$ 10 bilhões ao ano.

Os dados mostram que não houve queda nos recursos destinados à saúde, no cálculo do piso, por uma razão simples: o orçamento mínimo para o setor é definido na chamada Emenda 29, que estabelece que o orçamento do ano seguinte é igual ao do ano anterior mais a variação do PIB nominal (que leva em conta a inflação).

Em 2010, a verba para ações e serviços de saúde foi ajustada para R$ 62,9 bilhões, mas os técnicos dizem que nem todo o autorizado deve ser aplicado, pois o valor do piso está em R$ 60,9 bilhões, inferior ao total.

O orçamento global do Ministério da Saúde em 2010 foi autorizado em R$ 66,7 bilhões (valor da lei orçamentária) e estaria atualizado em R$ 68,3 bilhões, sendo que já foram executados R$ 51,7 bilhões.

Para 2011, a proposta orçamentária enviada ao Congresso prevê R$ 68,5 bilhões para as ações de saúde, com o piso nacional calculado em R$ 68,3 bilhões. Já a verba total para o Ministério da Saúde em 2011 está fixada em R$ 74,24 bilhões.

A questão é que o governo tem privilegiado outros gastos sociais que não a saúde. Em 2010, por exemplo, concedeu aumento de 9,67% para o salário mínimo e ainda 7,7% para os aposentados que ganham acima do mínimo. Além disso, preferiu reajustar os benefícios do Bolsa Família.

Mesmo após o fim da CPMF, o governo experimentou arrecadação recorde.

Em 2008 — já sem a CPMF —, a arrecadação de impostos fechou em R$ 466,33 bilhões, contra R$ 417,99 bilhões de 2007. Em 2009, com a crise financeira global, ficou em R$ 456,08 bilhões. E, em 2010, preveemse R$ 521,46 bilhões. Para 2011, a nova previsão é de R$ 631,99 bilhões.

Arrecadação tem sido insuficiente para cumprir demandas Mesmo com recordes de arrecadação, o problema, alertam técnicos em Orçamento, é que ela tem sido insuficiente para atender a todas as demandas do governo.

A discussão da CSS está totalmente descolada da proposta orçamentária de 2011, que foi enviada ao Congresso pelo ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, sem menção a um novo imposto.

A polêmica sobre a saúde se arrasta devido à falta de regulamentação da chamada Emenda 29, que fixou patamar de investimento mínimo de União, estados e municípios em saúde.

Os estados devem investir 12% da receita corrente bruta, e os municípios, 15%. Mas ficou em aberto o percentual da União até uma regulamentação da Emenda 29. Até lá, o piso para a União é calculado com base na variação do PIB nominal.

Agora, a proposta em discussão no Congresso faz um meio-termo: mantém o cálculo atual do piso e cria a CSS como forma de garantir recursos extras à saúde. Dessa forma, sem incluir o dinheiro da CSS no cálculo do piso, o projeto substitutivo do deputado Pepe Vargas (PT-RS) atende à exigência da equipe econômica, que não queria aumentar o piso, e sim manter a destinação média de 7% da receita da União à saúde.

A proposta original de regulamentação da Emenda 29, de autoria do senador Tião Viana (PT-SC), previa que a União destinasse 10% da receita corrente bruta para a saúde — o que é considerado inviável pela equipe econômica, já que hoje isso levaria a um orçamento de cerca de R$ 80 bilhões.

Mas o perigo é que boa parte dos parlamentares defende essa proposta e não a CSS.

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