terça-feira, 7 de dezembro de 2010

A Internet e o Novo Modo Social de Produção:: Raulino Oliveira *

DEU NO PORTAL DO PPS

Companheiros do PPS têm insistido para que eu escreva alguma coisa sobre a Internet e as redes tecnológicas para debate no Partido. Aparece aqui uma oportunidade com a publicação na lista de discussão do Diretório Nacional do PPS da matéria do Valor Econômico “O Titanic da Cibercultura”, que traz algumas considerações do Douto francês, o Messieur Dominique Wolton. Antes de entrar no tema não resisto a algumas considerações sobre o pensar da França e de sua intelectualidade atual; mais precisamente o pensamento francês do após guerra. Veja que o Centre National de La Recherche Scientifique foi criado em 19 de outubro de 1939, portanto num momento em que a elite do poder francesa não era de nenhum século de luzes. Haja vista seu comportamento durante a segunda grande guerra mundial. Este centro tem como Diretor de Pesquisa este senhor Dominique. A Wikipedia diz que no pós-guerra o Centro foi todo reformulado. Aqui a iniciativa se deu sob o comando e controle do Governo de Charles de Gaulle, a quem também seria um exagero colocá-lo junto ao pensamento revolucionário contemporâneo. Na década de setenta os pesquisadores franceses imaginavam a Cibernética como algo que poderia resolver a automação fabril. E formulavam algo do tipo “La Machine a Penser”. E quando tiveram notícia daquilo que os garotos da Califórnia estavam fazendo com os computadores porque não queriam ir para a Guerra do Vietnã, nominaram o “Personnal Computer” americano de L´Ordinateur.

Mesmo estando muito atrás dos Estados Unidos em tecnologia da Informação, alguns franceses conseguiram confirmar a tese de que enquanto a América realiza e produz, os franceses pensam. Isto pode se confirmar com os estudos geniais de Pierre Levy sobre a Revolução que a humanidade está vivendo. O livro "As NovasTecnologias da Inteligência: o futuro do pensamento na era da informática - 1992" é imperdível. Uma obra de fôlego escrita por este brilhante tunisiano que vive na França.

Agora vamos ao moço. A Revista Época publicou uma entrevista com Dominique Wolton em julho de 2006, Edição nº 426, em que este senhor dizia: "A TV e o rádio são os alicerces da democracia de massas. São eles que asseguram a tolerância ao diferente, reforçam os laços sociais e promovem a identidade de uma nação". Seu discurso também destoa da visão convencional sobre a internet. "É uma besteira dizer que ela promove a democracia, a não ser em regimes totalitários", diz ele. Wolton afirma que os intelectuais, tão críticos sobre a mídia de massa, se deixaram instantaneamente encantar pela internet. Razão disso, segundo Wolton: o deslumbramento com a tecnologia. "Os intelectuais jamais gostaram suficientemente da TV e do rádio, mas de repente amaram a internet." Está aqui uma boa síntese do artigo republicado na lista de discussão do Diretório Nacional do PPS. O Titanic do moço. Onde está o centro da falácia? Na célebre questão levantada por Mao Tse Tung, quando critica os pensadores de pouca profundidade: “o idiota quando aponta a lua fica discutindo na verdade a ponta de seus próprios dedos”.

A Internet é uma nova Base técnica e como tal leva a sociedade humana para um “Novo Modo Social de Produção”. Esta constatação genial de Marx sobre o necessário movimento da sociedade humana está mais do que verificada na História concreta dos homens. Ela é uma efetiva maneira de existir da sociedade humana.

Adam Schaff num pequeno livro escrito em 1986 já dizia: “Atualmente não é preciso ser marxista – embora este modo de pensar seja típico do marxismo. Independentemente de se aceitar ou não a teoria marxista da influência recíproca entre base e superestrutura, com todas as consequências daí resultantes, qualquer pessoa habituada a refletir em termos das Ciências Sociais contemporâneas compreende que as transformações revolucionárias da ciência e da técnica, com as conseqüentes transformações na produção e nos serviços, devem necessariamente produzir mudanças também nas relações sociais.” (A Sociedade Informática Editora Brasiliense – 1990).

O senhor Wolton preso a ponta de seus dedos vê a Internet simplesmente como mídia, uma nova mídia pelo menos. A Internet até é também uma mídia, mas é a primeira mídia “free” na humanidade se opondo dialeticamente a todas as demais formas de comunicação e informação porque todas as demais são “push”. Empurram para a população a partir de um centro de decisão a informação e opinião. E aqui temos uma contradição concreta e como dizia Marx na Crítica a Filosofia do Direito de Hegel, em contradição concreta não há lugar para nenhum tipo de mediação.

A Internet, ao contrário, possibilita que qualquer pessoa que disponha de seus dispositivos tecnológicos publique, critique, opine e até não leia ou não ouça o que vem sendo publicado. Veja que só esta particular forma da Internet se configurar junto à sociedade já é absolutamente revolucionária. Uma mídia livre angustia a todos aqueles que precisam da Regulação como forma de impedimento social, basta ver o que os “Intelectuais do PT” vêm tentando organizar para a Imprensa, as mídias televisivas e a Internet em nosso país, como aquilo que seria uma necessária Regulação. A reação assustada não vacila em jogar a Liberdade de Imprensa pra baixo do tapete, principalmente se instituída de poder.

A Internet é a Revolução porque implode de forma radical todas as distâncias existentes na sociedade humana. Não só as distâncias físicas entre os espaços, mas as distâncias entre pessoas, entre todos os instituídos e instituintes, entre todos os comandos e comandados, quebrando assim todos os princípios da sociedade industrial e suas formas tayloristas de organização da produção e da sociedade. É aqui que tudo que é sólido se desmancha no ar!

A Globalização, hoje já um termo surrado e usado como mais uma “perversidade do Império Capitalista”, é produto desta implosão e se manifesta em todas as expressões e movimentos do Capital. Ela não é produto de nenhuma engenhosidade dos especialistas do Capitalismo financeiro e muito menos de Governos poderosos. Estas considerações podem, quando muito, servir para agitação dos defensores de uma possibilidade de algum Socialismo mais humano. Enquanto o Capitalismo em sua esperteza e pragmatismo tenta se apropriar do Tempo real para buscar novas formas de geração de valor e de acumulação.

A Globalização, produto de uma nova base técnica, indica com facilidade que é absolutamente impossível um projeto Socialista na humanidade contemporânea. O Socialismo se demonstrou uma forma de Capitalismo Monopolista de Estado querendo encurtar distâncias num mundo industrial onde as distâncias eram petrificadas. Foi uma experiência que exacerbou as formas sociais de Comando e Controle, desdobrando experiências profundamente autoritárias.

A Internet se apropria do tempo de forma radical e cria uma nova forma de geração de valor. “Estar fora das redes é estar fora do tempo”. Uma frase colocada pela Microsoft na entrada da Comdex em Las Vegas no ano de 1993. Estar “on line” é na prática da produção e da criação de valor estar praticamente em tempo Real. A famosa contradição entre tempo histórico e tempo real se resolve com a implosão de todas as distâncias. Uma instigante questão colocada para o processo produtivo em redes é que a geração de valor é incalculável, mas na maioria das vezes fica quase impossível precificar o produto ou mesmo um serviço gerado nas novas formas de produção propostas pela Internet. Todos os grandes processos geradores de valor social nesta nova era até agora são gratuitos. Aqui fica evidente a importância da Internet como mídia, a publicidade pode ser uma saída para este vigoroso impasse.

A natureza da Internet quando imaginada por Paul Baran em 1969, a antiga ARPANET, quebrava a lógica do centro como processo de informação e comunicação. Verdade que esta foi uma preocupação de Segurança Militar para transferência de dados entre a Europa e os Estados Unidos, que precisava de fortes defesas contra a espionagem soviética.

Acontece que o Diagrama de Paul Baran era uma crítica contundente ao funcionamento de sistemas centralizados e descentralizados. Ele assim propôs uma forma inédita de fluxos de informação distribuídos em base binária: pacotes de informação fluindo entre vários pontos não programados e se encontrando através de protocolos também de natureza binária. Estava então criada pelo homem a Rede Distribuída. Rede sem centro e geradora de valor de forma sustentável. É por este motivo que hoje podemos afirmar que tudo que tem padrão de rede distribuída é por sua natureza sustentável. A Ciência vem constatando este processo nos fenômenos físicos, químicos e biológicos. A própria descoberta e “leitura” dos códigos genéticos foram possíveis graças a esta compreensão e a velocidade do funcionamento dos computadores contemporâneos.

A Política tomará uma nova forma nesta sociedade em tempo real. Modifica-se a Polis e consequentemente é necessário que novas formas de organização social se engendrem.

O papel do revolucionário é se encharcar de uma nova práxis, a atividade humana nas redes e seus desdobramentos na organização social da produção. A apropriação do conhecimento e do saber numa sociedade onde o segredo se esvai como forma de poder. Hoje já é clássica a frase: se você não quer que ninguém saiba sobre alguma coisa não coloque o assunto na Internet, na verdade uma piada que contém verdades.

Esta a novidade que nos interessa: como fazer Política neste novo mundo que está nascendo? Como enfrentar uma sociedade que coloca o interesse em rede e se desregula por isto? Estão aqui os elementos de um comportamento pós-moderno que precisaremos estudar e apreender com muita humildade. A pós-modernidade tem algo do personagem indicado por Gramsci quando em sociedades em mudanças surgem pessoas sem qualquer escrúpulo que são capazes de qualquer atrocidade para se locupletarem diante do caos das próprias mudanças. Mas a pós- modernidade é também uma marca forte de nossa contemporaneidade e é co-participe da criação em nossos dias.

Estou convencido que a Revolução está em pleno andamento na nossa contemporaneidade e fazer Política agora é participar dela. Vivendo a sociedade nas redes e procurando novas formas de organizar as vontades, a potencialidade criadora das pessoas. Somos todos aprendizes, temos que encarnar a Revolução e participar desta avalanche antes que viremos avalanche porque tentamos resistir ao irresistível processo histórico.


Raulino Oliveira é dirigente nacional do PPS.

* texto adaptado de mensagem enviada para a lista de discussão do Diretório Nacional do PPS.

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