quarta-feira, 12 de maio de 2010

Reflexão do dia – Fernando Henrique Cardoso

Tocqueville se apercebeu das mudanças que se avizinhavam com o advento da “era americana”, nos costumes, na economia e na política, ao haver escrito décadas antes e mesmo com maior profundidade e menos nostalgia do que Nabuco. Não podia nutrir nostalgia porque continuava a sentir-se muito bem no papel de aristocrata que entendia o processo social, mas tudo fazia para que as forças novas não perturbassem o equilíbrio tradicional das coisas. Analisou como ninguém o quê da democracia na América (o”espírito de liberdade”, que permitia a associação das pessoas para realizar fins coletivos independentemente da autoridade, a religiosidade agregadora dos protestantes, a força das comunidades locais e ainda a liberdade de imprensa). Em seu íntimo, contudo, nunca deixou de ser um “do antigo regime”. Via na democracia de massas o perigo do autoritarismo, a igualdade induziria a uma forma de tirania. Já Nabuco irmanou-se intimamente com o negro e se tornou simpático às características democráticas da nova sociedade, embora nunca tenha aceitado as formas republicanas no Brasil e tivesse confundido o “poder pessoal” do Imperador, tão duramente criticado por Sergio Buarque, como se fosse uma formas branda de exercer o poder moderador e de provocar a alternância democrática. Deixou que o lado tradicionalista de sua alma o impedisse de ver a inconsistência que havia em ser tão radicalmente abolicionista, tão favorável à integração do negro na cidadania, e venerar a monarquia.
Se a visão política de Joaquim Nabuco não chegou a ser a de um revolucionário propriamente dito, embora conservador (como no título da obra citada acima, ideia extraída de Gilberto Freyre) foi muito mais do que simplesmente um saudosista ou um conservador. Em Tocqueville se vê, a despeito de sua criatividade intelectual, no que consiste um verdadeiro conservador: compreende o sinal dos tempos mas não se comove com eles; aceita-os sem adesão emocional e, se possível, luta contra as mudanças.
Pode-se concordar com o comentário de Marco Aurélio Nogueira que, em seu “O encontro de Joaquim Nabuco com a política”, sublinha as dificuldades para sustentar o liberalismo no Brasil, como Nabuco fez. Em um país escravocrata não haveria sujeitos sociais que apoiassem ideias liberais. A despeito de nosso liberalismo ser fruto de um feixe de “ideias fora do lugar”, o autor mostra que ele acabou por se ajustar às realidades, ficando por isso mesmo incompleto ou deformado. Sem negar o que de certo há no argumento, não há que exagera-lo. Marco Aurélio Nogueira faz justiça a Nabuco, mas vai um tanto,longe ao qualificar o liberalismo do império: “Liberalismo conservador, elitista e antipopular, tingido de autoritarismo, antidemocrático e sem heroísmo.” (P.100)


(Fernando Henrique Cardoso, na palestra em homenagem a Joaquim Nabuco, em 18/3/2010, na Academia Brasileira de Letras, Rio de Janeiro.)

A pátria de chuteiras:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

O futebol no Brasil tem tanta importância que acaba se misturando com a política, explorado pelos governantes independentemente de sua inclinação esportiva. Cada vez mais jogadores de futebol são candidatos a cargos eletivos, como Romário este ano. E não é de hoje. Em 1927, o então presidente Washington Luís tentou se meter em uma partida de futebol e acabou desautorizado por Feitiço, um atacante do Santos.

Na final do Campeonato Brasileiro de seleções estaduais, entre Rio de Janeiro e São Paulo, no estádio de São Januário, um pênalti marcado contra o São Paulo, quando o jogo estava empatado em 1 a 1, provocou a ira dos paulistas, que se recusaram a continuar a jogar.

Presente ao estádio, Washington Luís ordenou que a partida fosse reiniciada, no que foi contestado por Feitiço de dentro do campo: Diga ao presidente que ele manda no país. Na seleção paulista mandamos nós. E o jogo não recomeçou.

Vários presidentes entraram em disputa com técnicos da seleção brasileira, até mesmo Fernando Henrique, que não é dos mais fanáticos torcedores.

Pois, em 2002, ele engrossou o coro dos que queriam Romário na seleção e levou uma resposta de Felipão mais ou menos no mesmo teor da de Feitiço.

Lula certamente é o presidente mais ligado ao esporte, podendo seu gosto pelo futebol ser comparado com o do general Médici, que comparecia aos estádios de radinho de pilha no ouvido, fato muito explorado pela equipe de marketing da época.

Lula também explora essa ligação do brasileiro com o futebol, mas não chega ao ponto de tentar escalar um jogador, como fez Médici com Dario, provocando uma crise na seleção de 1970, que levou à demissão do técnico João Saldanha.

Agora mesmo está fazendo uma grossa demagogia, criando a Bolsa Copa para dar pensão a jogadores campeões do mundo em 1958, 1962 e 1970.

Até agora só o grande Tostão recusou a prebenda.

Torcer por um time popular como o Corinthians, como faz Lula, é sempre bom, mas o feitiço pode virar contra o feiticeiro quando a torcida liga a proximidade do presidente com seus jogadores a fracassos nos campeonatos.

Na Copa de 2006, Lula foi fazer uma gracinha com Ronaldo, perguntando se ele estava mesmo gordo, e teve que ouvir comentários sobre seu hábito de beber. Hoje já fizeram as pazes.

E quando Lula resolveu elogiar o argentino Messi, provocou a reação do goleiro Julio Cesar, que o aconselhou a se mudar para a Argentina e ainda arrematou: Quem sabe o Brasil não melhora um pouco com a saída dele?.

O candidato tucano à Presidência, José Serra, que também é um torcedor fanático do Palmeiras, já recebeu uma dura do técnico Felipão quando fez uma crítica ao técnico, que dirigia o Palmeiras.

Felipão mandou Serra, que era ministro da Saúde na época, tomar conta da precária saúde nacional.

É sinal de amadurecimento da nossa democracia, portanto, o fato de que ser campeão do mundo não influi na escolha do presidente.

Em 98, Fernando Henrique Cardoso foi reeleito mesmo com o Brasil perdendo a Copa, e, em 2002, tendo o país se sagrado pentacampeão, o oposicionista Lula foi eleito.

Misturar política e futebol não dá bom resultado. O patriotismo é o último refúgio do canalha, definiu Samuel Johnson, escritor e pensador inglês do século XVII.

Eu me lembrei da frase ontem, ao ver a entrevista do técnico Dunga na convocação dos 23 jogadores que vão disputar a Copa do Mundo na África do Sul.

Não tenho nenhum motivo para considerar Dunga um canalha, coisa que tudo indica ele não é. Mas não digeri bem aquele discurso patrioteiro que ele e seu auxiliar Jorginho fizeram.

Fiquei com receio de que uma certa politicagem equivocada esteja tomando conta da seleção, e que os jogadores estejam levando ao pé da letra a máxima rodrigueana de que a seleção é a pátria de chuteiras.

Mas o que me chamou mais a atenção foi a exagerada dedicação de Dunga ao sofrido povo brasileiro e à exortação ao sacrifício no altar da pátria.

Ele chegou a se referir às lições de patriotismo que recebeu de sua mãe, professora de geografia e história.

Quando começou a falar de apartheid e da ditadura militar no Brasil, não sei exatamente por que, Dunga demonstrou que não é um indivíduo politizado e, portanto, ainda bem, seu apego ao patriotismo não é um escape político. É apenas um equívoco de quem mistura conceitos e tem uma visão deturpada da função de um jogador de futebol numa sociedade como a brasileira.

Achei Dunga rancoroso demais, mesmo considerando que algumas perguntas vinham com distorções descabidas como a tentativa de comparar Neymar a Pelé ou Maradona ou tivessem o objetivo explícito de provocar o técnico.

Mas mesmo quem considerou razoável a explicação oficial de falta de experiência para que Neymar e Paulo Henrique Ganso não estivessem na relação ficou sem argumento ao saber que Ganso está na lista de sete reservas enviada à Fifa.

A tão decantada coerência de Dunga não combina com essa decisão, pois potencialmente ele considera que o apoiador do Santos pode estar na seleção em caso de contusão de um jogador da relação oficial, apesar da inexperiência.

Já que é assim, não precisa de contusão.

Tudo somado, Dunga vive uma experiência única na vida de um esportista ser técnico da seleção brasileira depois de ter sido jogador campeão do mundo , mas não está tranquilo.

O técnico, que visivelmente não se dá muito bem com as críticas, deixou transparecer durante toda a entrevista que tem um sentimento de vingança guardado no peito prestes a explodir.

Se o Brasil for campeão do mundo, quase certamente veremos um Dunga exultante e raivoso, considerando-se um herói nacional, se vingando dos seus críticos com gestos e palavreados que estão sendo contidos a duras penas.

Caminho suave:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

De tudo o que se vê no noticiário sobre o caso do secretário Nacional de Justiça, Romeu Tuma Júnior, flagrado em gravações da Polícia Federal em conversas que caracterizam relações de amizade entre ele e um acusado de integrar a cúpula da máfia chinesa em São Paulo, chama atenção a quantidade de malabarismos feitos pelo governo para não melindrar o secretário.

Ontem, o Ministério da Justiça anunciou seu licenciamento pelo período de 30 dias, para em seguida ser desmentido por Tuma Júnior que, no comando das operações, optou por férias de 15 dias.

Fosse qual fosse o modelo, pela natureza do cargo e dos variados fatos surgidos após a divulgação das primeiras gravações (tentativa de relaxamento de um flagrante de apreensão de dólares no aeroporto de Guarulhos, suspeita de intervenção de Tuma Júnior na emissão de vistos ilegais e liberação de mercadorias de pessoas investigadas pela PF) o afastamento deveria ter sido imediato.

Por precaução no tocante às investigações ou para preservar o governo federal como um todo, independentemente do que venha a ser revelado sobre a extensão da amizade dele com o acusado Li Kwok Kwen.

Por iniciativa por superiores teria denotado apreço à compostura.

Passaram-se dias sem que ninguém soubesse o que fazer simplesmente porque, argumentava-se, o secretário era uma indicação direta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em atendimento ao senador Romeu Tuma, do PTB de São Paulo.

Caberia, seria de se supor, ao presidente demiti-lo. Mas, não era seu subordinado direto.

Esperava-se, então, uma decisão do ministro da Justiça. Mas passou-se a contar com a iniciativa de Tuma Júnior que, mirando-se em exemplos anteriores vindos de cima e segundo os quais quanto mais largas as costas mais quentes os panos, não se mexeu.

No Palácio do Planalto engendrou-se então uma solução desenhada para ser interpretada como "pressão" para Tuma Júnior pedir para sair: foi dado a ele prazo de cinco dias de prazo para se explicar à Comissão de Ética Pública da Presidência.

Logo a tão desgastada comissão, desautorizada por Lula numa queda de braço em 2008, com o então ministro do Trabalho, Carlos Lupi, e que em todas as batalhas em que se envolveu a ética saiu vencida.

Não será agora que contabilizará sua primeira vitória. Apenas servirá como aval decorativo na construção de um caminho suave à retirada do secretário.

Conto "das bases". Ainda hoje, 50 anos depois de instalada a capital da República no Planalto Central, deputados e senadores insistem em ignorar que o mandato de representação federal é exercido em Brasília.

O trabalho "nas bases" diz respeito às respectivas sobrevivências políticas, que deveriam financiar com outras fontes que não o dinheiro do contribuinte que lhes paga salários e benefícios para um expediente de segunda a sexta-feira na capital.

Mesmo assim surgem propostas, como a do líder do governo Cândido Vaccarezza, em boa hora negada pelo presidente da Câmara, Michel Temer, de antecipar o recesso do meio do ano para antes da Copa do Mundo, a fim de liberar mais cedo suas excelências para as férias e a campanha eleitoral.

Note-se, período em que se afastam no atendimento a interesse unilateral, pois o contrato das urnas prevê quatro e não três anos e meio de mandato com direito a licença-campanha e bolsa Copa do Mundo.

Vaccarezza já avisou que vai insistir.

Conto da desfaçatez. Pode ser chamado de gratuito o horário eleitoral que custa R$ 851 milhões ao Estado? Isso só com a renúncia fiscal decorrente da compensação às emissoras de rádio e televisão pelas perdas com a publicidade comercial que deixam de exibir, sem contar a parcela do Orçamento destinada anualmente ao Fundo Partidário.

O horário é gratuito para os partidos que ainda se dão ao desfrute de dizer que enquanto não for instituído o financiamento público as campanhas eleitorais continuarão "reféns" do caixa 2.

Fixação de imagem :: Fernando Rodrigues

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Enquanto o brasileiro se ocupa da escalação da seleção de futebol para a Copa, os pré-candidatos a presidente usam o período atual de baixa densidade política para testar hipóteses.

Foi o que se passou no início da semana quando José Serra bateu na atuação do Banco Central. Embora o tucano sempre tenha sido um crítico da política monetária adotada com alegria por FHC e por Lula, a posição apresentada de maneira forte, em público, serve como um laboratório para o PSDB.

As campanhas de Serra e da petista Dilma Rousseff se municiam agora das chamadas pesquisas qualitativas. Frases e atitudes mais polêmicas são testadas em encontros com grupos de eleitores. Todos conversam sob a coordenação de pessoas treinadas no ofício de decifrar a alma do brasileiro.

Se um grupo representativo de eleitores dá sinal de positivo para ataques ao BC, assim será. Não há novidade nesse tipo de estratégia. Em 2002, Lula ganhou a eleição com o ouvido colado nas "qualis".

A dificuldade de Lula no universo feminino foi atacada com uma propaganda na qual apareciam dezenas de mulheres grávidas, vestidas de branco e caminhando ao som de "Bolero" de Ravel. Jeca? Pode ser. Mas o PT faturou o Planalto.

Nesta semana, talvez de forma inadvertida, Serra produziu material farto para testes. O brasileiro vai votar levando em consideração os juros mais altos no mundo praticados por aqui? Não se sabe. Dilma Rousseff antecipou-se e foi na direção oposta. Exaltou a tal independência do Banco Central.

A seu modo, a petista tenta também fixar uma imagem. O PT carrega o carma de ter sido pouco amigável ao capital no passado. Mas todos esses movimentos são preliminares. Só lá para agosto, muitas "qualis" depois, os candidatos terão uma imagem montada para vender na campanha.

Aliança em processo de involução:: Rosângela Bittar

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Em todo início de governo, principalmente, e ao longo do mandato, nos embates políticos, os partidos aliados, sempre em choque de interesses, atribuem suas dificuldades à ausência de um articulador político, um mago que possa conduzir as negociações entre eles dando vantagens a todos. É um clássico da política esta discussão sobre a falta que faz o coordenador que, no governo Lula, já foi José Dirceu (PT), Aldo Rebelo (PCdoB), Jaques Wagner (PT), Walfrido dos Mares Guia (PSB), José Múcio Monteiro (PTB), Alexandre Padilha (PT). A panaceia representada pelo pobre funcionário, em cujas mãos se depositam todas as esperanças de acerto, atingiu agora a campanha eleitoral.

É por sua ausência, alega-se, que PT e PMDB não se acertam e adiamentos inexplicáveis têm sido registrados na agenda da candidatura de Dilma Rousseff (PT) à Presidência da República. Se pudesse ser definido em uma palavra o estado da arte da aliança eleitoral do PT com o PMDB para as eleições presidenciais de 2010, neste momento exato, esta seria involução. E os analistas da campanha dizem que o andar de caranguejo se deve à falta desse profissional, um político competente para comandar os partidos.

A começar por Minas, e não só de Minas, surgem sinais fortes de mudança de propósitos que deixa inquietos aliados do governo fora do PT. Bem verdade que este projeto nunca esteve bem definido, mas tão pouco nítido, como agora, entrando no recuo, também nunca. O senador Hélio Costa (PMDB-MG), renhido candidato a governador de Minas com o apoio do PT, recolheu-se discretamente logo que terminou a prévia para escolha do candidato petista, oficialmente, a governador, na prática a senador na chapa de Costa. Terminada a prévia, escolhido Fernando Pimentel (PT-MG), o PT queria fazer o anúncio, mas foi o PMDB que pediu adiamento.

Suspeitam aliados de Dilma que por trás desse súbito recolhimento do PMDB esteja Aécio Neves (PSDB). Hélio Costa teria se convencido que, dividido, o PT não faria sua campanha, limitando-se a lutar pela vaga ao Senado sem preocupar-se em dividir o voto com o candidato do PSDB, Antonio Anastasia. Temendo o insucesso logo de início, estaria o senador pemedebista mais propenso agora a voltar ao Senado.

O mesmo sentimento viria determinando as decisões de vários candidatos pemedebistas ou apoiados por governadores do PMDB, segundo análises de aliados que colocam o PT sob o signo da desconfiança. No Rio Grande do Sul, o candidato do PMDB, José Fogaça, está anunciando que seguirá as decisões do núcleo regional de seu partido e este, como assinala a análise da campanha petista, "é José Serra".

"O PMDB de São Paulo é Serra, o de Pernambuco é Serra, Mato Grosso do Sul é Serra, Santa Catarina é Serra", cita o dirigente, não vendo muita saída para os candidatos do PMDB em alguns Estados. "Como o Fogaça vai fazer campanha para Dilma Rousseff com o PT batendo nele? E o Tarso Genro (candidato do PT no Rio Grande do Sul) vai bater em quem se não for no Fogaça"? Realmente, uma realidade sem sustentação politica.

Nem no Amazonas, onde os adversários da aliança PT-PMDB não se desenvolvem politicamente, a situação é tranquilizadora. O governador Eduardo Braga (PMDB) não quer apoiar Alfredo Nascimento (PR), o candidato de Dilma Rousseff, e dirige seus esforços para o candidato Omar Aziz, do PMN, partido cuja direção veta a campanha para a candidata petista à Presidência. No Ceará, o PT está impondo um candidato ao Senado, José Pimentel, que acabará afetando a eleição do pemedebista Eunício Oliveira, reconhecido como dono de muitos votos na Convenção Nacional do PMDB que vai aprovar ou não a aliança com o PT.

Até o presidente do partido, Michel Temer, apoiado por todos como o candidato a vice presidente na chapa do PT, tem feito movimentos surpreendentes. No dia seguinte a um jantar com Dilma Rousseff, quando anunciou à saída ter sido convidado para ser o candidato a vice, não produziu um grande ato, evitou o assunto e adiou a reunião do PMDB que faria uma espécie de lançamento oficial de seu nome de cuja escolha não há mais dúvidas.

O PT está cometendo dois erros, segundo os analistas internos da campanha que figuram entre os aliados. O primeiro, deu prioridade total ao desempenho nacional de sua candidata a presidente, e isto pressupunha concessões nos Estados, o que não ocorreu. O outro erro foi considerar o PMDB um partido nacional, que se contentaria com o lugar de vice na chapa concedido ao presidente do partido.

"O problema do PMDB não está na questão nacional, ser vice não resolve os problemas no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina, em São Paulo, em Pernambuco, em Minas Gerais, no Mato Grosso do Sul, no Pará, no Amazonas, no Rio de Janeiro, na Bahia, no Ceará, no Maranhão".

Esta concepção equivocada do PT, segundo a análise de aliados, levou a erro de execução. Tendo o tempo de TV do PMDB, e já decidido que o presidente Lula vai eleger Dilma Rousseff, o PT partiu para se fortalecer como partido num futuro governo Dilma e foi tratar de buscar candidatos para fazer uma grande bancada, senadores e governadores. Os aliados do PMDB consideram, com isto, que o PT está jogando sozinho, e resolveram dar um tempo para ver a poeira baixar.

A pressão do funcionalismo público sobre o governo por aumento de salários e benefícios está para o governo como a pressão das centrais sindicais por mais verbas e benefícios trabalhistas. São recebidos como movimentos descompromissados com os resultados, além de terem efeitos eleitorais próximos de zero. A reação do governo, traduzida na tardia braveza presidencial com os funcionários em greve, a quem o presidente Lula mandou negar reajustes e cortar pontos, é também desprovida de efetividade. Tudo já foi dado a estas comunidades e, por isto, delas o governo sabe que não perde o apoio ou os votos. Para uma pressão retórica, uma reação retórica.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

Bolsa Família:: Denise Paiva

DEU NA TRIBUNA DE MINAS

O Bolsa Família deve ser contextualizado numa dimensão histórica e numa abordagem crítica, evidenciadas suas contradições e limitações, além da sua inegável importância. O programa de transferência de renda, com lógica não contributiva, que vem ganhando escala e feitio de política universal de proteção social não começou no governo Lula.

A referência mais objetiva enquanto política pública se deu no âmbito municipal em Campinas, na década de 80. O prefeito do PSDB, José Roberto Magalhães, um mineiro de Andrada, alcunhado de Grama, foi pioneiro nesta estratégia de enfrentamento à pobreza. A versão pioneira do Bolsa Família no referido município era tão bem-estruturada e articulada com outras ações de promoção social e de abertura de múltiplas oportunidades que não era possível afirmar, de imediato, se o sucesso em termos de melhoria na qualidade de vida dos beneficiários se dava pelo subsídio econômico ou por um conjunto articulado de ações, inclusive apoio psicossocial.

No âmbito estadual, o pioneirismo coube ao Governador do PT do Distrito Federal, Cristovam Buarque, em 1995. Surge o Bolsa Escola como estratégia privilegiada para assegurar a permanência das crianças na escola, o que ajudou o Distrito Federal a galgar índices de sucesso no ensino fundamental e no combate ao trabalho infantil.

No âmbito federal, no governo FHC, foram institucionalizados os programas de transferência de renda dos ministérios da Previdência e Assistência Social, Saúde e Educação e que se transformaram em carros-chefe da política social “tucana”. O então presidente Fernando Henrique, ao lado de Ruth Cardoso, criou o Vale Cidadania, um subsídio de R$ 50 para as famílias que retirassem seus filhos das carvoarias do Mato Grosso e os levassem para a escola.

Em comemoração ao Dia da Criança, foi criado o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), cujo desenho fora feito pelo Fórum de Erradicação do Trabalho Infantil. O Fórum, criado em novembro de 1994, ainda no governo Itamar, reuniu governo, sociedade civil, empresariado, ministério público e organismos internacionais como um espaço privilegiado de construção e acompanhamento de políticas públicas.

O Peti teve o grande mérito de inaugurar, junto com o subsídio econômico, a jornada educacional ampliada. Depois das carvoarias, foi ganhando os canaviais, sizais, mandiocais. Percorrendo o mapa das piores formas de exploração do trabalho infantil se tornou uma referência nacional e internacional exitosa e uma consistente inspiração para o Bolsa Escola e depois para o Bolsa Família.

Mas a grande matriz das chamadas “bolsas” é o Programa de Renda Mínima do Senador Suplicy (1992) sobre o qual nos debruçaremos neste espaço, em outra oportunidade.

Denise Paiva é Assistente Social

Amélia Rabello e Quarteto Brasileiro - Duro com Duro/Ary Barroso

Serra e Jarbas reúnem os aliados no Estado amanhã

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Presidenciável vem almoçar com o peemedebista candidato a governador das oposições e deputados do PSDB, PMDB, DEM e PPS. Antes, concede entrevista a Geraldo Freire, na Rádio Jornal

Mesmo com a febre do twitter, dos blogs e das outras páginas de relacionamento na internet, os presidenciáveis estão recorrendo ao rádio para se comunicar com o povo nesta fase de pré-campanha. O ex-governador de São Paulo José Serra, pré-candidato a presidente da República pelo PSDB, chega amanhã ao Recife para seguir à risca uma máxima defendida por sua assessoria de marketing: participar do maior número possível de programas radiofônicos dentro do que eles consideram atos artesanais de campanha. Foi o próprio tucano que tomou a iniciativa de agendar, de última hora, a sua participação no programa Supermanhã, de Geraldo Freire, na Rádio Jornal, o que, inicialmente, não estava prevista.

Nesta fase da pré-campanha, o ex-governador quer chegar perto da população, principalmente daqueles que ainda não têm o hábito de entrar na internet, espaço onde o tucano tem se comunicado livremente com os cidadãos. Até para conquistar simpatizantes, já que o presidenciável sabe que a popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Nordeste e em Pernambuco é grande, como indicam pesquisas de opinião. Lula apoia a ex-ministra e presidenciável Dilma Rousseff (PT).

O senador Jarbas Vasconcelos (PMDB) pré-candidato a governador das oposições modificou a agenda para acompanhar a visita do tucano. Todos os deputados federais da oposição também estão retornando mais cedo ao Estado. O senador Sérgio Guerra, presidente nacional do PSDB, virá com Serra.

O grupo se juntará aos deputados estaduais para participar de um almoço, após a entrevista, em um restaurante do Recife. Neste ato, a oposição quer mostrar à opinião pública que está unida em Pernambuco e reforçar a dobradinha Serra-Jarbas. Se houver tempo, antes do programa de Geraldo Freire, o presidenciável tucano fará uma caminhada por algum local público para fazer o teste de popularidade, junto com Jarbas.

Serra também já confirmou que retorna ao Recife no próximo dia 28, para prestigiar o evento em que a oposição lançará a majoritária estadual completa. Além de Jarbas, o senador Marco Maciel (DEM) confirmou que é candidato à reeleição. O PSDB deve indicar o pré-candidato a vice-governador e o PPS o nome do segundo pré-candidato ao Senado.

BANCO CENTRAL

Em sua primeira visita a Goiás na condição de pré-candidato à Presidência, ontem, o tucano José Serra defendeu, em Goiânia, a autonomia do Banco Central e uma atuação integrada com a política econômica do governo. O Banco Central tem de ter autonomia para trabalhar, disse o ex-governador paulista. Mas tem de estar integrado com a política econômica do governo e com o presidente da República, que é quem indica seu presidente e diretores. Foi assim no governo de Fernando Henrique e no governo Lula, explicou. Para Serra, o BC deve atuar com sinergia. Precisa estar voltado para a estabilidade de preços e o desenvolvimento. Por isso, é preciso ter entrosamento, disse.

Serra procurou evitar mais polêmica com a declaração que deu, na segunda-feira, em entrevista à CBN. Na ocasião, ele disse, em relação ao Banco Central, que o presidente da República tem que fazer sentir sua posição se houver erros calamitosos na condução da política monetária do País. Seus principais adversários Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PV) aproveitaram a frase para tentar se contrapor a Serra, defendendo a autonomia do BC e sua atuação na crise mundial, que havia sido criticada pelo ex-governador.

TSE veta que aliança tenha nome extra para o Senado

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Decisão afeta pacto PV-DEM no Rio e apoio do PTB a PSDB

Felipe Seligman
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) entendeu por unanimidade que a coligação partidária estadual deve ser a mesma tanto para os candidatos a governador do Estado como para os candidatos a senador.

A resposta do TSE terá influência principalmente no Rio de Janeiro e em São Paulo.

No Rio, o PV terá de sacrificar sua pré-candidata ao Senado, Aspásia Camargo, se quiser dar espaço ao ex-prefeito Cesar Maia (DEM). Em São Paulo, ela impedirá o PTB do senador Romeu Tuma, que tentará se reeleger, de se coligar com a chapa do PSDB -que vai lançar Orestes Quércia (PMDB) e Aloysio Nunes (PSDB) ao Senado.

Os ministros responderam a uma consulta do senador Francisco Dornelles (PP-RJ).

O atual entendimento do TSE diz que as coligações em eleições majoritárias (como a de governador e de senador) não precisam ser refletidas naquelas proporcionais (como a deputados federais). O tribunal, porém, nunca havia se pronunciado sobre a relação entre as eleições majoritárias. Ontem, o TSE respondeu negativamente às questões do PP.

No Rio, a aliança do PV com o DEM é fundamental para que o pré-candidato do partido ao governo, Fernando Gabeira, ganhe mais tempo no horário gratuito. Se o TSE tivesse respondido positivamente à consulta, DEM, PV, PSDB e PPS poderiam se unir em torno de Gabeira, mas o primeiro partido ficaria livre para lançar Cesar Maia como candidato avulso.

Serra afirma que não é contra autonomia do BC

DEU EM O GLOBO

Tucano defende entrosamento com o restante da equipe econômica, mas volta a criticar as altas taxas de juros

Adriana Vasconcelos
Enviada especial

GOIÂNIA. Um dia depois de declarar que o Banco Central não é a Santa Sé, o pré-candidato do PSDB à Presidência, José Serra, amenizou ontem o discurso que levou preocupação ao comando da campanha tucana e gerou críticas de seus adversários. Com cuidado para não causar nova polêmica, Serra afirmou que não é contra a autonomia do Banco Central, mas que considera fundamental que seus dirigentes estejam entrosados com o restante da equipe econômica.

Entretanto, voltou a criticar as altas taxas de juros do país.

Não tem por que o Brasil continuar sendo o recordista mundial em taxa de juros reais.

Não acho que essa é uma fatalidade da natureza. Isso não significa atropelar nada ou virar a mesa. Mas quem é que quer ter o maior juro real do mundo? questionou o tucano.

Evitando opinar sobre a divergência que existe hoje entre o presidente do BC, Henrique Meirelles, e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, na condução da política econômica do governo Lula, o tucano disse que num eventual governo seu haverá um entrosamento entre os integrantes de sua equipe.

Acho que o Banco Central tem de ter autonomia, liberdade para trabalhar, mas integrado com a política econômica do governo, com o Ministério da Fazenda, o Ministério do Planejamento e o próprio presidente da República, que escolhe seus diretores.Foi assim no governo Fernando Henrique, como no de Lula. O Banco Central tem de estar voltado, assim como todas as instituições econômicas, para a estabilidade de preços, para não ter inflação, e para o desenvolvimento.

Para isso é fundamental ter entrosamento.

O pré-candidato tucano minimizou ainda o tom ríspido do diálogo travado com a colunista Míriam Leitão durante a entrevista concedida anteontem à rádio CBN.

Foi apenas o calor de uma discussão com uma repórter que é muito preparada e tem convicções, e a quem eu respeito bastante disse ele.

Durante sua visita à capital de Goiás, que começou por volta do meio-dia e se estendeu até o início da noite, Serra voltou a esbanjar bom humor.

Ele admitiu que seu humor vai melhorando ao longo do dia.

Para aliados, episódio pode ser educativo Entre os aliados de Serra, porém, o clima ontem era de preocupação. Para eles, o pré-candidato teria escorregado num dos melhores momentos de sua campanha por excesso de confiança. Apesar disso, a expectativa é de que o episódio, ocorrido bem antes da eleição, possa ser educativo e reduza o salto alto que alguns integrantes da campanha tucana estavam usando desde que Serra conseguiu recuperar a vantagem que tinha nas pesquisas em relação à sua principal adversária, a petista Dilma Rousseff.

Já um outro grupo considera que Serra, a partir de agora, terá de se esforçar para mostrar a uma parte do mercado financeiro que não pretende mexer na autonomia do Banco Central.

Serra critica juro alto e uso da máquina

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Tucano diz que PT criou "ministérios a granel", mas depois promete mais dois

Pré-candidato evita criticar a independência do BC, mas afirma que em seu governo não vai haver conflitos dentro da equipe econômica

Andreza Matais
ENVIADA ESPECIAL A GOIÂNIA

Um dia depois da polêmica sobre o grau de autonomia do Banco Central, o presidenciável José Serra (PSDB) voltou ontem a criticar as taxas de juros do Brasil -"as mais altas do mundo"- e o aparelhamento do Estado pelo atual governo.

Segundo Serra, foram criados "ministérios a granel" e "muitos" cargos comissionados, quando o governo "deveria ter investido no povo".

Em sua primeira visita a Goiânia na pré-campanha, Serra fez corpo a corpo num shopping ao lado de políticos de dez partidos, incluindo o PP.

Beijou crianças, fez galanteios a mulheres ("voto de mulher bonita vale o dobro") e prometeu reformar o aeroporto. Também reafirmou que pretende criar um Ministério da Segurança Pública e um outro para pessoas com deficiência.

De Freud de Melo (PMDB), ex-prefeito de Aparecida de Goiânia, ouviu discurso no qual ele pediu para Serra ser mais agressivo com Dilma Rousseff, do PT: "Se não for você, arruma alguém para fazer isso". Serra apenas ouviu e prometeu fazer a reforma política.

A autonomia do Banco Central foi tema recorrente na peregrinação do pré-candidato, que deu entrevista a TVs, jornais e rádios locais. Serra se esforçou para desfazer a imagem de crítico à autonomia do BC.

"O BC tem que ter liberdade e autonomia para trabalhar e deve ter integração com a política econômica, com o Ministério da Fazenda, com o próprio presidente, que escolhe os diretores do banco. Tem que estar voltado da mesma maneira que todas as instituições da área econômica. Na minha equipe será assim, todo mundo entrosado", disse.

Questionado se essa era uma "realidade do atual BC", Serra quase perdeu o humor: "Eu não vou falar do BC de hoje senão de novo vai causar ventania sem razão. Estou dizendo como vai ser comigo, tá certo?"

Serra criticou Dilma por apoiar o BC: "A Dilma defendeu isso?", disse. "Defendeu a política do BC", disseram os jornalistas. "BC que mantém os juros reais como os maiores do mundo. Para mim é novidade que ela tenha defendido o maior juro real do mundo", disse ele.

BC vira arma do duelo entre Serra e Dilma

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Ele quer banco voltado para desenvolvimento; ela não vê necessidade de modificação alguma

Rubens Santos e Elder Ogliari

Após resistir em voltar a falar do Banco Central, o presidenciável José Serra (PSDB) defendeu ontem uma atuação integrada com a política econômica do governo. "O Banco Central tem de estar voltado para a estabilidade de preços e o desenvolvimento. Por isso, é preciso ter entrosamento."

Em sua primeira visita ao Estado na condição de pré-candidato, o tucano afirmou que o BC "tem de ter autonomia" para trabalhar. "Mas tem de estar integrado com a política econômica do governo e com o Presidente da República, que é quem indica seu presidente e diretores. Foi assim no governo de Fernando Henrique e no governo Lula."

Em Rio Grande, a pré-candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, defendeu que o BC mantenha sua atual autonomia operacional sem a necessidade de formalização da independência do órgão. "Do jeito como está é muito bom", declarou. "Não é necessário a gente introduzir nenhuma modificação e não acho prudente mexer em time que está ganhando", reiterou, após ser questionada pelos repórteres, que queriam saber sua opinião sobre as declarações de Serra, que, na segunda-feira havia dito que "o Banco Central não é a Santa Sé" e que sua autonomia deve ficar dentro de "parâmetros".

Dilma citou ainda suas passagens pelas secretaria da Fazenda de Porto Alegre e de Minas e Energia do Estado, "por duas vezes", além dos ministérios do governo Lula (Minas e Energia e Casa Civil). "Acredito que tenho experiência de gestão razoável, aliás, do ponto de vista da União, acho que das maiores."

Sua passagem pelo Rio Grande do Sul incluiu uma visita à Rede Pampa de Comunicação, onde concedeu entrevista ao programa Pampa Boa Noite. Antes de sair, a petista posou para fotos ao lado das belas apresentadoras e assistentes de palco de outro programa, o Studio Pampa.

Tributária. Serra garantiu que a reforma tributária será uma das prioridades de seu governo, se eleito. "Vamos tocar a reforma para frente. O atual governo não conseguiu, mas eu me proponho a fazer. Até porque é uma área que conheço bastante", afirmou.

O tucano disse também que investimentos em infraestrutura, educação, saúde e segurança pública serão prioritários e garantiu que vai "tocar grandes obras", incluindo o término da Ferrovia Norte-Sul, iniciada em 1986 pelo então presidente José Sarney (PMDB). "É prioridade. Está na hora de acelerar e concluir essa estrada."

Serra citou ainda a responsabilidade do Planalto para reverter o aumento dos índices de violência. "O governo diz que segurança é uma questão dos Estados, mas contrabando de armas e de drogas é tarefa federal."

É hora das Cartas ao Povo :: Rolf Kuntz

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


O cenário eleitoral ficaria mais claro, e talvez mais seguro, se fossem escritas pelo menos mais duas Cartas ao Povo Brasileiro. Há oito anos o candidato Luiz Inácio Lula da Silva assinou uma carta aberta ao eleitorado para declarar sua intenção de governar com responsabilidade, sem cometer as tolices pregadas tradicionalmente por seu partido. Tomou também outros cuidados.
Chamou para assessorá-lo um companheiro com reputação de bom administrador, conquistada quando prefeito de Ribeirão Preto. Pouco antes de assumir o governo, convidou para a presidência do Banco Central (BC) um banqueiro com experiência internacional. A primeira decisão do BC sob o comando desse banqueiro foi uma forte elevação de juros para derrubar a inflação. O presidente Lula o deixou trabalhar como se estivesse protegido por autonomia operacional.

Muitos criticam a política de juros. Mas a inflação se manteve em níveis quase civilizados, favorecendo a elevação da renda e do consumo das famílias pobres. O presidente Lula soube valorizar a estabilidade de preços e tirou disso enorme proveito político. Quanto a esse ponto, poderia dar lições a economistas do PT, frequentemente propensos a defender um pouco mais de inflação - quanto é esse pouco? ? em troca de um pouco mais de crescimento.

O quadro político ficaria mais nítido se cada um dos pré-candidatos mais cotados escrevesse uma Carta ao Povo, para explicar direitinho, de papel passado, a extensão de seu compromisso com a estabilidade. Por enquanto, o eleitor mais cuidadoso e mais informado tem graves motivos para preocupação ? especialmente se tiver idade para conhecer as desgraças do voluntarismo e do jogo sem regras. O tucano José Serra e a petista Dilma Rousseff têm proclamado a intenção de manter a estabilidade, apontada por ambos como conquista irreversível. Essa é agora a conversa politicamente correta, mas é também, no lado oficial, um discurso de ocultação.

Basta ver a piora das contas públicas, com déficit nominal de 3,46% do Produto Interno Bruto (PIB) nos 12 meses até março, para perceber algo errado. Além disso, calcular o resultado fiscal sem contar despesas de investimento é uma forma de maquiar as contas.

O presidente e seus ministros falam sobre a estabilidade como se a deterioração das contas públicas não fosse evidente. Sem destoar, a ex-ministra Dilma Rousseff segue a instrução recebida do chefe. Defende a política de juros criticada pelo ex-governador e acena com a manutenção da estratégia seguida por Lula. Mas não se compromete com a ideia de autonomia formal para o BC.

O pré-candidato José Serra aponta erros na política de juros, proclama a falibilidade dos seus condutores e ao mesmo tempo nega a intenção de virar a mesa. Mas fala em autonomia "dentro de certos parâmetros". Quem determinará esses parâmetros?

A oposição da ex-ministra Dilma Rousseff à autonomia formal do BC combina com sua resistência, nunca disfarçada, à independência operacional das agências de regulação. Todas as suas interferências nessa questão foram para manter as agências subordinadas ao comando político do Executivo, sujeitas, portanto, aos interesses partidários e eleitorais de cada momento.

Foi essa a política dominante nos quase oito anos do governo Lula. Ele chegou ao Planalto, em 2003, condenando as decisões tomadas por agências, como se devessem depender do presidente da República, e nunca mudou seu comportamento.

Nunca houve o mesmo empenho no controle dos gastos públicos ? exceto por iniciativa do ministro Antônio Palocci ? e na busca de qualidade e produtividade na administração federal.
Mas a folha de salários e o quadro do funcionalismo cresceram quase sem parar. Só no Executivo, os servidores civis aumentaram de 485,7 mil em 2002 para 527,2 mil em 2009. Neste caso, a pergunta vale especialmente para a pré-candidata petista: o quadro e a folha vão continuar crescendo como nos últimos anos?

Da fraca gestão fiscal tem dependido a política de juros, principal pilar da estabilidade. O câmbio resulta em parte desses fatores. Mas o câmbio seria menos importante, se a tributação afetasse menos a competitividade. Estes assuntos também caberiam nas novas Cartas ao Povo Brasileiro.

Nenhum desses pontos basta para definir uma política de desenvolvimento. Mas um compromisso real com a estabilidade e com a competência administrativa é condição essencial para qualquer projeto de crescimento seguro e de transformação. O desastre dos anos 80 e do começo dos 90 é uma boa prova disso. Mas o mais lamentável é ter de voltar a esses assuntos.

É jornalista

Criticado por Serra, presidente do BC leva Dilma para reuniões nos EUA

DEU EM O GLOBO


Maria Lima

BRASÍLIA. A précandidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, fará a estreia de sua campanha presidencial no cenário internacional na próxima semana.

Ela tem encontro com investidores estrangeiros em Nova York dia 21. Um dia após as críticas do presidenciável tucano, José Serra, à gestão de Henrique Meirelles à frente do Banco Central, Dilma anunciou que estará ao lado de Meirelles na solenidade na qual ele receberá o prêmio de personalidade do ano pela Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos (Brazilian-American Chamber of Commerce), dia 20.

Meirelles foi escolhido personalidade do ano por ajudar a melhorar as relações comerciais entre Brasil e Estados Unidos. Ele será premiado juntamente com o presidente da empresa norteamericana GE, Jeffrey Immelt.

Oposição ironiza: campanha resolveu exportá-la Responsável pela coordenação da elaboração do programa de governo da candidata petista, o assessor de assuntos internacionais do presidente Lula, Marco Aurélio Garcia, disse que é natural que os candidatos façam uma rodada de encontros com embaixadores, empresários e autoridades estrangeiras para expor seus programas de governo.

Garcia negou que o encontro de Dilma com investidores estrangeiros seja uma sinalização para acalmar o mercado, que anda nervoso agora em função da crise da Grécia. Ele disse que o Brasil passará bem por esse novo abalo, e que, no máximo, será reduzido o volume de investimentos na Bolsa brasileira.

A Dilma vai aproveitar este período, até por constrangimento legal à mobilidade dos candidatos aqui no Brasil, para iniciar esses contatos lá fora. Eu diria até que o Lula teve que fazer isso com mais ênfase. Hoje não precisa tanto, porque o Brasil já tem uma visibilidade muito boa no exterior. Não há nada de anormal nisso disse Marco Aurélio Garcia.

Para a oposição, a viagem de Dilma ao exterior é uma tentativa da coordenação de sua campanha de neutralizar gafes da petista neste início de campanha aqui no Brasil. O ex-líder do DEM Ronaldo Caiado (GO) comparou-a ao pai rico que, quando o filho começa a fazer muita besteira, manda passar um tempo na Europa ou nos Estados Unidos: Dilma tem feito tantas trapalhadas no Brasil, que a coordenação da sua campanha resolveu exportá-la por um tempo.

Declaração sobre BC divide mercado

DEU EM O GLOBO


Uns acham que afeta candidatura, enquanto outros afirmam que não

Fabiana Ribeiro

O vaivém das declarações do pré-candidato do PSDB à Presidência, José Serra, sobre o Banco Central provocou reações diferentes de analistas de mercado.

Fontes ligadas ao setor financeiro disseram acreditar que as opiniões do político podem deixar o mercado receoso em relação à sua candidatura, mas outros afirmaram que suas afirmações não assustaram. Depois de dizer que o BC não é a Santa Sé na última segunda-feira, Serra passou a defender um entrosamento.

Essas declarações do Serra assustam o mercado, que fica mais temeroso em relação à sua candidatura. Ainda que se saiba que ele respeitaria a autonomia do BC, essas frases não caem bem aos olhos do mercado disse um analista financeiro.

Segundo Luis Otávio de Souza Leal, economista-chefe do ABC Brasil, uma opinião mais contundente do presidente da República pode naturalmente afetar as expectativas do mercado, o câmbio e até o riscopaís, além, é claro, de enfraquecer o Banco Central: É bom lembrar que o a escolha do presidente do BC é do presidente da República disse o economista.

Já para Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do BC, as últimas declarações de Serra não arranham a imagem de sua candidatura junto aos mercados.

O BC tem uma autonomia operacional, e é claro que o Serra sabe disso. Mas se o BC estiver olhando exageradamente a inflação, o presidente da República pode se posicionar em relação a isso disse ele, acrescentando que falta uma legislação para o BC.

Os dois teatros da campanha:: Vinicius Torres Freire

DEU NA FOLHA DE S. PAULO


Serra foge do confronto com Lula e do debate econômico, mas sabe-se ainda menos o que Dilma pensa

As ideias econômicas de José Serra são muito mais conhecidas que as de Dilma Rousseff.

Ou melhor, era conhecido o estilo do pensamento econômico de Serra pelo menos até ali por volta de 2007, 2008. Foi então que o lado escuro da força das necessidades eleitorais fez o candidato tucano represar qualquer sugestão pública estridente de que pense algo sobre economia.

Mas as elites econômicas, políticas e intelectuais interessadas no assunto têm ao menos uma vaga ideia, ou até forte suspeita, do estilo de Serra na economia. De Dilma Rousseff conhecem-se apenas vaguidades dos tempos de oposicionismo, as estocadas na equipe de Antonio Palocci e, agora, o seu lulismo sem dó nem piedade pela própria autonomia intelectual e política. Ao menos na campanha.

Causou, porém, alguma sensação a resposta atravessada de Serra a uma pergunta obrigatória da jornalista Miriam Leitão sobre a autonomia do Banco Central, num programa da rádio CBN, anteontem.

O tucano apenas irritou-se com a pergunta, que quer repelir do seu script de candidato. Deu apenas a entender o que já sabia: que jamais foi simpático às políticas do BC nos últimos 46 anos (ou seja, sempre).

E daí? Nada. A sensação causada pela resposta torta de Serra foi apenas teatro sobre teatro, metateatro eleitoral. O povo comum não tem noção do que se trata. As elites interessadas já conhecem o jeitão de Serra. Curioso foi apenas o escorregão do tucano, politicamente sempre muito disciplinado.

Serra já disse que apoiaria uma decisão de Lula sobre os reajustes irresponsáveis que o Congresso deu a aposentados. Já disse que convidaria petistas para seu governo. Na condição de candidato oposicionista, finge-se de morto, pois quer evitar até a morte o conflito com Lula.

Em suma: a elite sabe quem é Serra, embora não saiba o que o tucano faria exatamente na política econômica. A resposta de Serra sobre a autonomia do BC não altera o que esse público de elite pensa sobre ele. Para o povo, Serra, assim como Dilma e Marina, continua o seu teatro. Logo, o debate eleitoral relevante continua no escuro, mais do que qualquer campanha desde 1989.

José Serra está envolvido no debate econômico brasileiro desde o final dos anos 1960. Daí aos 1970, como economista acadêmico, de esquerda, mas não muito. Nos anos 1980, esteve no debate tanto como secretário do Planejamento do governo de São Paulo, sob Franco Montoro (1983-86), como constituinte. E, depois, como parlamentar tucano, já bem perto do "centro".

Já distante da universidade e dos escritos acadêmicos, esteve no centro do debate da política econômica nos anos FHC e protofernandinos (1993-2002), destacando-se em especial como "ministro da oposição" aos economistas do governo tucano. Serra, pois, teria o que dizer nesta campanha. Ainda terá?

Serra faz até agora uma campanha que não está à altura da sua biografia, biografia que, no entanto, tenta apresentar como sua principal vantagem diante da candidata de Lula. Note-se, porém, que Dilma está indo muito mais longe na sua tentativa de maquiar seu personagem eleitoral e na obliteração de sua personalidade.

Erro nos juros:: Celso Ming

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


O pré-candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra, não é claro e fica especialmente desconfortável quando a pergunta dos jornalistas toma o rumo do que pensa sobre autonomia do Banco Central e sobre política monetária. Foi o que se viu na entrevista que deu segunda-feira à rádio CBN, em resposta a questões da colunista Míriam Leitão.

Todos sabemos que Serra tem sido crítico contumaz não só da política monetária, mas, também, da política cambial. E isso não é coisa recente. Vem dos tempos em que foi ministro do Planejamento do governo Fernando Henrique.

Afora isso, em janeiro, o presidente do PSDB, deputado Sérgio Guerra, avisou na revista Veja que, com Serra na Presidência, haveria mudanças no câmbio e nos juros. Até agora ninguém ficou sabendo o que seriam essas mudanças nem o que significariam. Parece, portanto, natural que o eleitor queira conhecer melhor o pensamento do pré-candidato José Serra em matéria de tamanha importância para a definição da política econômica do próximo governo.

Não basta ele dizer que "não vai virar a mesa" e que vai respeitar o atual tripé: responsabilidade fiscal, câmbio flutuante e sistema de metas de inflação. É preciso saber até mesmo o que é essa mesa a que se refere e o que, no seu entendimento, seria virá-la. Serra argumenta que tem todo o direito de criticar o Banco Central "quando comete erros calamitosos".

Ninguém discorda, em princípio, de uma afirmação desse tipo. Não há como negar que, durante a administração Lula, o Banco Central cometeu erros. Foram especialmente erros de dosagem e de timing. Mas daí a dizer que foram erros capazes de produzir calamidades vai uma distância enorme. O simples diagnóstico de que tenham sido erros graves sugere que o pré-candidato esclareça o que pensa sobre política monetária, sistema de metas de inflação e os atuais modelos de avaliação do Banco Central.

Não basta que repita que "o Banco Central não é a Santa Sé". É preciso saber, também, o que deve ser considerado erro calamitoso a ponto de merecer não apenas críticas, mas até mesmo uma intervenção na condução de sua política.

Em suas manifestações anteriores, o economista José Serra não escondeu seu ponto de vista de que a mãe de todos os males da economia brasileira esteja na condução equivocada da política fiscal. Quase sempre é o desequilíbrio das contas públicas que gera inflação. Sua natureza é, portanto, fiscal e, assim, requer tratamento também fiscal. No entanto, a falta de determinação deste governo na administração das contas públicas acaba deixando para o Banco Central a tarefa ingrata de atacar a inflação com o único instrumento de que dispõe, que é a política de juros. Essa parece ser, também, a razão pela qual o Brasil convive com o que se convencionou chamar de "os juros mais altos do mundo".

Por isso, é de se esperar também que, uma vez à frente do governo federal, José Serra se empenhe para que a política fiscal não deixe encrencas a serem atacadas pela política monetária. Se for assim, os juros cairão mais ou menos naturalmente, sem que o Banco Central seja obrigado a forçar a mão.

E , se é verdade que Serra entende que a administração pública deve fluir assim, e não à força de intervenções, convém também saber o que pensa a respeito dos limites da autonomia do Banco Central.

Confira

Mergulho

O pacotão de quase US$ 1 trilhão para socorrer as economias da União Europeia em dificuldades e blindar o euro não está produzindo os resultados esperados pelos chefes de Estado. É o que explica o aprofundamento da queda das cotações do euro.

Dinheiro virtual

Tudo se passa como se esses recursos ainda não estivessem à disposição. Contam apenas com a garantia dos países do euro, alguns em má situação. Terão de ser buscados no mercado financeiro, sem que fique previamente claro como os países devedores formarão a poupança que se destinará a pagar essa dívida.

Analistas veem freio nas exportações para a UE

DEU EM O GLOBO

Após socorro, alta das "commodities" trouxe alívio a produtores brasileiros. Mas crescimento menor na Europa preocupa

Cássia Almeida e Eliane Oliveira

RIO e BRASÍLIA. O pacote de resgate de 750 bilhões de euros (US$ 1 trilhão) para conter a crise grega, trouxe alívio para o setor exportador brasileiro. Depois de fortes quedas na semana passada, as commodities recuperaram parte das perdas.

Mas, na avaliação de especialistas, o cenário a longo prazo não é tão alentador. Diante do ajuste fiscal que grande parte dos países europeus já anunciou, é dado como certo o crescimento menor ou até estagnação do bloco, que é o maior parceiro comercial do Brasil. No ano passado, 23% das nossas vendas externas tiveram a Europa como destino. Assim, além de menos exportações, a desaceleração também poderá levar à queda nas cotações das commodities mais para frente.

A União Europeia é a maior economia do mundo, se fica estagnada, todo mundo perde. A Alemanha terá que tomar medidas de austeridade.

Todos (os países) estão com déficit fiscal alto afirma o economista Marcelo Nonnenberg, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Europa deve crescer menos de 1% este ano O crescimento esperado para Europa este ano, segundo Nonnenberg, era de 1,5%. Agora deve ficar abaixo de 1%, inclusive no próximo ano, diz o economista.

Mas o socorro financeiro, que evitou que os países mais endividados da Europa fosse a nocaute, animou os exportadores.

A avaliação da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) é que o Brasil será beneficiado com a recomposição das exportações de commodities em geral, como minério de ferro, soja, açúcar e carnes bovina e de frango, que têm os europeus como principais compradores.

Na semana passada, as cotações das commodities estavam despencando e agora começam a se recuperar. O pacote foi excelente para o Brasil disse o vice-presidente da AEB, José Augusto de Castro.

Ele citou como exemplos a soja e o petróleo, que aumentaram, respectivamente, 1% e 1,69%, na segunda-feira. Essa recuperação, porém, não foi suficiente para compensar o tombo da primeira semana de maio, de acordo com a RC Consultores.

Em relação à última semana de abril, a cotação da soja registrou queda de 3,87%. Já o preço do petróleo teve uma desvalorização de 12,81%, sendo negociado a por US$ 75,11 o barril.

O economista André Sacconato, da Tendências, diz que o socorro deixou os investidores mais animados: Agora sim, a Europa pôs a mão na massa, o que deixou o mundo mais otimista. Em situações de risco, as pessoas trocam compras e investimentos por títulos americanos.

Investimento direto foi de US$ 5,6 bilhões no 1° tri Além do impacto no comércio, a crise europeia já teve reflexo no fluxo de investimentos financeiros para o Brasil. Luís Afonso Lima, diretor-presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet), mostra os números desse abandono nas aplicações financeiras.

No último trimestre de 2009, o Brasil recebeu US$ 23,3 bilhões de investimento estrangeiro em ações e títulos de renda fixa. No três primeiros meses deste ano, o valor despencou para US$ 9,3 bilhões: E estou com dúvidas se conseguiremos receber os US$ 45 bilhões de investimento estrangeiro direto (recursos destinados à produção) previstos para 2010. No primeiro trimestre, entrou apenas US$ 5,6 bilhões.

Para Fábio Silveira, da RC Consultores, o momento ainda é de grande insegurança: Não acredito na eficácia desse pacote. A situação na Europa é medonha e o dinheiro vai impedir que a região afunde ainda mais. A recuperação europeia pode levar três anos. O menor crescimento do bloco europeu terá impactos sobre as exportações brasileiras.

O secretário adjunto de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Gilson Bittencourt, lembrou que uma crise sempre gera dificuldades em geral. O pacote de ajuda, enfatizou, deve evitar nova recessão.

Qualquer crise neste momento seria negativo para as economias como um todo, inclusive o Brasil, que é exportador de commodities para a Europa disse Bittencourt.

O professor da PUC-SP, Antonio Corrêa de Lacerda, está otimista. Diz que a crise na Europa não impedirá o crescimento forte do Brasil, entre 5% e 6%, se o Banco Central não aumentar os juros olhando só para a demanda dentro do país, desconsiderando o cenário externo: Mas, sem dúvida, os países emergentes, especialmente o Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) e agregados vão puxar o crescimento do mundo nas próximas décadas.

Brumas europeias:: Miriam Leitão

DEU EM O GLOBO


O pânico passou, a euforia passou, agora a Europa vive o cotidiano de uma crise que tem desdobramentos conhecidos e dilemas ainda não resolvidos.

É o que pensa o economista José Roberto Mendonça de Barros, da MB Associados. Na Inglaterra, conservadores e liberais-democratas viverão o desafio de conciliar posições divergentes para combater o déficit público no meio da recessão.

O início do governo conservador na Inglaterra representa mais um ponto de dúvida num continente que já tem sombras suficientes.

O primeiro-ministro, David Cameron, que assumiu ontem, tem um programa de corte de gastos duro e controvertido.

O vice-primeiro ministro, Nick Clegg, dos liberaisdemocratas, tem divergências sérias com os seus, agora, companheiros de governo. Será um governo dividido tentando fazer um programa forte.

Os conservadores, fora do poder desde 1997, não têm agora uma bandeira clara como a da privatização de Margaret Thatcher. Eles se propõem a cortar à metade o déficit público, de 11,5% do PIB, através de medidas que podem não ter o efeito que se imagina. A maioria das medidas é cosmética, como corte de 5% e congelamento por cinco anos do salário dos ministros; congelamento do salário de funcionários; fim do crédito fiscal no imposto de famílias com renda acima de 50.000 libras; aumento da idade de aposentadoria; redução de benefícios sociais exceto para o terço mais pobre da população. Propõe também corte de impostos das empresas. Os liberais-democratas têm propostas diferentes, ainda que façam a mesma promessa de cortar gastos. Eles propuseram imposto sobre grandes propriedades e pagamento da dívida que os bancos fizeram junto ao Tesouro durante a crise.

Depois de cinco dias de um absoluto impasse, o cenário pela frente é de um governo híbrido no meio de uma crise econômica.

Na Zona do Euro, a boa notícia, segundo José Roberto Mendonça de Barros, é que o pânico da quinta-feira foi quebrado na decisão do fim de semana de montar o pacote de quase US$ 1 trilhão.

O que a Europa demonstrou é que vai continuar apostando alto no seu projeto de integração e que está disposta a construir saídas para a situação atual. De um lado, a ajuda à Grécia para que ela saia da crise, de outro, a construção de um mecanismo de financiamento para os outros países em dificuldade.

O fundo de C 440 bilhões vai formar uma Sociedade de Propósito Específico.

Essa SPE vai comprar títulos de países com spreads altos demais disse.

José Roberto disse que quebrou-se a cadeia de transmissão do pânico, mas permanece o problema estrutural fiscal. Isso exigirá um longo tempo até ser digerido através de medidas que serão recessivas. Crises fiscais têm desdobramentos conhecidos. Mas, segundo o economista, há uma enorme incerteza sobre outro problema revelado pela atual turbulência na Europa.

Ninguém tem a mais pálida ideia de como resolver o problema de países do mesmo sistema monetário que tenham índices de produtividade inteiramente diferentes.

A Alemanha teve forte aumento da produtividade nos últimos anos, enquanto Espanha e Portugal permanecem com baixa capacidade de competir. Como fazer para resolver esses desequilíbrio se todos os países têm a mesma moeda? Isso ninguém sabe resolver, nem eles. É esse dilema que surgiu na atual crise europeia disse José Roberto.

Ele acha que a Alemanha, que já é mais competitiva que os outros países europeus, só terá a ganhar na atual crise.

O euro está se desvalorizando e isso aumentará ainda mais a competitividade da Alemanha, que já é uma máquina de exportar.

Ela vai aumentar suas exportações, crescer ainda mais, e enfrentará seu déficit da forma mais fácil, que é crescendo. Mas o que vai acontecer no longo prazo com países que não são competitivos não está claro afirmou.

O povo alemão não parece convencido de que a Alemanha vai ser a grande ganhadora. Eles se opõem ao pacote de ajuda e se sentem pagando uma conta que não é deles.

José Roberto disse que a demora da Europa em conseguir propor uma solução prova que não é apenas o Brasil que toma decisões quando não há outra saída: O Brasil enfrentou a inflação quando estava em hiperinflação, só mudou o regime cambial após o colapso do câmbio, a Europa agora só se moveu quando estava próxima do abismo.

Mas ele acha que a Europa tomou boas decisões.

A euforia da segunda-feira foi para contrabalançar as perdas sucessivas e a crise de pânico da quinta-feira.

Já se sabe que não haverá uma crise bancária na Europa. A dívida será financiada pelo Fundo e pela Sociedade de Propósito Específico. No caso da Grécia, pode haver mais adiante uma reestruturação organizada.

Mas a crise fiscal vai demorar a ser resolvida, e a forma de resolver o desequilíbrio de competitividade de países sob o mesmo sistema monetária continuará sendo um enigma. A Europa terá que resolver isso em algum momento.

As bolsas continuarão na sua volatilidade. Não é isso que impressiona, nem na alta, nem na queda. A dúvida é o futuro do projeto da Europa.

CNBB vê chavismo em plano de direitos humanos

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Para entidade, programa do governo na área de Direitos Humanos tem como objetivo cercear liberdade de imprensa

José Maria Mayrink
ENVIADO ESPECIAL / BRASÍLIA

A discussão do Programa Nacional de Direitos Humanos foi o tema de maior tensão na 48.ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que se encerra amanhã em Brasília, por causa da oposição de um grupo de participantes.

O grupo considera o texto uma "inspiração bolivariana", com a intenção de cercear a democracia, utilizando para isso a censura à imprensa. "Há uma inspiração inegável nos modelos bolivarianos da Venezuela, Bolívia e Equador, cujos governos pregam a democracia participativa de grupos de pressão, inibem o Legislativo e o Judiciário e negam valores transcendentes", afirmou o arcebispo da Paraíba, d. Aldo Pagotto, que brigou no plenário da reunião pela aprovação de uma declaração mais dura sobre o programa.

A tendência inicial, pela proposta de alguns bispos, era divulgar uma mensagem mais moderada, restringindo as críticas a alguns pontos condenados pela Igreja, como a defesa do aborto e a união estável de pessoas do mesmo gênero.

Os debates levaram a uma versão aceitável para os dois lados, depois da rejeição de um rascunho de declaração considerado brando pelos mais radicais.

Ambiguidade. "A questão da retirada de símbolos religiosos de locais públicos é periferia, pois na verdade não há lugar no Programa Nacional de Direitos Humanos para valores perenes", insistiu d. Aldo. "O texto é cheio de proposições ambíguas que misturam direitos humanos com leis feitas por minorias e grupos de pressão, de acordo com uma ética de situação ou das circunstâncias", acrescentou.

Para d. Aldo, exemplo dessa ambiguidade é a ação dos sem-terra, que passam a ter direitos acima da propriedade, com consequente inibição do Judiciário, "Invade-se a terra e, para reaver o que considera seu, o fazendeiro tem de discutir com os invasores, antes de recorrer à Justiça", observou.

O arcebispo da Paraíba disse ainda que, ao contrário de alguns bispos que acreditam ser possível um diálogo, porque identificam pontos positivos no programa, ele não vê como se pode dialogar a partir de ambiguidades.

"Eu tenho dificuldade de apontar pontos positivos no texto, porque me parece óbvia a intenção de cercear a democracia, que os bolivarianos consideram uma instituição caduca", insistiu d. Aldo.

Tensão. Falando aos jornalistas como delegados da Assembleia Geral, o bispo de Jales (SP), d. Demétrio Valentini, e o de Balsas (MA), d. Enemésio Lazzaris, também comentaram as discussões provocadas pela terceira edição do Programa Nacional de Direitos Humanos, lançado em dezembro do ano passado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

"Houve muita tensão, porque alguns bispos quiseram ir além dos pontos condenados, por consenso, pela Igreja (aborto, legalização do lenocínio, união de homossexuais)", observou d. Demétrio.

Para o bispo, está em jogo uma visão antropológica que "não respeita a ordem natural das coisas e a lei natural".

O QUE PENSA A MÍDIA

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Chopin - Valentina Igoshina - Fantasie Op.66

Recife :: Manuel Bandeira


Há quanto tempo que não te vejo!
Não foi por querer, não pude.
Nesse ponto a vida me foi madrasta,
Recife.

Mas não houve dia em não te sentisse dentro de mim:
Nos ossos, nos olhos, nos ouvidos, no sangue, na carne,
Recife.

Não como és hoje,
Mas como eras na minha infância,
Quando as crianças brincavam no meio da rua
(Não havia ainda automóveis)
E os adultos conversavam de cadeira nas calçadas
(Continuavas proví­ncia,
Recife).

Eras um Recife sem arranha-céus, sem comunistas,
sem Arrais, e com arroz,
Muito arroz,
De água e sal,
Recife.

Um Recife ainda do tempo em que o meu aví´ materno
Alforriava espontaneamente
A moça preta Tomásia, sua escrava,
Que depois foi a nossa cozinheira
Até morrer,
Recife.

Ainda existirá a velha casa senhorial do Monteiro?
Meu sonho era acabar morando e morrendo
Na velha casa do Monteiro.
Já que não pode ser,
Quero na hora da morte, estar lúcido
Para te mandar a ti o meu último pensamento,
Recife.

Ah Recife, Recife, non possidebis ossa mea!
Nem os ossos nem o busto,
Que me adianta um busto depois de eu morto?
Depois de morto não me interesará senão, se possí­vel,
Um cantinho no céu,

"Se o não sonharam", como disse o meu querido João de Deus,

Recife.