quinta-feira, 10 de junho de 2010

Reflexão do dia – Dora Kramer


Ao presidente Luiz Inácio da Silva já não basta infringir a lei de maneira explícita nem debochar dos tribunais de forma desabrida. Para tentar ganhar a eleição não hesita e agora simplesmente inventa que é um exemplar cumpridor da lei cercado por adversários infratores.

É bem verdade que o presidente nestes dois mandatos nunca deu um só exemplo de bom comportamento no campo da moral e da ética. Sempre que teve uma chance firmou ao lado do mau combate.

É certo que todos já estamos bastante acostumados com a ausência de modos da parte do presidente, fato visto como positivo por gente que acha que quanto mais sem educação o jeito, quanto mais chulas as expressões, quanto maior o menosprezo às normas de civilidade para alcançar os objetivos pretendidos, tanto mais parecido com o "povo brasileiro" o presidente será.

Mas o que a nação perde em termos de valores tendo a impostura como prática de um presidente da República não interessa como tema de discussão. Em país democrático com instituições e sociedade saudáveis é uma distorção.
É como se o que se vê e o que acontece não valesse nada, tudo perdesse o efeito só porque o presidente diz ao contrário.



(Dora Kramer, no artigo, “Roteiro adaptado”, ontem em O Estado de S. Paulo)

Causa perdida:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

A decisão do Brasil de votar contra as sanções ao Irã no Conselho de Segurança da ONU nos isola politicamente não apenas naquele órgão colegiado, mas no mundo ocidental do qual fazemos parte

A Turquia tem até suas razões geopolíticas para atuar como vem atuando, é vizinho do Irã, um de seus maiores parceiros econômicos, tem interesse em entrar para a Comunidade Europeia e joga com sua relação com os países muçulmanos para ganhar peso político.

O Líbano, com toda a força do Hezbollah, foi mais sensato e se absteve.

Claro que, ao intermediar o acordo nuclear com o Irã, o Brasil se colocou na arena internacional, houve uma mudança de patamar, porque o mundo mudou.

Já não existem mais potências hegemônicas, as lideranças das negociações têm que ser divididas entre os países, e a política externa brasileira arrojada tenta tirar proveito dessa mudança.

Arrojada até demais, a ideia de negociar a paz do Oriente Médio é despropositada e tratada com escárnio pelos envolvidos.

Invadiu a internet nos últimos dias um filmete com um programa humorístico identificado como sendo da televisão israelense onde uma turma do Casseta e Planeta de lá goza nosso presidente de maneira cruel.

O que não é possível é aceitar uma política externa irresponsável apenas por “patriotismo”, sem nenhuma razão realista que a justifique.

Não é possível aceitar que o presidente, qualquer que seja ele, possa usar o país para aventuras personalistas.

Apoiar o Irã, uma ditadura teocrática completamente fora das leis internacionais e do respeito aos direitos humanos, é um absurdo, ainda mais quando todo o Ocidente está trabalhando em conjunto para tentar controlar esses aiatolás atômicos, e conseguindo até apoio de China e Rússia.

Nem mesmo um pragmatismo comercial justificaria tamanho comprometimento, pois nossas exportações para o Irã representam menos de 1% de nosso comércio internacional, ao contrário da Rússia e da China, que mesmo tendo grandes interesses econômicos e políticos na relação com o Irã, aderiram às sanções como prova de que a situação é considerada realmente grave.

Os interesses de empreiteiras brasileiras, que estiveram recentemente no Irã em uma missão exploratória chefiada pelo ministro do Desenvolvimento Miguel Jorge, devem ser contrariados com as novas sanções, pois a maior parte das obras de infraestrutura do país está sob suspeita de acobertar o programa nuclear paralelo.

Diversas empreiteiras iranianas entraram na relação de empresas suspeitas que terão seus bens congelados e seus negócios monitorados.

Só mesmo um desejo incontrolável de surgir no cenário internacional como uma potência de peso, apressando um processo que vem se desenrolando naturalmente ao longo do tempo, justifica tal situação.

Mas nem tudo se deve à ânsia de ser reconhecido como uma peça importante no tabuleiro internacional.

Há ainda, entre os estrategistas da política externa brasileira, um grupo que tem a convicção de que o Brasil usou o pretexto de uma aliança estratégica com a Argentina para aderir às iniciativas americanas na área militar na região, o que teria levado desnecessariamente à assinatura do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP).

O resultado é que, dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China), o único que não tem a bomba atômica é o Brasil, e para compensar essa falta nossa política externa procura aumentar o peso político do controle do ciclo completo do enriquecimento do urânio, ou destacar a possibilidade de fazer a bomba como prerrogativa dos que não a têm.

Essa maneira de pensar a nova geopolítica mundial, e mais o convencimento de que está havendo uma mudança de paradigmas, e que os países emergentes assumirão o comando político do novo mundo multipolar — assim como está acontecendo com suas economias, que estão se destacando em relação às da Europa, Estados Unidos e Japão (o G3) —, está levando o governo brasileiro a dar um passo maior que as pernas.

Os efeitos internos da postura externa também são fundamentais para Lula.

Não apenas aqui, mas em vários países do mundo, inclusive a China, há essa novidade, que é a política externa trazer dividendos políticos internos aos governos.

Não é por outra razão que a candidata oficial Dilma Rousseff irá à Europa para ser recebida por chefes de Estados, num factoide que será apresentado em sua propaganda política. Como se ela fosse uma grande líder internacional.

Aliás, é mais uma ação indevida do governo em favor de sua candidata, pois quem está fazendo o roteiro da viagem é o assessor especial de política externa Marco Aurélio Garcia, que acumula as funções com a de coordenador da campanha de Dilma.

Atrás de um Prêmio Nobel da Paz, que até pode vir, porque o mundo está culpado pela crise econômica — e nada melhor do que homenagear um operário do terceiro mundo, líder de um grande país emergente, para aplacar esse sentimento —, Lula joga o Brasil num confronto desnecessário com os Estados Unidos de Barack Obama, não de George W. Bush, para ficar ao lado dos piores ditadores existentes.

O Brasil não tem nenhuma razão para sair do bloco ocidental, especialmente por uma causa tão ruim para a Humanidade.

Desativando ogivas? :: Valdo Cruz

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - A trapalhada dos petistas no caso do suposto dossiê anti-Serra foi providencial para o PSDB. Inverteu a onda de notícia negativa da campanha. A marola deixou de incomodar os tucanos e passou a perturbar os petistas.

Nas últimas semanas, a turma de Dilma Rousseff, em vez de comemorar o bom momento nas pesquisas de intenção de voto, foi obrigada a se explicar sobre a criação do tal "grupo de inteligência".

Em outras palavras, os petistas deram uma bela ajudazinha aos tucanos. Pelo menos o suficiente para dar um respiro a Serra, em queda nas pesquisas e cobrado pela indefinição de seu vice.

O mais incrível é que teve petista usando a notícia negativa para implodir adversários internos. Isso mesmo. Não bastasse a trapalhada, ela foi usada na guerra de bastidores entre paulistas e mineiros.

A velha guarda do PT se aproveitou do dossiê para enfraquecer aliados da candidata, como Fernando Pimentel, e garantir desde já maior controle político e econômico sobre um novo governo petista.

Dilma sentiu o cheiro de queimado e deu um freio de arrumação. Com certeza, com apoio do presidente Lula, que havia colocado Antonio Palocci na campanha para servir de contraponto a essa turma.

Agora, não surgindo nenhum fato novo, a tendência é que o caso vá perdendo gás e desapareça da mídia. Afinal, depois de lucrar com o episódio, os tucanos não devem ter lá tanto interesse em ficar falando em montagem de dossiês.

Mesmo com todas as negativas de ambos os lados, o fato é que esse tipo de jogo sujo existe desde sempre em todas as campanhas. Tucanos e petistas têm grande experiência no assunto.

O bom dessa história talvez seja o de fazer os dois lados desistirem de qualquer ação nesse lamaçal. As que estavam em curso e as que estavam em planejamento. Inclusive as feitas para ficar apenas nos arquivos, tal como arsenal nuclear de dissuasão. A conferir.

Elis Regina - João Valentão / Na batucada da vida 1978

Livro de Sergio Augusto de Moraes é Lançado com Grande Sucesso no Rio de Janeiro

Serra fará festa longe de Brasília

DEU EM O GLOBO

Convenção do PSDB será em Salvador, para fazer contraponto às de Dilma e do PMDB

Adriana Vasconcelos

BRASÍLIA e SALVADOR - O comando da campanha de José Serra prepara uma grande convenção para oficializar a sua candidatura a presidente pelo PSDB, neste sábado. O público esperado é de 5 mil a 10 mil pessoas, e o custo da festa está estimado entre R$ 400 mil e R$ 500 mil.

O local escolhido para a convenção nacional do PSDB foi o Clube Espanhol, muito usado para shows.

Só a área coberta tem capacidade para abrigar cerca de cinco mil pessoas. Será montado um palco com capacidade para 200 pessoas, onde deverão subir, além de Serra, as principais estrelas da oposição. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, porém, já avisou que não poderá comparecer, pois está no exterior.

O comando da campanha tucana optou por realizar a convenção em Salvador para estabelecer um contraponto às convenções do PMDB e PT, também marcadas para este fim de semana, mas em Brasília. Além de homenagear o maior colégio eleitoral do Nordeste, a ideia é explorar o fato de a Bahia ter sido o berço do Brasil e um estado formado pela mistura de culturas e etnias.

A festa terá a apresentação de alguns sanfoneiros, repentistas, grupos culturais e o Coral da Igreja do Bonfim.

A expectativa é que a lista de oradores seja restrita a quatro ou cinco nomes, para que Serra tenha a maior visibilidade possível. A previsão é que o candidato chegue a Salvador na noite de sexta-feira, quando ele não terá compromisso algum, para se dedicar à elaboração do discurso que fará no dia seguinte.

Embora o evento esteja marcado para as 9h, Serra só deverá chegar às 11h, e deve começar a falar por volta do meio-dia.

A convenção terá um concorrente forte para dividir as atenções em Salvador: a 13aMarcha para Jesus em Salvador, organizada pelos igrejas evangélicas. A marcha, prevista para começar às 13 horas, vai passar pela Avenida Oceânica, onde está o Clube Espanhol. O consultor de Marketing Político Sérgio Kobayashi, um dos organizadores da convenção do PSDB, encara o assunto com bom humor: — Fizemos um acordo com Jesus, vamos realizar nosso evento pela manhã, e, à tarde, esperamos a bênção dele.

Duas mil cadeiras serão colocadas em frente ao palco onde as lideranças nacionais do PSDB e de partidos coligados começarão a discursar a partir das 10h.

Lula divide palanque com Collor e Renan

DEU EM O GLOBO

Presidente faz périplo pelo Nordeste às vésperas da convenção em Salvador que lançará o tucano José Serra

Odilon Rios Especial para O GLOBO


SÃO MIGUEL DOS CAMPOS (AL.) Com um discurso carregado de críticas à elite brasileira, para uma plateia de trabalhadores rurais, empresários e usineiros, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva passou ontem pelo terceiro estado do Nordeste — Alagoas — em dois dias. Subiu num palanque com três candidatos ao governo do estado: o senador Fernando Collor (PTB), o exgovernador Ronaldo Lessa (PSB) e o governador Teotonio Vilela Filho (PSDB), candidato à reeleição. O périplo de Lula pelo Nordeste ocorre às vésperas da convenção do PSDB em Salvador, que indicará José Serra para disputar o Planalto.

O palanque da presidenciável Dilma Rousseff em Alagoas está rachado entre Collor e Lessa. Até ano passado, Collor apoiava Lessa para o governo, mas os “colloridos”, temendo pela situação de Collor em 2014 e uma possível traição do líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), resolveram lançar o ex-presidente da República ao governo.

Petistas ficam de fora do palanque Teotonio Vilela era aplaudido pela multidão, que gritava “Lula é Téo Vilela”. Collor, Renan e Lessa foram vaiados pela plateia, enquanto Lula chamava Renan e Collor de “companheiros”.

Representantes dos petistas, os deputados estaduais Paulo Fernando dos Santos e Judson Cabral ficaram de fora do palanque.

Lula chegou a Alagoas para assinar a ordem de serviço para a duplicação da BR-101, ligando Pernambuco a Sergipe e que custará R$ 1,4 bilhão.

— Alagoas só tem a agradecer o seu apoio a este estado — disse o tucano Teotonio Vilela Filho, citando o PAC e, ao mesmo tempo, rebatendo críticas de petistas, que o acusam de “carimbar” obras do governo Lula com o timbre do PSDB.

Lula voltou a chamar a crise financeira internacional de “marolinha” e rebateu as críticas ao Bolsa Família

Questionado contrato de empresário ligado a Dilma

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Fiscalização da Controladoria-Geral da União detectou 11 indícios de irregularidades em um dos principais contratos firmados com o governo pela Dialog Serviços de Comunicação e Eventos. A empresa é de Benedito Rodrigues de Oliveira Neto, o Bené, que até semana passada vinha atuando como uma espécie de gerente informal da pré-campanha da petista Dilma Rousseff à Presidência. A assessoria de Bené informou que não tem conseguido falar com ele para comentar o caso.

CGU vê indício de pagamento irregular a empresário ligado a comitê de Dilma

Sucessão. Controladoria-Geral da União aponta 11 indícios de irregularidade, incluindo o pagamento por serviços não executados, em contrato do governo com a Dialog, empresa de Benedito Rodrigues Neto, que atuou como gerente informal da campanha da petista

Rodrigo Rangel / BRASÍLIA

A Controladoria-Geral da União detectou 11 indícios de irregularidades num dos principais contratos da empresa Dialog Serviços de Comunicação e Eventos, do empresário Benedito Rodrigues de Oliveira Neto, o Bené, como o governo. Até semana passada, Bené vinha atuando como espécie de gerente informal da pré-campanha da petista Dilma Rousseff.

Em análise preliminar, os auditores constataram, por exemplo, que a empresa recebeu por serviços não executados. A auditoria da CGU foi iniciada ano passado, quando ainda não eram conhecidos publicamente os laços de Bené com o PT. A investigação foi instaurada a partir de suspeitas de irregularidades num contrato da Dialog com o Ministério das Cidades, em 2007. Graças a uma brecha na Lei de Licitações, esse contrato permitiu que a empresa estendesse seus negócios, sem licitação, para vários outros ministérios.

Nos últimos quatro anos, os pagamentos do governo à Dialog somam R$ 76,3 milhões. Outra empresa administrada por Bené, a Gráfica e Editora Brasil - registrada formalmente em nome do pai e de um irmão do empresário - recorreu ao mesmo procedimento da Dialog para obter contratos na Esplanada dos Ministérios. Como o Estado mostrou na terça-feira, somados, os contratos da Dialog e da Gráfica Brasil com o governo somam R$ 214 milhões de 2006 até este ano.

Atestados. De acordo com a fiscalização da CGU, o Ministério das Cidades chegou a atestar como devidamente prestados serviços que nunca foram executados pela Dialog. Os atestados, supostamente fraudulentos, serviram de base para que a empresa recebesse por esses serviços.

As irregularidades detectadas pela CGU começam já na fase inicial do contrato. Segundo os auditores, o Ministério das Cidades aceitou proposta da empresa com preços "manifestamente inexequíveis". É justamente onde está o principal da estratégia das empresas de Bené para obter tamanho sucesso nos negócios com o poder público.

Para ganhar a primeira concorrência, a empresa apresenta proposta com preços irrisórios. Vencida a disputa, com base num mecanismo da Lei de Licitações conhecido como "adesão a ata de preços", aproveita para firmar contratos com outros órgãos públicos sem necessidade de passar por nova concorrência. A prática, condenada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), também é utilizada pela Gráfica Brasil, outra empresa da família de Bené que nos últimos anos conseguiu multiplicar seus negócios com o governo.

Privilégios. A fiscalização da CGU indica que a empresa de Bené gozava de privilégios. No rol de indícios de irregularidades, os auditores levantam, por exemplo, a possibilidade de a Dialog ter tido conhecimento prévio da quantidade de vezes que o ministério necessitaria de cada serviço listado no edital de licitação. O dado permite que a empresa reduza drasticamente o valor daqueles serviços que serão utilizados em menor medida e, com isso, consiga ser mais competitiva na licitação, aumentando enormemente suas chances em relação às concorrentes que não conhecem detalhes tão precisos do futuro contrato.

Esse artifício é o primeiro passo para o chamado "jogo de planilhas": com a redução drástica dos preços daqueles serviços a serem menos solicitados, a empresa toma prejuízo naqueles itens, mas em compensação fatura nos demais, que terão maior volume.

Outro indício de que a Dialog tinha carta branca no governo está na maneira como ela conseguiu espraiar seus negócios, sem licitação, para outros ministérios. Como foi o responsável pela licitação-mãe - aquela que permitiu os contratos nos demais órgãos -, por lei o Ministério das Cidades tinha de referendar os novos contratos. Na prática, em caso de problemas, a pasta teria de informar aos outros órgãos para evitar a multiplicação do prejuízo aos cofres públicos. Não foi o que aconteceu. Apesar dos vários indícios de irregularidades, por várias vezes o Ministério das Cidades emitiu atestados que permitiram à Dialog ampliar seus negócios.

Coincidência. O início do sucesso das empresas de Bené dentro do governo coincide com sua aproximação com o PT, há pouco mais de seis anos. Amigo do ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel, ele se transformou numa espécie de filantropo da pré-campanha de Dilma Rousseff. Tinha trânsito livre na casa da QI-5, um dos bunkers da campanha. Era o responsável por cuidar das finanças. Foi encarregado, por exemplo, de providenciar os imóveis que servem ao comitê de Dilma e até a casa onde ela passou a morar depois de deixar o governo. Bené também participou pessoalmente das negociações com o grupo de arapongas contatado pelo PT para supostamente produzir dossiês contra adversários de Dilma.

Desde a semana passada, o Estado tenta contato com o empresário. Sem sucesso. Ontem, seu assessor de imprensa informou que não tem conseguido falar com ele nos últimos dias. A assessoria de Dilma nega enfaticamente qualquer relação de Bené com a pré-campanha petista e que ele tenha atuado na locação de casas utilizadas pela campanha e pela ex-ministra. Ao Estado, a assessoria da petista afirmou que as ligações de Bené são com o consultor Luiz Lanzetta, afastado no último sábado da pré-campanha após aparecer como pivô da crise do dossiê. O Ministério das Cidades negou-se a responder às perguntas da reportagem sobre o assunto.
Limitou-se a dizer que já prestou os devidos esclarecimentos à CGU.

10 questões garimpadas do Ibope

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

PERGUNTAS & RESPOSTAS

1.Para quem vão os 12% de eleitores que declaram espontaneamente, na pesquisa Ibope divulgada domingo, intenção de votar no presidente Luiz Inácio Lula da Silva?Ao contrário do que os petistas poderiam supor, apenas 48% optam por Dilma Rousseff quando são confrontados com a lista de candidatos. E surpreendentes 29% preferem José Serra (PSDB). Outros 10% vão para Marina Silva (PV).

2.Como se dividiriam os 9% de eleitores de Marina Silva (PV) em um 2º turno entre o tucano José Serra e a petista Dilma Rousseff?
Hoje, Dilma ficaria com uma parcela ligeiramente maior: 40%, contra 32% de Serra. Mas 21% votariam em branco ou anulariam seu voto.

3.Quem é mais fiel a seus candidatos: tucanos ou petistas?
Hoje, 71% dos eleitores que declaram preferência pelo PT votariam em Dilma. A fidelidade entre os simpatizantes do PSDB é proporcionalmente maior: 81% votariam em Serra. Mas há 29% de petistas contra apenas 6% de tucanos.

4.O PMDB deve fechar aliança com o PT na eleição presidencial, mas como votam seus simpatizantes?
Entre os 8% do eleitorado nacional que se declaram peemedebistas, Serra bate Dilma por 62% a 19%. Entre os 45% de sem-partido, o tucano venceria hoje a petista por 38% a 26%.

5.Se José Serra ganha entre tucanos, peemedebistas e nos sem-partido, como é que Dilma Rousseff empata com ele no total?
Nada menos do que 55% dos votos de Dilma vêm dos petistas. E outros 32% vêm dos sem-partido, principalmente daqueles que são fãs do presidente Lula, mas não são petistas.

6.Como a religião influencia o voto para presidente?
Para Serra e Dilma, não faz diferença. Católicos e evangélicos se distribuem na mesma proporção do eleitorado total entre os dois líderes da corrida presidencial. Mas a evangélica Marina Silva, do PV, tem proporcionalmente mais eleitores de sua religião (12%) do que de católicos (8%).

7.Que impacto têm os programas sociais federais nos eleitores de Serra e de Dilma?Para a petista Dilma Rousseff, 35 em cada 100 de seus eleitores se beneficiam diretamente de programas como o Bolsa-Família ou moram com algum beneficiário. Para o tucano José Serra, essa relação é menor, mas ainda significativa: 27 para 100. Detalhe importante: 1 em cada 3 indecisos é beneficiário direto ou indireto desses programas.

8.As mulheres votam mais em Serra porque rejeitam Dilma?
Não. A taxa de rejeição da petista entre o eleitorado feminino (18%) é praticamente igual à verificada entre os homens (19%). Dilma tem 8 pontos porcentuais a menos entre as mulheres provavelmente porque é menos conhecida entre elas. Serra, por sua vez, tem 3 pontos a mais entre as mulheres provavelmente porque é menos rejeitado pelas eleitoras (22%) do que pelos eleitores (27%).

9.Em quem votam os eleitores que rejeitam Serra ou Dilma?

Dos 19% que não votariam em Dilma Rousseff de jeito nenhum, 70% declaram intenção de eleger José Serra, 13% votam em Marina Silva e 16% pretendem anular ou votar em branco. Dos 24% que não votariam em Serra de jeito nenhum, 70% declaram preferência por Dilma, 12% votam em Marina e 14% devem anular ou votar em branco.

10.De onde veio o crescimento de Dilma Rousseff que a levou a empatar com José Serra?Entre abril e junho deste ano, Dilma cresceu 10 pontos porcentuais, de 51% para 60%, entre eleitores que acham o governo do presidente Lula ótimo. Ao mesmo tempo, Serra perdeu 8 pontos nesse segmento, que representa 27% do total do eleitorado. Esses fãs de Lula se concentram nas regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste.

Dilma não comparece a duas outras entrevistas

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Petista cancelou ida à sabatina de Folha e UOL, negociada por 4 meses

Pré-candidata ainda não confirmou presença no "Roda Viva", da TV Cultura, e no "CQC", da Band; Marina critica


BRASÍLIA - Além de ter cancelado a participação na sabatina Folha-UOL, a pré-candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, também não confirmou participação em ao menos dois programas de TV, o "Roda Viva", da Cultura, e o "CQC", da Band.

No "Roda Viva", em que o entrevistado é sabatinado por jornalistas e convidados, a presença de Dilma se daria em 28 de junho. Dois de seus adversários, o tucano José Serra e Marina Silva, do PV, já aceitaram o convite.

O programa com Marina será exibido na segunda-feira e o de Serra no dia 21.

No "CQC", Serra e Marina já participaram do quadro "O Povo quer Saber", em que foram questionados sobre temas que iam de propostas de governo a questões pessoais.Dilma ainda cancelou sua participação em um "talk show" que seria promovido pela CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) em Maceió. Serra também foi convidado, mas não aceitou.

Segundo a coordenação da campanha petista, a ausência de Dilma é motivada por problemas de agenda e não há nenhuma resistência a debates ou entrevistas.

Para justificar a falta na sabatina da Folha, que foi negociada durante quatro meses, os petistas argumentaram que ela terá que cumprir uma agenda internacional com visita a três países.

"É preciso compreender que a campanha precisa priorizar alguns compromissos", disse o presidente do PT, José Eduardo Dutra.

Marina criticou a desistência de Dilma de participar da sabatina Folha-UOL: "Lamento que o Brasil tenha sido privado da possibilidade de conhecer mais sobre as ideias e as propostas dos que concorrem à Presidência". Serra não quis comentar.

Dirceu vai a reunião de campanha de Dilma

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Ex-ministro também tem auxiliado na definição das alianças regionais

Petista foi chamado há poucos dias para ajudar a apaziguar os ânimos na campanha após a crise de suposto dossiê

Valdo Cruz

BRASÍLIA - Na reta final de fechamento de alianças e de definição da agenda antes do início oficial da eleição, a reunião de coordenação da campanha de Dilma Rousseff (PT) contou com a presença do ex-ministro José Dirceu.

Antecessor de Dilma na Casa Civil, Dirceu recentemente foi chamado para apaziguar os ânimos na campanha diante do "fogo amigo" provocado pelo episódio do suposto dossiê contra o candidato tucano a presidente, José Serra.

O petista, que deixou a Casa Civil durante o escândalo do mensalão, em 2005, foi cassado pela Câmara dos Deputados e virou réu no Supremo Tribunal Federal sob acusação de chefiar o esquema.

Segundo relato de participantes da reunião de ontem, o caso do suposto dossiê não foi discutido no encontro, mas a montagem da agenda da candidata petista.

A ideia é que ela concentre uma semana de atividades em São Paulo, Minas Gerais, Nordeste e Sul quando voltar de viagem ao exterior -Dilma visitará França, Espanha e Portugal, do dia 14 a ao dia 20 de junho.

ALIANÇAS

Dirceu também tem auxiliado na definição das alianças regionais entre o PT e os partidos da base aliada. As pendências serão decididas em reunião da executiva petista prevista para amanhã.

A reunião de ontem não contou com a presença do ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel, cuja permanência no comando da campanha foi colocada em dúvida nos últimos dias.

Dilma, no entanto, garantiu que ele continua em sua equipe. Aliados da pré-candidata disseram que Pimentel estará presente no próximo encontro do comando da campanha.

Sócio de pivô do dossiê continua na equipe

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Desligamento da empresa do jornalista Luiz Lanzetta ainda não foi formalizado pelo PT

Ranier Bragon e Márcio Falcão

BRASÍLIA - O desfecho planejado pelo comando da campanha de Dilma Rousseff (PT) para tentar sepultar a "crise do dossiê" ainda não se concretizou. A Lanza Comunicação continua com o contrato com o PT e um de seus sócios seguia até ontem atuando na estrutura de campanha.

No sábado, o jornalista Luiz Lanzetta, dono da Lanza, anunciou a rescisão unilateral do contrato com o PT.

Lanzetta foi apontado em reportagens como responsável por encomendar dossiê contra José Serra (PSDB) e investigação para detectar vazamento de informações na própria campanha. Ele nega.

Até ontem, porém, o PT não havia formalizado o desligamento da empresa -cujo contrato vai até o dia 31- e estudava a forma jurídica de tratar o tema, já que pretende manter a maioria dos assessores contratados via Lanza.

Além disso, o sócio de Lanzetta, o jornalista Robson Barenho, continuava trabalhando na campanha de Dilma, na área de rádio.

Ontem, a situação da Lanza foi discutida em reunião da coordenação da campanha. O secretário-geral do PT, José Eduardo Cardozo, afirmou que o contrato será "rescindido formalmente".

Sobre a permanência do sócio da Lanza na campanha, petistas disseram que também ainda é objeto de análise quem são os assessores que vão permanecer.

"Não temos nada contra ele [Barenho]. Não temos nada contra Lanzetta, foi ele quem decidiu sair. Vamos discutir isso ainda, mas estamos contentes com a equipe", disse o secretário nacional de Comunicação do partido, André Vargas.

Apesar de o PT não negar a participação de Barenho, ele disse que não tem ligação formal com a campanha.

A Folha tentou falar com Barenho pelos telefones da casa montada para a pré-campanha de Dilma. Funcionários confirmaram que ele continuava na casa.

País volta a ter juros acima dos 10%

DEU EM O GLOBO

Em decisão unânime, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central elevou, pelo segundo mês consecutivo, a taxa de juros, que agora passou de 9,50% para 10,25% ao ano. A alta veio dentro do esperado pelo mercado e mantém o país no topo do ranking dos juros mais altos do mundo. Com isso, saem favorecidas aplicações em fundos DI, COBs e títulos do Tesouro Nacional.

O IPCA, índice de inflação da meta, caiu para 0,43% em maio, contra 0,57% de abril.

BC eleva juros, que voltam a ficar acima de 10%

Taxa básica sobe para 10,25% ao ano. Economistas já apostam em elevações menores nos próximos meses

Patrícia Duarte e Ronaldo D’Ercole

BRASÍLIA, SÃO PAULO e RIO. Depois de um ano convivendo com juros de um dígito, o país voltou a trabalhar com a taxa básica, a Selic, acima de 10%. Ontem, em decisão unânime, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central elevou a taxa de 9,50% para 10,25% ao ano, repetindo o aumento de 0,75 ponto percentual de abril, quando o atual ciclo de aperto monetário teve início. O movimento era amplamente esperado pelo mercado.

Mas o ritmo de alta, daqui em diante, divide as opiniões.

Isso porque, em seu comunicado, segundo especialistas, o Copom não deu ontem indicações concretas de seus movimentos futuros. Para alguns agentes econômicos, a inflação já dá sinais de desaceleração e, por isso, não haveria necessidade de o BC continuar com elevações da mesma magnitude.

— A crise europeia pode afetar a economia real, já que o Brasil exporta muito para aquele continente.

Isso pode reduzir as próximas altas de juros, uma vez que diminui a atividade doméstica — afirmou o analista sênior para América Latina do BNP Paribas, Diego Donadio, para quem em julho a Selic subirá 0,5 ponto.

Em junho de 2009, em meio ao processo de cortes da Selic para enfrentar a fase mais aguda da crise internacional, o Copom derrubou a taxa de 10,25% para 9,25% ao ano, entrando pela primeira vez na História no patamar de um dígito.

Com a alta, o Brasil isolou-se ainda mais no primeiro lugar do ranking dos países com a maior taxa de juros do mundo. O juro real (acima da inflação) brasileiro subiu de 4,5% para 5,2% ao ano.

No comunicado, igual ao de abril, o comitê informou que, “dando seguimento ao processo de ajuste das condições monetárias ao cenário prospectivo da economia, para assegurar a convergência da inflação à trajetória de metas, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a Taxa Selic para 10,25% ao ano, sem viés.” — Ao fazer um comunicado lacônico, o Copom deixa uma porta aberta. Está claro que vai avaliar o cenário daqui para frente.

Na próxima reunião, pode aumentar de novo em 0,75 ponto ou menos — afirmou a economistachefe do ING, Zeina Latif que acredita na alta de 0,75.

Elevar a Selic é uma ferramenta de combate à inflação, pois encarece o crédito e acaba reduzindo o consumo. As expectativas do mercado são que o IPCA deste ano ficará em 5,64% e, em 2011, em 4,80%, ambos acima do centro da meta oficial, de 4,5%. Além de choques nos preços dos alimentos no início do ano, o ritmo forte da economia contribui para a aceleração do IPCA. Entre janeiro e março, o IBGE anunciou expansão de 9% da economia, na comparação interanual, e de 2,7% contra o trimestre anterior.

Fundos DI e CDBs ficam mais atraentes para investidor Em comunicado, Benjamin Steinbruch, presidente em exercício da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), argumenta que os preços já se comportam sem altas significativas. Miguel Torres, da Força Sindical, disse que a decisão representa “um balde de água fria na aquecida economia brasileira”. Já a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) ressaltou que a elevação reforça o compromisso do BC com o controle da inflação.

A alta da Selic torna mais atraentes as aplicações pós-fixadas, como fundos DI, os CDBs (Certificados de Depósitos Bancários) e os títulos do Tesouro Nacional. No caso dos fundos DI, a rentabilidade do que têm taxa de administração inferior a 2% já supera a da poupança.

Após subir 1,42% de manhã, o Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo, perdeu força e fechou em queda de 0,51%, aos 61.478 pontos. O dólar comercial recuou 0,64%, a R$ 1,848, segunda queda seguida

Brasil vota a favor do Irã e se isola dentro da ONU

DEU EM O GLOBO

Ahmadinejad desafia eficácia de sanções, e Lula diz que países fizeram "birra"

O Brasil e a Turquia ficaram isolados no Conselho de Segurança da ONU ao votar contra as sanções ao Irã, aprovadas por 12 dos 15 de seus membros, com abstenção do Líbano. A nova resolução representa uma derrota para a diplomacia brasileira, que lutou até o último momento para adiar a votação. A medida dificilmente deterá o programa nuclear iraniano, mas abre caminho legal para que sanções unilaterais mais duras sejam adotadas por EUA e países da UE. O presidente iraniano manteve a retórica desafiadora: "Essas resoluções não têm valor. São como um lenço usado, que deve ser jogado na lixeira”. Já o presidente Lula, irritado, disse que os países votaram por "birra": "Eu sinceramente espero que o companheiro Ahmadinejad continue tranqüilo.”

Votação na ONU isola o Brasil

Resolução contra o Irã é aprovada por maioria e abre caminho para sanções unilaterais

Marília Martins Correspondente • NOVA YORK

O Brasil e a Turquia acabaram isolados ontem, ao apoiarem o Irã, durante a votação em que o Conselho de Segurança da ONU aprovou novas sanções ao país. Foram somente esses os dois votos contrários, na sessão que aprovou por 12 votos a favor e com uma abstenção (o Líbano) a nova rodada de restrições ao programa nuclear iraniano.

A vitória da proposta americana — e a derrota da proposta do Brasil — pode representar também um duro golpe para a diplomacia brasileira, que lutara até o último momento para adiar a votação das sanções em busca de uma saída negociada, numa das maiores apostas do país no campo internacional dos últimos anos.

A votação durou apenas 15 minutos e foi seguida por uma hora e meia de discursos de justificação do voto. A nova resolução da ONU autoriza os países a inspecionarem a carga de navios do Irã; reforça o embargo ao proibir a transferência de mais tipos de armamento, como helicópteros de combate e mísseis; e aperta o cerco financeiro a empresas e bancos do país, incluindo “uma vigilância sobre o Banco Central”.

Mas dificilmente vai desestimular o Irã a prosseguir com o seu programa nuclear. Para garantir o apoio da China e da Rússia, cláusulas mais duras, que poderiam realmente atingir a economia do país, foram excluídas. Por outro lado, a medida abre caminho legal para que sanções unilaterais mais duras sejam adotadas por diversos países, sobretudo os Estados Unidos e membros da União Europeia. Em resposta, o Irã manteve a sua retórica desafiadora, afirmando que não deterá o enriquecimento de urânio.

— Essas resoluções não têm valor. São como um lenço usado que deve ser jogado na lixeira — disse o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, que comparou as sanções a “moscas incômodas”.

Comércio brasileiro pode ser prejudicado

Antes da reunião, a embaixadora brasileira na ONU, Maria Luiza Viotti, reuniu-se com a embaixadora americana, Susan Rice. Os americanos queriam saber como votaria o Brasil e este encontro durou cerca de meia hora.

Mais tarde, Rice saiu da votação cantando vitória e dizendo que o conselho havia “aprovado o mais duro regime de sanções atualmente em vigor na ONU para impedir que o governo iraniano persiga armas nucleares”.

Ela não evitou ironias contra o Irã: — Estamos cansados de ouvir muita retórica ridícula dos iranianos para obscurecer e encobrir a realidade de que estão violando suas obrigações diante da ONU — disse Rice.

Apesar de ter ficado em minoria ao lado da Turquia, Maria Luiza não reconheceu a derrota brasileira. Ela considerou as sanções ineficazes e disse que o Brasil agora vai continuar trabalhando para implementar o acordo de enriquecimento de urânio no exterior, fechado entre Irã, Brasil e Turquia no mês passado. Já o embaixador turco, Ertugrul Apakan, destacou que o acordo criara uma nova realidade e se mostrou preocupado que as sanções tenham um efeito negativo.

— Não foi uma derrota porque os esforços diplomáticos brasileiros foram unanimemente elogiados. As sanções podem atrasar a implementação, mas o acordo não foi descartado — disse Maria Luiza.

A embaixadora reconheceu, porém, que o Brasil vai ser prejudicado comercialmente. Segundo ela, as repercussões sobre o comércio bilateral ainda precisam ser avaliadas, uma vez que o Brasil cumprirá a resolução da ONU. Ela também espera que não haja consequências para as relações entre Brasil e EUA. Diplomatas americanos saíram do encontro criticando o voto brasileiro e dizendo que, “se o Brasil quer liderança no cenário internacional, deveria defender quem cumpre as regras e não quem as quebra”.

Mas Rice minimizou as diferenças: — O que nos separa do Brasil não é uma discordância de objetivo. Ambos os países acreditam que o objetivo é trazer o Irã para o cumprimento de suas obrigações diante da comunidade internacional. Nós discordamos quanto ao timing, ou seja, achamos que não era possível esperar mais para aprovar sanções — disse Rice.

O voto brasileiro quebrou uma longa tradição no Conselho de Segurança, onde habitualmente o Brasil acompanha a maioria ou se decide pela abstenção. Na justificativa do voto, Maria Luiza Viotti comparou o caso iraniano ao precedente do Iraque, em que “a espiral de sanções e ameaças resultou em consequências trágicas”.

O embaixador mexicano Claude Heller, atual presidente do conselho, esclareceu que as sanções agora adotadas poderiam ser revertidas imediatamente, “caso o Irã decida cumprir suas obrigações com a agência internacional de energia atômica”.

— As medidas adotadas são duras, mas não

bloqueiam o caminho para negociações. Agora está mais difícil. Para que as sanções sejam revertidas, qualquer ação iraniana vai ser submetida a uma comissão de especialistas para avaliar seu houve avanço no cumprimento das obrigações legais do país junto à ONU — disse Heller.

Para a Rússia, medida exclui uso da força

Diplomatas americanos e europeus disseram que a aprovação de novas sanções dá agora respaldo legal para que cada país aprove sua própria rodada de sanções unilaterais. Nos EUA, o senador John McCain mobilizou a bancada republicana para apresentar projetos de lei que proíbam qualquer instituição financeira americana dar suporte econômico não apenas ao programa nuclear iraniano, como também para “o governo dos aiatolás”. E deputados democratas também pretendem incluir no projeto de sanções unilaterais uma lista de empresas que vêm sendo investigadas por terem relações comerciais com o Irã, entre elas a Petrobras.

Com os votos contrários de Brasil e Turquia, e a abstenção do Líbano, os EUA perderam a chance de ter sua proposta aprovada por unanimidade.

Mesmo assim, ganhou reforços de países próximos ao Irã, como a China, que pediu que o Teerã cumpra com as exigências estabelecidas na resolução, e a Rússia, que destacou que o texto “exclui a possibilidade do uso da força”. Mas somente os próximos passos mostrarão quão eficazes as medidas serão.

— É óbvio que vamos continuar o enriquecimento de urânio — desafiou o embaixador iraniano, Mohammad Khazaee, que discursou no final da votação do conselho, como convidado, e acusou os americanos de usarem armas químicas e biológicas contra seu país na Guerra do Iraque. — O Irã não se curva a ameaças e pressões. Essas sanções são inúteis.

Brasil, Irã e protagonismo:: Fábio Wanderley Reis

DEU NO VALOR ECONÔMICO

O acordo que Brasil e Turquia celebraram com o Irã em torno da questão da política nuclear do país, com a novidade da importante participação brasileira num problema de política internacional de alcance mundial, levou a avaliações desencontradas entre nós. A julgar por pequena pesquisa pessoal na internet sem grandes preocupações de rigor, a discordância foi mesmo bem maior do que a manifestada na opinião internacional: os comentários de leitores a artigos sobre o assunto publicados no "New York Times" e no "The Economist" em seguida à divulgação do acordo eram em ampla maioria de aplauso a ele, vendo-o como algo favorável ao encaminhamento positivo das dificuldades com o Irã. As avaliações brasileiras tiveram caráter "projetivo", cada qual lançando sobre o evento aquilo que suas inclinações simpáticas ou hostis ao governo Lula recomendavam ou condicionavam.

Isso está provavelmente relacionado, em alguma medida, à especial desatenção do público brasileiro em geral a problemas de política externa. Se mesmo nos Estados Unidos, cuja política externa tem impacto de grande importância por toda a parte, poucos cidadãos prestam atenção real nela, que dizer aqui, onde a presença do país na cena internacional é tradicionalmente reduzida. Em tempos recentes (e governos, particularmente o atual) temos tido a intensificação dessa presença. O que não impede que o papel de Lula num acordo potencialmente tão importante quanto esse surja como algo desmesurado, passível de ser festejado como feito notável ou xingado e escarnecido como prova de arrogância ingênua.

A disposição crítica assumiu com frequência a forma de denunciar a aproximação do governo brasileiro com o Irã e Ahmadinejad, dado o caráter autoritário do regime iraniano. Não há dúvida quanto à impropriedade de manifestações de Lula com respeito ao Irã, exemplificada nas tolas declarações em que os conflitos relacionados com as eleições presidenciais do ano passado foram equiparadas a disputas entre torcidas de times de futebol. E cabe discutir, neste como em outros casos, até que ponto interesses nacionais de um tipo ou outro justificarão que se ignore o comprometimento dos direitos humanos em algum país que se queira ter como parceiro.

Relativamente ao acordo, porém, quanto mais problemático o regime ou o governo do Irã, tanto mais a festejar no fato de que se tenha conseguido obter dele a novidade de alguma disposição à negociação. É com certeza possível que o ânimo iraniano quanto ao acordo seja na verdade pérfido, visando a ganhar tempo para objetivos militares, como na leitura feita pelos EUA. Mas é patentemente absurdo, sobretudo diante da carta dirigida por Obama a Lula semanas antes do acordo, que a oportunidade que ele representava tenha sido não só rechaçada um dia após se saber que as discussões tinham tido êxito, mas que Obama se tenha mesmo empenhado pessoalmente em impedir tal desfecho. É claro que a posição sensata, em vez da reafirmação ultrarrápida da busca por sanções, teria sido, com os cuidados que parecessem necessários, a de conceder algum prazo, mínimo que fosse, para se tentar fazer do acordo obtido a plataforma inicial de um avanço diplomático mais seguro - e são igualmente claras as conexões da linha adotada com questões e pressões de política interna estadunidense que têm imposto distorções ao que presumivelmente se deveria esperar da atuação de Obama em assuntos de política externa, segurança e correlatos.

E é simplesmente lamentável ver um líder com o perfil especial de Obama trazer corroboração tão rápida à regra de que a estreiteza dos princípios do terreno baldio da política internacional leva a que supostos estadistas - ou, pior, estadistas verdadeiros - devam com frequência agir ao estilo de chefes de gangues de adolescentes.

De maneira afim à modéstia de nossa tradicional presença internacional, tem se repetida a pergunta de o que é que fomos fazer no Oriente Médio e em Teerã, tão longínquos - e a resposta, tomada como algo suficiente para desqualificar a iniciativa, tem se referido à busca de Lula por protagonismo. Mas há um sentido bem claro em que essa resposta serve para a pergunta de por que alguém se mete em política ou luta por ser presidente da República, e a questão real é a de se cabe esperar que o protagonismo pessoal dos líderes resulte na promoção de interesses coletivos ou até de valores compartilhados - nacionais ou, eventualmente, transnacionais ou globais. Quanto à Teerã longínqua, Celso Amorim ponderava que temos responsabilidades internacionais (somos até membros do Conselho de Segurança da ONU: caberia renunciar?), que têm crescido com nossa expansão. No mais, a diversificação de protagonismos nacionais em direção multipolar e mais igualitária é com certeza condição da construção institucional capaz de criar, quem sabe, política internacional mais democrática e responsável.


Fábio Wanderley Reis é cientista político e professor emérito da UFMG. Escreve mensalmente às quintas-feiras.

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Murilograma a Graciliano Ramos :: Murilo Mendes

1

Brabo. Olhofaca. Difícil.
Cacto já se humanizando,

Deriva de um solo sáfaro
Que não junta, antes retira,

Desacontece, desquer.

2

Funda o estilo à sua imagem:
Na tábua seca do livro

Nenhuma voluta inútil.
Rejeita qualquer lirismo.

Tachando a flor de feroz.

3

Tem desejos amarelos.
Quer amar, o sol ulula,

Leva o homem do deserto
(Graciliano-Fabiano)
Ao limite irrespirável.

4


Em dimensão de grandeza
Onde o conforto é vacante,

Seu passo trágico escreve
A épica real do BR

Que desintegrado explode.


Roma, 1963


In: MENDES, Murilo. Convergência, 1963/1966: 1 — convergência; 2 — sintaxe. São Paulo: Duas Cidades, 1970.