terça-feira, 5 de outubro de 2010

Reflexão do dia – Fernando Henrique Cardoso

O governo de Lula e do PT se iniciou disposto a exercer o papel de renovador da política e da ética. Termina abraçado com a despolitização e o clientelismo.


(Fernando Henrique Cardoso, no artigo ‘Segundo turno’, O Estado de S. Paulo, 3/10/2010)

País dividido:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

Se fizermos a conta de quantos brasileiros serão governados juntando os estados em que venceram PSDB e DEM e os que os tucanos disputam com boa chance de vencer, poderemos ter a oposição governando metade do país, o mesmo em relação às receitas tributárias. O DEM venceu no primeiro turno em Santa Catarina e Rio Grande do Norte, justamente dois dos estados em que Lula se dedicou a tentar exterminar seus adversários

O PSDB é o partido que elegeu mais governos no primeiro turno: Paraná, São Paulo, Minas e Tocantins. E disputa o segundo turno em cinco outros estados, com chances de vencer: Alagoas, Goiás, Pará, Roraima e Piauí. Mais uma vez o país está dividido, sem que a popularidade do presidente Lula se expresse em dominação política sobre o território.

Dilma Rousseff só venceu a soma dos votos oposicionistas de Marina e Serra em dez estados, e é enganoso acreditar que a vitória em 18 estados representa a hegemonia governista.

Na verdade, a oposição foi majoritária na maior parte do país. O estado de Minas Gerais, por exemplo, que aparece em vermelho no mapa da eleição, dificilmente pode ser considerado um território petista, ainda mais que Marina teve uma votação expressiva por lá, e a soma dos votos oposicionistas supera os da candidata oficial, ao contrário do que acontecia nas últimas eleições, onde Lula prevalecia claramente. A ida para o segundo turno significa que a vitória avassaladora do governo, a chamada onda vermelha, não se concretizou.

A candidata Dilma Rousseff teve mais ou menos o mesmo tamanho de votação que Lula vem tendo desde 2002, o que significa que o PSDB, se quiser vencer a eleição, terá que ampliar suas alianças eleitorais, o que o PT de Lula vem fazendo com êxito.

O PSDB tem tido regularmente cerca de 40% dos votos no segundo turno, enquanto o PT de Lula vai a 60%. Lula incorporou no segundo turno a maioria dos votos de Ciro Gomes e Garotinho em 2002, e os de Heloisa Helena e Cristovam Buarque em 2006.

Dilma entra no segundo turno como a grande favorita, precisando de pouco mais de quatro pontos percentuais para vencer. O objetivo de Serra será, por outro lado, tirar votos de Dilma, além de receber a maioria da votação de Marina.

Mesmo que receba cerca de 80% dos votos que foram para a candidata verde, Serra não ganha se não conseguir roubar eleitores de Dilma.

É mais fácil para o PSDB fazer um acordo com o PV para governar do que esse acordo sair com o governo. Afinal de contas, Marina saiu do governo porque não conseguiu convencer Lula de que a questão do meio ambiente é essencial para um crescimento sustentável rumo ao futuro, e um dos principais obstáculos que encontrou pela frente sempre foi a visão desenvolvimentista de Dilma Rousseff.

Não há nenhum razão para que acredite que num futuro governo Dilma a coisa seja diferente.

Por isso a tentativa do PT é para que ela fique neutra na disputa do segundo turno.

Serra pode tirar votos de Dilma especialmente nos estados de São Paulo e Minas Gerais.

No seu estado, embora tenha vencido a eleição que parecia perdida apenas poucos dias atrás, Serra venceu Dilma por cerca de 700 mil votos, o que é pouco para a tradição tucana, que governa o estado há 16 anos e tem pelo menos quatro anos mais pela frente.

Desde 1994 que o PSDB vence a eleição presidencial em São Paulo por uma diferença mínima de 3,5 milhões de votos, e que pode chegar até a 5 milhões de votos. Isso quer dizer que Serra tem entre 3 e 4 milhões de votos para ganhar em São Paulo.

Em Minas, Lula sempre venceu as eleições presidenciais por uma diferença semelhante à que Dilma teve este ano, cerca de 2 milhões de votos.

O ex-governador Aécio Neves, tendo saído da eleição como o grande líder político do estado e do PSDB no país, tem condições para tentar reverter esse quadro, pois tanto em São Paulo quanto em Minas o Partido Verde faz parte da coligação do PSDB local.

Era razoável que no primeiro turno o grupo do governador Aécio Neves não pudesse se empenhar tanto na campanha presidencial, pois a prioridade era mesmo reeleger Antonio Anastasia, e as implicações políticas regionais dificultavam esse trabalho.

A coligação regional abrigava diversos partidos que apoiam o governo Lula e estavam comprometidos com a candidatura de Dilma, e por isso o voto Dilmasia teve grande aceitação entre os mineiros.

Mas agora, vencida com êxito esta etapa já no primeiro turno, Aécio está liberado para tentar reverter essa situação.

É claro que o favoritismo de Dilma neste segundo turno está mantido, e, sobretudo, a presença do presidente Lula na campanha fará com que a manutenção da votação que Dilma teve no primeiro turno seja possível, e até mesmo provável.

Mas este será um segundo turno muito diferente de quantos já aconteceram, todos com Lula liderando a disputa.

Inclusive porque Dilma é uma candidata frágil politicamente e despreparada para uma maratona eleitoral como a que terá que continuar enfrentando.

Sobretudo se levarmos em conta que o capa preta do petismo José Dirceu revelou em sua já famosa palestra a sindicalistas baianos que Dilma ainda se ressente do tratamento do câncer linfático e está debilitada fisicamente.

Disse Dirceu a respeito do cancelamento de vários compromissos de campanha nesse primeiro turno: (...) nossa candidata estava num momento muito difícil, muito cansada, tendo que se dedicar aos programas de televisão. (...) Ela praticamente não foi ao Norte do país, vocês perceberam isso? (...) Porque primeiro nós temos mais de 40 anos de idade, segundo porque ela passou por um câncer.

Ela sente muito isso ainda. O presidente Lula continuará comandando a campanha de seu laranja eleitoral, mas deve ter sentido o tranco das urnas, e a tendência é alterar o comportamento neste segundo turno. Ele claramente errou a mão no último mês de campanha, achando que estava tudo decidido, e perdeu a noção da realidade.

O recado maior das urnas é que a sociedade não aceita que, mesmo um presidente tão popular quanto Lula, se sinta dono do país, em condições de fazer o que quer e dizer o que as pessoas devem fazer, de escolher inimigos pessoais para exterminar.Lula inventou sua criatura eleitoral do nada e corre o risco de inviabilizá-la politicamente se se deixar dominar pela arrogância.

Nova rodada:: Miriam Leitão

DEU EM O GLOBO

Obrigada, Marina, por ter dado ao Brasil mais uma chance de discutir e pensar; por ter mostrado que um presidente, mesmo popular, não garante a eleição em primeiro turno; por ter tornado a conversa mais inteligente com seus semitons, entre o vermelho e o azul; por ter elevado a agenda ambiental ao ponto de encontro de outros grandes temas nacionais.

Obrigada pela alegria do discurso em que comemorou os resultados eleitorais que não a levaram para o segundo turno. Foi uma aula de política, num país onde a política anda tão deseducada.

Por ter lembrado a questão mais fundamental em qualquer democracia: o eleitor é dono do seu voto. E por ter alertado os dois candidatos que continuam na disputa, Dilma Rousseff e José Serra, que eles têm agora um privilégio e uma responsabilidade.

Marina foi o estuário onde desaguaram vários tipos de votos: os descontentes, os fiéis, os esperançosos.

Esse grupo, com sua diversidade, vai decidir a eleição.

Certamente vai se dividir, não irá todo para um lado só, porque é da natureza desse grupo a inquietação com o automatismo, com o comando único, com as certezas prévias.

José Serra tem um caminho maior a andar se quiser ganhar a eleição, mas deve lembrar que o bom momento econômico atual é mais uma etapa dos ganhos dos últimos 16 anos.

Esses avanços nasceram na estabilização monetária, vitória do grupo político ao qual Serra pertence, da qual ele pouco fala.

Dilma Rousseff, se quiser transformar seu favoritismo em vitória, terá que aprender algumas lições com Marina. Primeiro, a humildade; segundo, a ser natural e não um produto do marketing político; terceiro, entender afinal do que Marina está falando quando se refere à conciliação entre economia e ecologia. Esse talvez seja o desafio mais difícil para quem, como Dilma, acredita no modelo de obras dos anos 70.

Marina deu uma lição também aos analistas que tantas vezes disseram que ela era a candidata de uma nota só. E a lição é que o desafio ambiental e climático não é um modismo, um nicho, uma nota. É o pano de fundo de qualquer proposta verdadeiramente desenvolvimentista.

O verde de anos atrás defendia espécies ameaçadas. Elas continuam precisando de proteção, mas o verde hoje tem urgências mais amplas.

Mudou de patamar. Nenhum planejamento estratégico em empresas, organizações, países pode ignorar essa questão. É uma nova lógica à qual todos os outros projetos da logística à reforma tributária, da educação ao planejamento urbano, da energia ao financiamento público têm que se adaptar. É isso ou não ter futuro. Simples assim.

Essa eleição deixou muitas lições. Primeiro, que pesquisa é pesquisa e urna é urna. Segundo, que é preciso rever também a certeza de que um candidato com menos de um minuto e meio de televisão, um partido pequeno e sem capilaridade não é competitivo. Terceiro, que o Brasil é plural e desafiador.

Aécio Neves deu uma imensa demonstração de força em Minas Gerais, mas, em Belo Horizonte, Marina teve mais votos para presidente, e, no estado, a vencedora foi Dilma Rousseff. Aécio tem que ir além do esforço pelo seu grupo. O Rio Grande do Sul elegeu Tarso Genro no primeiro turno, mas deu mais votos para presidente a José Serra. Tarso tem o mesmo desafio de Aécio. O Distrito Federal, que deu à Marina o primeiro lugar para presidente, levou a espantosa mulher de Roriz para o segundo turno. O DF tem ainda a marca do atraso clientelista. Mesmo com sua altíssima popularidade, 70 comícios e a máquina pública, o presidente Lula não conseguiu eleger Dilma no primeiro turno e perdeu nos dois maiores colégios eleitorais do país. O PMDB, nunca competitivo para a Presidência, continua a maior força no Senado, mas encolheu na Câmara. Há outras forças políticas, mas a bancada do PR puxada por Tiririca e Garotinho é um sinal de que a representação política pode sempre ficar pior.

O olhar atento revela que nenhuma generalização é possível e que o quebra-cabeças que sai da urna é mais matizado do que o previsto.

Os institutos de pesquisa precisam renovar suas amostras e metodologias.

Mesmo os mais eficientes erraram muito. E o erro não é neutro, ele produz fatos políticos. Qual é a influência de semanas a fios de pesquisas repetindo que Dilma ganharia no primeiro turno, Serra estava em queda ou estagnado, e Marina mal saía dos 10%? A explicação universal de que pesquisa é apenas uma fotografia é insuficiente.

O cientista político Jairo Nicolau lembrou no seu blog Eleições em Dados que, na Inglaterra, quando os institutos previram vitória trabalhista e deu o conservador John Major, em 1992, eles montaram uma força-tarefa para entender os erros.

Dilma está mais perto de pôr a mão na taça do que Serra. Isso é até matemático.

Mas a candidata governista falou num tom de desalento, de forma burocrática, cercada de homens abatidos. Ao contrário de Serra e Marina que falaram cercados por suas militâncias.

Os próximos 26 dias serão intensos. Mas a pessoa que for eleita poderá agradecer a Marina Silva: sairá mais legitimada após essa segunda chance.

A política venceu a arrogância :: Alberto Aggio

O resultado da votação do dia 03 de outubro para presidente da República foi uma derrota política para Lula. Sua arrogância dava como certa a vitoria de Dilma Rousseff (PT). Os apoiadores da candidata afirmavam sem nenhum pejo que a carreira política do ex-governador de São Paulo José Serra (PSDB) se encerraria naquela contenda eleitoral. A senadora Marina Silva (PV) era desqualificada como carta fora do baralho: “uma candidata que não se sabe para o que veio”, diziam. Agora descobriram!

A conquista do segundo turno das eleições presidenciais representa uma vitoria contra esse tipo de arrogância e um alerta: a maioria dos eleitores brasileiros votou contra a candidata inventada pelo “dedaço” do presidente Lula. Juntos, os votos de Serra e Marina formam uma maioria que poderá se reproduzir no segundo turno, uma tendência que não pode ser desprezada se for examinada com isenção.

Marina Silva perdeu as eleições mas seus quase 20 milhões de votos garantiu a realização do segundo turno. Mas ela foi vitoriosa em termos políticos. Depois de sair do governo Lula e se candidatar à presidência da República, Marina Silva definiu uma estratégia: discutir os problemas do país e superar o engessamento que Lula queria nessas eleições ao buscar opor os governos do PSDB e do PT dos últimos 16 anos. Lula imaginava que iria fazer Dilma vitoriosa através de um plebiscito: o “nós” (os bons) contra “eles” (os maus), ludibriando a população com números sem substância qualitativa ou isentos de qualquer interpretação e debate. Um equívoco que Marina soube explorar e que o eleitorado corroborou, respondendo com sua expressiva votação.

É uma velha lição política aquela que diz que não se ganha eleição na véspera. Os petistas avaliaram que a eleição iria ser um “passeio”. O excesso de confiança de Lula, ao atacar uma imprensa que sempre cumpriu seu papel no tocante às denuncias de corrupção, a gangrena da nossa democracia, levou Lula a perder o senso de medida e também os votos que poderiam garantir a vitoria de sua candidata. A cidadania democrática se insurgiu contra claras as inclinações de autoritarismo do presidente.

Discutir o país é o ponto de partida e o ponto de chegada de qualquer política que busca elevar a qualidade da nossa recente democracia. Foi isso que Lula quis evitar criando a imagem de país pronto e acabado, à sua imagem e semelhança, inebriado pelo consumo e pelo marketing governamental. A cidadania lhe deu uma lição preciosa: disse que quer um segundo turno para discutir concretamente aquilo que se refere diretamente às obrigações do governo federal no que tange à questões importantes, especialmente aquelas que envolvem a infra-estrutura do país, a saúde, a segurança e a educação, elementos essenciais para a conquista, avanço e manutenção do desenvolvimento e do bem-estar dos brasileiros. A cidadania quer abrir espaço para o debate que não houve, sem a prerrogativa de que sua candidata seja a melhor simplesmente porque é “amiga do presidente” e tem “orgulho disso” ou porque ela, segundo Lula, está “destinada” a ser a “mãe dos brasileiros”. Lula precisa entender que é o Estado patrimonialista – aquele que as elites costumam entender como coisa sua – que a democracia brasileira está deixando para trás.

A eleição revelou que da parte da oposição (Serra e Marina) existe uma sensível disposição para aprofundar os temas que importam para a construção de um Brasil novo e voltado para o futuro. O arco que passa pela proposta de um “desenvolvimento exigente” tem tudo para se articular com a idéia generosa da sustentabilidade e indicar as bases de uma economia forte, projetada para uma longa perspectiva, sem esquecer os desafios imediatos do presente marcados pela nossa gritante iniqüidade. É a política que pode e deve construir o futuro. Com suas vitorias, a arrogância vai ficando para trás.


Alberto Aggio é professor da UNESP-Franca

A derrota política do lulo-petismo :: Augusto de Franco

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Marina contribuiu para separar o joio do trigo em uma base eleitoral que o governo acreditava cativa e abriu fenda no esquema neopopulista

Contra fatos não há argumentos.

E "o dado concreto" é que os brasileiros, em sua maioria, não apoiaram o terceiro mandato de Lula (por interposta pessoa).

Os quase 47% dos votos de Dilma configuram uma derrota política, se considerarmos o fortíssimo empenho da máquina estatal a favor de sua candidatura e o engajamento exorbitante do presidente da República -como "nunca antes se viu neste país"- em prol da sua vitória no primeiro turno.

Com efeito, Lula abandonou a sua posição de magistrado para se engajar na guerra eleitoral da forma mais rasteira, transformando vítimas em culpados, levantando solertes suspeições, falsificando a opinião pública, investindo contra a liberdade de imprensa.

Ele cometeu esse erro porque estufou com seus 80% de popularidade. Perigo! Em política, a hiperinflação do ego costuma vir acompanhada de pretensões despóticas. E o sujeito possuído pelo mito que criou sobre si mesmo acredita-se o único eleitor e acaba confundindo popularidade com legitimidade.

Em certa época, 99% dos albaneses achavam o governo do ditador Hoxha ótimo ou bom. Saddam, nos seus tempos de glória, alcançou 96% de aprovação dos iraquianos.

Fujimori, quando deu um golpe em 1992, dissolvendo o Congresso e intervindo no Judiciário, chegou a 80% de popularidade no Peru.

Na lista das duas dezenas de ditadores remanescentes, de Lukashenko (em Belarus) a José Eduardo (em Angola), de Kim Jong Il (na Coreia) a Gaddafi (na Líbia), dos irmãos Castro (em Cuba) a Mugabe (no Zimbábue) passando por al-Bashir (no Sudão), temos um verdadeiro festival de campeões de popularidade.

Todos esses autocratas, a despeito dos votos que teriam ou tiveram, eram e são ilegítimos. Lula deveria refletir sobre isso.

Mas, independentemente do resultado do segundo turno, uma derrota política mais profunda do lulo-petismo já começou.

Porque a degeneração da política que atingiu o coração do governo-partido aborreceu seu público mais íntegro e criativo. Quem tinha um pouco de honestidade e espírito inovador não via a hora de pular fora daquele antro.

Quando apareceu uma candidatura alternativa, como a de Marina, a porta se escancarou. Militantes, simpatizantes e eleitores que ainda votavam no petismo para não parecer retrógrados acorreram para a saída, aos milhões.

Marina contribuiu para separar o joio do trigo numa base eleitoral que o governo acreditava cativa.

Abriu uma fenda no esquema neopopulista, que só tende a se alargar. Lula e o PT ficaram com o joio.

Restaram-lhes, além das vítimas do clientelismo assistencialista e os mesmerizados pela sua retórica, os militantes mais deformados e os negocistas da política.

Tudo isso dependeu, em parte, do discurso inovador de Marina, mas, muito mais, da situação que objetivamente se configurou.

Mesmo que ela, Marina -tentada a se construir como liderança mítica substituta de Lula ou como chefe de uma espécie de "PT do bem"-, não recomende o voto em Serra no segundo turno (o que seria um erro), o estrago no lulo-petismo está feito.


Augusto de Franco, 60, escritor, é autor, entre outras obras, de "Alfabetização Democrática". Foi conselheiro e membro do Comitê Executivo da Comunidade Solidária durante o governo FHC (1995-2002). Foi membro da direção nacional do Partido dos Trabalhadores de 1982 a 1993.

Uma dura lição para o PT :: Aldo Fornazieri

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Como o processo eleitoral ainda não terminou, o resultado do primeiro turno permite afirmar que o PT saiu dele com uma derrota relativa: não alcançou seu principal objetivo, que era o de eleger Dilma Rousseff sem a necessidade de um segundo turno. De quebra, a oposição saiu fortalecida nas disputas estaduais, com quatro governadores eleitos pelo PSDB e dois pelo DEM. O PSDB manteve os seus dois principais baluartes: São Paulo e Minas Gerais; e o DEM não foi extirpado da política brasileira. A conquista do Paraná foi contrabalançada pela perda do Rio Grande do Sul.

O novo fracasso do PT nos dois principais colégios eleitorais do País revela duas coisas: em Minas houve um enorme erro de estratégia com o não lançamento de uma candidatura própria. Em São Paulo o PT precisa mudar de rumos e apostar em novas lideranças. Com a vitória de Tarso Genro no primeiro turno, o eixo de poder no PT passa por fora do Sudeste.

O resultado final em 18 Estados, com 4 governadores do PMDB, 4 do PT, 3 do PSB e um do PMN, mostra um quadro de equilíbrio entre governo e oposição, o que é salutar para a democracia, já que impede um hegemonismo desequilibrador de uma sigla. A oposição fugiu do apocalipse que se anunciava, é verdade. Mas terá de se reconstruir, pois PSDB e DEM são partidos fragmentos, sem base social e sem eixos programáticos claros, capazes de lhes conferir identidade e sentido.

Marina Silva foi a grande vencedora do primeiro turno. Ganha força para negociar uma agenda com um dos candidatos - Dilma ou José Serra. Um purismo olímpico de Marina neste momento representaria um não dar consequência à sua expressiva votação.

Serra vai para o segundo turno não por méritos próprios, mas graças ao desempenho de Marina. O que ele ganhou é uma oportunidade de se reabilitar, de reconstruir sua credibilidade, de apresentar uma agenda para o Brasil, pois a sua campanha no primeiro turno foi sofrível, errática e sem foco. O segundo turno, de qualquer forma, recoloca em cena aquilo que se previa no início do processo eleitoral: uma campanha dura e polarizada entre Dilma e Serra. Naquele momento se esperava até mesmo que Serra pudesse chegar à frente de Dilma no primeiro turno.

Dilma fez uma campanha centrada nas realizações do governo, mas também deficitária em termos de agenda futura. O que mais pesou para o seu recuo na reta final, e a ascensão de Marina, foram a tradicional arrogância petista, ancorada numa sede desmedida de poder, e a insistência em não aprender com os erros do passado. Três erros graves da campanha governista determinaram o segundo turno.

O primeiro erro foi o escândalo envolvendo Erenice Guerra. Alegar desconhecimento do tráfico de influência na Casa Civil é absolutamente insustentável, pois o governo dispõe da Abin, da Política Federal e de outros órgãos de controle interno para saber o que se passa no alto escalão governamental e no seu entorno. O que o episódio Erenice demonstra é que o PT e o governo abandonaram os cuidados necessários com o tema da moralidade pública, acreditando que o poder é uma espécie de salvo-conduto para práticas antirrepublicanas. Na verdade, desde que chegou ao poder, o PT foi enfraquecendo sua vértebra republicana, caminhando para a vala comum dos outros partidos nesse quesito. Não é raro ouvir de militantes petistas a tese de que sem essas práticas não se governa. O que a evidência tem demonstrado é que a assimilação dessas teses e dessas práticas representa muito mais risco do que benefício político, além de uma descaracterização em termos de valores republicanos.

O segundo erro, na reta final da campanha, consistiu em morder a isca, pisar na casca de banana jogada pelos adversários. Os petistas - presidente Lula à frente - passaram a atacar a imprensa, abrindo o flanco para que proliferassem acusações de antidemocratismo e para que se publicassem manifestos em defesa da liberdade de expressão, reanimando o medo que é tônica nas campanhas desde 1989, quando Lula chegou perto da vitória. O próprio presidente parece ter-se esquecido de que o que ganha votos são mensagens positivas, simplicidade e um estilo "Lulinha paz e amor".

O terceiro erro foi em torno do polêmico tema do aborto. Inicialmente, documentos do PT o declararam a favor do aborto. Dilma manteve uma posição ambígua sobre o assunto até que, na véspera das eleições, no contexto de perda de votos por causa das dúvidas sobre sua posição, ela se manifestou contra o aborto. Mas já era tarde. Aqui também há uma falta de aprendizado com a História. Temas morais, altamente sensíveis para a maioria das pessoas comuns, merecem todo o cuidado no trato dispensado por candidatos majoritários. Um presidente da República deve ser o símbolo da unidade da Nação. Os temas morais polêmicos devem ficar no âmbito do Legislativo.

Dilma e Serra precisam extrair uma bela lição da campanha de Marina. Não são apenas cimento, ferro, estradas e obras que rendem votos. O "eu fiz" ou "fiz mais" também não resolve tudo. Uma campanha para a Presidência precisa irradiar valores vinculantes, uma perspectiva de civilização. Os dois candidatos mais votados pouco falaram de valores.

Uma eleição presidencial é também uma promessa de futuro, uma visão de destino que a sociedade quer e precisa se dar. O futuro não se define apenas no factível em termos de obras, mas também na regulação social pelo metro dos valores. A política é um dos fatores sociais nos quais os indivíduos querem encontrar uma razão de vida. A política é a atividade que consegue configurar de forma mais abrangente um sentido de pertencimento a uma comunidade de destino. Uma disputa presidencial apartada de valores e de sentido civilizador perde a sua razão principal de ser.


Diretor Acadêmico da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP)

O eleitor tem a força:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A rigor não há surpresa na realização do segundo turno, bem como não haveria razão objetiva para o presidente Luiz Inácio da Silva ter saído de cena nem para Dilma Roussef e a cúpula da campanha terem entrado em cena com jeito de derrotados no pronunciamento da candidata domingo à noite.

O mais confiável dos institutos (por não trabalhar para nenhuma campanha), o Datafolha, na véspera indicava que Dilma teria entre 48% e 52% dos votos e José Serra teria entre 29% e 33%. O eleitor deu 46% para ela e 32% para ele.

O problema de quem acredita em fabulações é do crente e não da fábula.

Quanto a Lula e o PT, praticamente só colheram vitórias: transferência inédita e espetacular de todos os 47milhões de votos de Dilma; o primeiro lugar com 14 pontos porcentuais à frente da oposição; a dianteira em 18 estados da federação; maioria incontestável na Câmara e no Senado; derrota de adversários importantes (Tasso Jereissati, Artur Virgílio e Marco Maciel); eleição dos campeões de voto na coligação lulista: dos governadores com mais de 80% dos votos aos deputados Garotinho e Tiririca.

Apenas não se realizaram todos os desejos de Lula e isso foi o suficiente para que naquele momento se instalasse a frustração óbvia nos semblantes dos correligionários de Dilma e, sobretudo, para a ausência de Lula não frequenta cenário adverso.

Lula não conseguiu realizar a fantasia de ver o eleitorado fazer o cotejo entre ele e Fernando Henrique Cardoso e ainda viu a eleição surpreendente de Aluisio Nunes Ferreira ao Senado por São Paulo, o único a fazer de FH seu cabo eleitoral.

Lula não conseguiu varrer o PSDB do mapa paulista _ ao contrário, perdeu no primeiro turno no primeiro colégio eleitoral, bem como assistiu à vitória de A a Z dos tucanos no segundo colégio, com Aécio Neves tirando Fernando Pimentel e o PMDB do jogo. Tanto desgaste em Minas para nada no que tange à política estadual.

Lula não conseguiu dizimar o DEM. O partido saiu da eleição com dois governadores (RN e SC) sendo um deles eleito exatamente no estado onde o presidente há poucos dias fez o discurso convocando à extirpação.

Lula, pela quinta vez, não conseguiu ganhar no primeiro turno.

Lula não conseguiu impor sua vontade, foi obrigado a recuar do tratamento arrogante de quem se acreditou mesmo acima do bem e do mal, achando que estava realmente autorizado a dizer ou fazer qualquer barbaridade impunemente.

E por que Lula não conseguiu prevalecer sobre todo e sobre tudo? Porque de verdade só quem tem a força absoluta é o eleitorado. Este disse em bom som um alto lá ao presidente, informando-se que o poder tem limites e que os impõem não as pesquisas de véspera: são as urnas no dia D.

Como líder político influente ele induz, mas não substitui a vontade das pessoas.

Bom de briga. Não obstante a deslealdade de alguns métodos, o PT sabe fazer uma disputa política. Por exemplo: soube formar um ambiente favorável a Dilma desde os tempos de magras intenções de votos dizendo, repetindo e sustentando com pesquisas contratadas, que ela ganharia no primeiro turno.

Na comunicação foi imbatível, porque convenceu a imprensa a repetir a "tendência" como se fora certeza absoluta.

A realidade não confere? Culpa das pesquisas.

Marina. A candidata do PV saiu-se muitíssimo bem no crescimento da reta final até a conquista de quase 20 milhões de votos.

Mas daí a classificá-la como uma "nova força política" para além da fronteira do ambiente eleitoral, vai uma distância de léguas a percorrer antes de chegar lá.

O eleitorado teve variadas razões para votar em Marina _ a menor delas a causa do meio-ambiente _ e é, por isso, disperso, desarticulado e circunstancial.

Para efeitos eleitorais caberá às campanhas em disputa seduzir esses eleitores que não têm dono e apoiarão quem melhor lhes parecer.

Voto ou sombra e água fresca? :: Eliane Cantanhêde

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - O PT e a campanha de Dilma demoraram a acordar para o risco da apresentação de dois documentos sobre o resultado no Nordeste, por exemplo, onde a candidata governista tem expressiva maioria. Só na última hora eles entraram na Justiça contra a lei. E não foi por falta de aviso.

Agora, o PSDB e a campanha de Serra devem ficar alertas para um outro risco: o de um aumento substancial da abstenção no segundo turno em todo o país, principalmente do eleitorado de maior renda e de maior escolaridade.Motivo: a eleição final vai cair justamente no meio do feriadão de Finados. A votação é no dia 31 de outubro, domingo, e o feriado, em 2 de novembro, terça.

Com o sol agradável de primavera, o cansaço depois de um ano de labuta, uma praia logo ali... Vai ser difícil segurar a turma para votar. Se o PSDB não se cuidar, vai sofrer mais do que o PT. E também não terá sido por falta de aviso.

O índice de abstenção seguiu a regra e foi bastante alto no primeiro turno: 18,12%. Ou seja, 24,6 milhões de eleitores não votaram, seja porque não entenderam a história dos documentos, seja porque mudaram a sessão de votação sem avisar, seja por falta de informação ou puramente de vontade.

Uma grande ausência pode fazer diferença para um lado ou para outro, dependendo de onde se concentrarem os faltosos. No primeiro turno, os menores Estados e o DF tiveram baixa abstenção, ao contrário de Estados médios do Nordeste -como o Maranhão, com quase 24%, ou um quarto de ausentes.

Nos maiores colégios, o índice de faltas ficou pouco abaixo da média. Em São Paulo e no Rio, 16,4% e 17,4%. Em Minas Gerais, 18%. Nos três, a eleição para governador acabou no primeiro turno, com as vitórias de Alckmin, Cabral e Anastasia. Esse pode ser um fator de desestímulo para o eleitor ir votar "só" em Dilma ou em Serra. E logo no meio de um baita feriadão...

Uma aposta com o destino :: Wilson Figueiredo

DEU NO JORNAL DO BRASIL

O exercício de falar todos os dias, o ano inteiro, tantas vezes quantas fossem necessárias, ou lhe parecessem convenientes aos fins dos quais não abdicaria por nada neste mundo, levou Luiz Inácio Lula da Silva a ser o supremo locutor da sucessão presidencial. Ocupou-se da função tanto por não poder candidatar- se quanto pelo narcisismo de intrometer-se, ostensiva e abusivamente, em sucessões estaduais e atender a uma carência compulsiva de provocar o espírito federativo. Não lhe faltou fôlego na campanha para soprar brasas e lançar fumaça nos olhos alheios. Cedeu à tentação e fez o oposto do que o levou, finalmente, ao poder. Deu-se mal, porém, na própria sucessão. Com a soberba das pesquisas, expôs ao risco gratuito do segundo turno a candidatura Dilma Rousseff. Ficou mais dramática a contagem regressiva para o fim dos dois mandatos presidenciais, dos quais Lula não quis aproveitar a oportunidade para se despedir. E se fazer lembrar, daqui a quatro anos.

Nunca o espírito de desforra terá sido tão bem acondicionado e encaminhado na aparência, pela perda da oportunidade do terceiro mandato, do que no episódio vivido pelo avesso: uma vitória com sabor de derrota. Na margem de erro pessoal, para mais ou para menos. Pode não ser assim visto por todos, mas a insistência de Lula em focalizar, de ângulo crítico, a liberdade de imprensa, como fez na despedida da campanha, revela amargura que extravasa em hora imprópria. Vitória e ressentimento não se dão bem.

Ao celebrar seu triunfo político, por encaminhar sozinho e, principalmente, apostar numa candidatura sem atributos notórios para o desafio de sucedê-lo, Lula não revela júbilo de vencedor, antes confirma a mágoa subir-lhe à garganta para acertar com a imprensa a conta de não reconhecê-lo como se vê e gostaria de ser visto. Antes de sair, o presidente cobra da imprensa, a prestações, a dívida de que se considera credor por tê-la reconhecido, em mais de uma oportunidade, como decisiva à sua vitória. Não é agradecimento, nem reconhecimento. Um equívoco não se paga com outro: Lula não deve à imprensa qualquer favor por eleger-se duas vezes, nem ela se sente credora de qualquer retribuição, pois não houve nem caberia favorecimento, por parte dela. A vitória de Lula em 2002 se deveu à sensatez da assinatura dele na carta aos brasileiros, com o compromisso de não agredir o passado que recebia das mãos do seu antecessor e lhe valeu como herança proveitosa. Para não dizer bendita.

A imprensa nada lhe deve por ter exercido a obrigação de informar e o direito de divergir de seus atos. Não precisa agradecer o que a liberdade de imprensa, da mesma forma, lhe garante pelo princípio sem o qual a democracia deixa de existir.

Na véspera da eleição, a pausa para separar o debate e a opção da cidadania pelos governantes, mais uma vez Lula voltou ao tema do seu ressentimento incurável ao acusar a existência de um mal explicado autoritarismo da imprensa, que fica devendo para pagar quando a poeira eleitoral baixar.

O presidente foi o vencedor de uma aposta com o destino e se tornou credor de um feito memorável, e nem por isso sobrenatural: graças aos seus recursos políticos intransferíveis, criou uma candidata sem os dotes apropriados à habilitação, mas não deixa de ser também o grande derrotado da temporada. Continua inconsolável com a perda da oportunidade do terceiro mandato ao alcance da mão esquerda o cobiçado fruto proibido no paraíso continental. Daqui por diante, os fatos tendem a fugir ao seu alcance pessoal. E a hipótese de ser obrigado a dar-lhe adeus exerce efeito perturbador em seus cálculos. Lula não é de viver e se celebrar no passado.

Há, em relação aos fatos e a Lula, uma contagem regressiva em curso, pois o tempo não depende dos meios de mensurá-lo, nem da posição em que os astros se apresentem. Pode ser que, ao contrário do que Lula imagina, seu reinado e sua fortuna não terão sido o começo de uma nova era, mas o fim do período do qual ele foi o produto natural. A História poderá poupá-lo de culpas veniais, mas não irá ressarci-lo das perdas das quais o tempo lhe dará a relação completa. E, antes dela, a concorrência se encarregará de trazer à luz do dia o que se perdeu mas será encontrado, reunido, documentado e apresentado.

Eleitores ocultos da jihad brasileira:: José de Souza Martins*

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO / ALIÁS
(03/10/2010

Um pastor manda de Nova Iorque aos crentes de sua numerosa e obediente igreja evangélica recomendação para que votem na candidata oficial. Um bispo católico publica declaração recomendando aos fiéis que não votem nela. Um pastor de importante igreja protestante lança apelo para que os adeptos de sua igreja votem na candidata não-oficial. Um frade católico há muito declara que espera que a candidata oficial ganhe a eleição e que a oposição nunca mais retorne ao poder. Se é para a oposição nunca mais voltar ao poder, não se trata de eleição e sim de nomeação. Estamos em face do eleitor oculto, o das religiões, que vota corporativamente e sem liberdade, por motivos religiosos e não por motivos políticos.

A questão política como questão religiosa, no Brasil, se propõe desde a Proclamação da República e da separação entre o Estado e a Igreja. Bispos e padres deixaram de ter status similar ao de funcionário público e a Igreja deixou de ter privilégios de repartição pública. O caráter missionário da atuação católica foi largamente beneficiado pela cessação da tutela, dando-lhe a oportunidade de, pela primeira vez em nosso país, fazê-la Igreja livre e profética.

A Igreja Católica, porém, aproveitou mal a possibilidade involuntariamente aberta pela República do ideário positivista dos militares que a proclamaram. Do mesmo modo, a democracia da pluralidade religiosa não consolidou essa premissa básica do Estado moderno entre nós, como se esperava e era necessário. Os protestantes e as outras denominações religiosas foram tímidos na consolidação da democracia nascente e na defesa do Estado não-confessional.

Politicamente marginalizada durante toda a República Velha, que era de inspiração positivista e anticlerical, preparou-se a Igreja nesse período para a Restauração Católica, fundada num ideário de direita e em valores da tradição conservadora. Significativamente, e por isso mesmo, lograria o status de “religião da maioria do povo brasileiro” no governo Vargas. Um intercâmbio claramente informado pelo populismo que nascia. O protestantismo se difundiu devagar, à margem da política e do poder, pesando sobre ele o informal veto católico. Poucos notaram, até, que um presbiteriano, Café Filho, sendo vice de Getúlio Vargas, assumira a Presidência da República com o suicídio do presidente em 1954. Era a via silenciosa da ascensão política dos protestantes.

O golpe militar de 1964 teve a decisiva participação católica com as Marchas da Família com Deus pela Liberdade. No entanto, um fato insólito se passou, revelador das grandes mudanças sociais que haviam ocorrido no País: diversos protestantes, especialmente presbiterianos, ascenderam em diferentes momentos do regime aos governos dos Estados, no Rio de Janeiro, em Pernambuco, no Pará, na Guanabara e mesmo em São Paulo, indiretamente, quando Laudo Natel, ligado ao Bradesco, de Amador Aguiar, presbiteriano, assumiu o governo com a cassação de Adhemar de Barros e nomeou um secretariado com notória presença protestante. A escolha do luterano Ernesto Geisel para a Presidência da República confirmou essa tendência do regime militar. A mudança de orientação da Igreja Católica em relação à ditadura, cuja instauração apoiara, e a hostilidade entre o Estado e a Igreja, nesse período, ganham clareza nesse cenário de fundo religioso.

É nesse quadro adverso e na consequente repressão que alcançou setores engajados da Igreja, até mesmo bispos, que sua atuação política evoluiu na direção do estímulo aos movimentos populares, a ação política orientada contra as incongruências do Estado, sobretudo o descompasso entre o legalmente possível e o politicamente realizado. Nesse legalismo antagônico ao Estado autoritário, os setores mais ativos da Igreja não tiveram outra alternativa para afirmação dos seus valores conservadores, dado que o espaço político de direita, de sua atuação mais coerente, fora bloqueado pela tendência anticlerical dos militares e capturado pelos evangélicos. Sobrou-lhes constituírem sua militância no espaço residual de oposição à ditadura. O rapto ideológico do vocabulário de esquerda deu um revestimento moderno ao programa conservador e nem por isso menos transformador de que a Igreja no Brasil se tornou protagonista.

Nem os católicos nem os evangélicos conseguiram formular uma concepção democrática de política, no sentido de resguardar as respectivas religiões contra o monolitismo ideológico a que tende a política partidária. Não conseguiram propor suas religiões, na política, como religiões universais e pluralistas, irredutíveis ao partidário. O que possa lhes parecer um êxito político-partidário, nestas eleições e em outras precedentes, é na verdade um fracasso religioso, sobretudo no fato de que tendo se proposto como instrumentos do aparelhamento religioso-ideológico do Estado, tornam-se inversamente aparelhos da política e do próprio Estado. No altar das ambições de poder de sua guerra santa, sacrificam a missão profética das igrejas e minimizam a grande função histórica e libertadora que poderiam e deveriam ter na miséria moral e política da sociedade contemporânea.


* Professor Emérito da Universidade de São Paulo. Dentre outros livros, autor de O Poder do Atraso, Hucitec, São Paulo, 1999; e A Sociedade Vista do Abismo, Vozes, Petrópolis, 2010.

Dilma fará ofensiva religiosa para atrair voto conservador

DEU EM O GLOBO

PV pode demorar 15 dias para decidir apoio; Serra diz que Aécio é "pessoa-chave"

Após a decepção com a necessidade de segundo turno, a campanha da candidata petista, Dilma Rousseff, iniciou ofensiva para conter a sangria de votos evangélicos e católicos registrada na reta final do primeiro turno, Dilma e aliados reconheceram que agiram tarde contra boatos na internet afirmando que ela era contra a vida e a favor do aborto. Dilma terá ajuda de governadores e senadores eleitos, chamados às pressas a Brasília. "Foi uma campanha perversa, com inverdades sobre o que penso", afirmou Dilma. Em busca dos votos de Marina Silva, José Serra (PSDB) disse esperar aproximação com o PV, que integrou seu governo. Mas a decisão do PV pode levar 15 dias.

Serra foi ao enterro do pai do ex-governador de Minas, Aécio neves, eleito senador, e disse que o mineiro é "pessoa-chave" no 2º turno.

Cruzada pelo voto conservador

Dilma e aliados traçam estratégia para tentar reconquistar evangélicos e católicos

Cristiane Jungblut, Gerson Camarotti e Maria Lima

BRASÍLIA - Depois do anticlímax para os petistas com a realização do segundo turno, o comando da campanha da candidata Dilma Rousseff iniciou uma ofensiva ontem mesmo, com ajuda de uma força-tarefa formada por governadores e senadores eleitos, para reanimar a militância e reverter a sangria dos votos evangélicos e católicos ocorrida na reta final do primeiro turno. Na reunião fechada, Dilma e aliados reconheceram que perceberam tarde demais o efeito da campanha na internet com boatos de que ela era contra valores da vida e a favor do aborto. E que subestimaram o movimento de perda de votos entre cristãos. A reconquista desses votos passou a ser uma das principais estratégias para o segundo turno.

Foi uma campanha perversa, com inverdades sobre o que penso, o que digo. Lançaram inverdades. Estou analisando como vamos nos comportar.

Vamos fazer um movimento no sentido de esclarecer com muita tranquilidade nossas posições. (A campanha) foi feita com base em calúnias e difamações. Estávamos inocentes.

Mas estamos muito atentos a isso. A gente percebeu tarde, mas percebeu disse Dilma, em entrevista acompanhada de dez governadores aliados eleitos, senadores e apoiadores num hotel de Brasília.

Ela não acusou ninguém diretamente sobre a autoria da campanha.

Não apareciam disse.

Além dos aliados eleitos domingo, parlamentares do PT ligados às questões religiosas estão entrando em campo para desfazer a imagem negativa de Dilma nesses setores, em especial entre evangélicos. Parlamentares reclamam que avisaram a cúpula do PT da campanha sobre o crescimento de Marina e a demonização de Dilma, mas não foram ouvidos.

Aliados veem erro de planejamento

Estão sendo arregimentados Gilmar Machado (PT-MG), da Igreja Batista, amigo de Marina, e Benedita da Silva, do Rio, além do chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho, que tem fortes laços com a Igreja Católica. O secretárioexecutivo do PT e coordenador da campanha de Dilma, José Eduardo Cardozo, disse que ela já explicou à exaustão sua posição.

Foi uma jogada pouco ética disse Cardozo.

O governador Marcelo Déda (PTSE), um dos primeiros a chegar ontem a Brasília para a força-tarefa de Dilma, disse que essa boataria quase atingiu sua reeleição na reta final e estimou que tenha perdido cerca de seis pontos percentuais nos últimos dias com os ataques religiosos.

Essa queda de Dilma e um crescimento de Marina Silva no final se deve ao recrudescimento do fundamentalismo religioso. É o efeito do púlpito nas igrejas disse Déda.

Nos últimos 30 dias houve muitas críticas e nos últimos 15 dias, especialmente, houve uma campanha fascista de boataria reforçou o governador Eduardo Campos (PSB-PE).

A campanha de Dilma também identificou que, em vários segmentos da Igreja Católica, principalmente dioceses comandadas por bispos conservadores e moderados, houve CARTAZES DE Dilma e Lula chegam para decorar hotel em Brasília, onde governadores e senadores eleitos se reuniram para decidir os rumos da campanha André Coelho/ recomendação de voto contrário à petista. Por isso, além dos evangélicos, haverá trabalho especial para recuperar o voto dos católicos.

Ontem, o senador Marcelo Crivella (PRB-RJ), bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, confirmou que em igrejas evangélicas houve pregação contrária à Dilma e reconheceu que isso teve influência. Ele aposta que é possível reverter parte da evasão de votos com um trabalho de conscientização. E explicou que a reunião da semana passada com líderes católicos e evangélicos não foi suficiente para conter a sangria.

Aquela reunião da semana passada não chegou na amplitude necessária.

Os pastores podem ter dificuldade para conseguir votos dos fiéis. Para tirar o voto, o efeito é inverso e os pastores têm muita influência disse Crivella, afinando o discurso para o público evangélico.

O governador Jaques Wagner (PTBA) chegou a admitir que o grande erro da campanha foi ter feito previsão de vitória em primeiro turno.

O erro foi de planejamento e de imaginar que venceríamos no primeiro turno. Numa campanha de dois turnos, é um equívoco apostar numa vitória no primeiro turno.

Agora, a campanha de Dilma ficou refém dos aliados para ter novo impulso.

Vários aliados não escondiam o alívio com a mudança de comportamento.

A própria Dilma passou a telefonar pessoalmente para todos para o evento.

Imagine se a Dilma tivesse sido eleita em primeiro turno. A vida esta-ria difícil. Voltamos a ter importância no jogo revelou um senador.

Sem um só dia de descanso, Lula e Dilma acordaram ontem disparando telefonemas e fazendo uma convocação imediata de governadores e senadores eleitos. O governador eleito do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, foi um dos primeiros a ser contactado.

Genro e os petistas gaúchos creditam a realização do segundo turno ao bombardeio da grande mídia.

Não sei se os ataques vão cessar.

Foi uma estratégia bem montada pelo PSDB com seus apoiadores na grande mídia disse Tarso.

Eles acusaram os meios de comunicação de alimentar fundamentalismo religioso na campanha.

Não podemos estimular o fundamentalismo religioso na política. A mídia acabou estimulando isso disse Raul Pont, deputado estadual.

Além de tentar esvaziar os boatos, eles vão reforçar a comparação com o governo Fernando Henrique e voltar a tratar da privatização.

Vamos desfazer os boatos envolvendo temas sensíveis que falsearam a posição da candidata. Vamos mostrar que vão fazer mais privatizações, que a segurança para exploração do pré-sal é o nosso projeto, as comparações vão ser aprofundadas disse o ex-líder do governo na Câmara Henrique Fontana (PT-RS).

Serra: Aécio é pessoa-chave no 2º turno

DEU EM O GLOBO

"Tenho relação de amizade e parceria com vários integrantes do PV. Por isso, espero uma aproximação", diz tucano

Adriana Vasconcelos* e Thiago Herdy

BELO HORIZONTE. Algumas horas após a confirmação de sua ida ao segundo turno na disputa presidencial, o candidato do PSDB, José Serra, desembarcou na manhã de ontem em Belo Horizonte para se solidarizar com o ex-governador tucano Aécio Neves, que perdeu o pai no domingo. Na saída do velório de Aécio Cunha, Serra disse que Aécio Neves deverá ser uma das pessoas chave de sua campanha na segunda etapa da eleição.

Eleito senador com uma votação superior à que garantiu à reeleição em primeiro turno do governador tucano Antonio Anastasia, Aécio se consagrou com o grande vencedor da oposição no primeiro turno. Com a sucessão estadual resolvida, Serra espera agora que Aécio possa ajudá-lo a reverter a vantagem que a presidenciável petista, Dilma Rousseff, teve em Minas no primeiro turno 46% dos mineiros votaram na petista contra 30% no tucano.

Não creio que seja o caso já do Aécio se envolver no trabalho imediatamente. Mas ele será uma das pessoas-chave da campanha, junto com o governador Anastasia, em Minas e no plano nacional para que a gente tenha um final feliz no segundo turno disse Serra, que tem a preocupação de atrair o apoio do PV de Marina Silva.

Ele fez questão de ressaltar sua afinidade com o PV: Tenho relação de amizade e parceria com vários integrantes do PV. Por isso, espero, sim, uma aproximação. Como governador, fiz um programa ambiental em parceria com o PV, considerado o mais avançado do Brasil. A nossa lei de mudanças climáticas também é considerada a mais avançada do Hemisfério Sul. Portanto, a área ambiental para mim é prioritária.

Mesmo abalado, Aécio prometeu ajuda Serra na reorganização de sua campanha: Eu me coloquei à disposição para atuar da forma que ele achar mais adequado. O governador Anastasia da mesma forma.

Estamos à disposição para trabalharmos em Minas, onde ele achar necessário.

Aécio não disfarça a mágoa pelo fato de o presidente Lula ter interferido na disputa mineira, para ajudar o candidato Hélio Costa (PMDB). Lula fez gravações a favor de Costa e subiu o tom nos discursos em comícios, chegando a declarar que tucano não gosta de pobre.

Trago o sentimento de que na política não é por alguém estar no outro campo ou disputar uma eleição contra você, que é inimigo. Tampouco alguém, por estar do seu lado, estar cercado apenas de virtudes disse Aécio, reforçando a defesa do governo FH. Vamos mostrar que temos o melhor projeto para o país, um projeto que reconheça os avanços que tivemos nos últimos oito anos, como nos oito anos que antecederam o governo Lula. Até porque não teria havido o governo do presidente Lula se não tivesse havido o do presidente Itamar, com o plano real, e o do presidente Fernando Henrique, com a modernização da economia.

Anastasia (PSDB) anunciou que sua prioridade agora é eleger Serra presidente: Faremos o grande esforço pela eleição do nosso candidato José Serra. As bancadas acabaram de ser eleitas, vamos trabalhar com nossos líderes para dar em Minas a vitória a ele.

O governador eleito de São Paulo, Geraldo Alckmin, que acompanhou Serra ao velório, defendeu que o tucano incorpore propostas encampadas pela campanha de Marina. Para ele, Serra não deverá ter as mesmas dificuldades que ele teve no segundo turno da disputa presidencial de 2006.

Serra tem chance de vencer.

Primeiro, porque o Lula, que tem prestígio inquestionável, não é candidato. Segundo, porque Lula não é candidato à reeleição. É muito difícil alguém perder uma reeleição. A Dilma não é presidente. Além disso, na minha eleição, não tive apoio no segundo. Agora, temos uma terceira força, o eleitorado da Marina, com quase 20% dos voto. Eu diria que Serra sai como favorito.

Serra desconversa sobre possibilidade de trocar vice O governador de São Paulo, Alberto Goldman, aposta que a mobilização dos governadores eleitos pelo PSDB em São Paulo, Paraná e Minas representam 40% do eleitorado será fundamental para garantir a vitória de Serra. Por enquanto, ele descarta a possibilidade de mudança drástica na campanha tucana ou a substituição do marqueteiro de Serra, Luiz Gonzalez.

Serra desconversou sobre os rumores de que poderia substituir seu vice, o deputado Indio da Costa (DEM-RJ).


* Enviada especial

Serra convoca aliados para o 2o- turno

DEU EM O GLOBO

Evento em São Paulo amanhã pretende dar o pontapé no início da nova etapa da campanha eleitoral

Flávio Freire

SÃO PAULO. A direção do PSDB definiu ontem, depois de uma reunião de quase três horas no comitê central do partido, que tucanos eleitos nos mais diferentes cargos desembarcarão amanhã em São Paulo para um evento batizado inicialmente de Todos com Serra, Todos pelo Brasil. O objetivo é mostrar o apoio nacional ao candidato do PSDB a presidente, José Serra, como uma forma de dar a largada à campanha no segundo turno.

A decisão é o resultado de um pedido feito por Serra, logo depois que foi confirmado o segundo turno presidencial, no início da noite de domingo.

Serra cobrou do comando nacional da campanha um movimento de unidade em torno de sua candidatura. Por telefone, ainda em seu escritório particular, de onde acompanhou a apuração dos votos, o candidato pediu aos colaboradores que trabalhassem para, o quanto antes, reunir o maior número de nomes do partido em um evento que marcaria o pontapé inicial na segunda etapa da disputa.

Quero fazer um chamado aos partidos políticos e brasileiro e brasileiras do bem: vamos juntos construir um Brasil melhor, porque pode ficar bem melhor disse Serra, na comemoração do resultado da apuração do primeiro turno, que confirmou que ele vai disputar o cargo de presidente com a candidata do PT, Dilma Roussef, no dia 31.

Vamos mostrar nossas diferenças, diz nota tucana O PSDB divulgou nota ontem reforçando o chamado para.

Vamos, com determinação, mostrar nossas diferenças. Temos um líder forte, com densa história de vida, biografia consistente e visão de futuro, diz a nota, assinada pelo presidente do partido, Sérgio Guerra.

Na nota, o partido festeja a eleição dos governadores do partido em São Paulo, Minas, Paraná, Santa Catarina, Tocantins e Rio Grande do Norte.

Lembra também que disputa o segundo turno para governador em outros cinco.

A hora é de luta, de reunir todas as forças e levar José Serra à vitória. É hora de união com todos os que se identificam com nosso projeto, que se aproximam da nossa luta e que venham agregar ideias, disposição e determinação de construir um Brasil melhor, afirma a convocação, que promete melhorias na saúde, segurança, infraestrutura e educação.

Nossa adversária teve oito anos para fazer melhorias, mas não fez, critica o documento.

Deputados, senadores e governadores convocados Deputados, senadores e governadores eleitos pelo PSDB, e partidos aliados em todo o país, começaram a ser convocados ontem mesmo, em tom de compromisso e com prioridade absoluta. Já foi convidado para discursar no evento o candidato vitorioso ao Senado por Minas Gerais, o ex-governador Aécio Neves. O governador eleito de Minas, Antonio Anastasia, também está na lista de convidados, assim como Beto Richa, do Paraná. Até ontem à noite, Caio Carvalho, da coordenação nacional do partido, procurava um espaço para abrigar o evento.

O grupo paulista formado por Geraldo Alckmin, eleito governador, Aloysio Nunes Ferreira, que garantiu vaga no Senado, e integrantes do governo estadual, também engrossará o coro pró-Serra.

O evento é para pedir para todo mundo ir para a rua, para brigar pela candidatura.

O Serra quer todo mundo nessa luta disse ontem a senadora Marisa Serrano (TO), que ontem dedicou-se a convites não só a tucanos, mas também a partidos aliados.

Integrantes do PV também podem ser convidados O PSDB não esconde o interesse em convidar integrantes do PV paulista afinados com sua candidatura, como forma de mostrar maior aproximação com Marina Silva, tida como a fiel da balança na nova etapa eleitoral. Serra quer evitar nas próximas semanas qualquer revés na sua candidatura provocado por eventuais problemas na coligação.

Ele também exigiu o reforço de material de campanha país afora, com cartazes, adesivos e santinhos. No discurso em que comemorou a ida para o segundo turno, o presidenciável chegou a pedir para ninguém tirar férias ou descansar nesse período.

Governador de SC dá apoio hoje

DEU EM O GLOBO

FLORIANÓPOLIS. O governador eleito de Santa Catarina, Raimundo Colombo (DEM), informou ontem que estará hoje com o vice, Eduardo Pinho Moreira, e os senadores eleitos Luiz Henrique da Silveira (PMDB) e Paulo Bauer (PSDB), como candidato do PSDB à presidência, José Serra, para demonstrar apoio público ao tucano.

Pela manhã, o grupo se encontrou com Jorge Bornhausen (DEM), para tratar do apoio a Serra.

Colombo disse que vai dedicar outubro para eleger o tucano presidente, e só depois tratar da transição e formar a sua equipe de governo.

Vamos visitar o Serra em São Paulo para declarar nosso apoio, nossa solidariedade e trabalhar, trabalhar declarou.

Luiz Henrique não poupou o PT de críticas ao dizer que o seu apoio a Serra se deve à oposição ferrenha que os petistas sempre fizeram a ele em Santa Catarina.

Quando declarei que iria apoiar Serra para presidente, o governo federal não deu mais andamento a diversos projetos atacou.

Silveira disse que o PMDB catarinense vai em bloco apoiar o Serra no segundo turno. Mas, no primeiro turno, boa parte apoiou a candidata do PT. E o ex-governador, Paulo Afonso Vieira do PMDB e um dos coordenadores da campanha de Dilma em Santa Catarina, disse que manterá o apoio à petista Quando diziam que a Dilma se elegeria no primeiro turno, eu dizia que haveria segundo para se revelar a verdadeira cara e os propósitos dos candidatos afirmou Luiz Henrique.

FH diz que não vai se engajar no segundo turno

DEU EM O GLOBO

"Decidi ser o oposto do presidente Lula", critica ex-presidente

SÃO PAULO. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou ontem que não vai participar ativamente da campanha de José Serra (PSDB) no segundo turno das eleições presidenciais.

Ele disse que quer ser o oposto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que participa diretamente a campanha da petista Dilma Rousseff.

Eu terminei o mandato e acho que não é próprio se engajar em campanhas. Eu decidi ser o oposto do presidente Lula. Eu tenho a minha torcida, mas não vou ficar lá tentando chutar um gol disse Fernando Henrique, após participar da inauguração do Auditório Moise Safra no Hospital Albert Einstein Ele (Lula) está o dia inteiro querendo esmagar o adversário.

O ex-presidente disse que o segundo turno permitirá que cada um volte a pensar no que será melhor para o Brasil.

O pior que pode acontecer ao país é ter um só lado ganhando tudo, e não foi o que aconteceu disse.

Gabeira reafirma apoio a Serra

DEU EM O GLOBO

Rafael Galdo

Com um capital eleitoral de 2,69 milhões de votos ( 31,5 2 % )para Marina Silva e de 1,63 milhão (20,68%) para Fernando Gabeira no Rio, o PV fluminense já se articula para definir aliança no segundo turno da eleição presidencial.

Gabeira, que teve o PSDB em sua coligação, reiterou ontem o seu apoio ao tucano José Serra (SP). No entanto, outros líderes verdes defendem uma conversa preliminar com a presidenciável do PT, Dilma Rousseff.

Presidente regional do PV, Alfredo Sirkis, coordenador da campanha de Marina no Rio e eleito deputado federal, com cerca de 73 mil votos, defendeu a proposta da presidenciável de levar a decisão sobre o apoio para uma convenção. Segundo ele, integrante da executiva nacional do PV antes disso será aberto um processo de diálogo com Dilma e Serra, para que pelo menos dez pontos do programa dos verdes seja apresentado.

Embora tenha dito que apoiará Serra, Gabeira também afirma que aguardará as decisões do partido. Segundo ele, o compromisso de apoiar Serra em um segundo turno foi assumido desde a composição da aliança e deve ser cumprido: Meu apoio é ao Serra, a menos que o partido me proíba disso, o que acredito que não vai acontecer.

Integrante da executiva nacional do PV, a vereadora Aspásia Camargo diz que o partido tende a ficar neutro. Aspásia explica que no Rio a responsabilidade de manter uma coerência com o que foi proposto no primeiro turno é maior, por causa da grande votação do PV. E lembra: várias vezes Marina disse que Dilma e Serra eram muito parecidos.

Aspásia afirmou que, no plano estadual, serão cobradas posições dos presidenciáveis em relação a investimentos em áreas como o turismo e as indústrias da comunicação e de criação no Rio.

O PSDB também se movimenta para tentar reverter o quadro desfavorável a Serra no estado.

Hoje, os tucanos fluminenses se encontram com a equipe de campanha do candidato em São Paulo. Vão traçar metas para conquistar os votos do eleitorado verde e tentar enfraquecer o desempenho de Dilma. Eles não abrem mão de ter Gabeira na rua pedindo votos para Serra.

A participação de Gabeira é estratégica, reforça nossa presença entre o eleitorado do PV afirma o deputado federal Otávio Leite (PSDB-RJ).

Colaborou: Marcelo Remígio

O silêncio de Lula

DEU EM O GLOBO

0 presidente Lula, que fez em média dois comícios por dia em favor de Dilma no primeiro turno, completou ontem 24 horas sem qualquer comentário sobre o resultado das eleições. Coube ao ministro da Articulação Política, Alexandre Padilha, falar por ele: "0 presidente está muito feliz."

Lula não aparece e não comenta resultado

Presidente não foi com Dilma ao pronunciamento depois da eleição e passou o dia ontem em reuniões fechadas

BRASÍLIA. Depois de fazer, no primeiro turno, mais comícios e discursos para Dilma Rousseff do que para ele próprio na campanha de 2006, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não apareceu em público após a confirmação de que sua candidata ao Planalto não conseguiu vencer no primeiro turno. Desde que votou em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, no domingo de manhã, Lula mantevese em silêncio sobre o resultado das eleições.

Nem mesmo no pronunciamento que Dilma fez no domingo à noite, para comentar o resultado ao lado do comando de sua campanha e aliados, Lula apareceu. Se Dilma tivesse ganhado no primeiro turno, como esperavam os petistas até a semana passada, porém, o PT e o Planalto já preparavam uma festa em Brasília.

Ontem o presidente passou o dia no Palácio do Planalto, em encontros com ministros e políticos aliados. À tarde, recebeu o governador reeleito do Rio, Sérgio Cabral (PMDB).

O ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, após reunir-se com Lula e o ministro de Comunicação de Governo, Franklin Martins, disse que Lula está satisfeito, e não cogita se licenciar do cargo durante a campanha.

— O presidente está muito feliz com o resultado da candidata Dilma no primeiro turno: ela alcançou o mesmo patamar histórico que o presidente, em 2002 e 2006, que o levou para o 2º turno em que foi vitorioso — disse Padilha.


Quem ganhou e quem perdeu mesmo?

DEU EM O GLOBO

Semblante dos candidatos não correspondeu à sua posição no primeiro turno

José Casado

As imagens são reveladoras. Ao triunfo de domingo nas urnas (46,9% dos votos válidos), a candidata Dilma Rousseff (PT) e seu vice, Michel Temer (PMDB), responderam com um misto de tensão e desencanto. A surpresa com o segundo turno refletiu-se em um discurso protocolar e quase burocrático de agradecimento pelos 47 milhões de votos recebidos na voz de uma candidata visivelmente cansada.

Lula, seu principal cabo eleitoral, recolheu-se ao silêncio. Ele completou ontem 24 horas longe das câmeras e 72 horas sem fazer um único discurso situação incomum para quem há 21 anos participa ativamente de campanhas presidenciais e, volúvel à sedução dos microfones, habituou-se falar em público pelo menos duas vezes por dia.

Em contraste, os derrotados José Serra (PSDB), com 32,6% dos votos, e Marina Silva (PV), com 19,3%, mostraram-se em estado de pura alegria desde o fim da apuração.

Por trás do choque de realidade a que Dilma, Temer e Lula foram submetidos na noite de domingo, estão quase os mesmos fatores que ajudam a entender o motivo do riso franco e permanente com que Serra e Marina atravessaram a segunda-feira.

Um deles é o limite imposto pelo eleitorado na transfusão de prestígio de Lula para Dilma, sob a forma de votos. Pela terceira vez, desde 2002, ele é obrigado a enfrentar um segundo turno.

Outro é que, nesta nova etapa, Dilma será obrigada a expor ideias de forma menos genérica e adotar uma postura conciliatória com valores e convicções de setores conservadores e religiosos em parte responsáveis pelo feito de Marina nas urnas (ela avançou mais no eleitorado com a pregação de valores e convicções pessoais do que com o projeto econômico ecológico do Partido Verde.) Em tese, Dilma precisaria apenas manter os votos que conquistou e adicionar 20% do eleitorado de Marina para chegar ao poder. Nessa conta, Serra dependeria de 85% dos votos dados ao PV.

O problema da matemática com a política é que ambas nunca combinam.

No domingo, isso ficou claro com as pesquisas eleitorais elas estão na raiz do desencanto da nação petista, que apresentou um triunfo com perfume de derrota.

Especialistas criticam pesquisas

DEU EM O GLOBO

Os erros dos institutos de pesquisa trouxeram à tona debate sobre a capacidade que a divulgação de dados de intenção de voto tem de alterar a decisão do eleitor. Institutos e especialistas falam nas causas para os erros: entre elas, os altos índices de abstenção, não contabilizados nos levantamentos.

Especialistas criticam erros de pesquisas

Institutos superestimaram votação de Dilma e subestimaram, por exemplo, a subida de Marina Silva

Gilberto Scofield Jr.

SÃO PAULO. Os erros cometidos nas pesquisas eleitorais deste ano voltaram a acender o debate, entre cientistas políticos e especialistas em opinião pública, sobre a real utilidade da divulgação maciça de sondagens de intenção de voto e de sua capacidade de alterar os resultados finais nas urnas, quando não captam com precisão a vontade do eleitor.

No caso das pesquisas para a Presidência, eles apontam erros acima dos dois pontos, para cima ou para baixo nas margens de erro, que superestimaram a performance da candidata Dilma Rousseff (PT) e subestimaram especialmente a candidata Marina Silva (PV).

Pesquisas podem influenciar resultados Deslizes, como os números que indicavam Geraldo Alckmin (PSDB) em posição de vitória folgada para o governo de São Paulo quando o senador Aloizio Mercadante (PT) teve muito mais votos nas urnas do que o previsto, e o primeiro turno acabou numa disputa acirrada ou as previsões que tiravam Aloysio Nunes Ferreira (PSDB) da disputa por uma vaga de senador por São Paulo (conquistada com folga pelo candidato) somaram-se a inúmeros resultados finais que terminaram fora das margens de erro. Isso incluiu a disputa pela Presidência.

É preciso discutir a oportunidade de divulgação de pesquisas com erros graves de metodologia, porque as campanhas, os eleitores e a própria mídia se pautam por elas, o que pode influenciar artificialmente o voto afirma o historiador Marco Antonio Villa, professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos. Houve problemas de metodologia, com os institutos Datafolha e Ibope errando bem menos.

Ainda assim, essas pesquisas podem influenciar o resultado, especialmente em disputas mais apertadas.

Os analistas e os próprios institutos apontam vários motivos para os erros das pesquisas.

Fala-se das taxas de abstenção nunca contabilizadas nos levantamentos, dos erros na hora de votar, de eleitores que se envergonham de dizer seus votos, de ondas de opinião que são captadas aquém do que mostram as urnas e, principalmente, metodologias de pesquisa que, por serem restritas ou focarem em grupos e regiões específicas, não captam com exatidão o amplo leque de preferências eleitorais do país.

Os institutos não estão identificando com clareza determinadas tendências e a vitória de Marina Silva no Distrito Federal mostra isso diz professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB).

Todos os institutos erraram o resultado final. Erraram no que eles consideram como erro máximo das pesquisas (margem de erro). O Ibope errou mesmo a pesquisa de boca de urna, que entrevista os eleitores no dia das eleições. A pesquisa ouviu 4.300 eleitores (a margem de erro anunciada é de no máximo de dois pontos percentuais); todos os candidatos chegaram fora dos limites definidos. Os resultados que circularam das pesquisas presidenciais nos estados mostram resultados muito mais discrepantes ainda. Este erro coletivo dos resultados foi o maior já cometido pelos institutos no Brasil diz Jairo Nicolau, cientista político e professor visitante do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP), da Uerj, em seu blog Eleições em Dados.

Anteontem, Ricardo Caldas, professor de ciência política e diretor do Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares da UnB, afirmou em entrevista ao portal Terra, ainda quando a apuração oficial estava pela metade, que o instituto Datafolha foi o que errou menos mas, ainda assim, a maioria dos institutos falhou.

É preciso que os institutos revejam suas metodologias de pesquisa e a forma de abordar o eleitor afirmou.

Ibope diz que acertou mais do que errou Márcia Cavallari, diretora executiva de Inteligência do Ibope, disse achar que o instituto acertou mais do que errou, e observou que o Ibope não cometeu erros de tendência (que captam a subida ou a perda de votos de um candidato), mas imprecisões nos índices, alguns pontos acima ou abaixo dos resultados finais.

Pesquisa de opinião pública é complicada e as pessoas mudam de ideia de um dia para o outro, o que significa que os institutos podem errar. Houve erro no caso das eleições no Paraná, mas é bom observar que captamos a subida de Beto Richa na pesquisa de boca de urna.

Em Santa Catarina percebemos o mesmo com Raimundo Colombo, ainda que o índice final tenha sido maior do que o verificado nas pesquisas. No geral, acertamos muito mais do que erramos diz Cavallari.

Quando o governador eleito do Paraná, Beto Richa (PSDB), decidiu recorrer à Justiça Eleitoral para suspender as pesquisas que indicavam a realização de um segundo turno no estado, na reta final da disputa, muita gente o acusou de recorrer à censura para evitar revelar sua suposta fraqueza eleitoral. Mas o resultado final de Richa nas urnas, com uma vitória de 52,4%, observa Marco Antonio Villa, faz pensar até que ponto pesquisas erradas podem mudar uma disputa apertada.

Cheguei a ler entrevistas do candidato a senador por São Paulo, Netinho de Paula, falando de planos para disputar a Presidência. Fala-se na liberdade de escolha do eleitor, mas o fato é que as pesquisas influenciam diz Villa.

No berço político do PT, Dilma não atingiu 50% dos votos

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Petista teve 46% em São Bernardo do Campo, para 32% do tucano José Serra e 19% de Marina Silva (PV)

Elizabeth Lopes

Apesar de terminar a corrida eleitoral deste domingo em primeiro lugar na cidade de São Bernardo do Campo - berço do PT e onde o presidente Luiz Inácio Lula da Silva começou a carreira política, como sindicalista -, a candidata petista, Dilma Rousseff, não alcançou 50% dos votos válidos. Na contagem geral dos votos em São Bernardo, a petista teve 46%, para 32% do tucano José Serra e 19% de Marina Silva (PV), coincidentemente, o mesmo porcentual de votos que os três presidenciáveis tiveram em todo o País.

"Mesmo na cidade do seu padrinho político e líder em popularidade, Dilma não ganharia no primeiro turno", afirma o especialista Sidney Kuntz, comparando a votação registrada em São Bernardo do Campo com o restante do País. Segundo ele, a votação da petista no reduto político de Lula, que ficou abaixo do esperado, acendeu a luz amarela entre os correligionários da legenda. Reuniões emergenciais já estão sendo organizadas para discutir as eventuais falhas ocorridas na reta final do primeiro turno e definir os rumos desta nova fase da campanha.

Ao falar do reduto político do presidente da República, Kuntz lembra que Frank Aguiar, vice-prefeito de Luiz Marinho (PT) em São Bernardo do Campo, não conseguiu se eleger deputado federal. Kuntz avalia que, apesar do empenho e popularidade de Lula, o PSDB tem muita força em todo o Estado de São Paulo, tanto que o candidato do PSDB ao governo paulista, Geraldo Alckmin, foi eleito no primeiro turno, apesar da margem apertada, e o tucano Aloysio Nunes Ferreira obteve uma das duas vagas ao Senado Federal, deixando de fora Netinho de Paula (PC do B), da coligação petista, que era apontado pelas pesquisas como um dos favoritos da corrida.

Na análise da apuração dos votos nas cidades do ABC paulista, Dilma só registrou mais de 50% em Diadema, município administrado pelo PT. Ali, teve 56% dos votos válidos, Serra, 23% e Marina, 19%. Em Mauá, também administrada pelo PT, Dilma também não chegou a 50% dos votos válidos, ficando com 47%, para 30% de Serra e 20% de Marina. Em Santo André, administrada pelo PTB, aliado dos tucanos, Dilma obteve 39%, Serra, 36% e Marina, 22%. Em São Caetano do Sul, administrada também pelo PTB, Serra liderou com 52%, seguido de Dilma, com 23%, e Marina, com 21%.

Aécio pede mudança de tom para apoiar Serra

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Tucanato mineiro quer que presidenciável adote o figurino e o discurso de candidato da oposição

Christiane Samarco
Enviada especial Belo Horizonte

Embalado pela conquista de um lugar no segundo turno, o presidenciável tucano José Serra desembarcou ontem no segundo maior colégio eleitoral do Brasil para virar tributário do sucesso que o PSDB desfruta em Minas Gerais. Uma operação política recebida com uma contraproposta pelo tucanato mineiro: o compromisso de lançar o senador eleito Aécio Neves ao Planalto em 2014 e acabar com o fator previdenciário no cálculo das aposentadorias do INSS, instituído no governo FHC.

O que era, portanto, para ser apenas uma visita de pêsames ao recém-eleito senador, que acabara de perder o pai e ex-deputado Aécio Cunha, teve outra serventia e abriu espaço aos tucanos para falar do segundo turno da disputa presidencial e apresentar a conta política de Minas Gerais para virar o jogo favorável à adversária petista Dilma Rousseff.

Assim, além de preservar o projeto de poder de Minas, com Aécio Neves candidato à Presidência em 2014, o tucanato local quer que Serra mude a campanha e adote o figurino e o discurso de candidato da oposição. E mais: pedem ousadia na apresentação de propostas para mudar a vida do eleitor, a começar pelo fim do fator previdenciário.

Foi neste clima que o deputado estadual Domingos Sávio (PSDB-MG), no embalo das urnas que na véspera o promoveram a deputado federal, tomou o braço de Serra pela mão e desceu as escadas da Assembleia Legislativa de Minas, onde ocorria o velório de Aécio Cunha, e cochichou sua proposta: "O senhor tem de ir para a televisão e anunciar o fim do fator previdenciário. Se o senhor acabar com isto, antes que o PT o faça, a gente ganha a eleição".

Serra não disse nem que sim, nem que não. Ouviu com a atenção devida ao interlocutor que, sete meses atrás, arriscara uma campanha para que Aécio aceitasse ser seu vice na corrida sucessória, como forma de facilitar a vitória do PSDB sobre o PT de Lula e sua candidata.

O fator previdenciário é um sistema de desestímulo à aposentadoria precoce, uma vez que o INSS paga uma pensão maior ao aposentado que adiar a decisão de se aposentar. Nos primeiros dez anos de vigência, o método gerou economia para os cofres públicos calculada em R$ 10 bilhões. Caso seja extinto, a despesa deverá voltar a crescer.

Erro. Atento às abordagens, o governador eleito de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), aconselhava Serra a não repetir o erro que ele cometera em 2006, quando demorou para reiniciar a campanha do segundo turno contra o presidente Lula e acabou derrotado. "Aqueles dez dias que eu fiquei sem programa de televisão, desmobilizaram a campanha. Quanto mais rápido começar o horário eleitoral, melhor. Como o Brasil é muito grande, é preciso um mutirão, incorporando todo mundo", sugeriu.

O deputado estadual Carlos Mosconi (PSDB) acredita que um acordo simples político para preservar o projeto Aécio 2014 pode virar uma "onda maluca" a favor de Serra em Minas. "A força política do Aécio coloca o fim da reeleição na pauta", completa o segundo suplente do ex-governador no Senado, Tilden Santiago (PSB), que votou em Marina Silva (PV) no primeiro turno. "Se o Aécio me pedir para votar no Serra neste segundo turno, não terei como negar, mas é hora de o PSDB paulista se redimir e acabar com a reeleição", adverte Tilden.

Um tucano experiente adverte que Aécio pode fazer a diferença em Minas, mas com uma condição: "É preciso que haja uma tendência nacional favorável. E o clima positivo de virada prosseguirá, mas só o Serra pode dar início a isso, mostrando algo diferente. O que tem de haver é um discurso novo para o segundo turno".

"Precisamos passar a falar para os eleitores que nós não conseguimos atingir e que a Marina atingiu de maneira muito especial. Isto é fundamental", sugere o secretário-geral do PSDB e deputado federal mais votado de Minas Gerais, Rodrigo de Castro.

Para o presidente da Associação Mineira de Municípios e prefeito tucano de Conselheiro Lafaiete, José Milton Rocha, se quiser conquistar os mineiros neste segundo turno, Serra terá de encontrar um outro "mote de campanha, com apelo popular". Ele entende que será preciso, também, mudar "radicalmente" a postura e se assumir como candidato de oposição. "Para ganhar os prefeitos, ele vai ter de bater no que o PT tem de pior, que é a corrupção, com um discurso mais forte e mais firme", propõe.

Colaborou Eduardo Kattah

Escolha para 2º turno expõe divisão do PV

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Grupo de Marina ficou longe das lideranças do partido, que agora precisa se unir para escolher qual presidenciável apoiar

Luciana Nunes Leal, Roldão Arruda

O candidato derrotado ao governo do Rio, Fernando Gabeira (PV), foi o primeiro aliado da senadora Marina Silva a anunciar apoio a José Serra (PSDB) no segundo turno. Os tucanos só aguardam agora um sinal do deputado para planejar sua participação na campanha. A expectativa é que Gabeira ajude a levar para Serra parte dos 2,6 milhões de votos (31,52%) obtidos por Marina no Estado.

Gabeira teve 1 milhão de votos a menos que Marina (20,68%) e perdeu a disputa com o governador Sérgio Cabral (PMDB) no primeiro turno. O deputado do PV afirmou que não vai tentar convencer Marina a se aliar a Serra. "Não quero criar constrangimento a ela, de maneira nenhuma. Farei tudo da forma mais harmônica possível", respondeu.

Gabeira disse que seu apoio estava definido desde o primeiro turno. "Apoio Serra não só porque ele me apoiou, mas porque o considero o melhor candidato", afirmou.

A decisão de Gabeira é individual. Não leva em conta o processo de debates e consultas sobre o segundo turno anunciado na noite de domingo por Marina. Esse processo foi iniciado ontem à noite, em São Paulo, com uma reunião que teve a participação de seus assessores e apoiadores mais próximos, além de representantes da direção nacional do PV.

Gabeira não esperou nem o debate no diretório estadual do Rio. De acordo com o presidente do partido no Estado, deputado federal eleito Alfredo Sirkis, a decisão só será anunciada após os debates internos, que incluiriam até reuniões com Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB). A ideia é apresentar a eles uma plataforma programática mínima e não negociar cargos.

"Vamos ter reuniões de coordenação, fazer uma seleção de propostas e depois encontrar os dois candidatos. Queremos evitar a cena tradicional da política brasileira da divisão de ministérios e decisões tomadas de forma fisiológica. Vamos puxar um programa mínimo, obrigando os dois empedernidos desenvolvimentistas a trabalhar com a ideia da sustentabilidade."

Com essa declaração, Sirkis deixa aberta a possibilidade de neutralidade, defendida pelos círculos mais próximos a Marina Silva, que incluem ambientalistas recém-convertidos à vida partidária e antigos militantes do PT, que ela atraiu para o PV.

Os debates levarão em conta as diferentes tendências existentes no partido. Em São Paulo, a posição do diretório estadual é francamente favorável ao apoio a Serra. Pesam a favor disso as atitudes do presidente do partido, o também deputado eleito José Luiz de França Penna, próximo aos tucanos, de apoiar José Serra, e do candidato derrotado ao governo do Estado, Fábio Feldman. Ele foi filiado ao PSDB até 2005 e até hoje mantém sua amizade com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e com Serra.

O PV de São Paulo tem sido aliado histórico do PSDB. E esse cenário tende a se manter. Todos os seis deputados paulistas eleitos agora para a Câmara têm ligações com os tucanos. Um deles, Sinval Malheiro, chegou a declarar no primeiro turno que sua escolha para senador recairia sobre Aloysio Nunes Ferreira, do PSDB, e não em Ricardo Young, do PV. Ele também já disse que é muito amigo do prefeito Gilberto Kassab, que faz parte do DEM e é aliado de Serra.

De olho em apoio do PV, tucano diz que 'ecologia é prioridade'

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Tucano menciona parceria com o partido de Marina em São Paulo e afasta hipótese de trocar Índio por Aécio

Eduardo Kattah

BELO HORIZONTE - No dia seguinte à votação em primeiro turno, o candidato do PSDB à Presidência, José Serra, intensificou ontem o cortejo à presidenciável do PV, Marina Silva, cuja votação serviu como fiel da balança para a ocorrência do segundo turno entre o tucano e a petista Dilma Rousseff.

Serra compareceu no início da tarde ao velório do ex-deputado Aécio Ferreira da Cunha, pai do ex-governador e senador eleito Aécio Neves (PSDB), e disse que o mineiro será uma das "pessoas chaves" para vitória no segundo turno da eleição presidencial.

O presidenciável tucano alegou que possui proximidade com o PV e sempre obteve o apoio da legenda verde em São Paulo, quando ocupou a prefeitura e o governo do Estado.

"O grande secretário do Meio Ambiente, o Eduardo Jorge, foi levado por mim à prefeitura e continuou na gestão do Kassab, sem falar nas relações de amizade com vários outros integrantes do PV. E eu espero realmente uma aproximação", afirmou.

Serra salientou ainda que, como governador, elaborou programa ambiental em parceria com o partido de Marina e disse que a área ambiental é prioritária para ele. "Elementos para a aproximação existem e eu espero sinceramente que ela aconteça."

Mais uma vez, elogiou a campanha de Marina, afirmando que a ex-ministra do presidente Luiz Inácio Lula da Silva "contribuiu para diversificar as opções do povo brasileiro" e incorporou à política uma grande fatia da juventude brasileira. "Contribuiu para que nós tivéssemos segundo turno, e, portanto, para a democracia", disse. """Merece respeito e admiração da minha parte."

Vice. Sobre especulações relacionadas à troca do candidato a vice em sua chapa, Índio da Costa (DEM), o candidato tucano disse que tem "entendido que não há possibilidade legal". Sobre a hipótese de Aécio assumir o posto, afirmou que não acredita na especulação. "Não creio, não ouvi essa especulação e é melhor também não avançar muito em coisas dessa natureza."

Ao falar sobre o papel de Aécio na campanha de segundo turno, Serra demonstrou confiança no empenho do ex-governador, que levou o PSDB a uma vitória consagradora em Minas. "Creio que não seja o caso já de o Aécio se envolver num trabalho direto, imediatamente (em razão do falecimento do pai), mas acredito que ele será uma das pessoas chaves, junto com o (governador reeleito, Antonio) Anastasia aqui em Minas e no plano nacional para que a gente chegue num final muito feliz no segundo turno."

Tucanos escalam FHC para buscar apoio de Marina

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O PT e o PSDB começaram articulações para tentar atrair o apoio de Marina Silva (PV). Os tucanos escalaram o ex-presidente FHC para o contato. Os petistas atribuíram a tarefa ao baiano Jaques Wagner e aos acrianos Tião e Jorge Viana.
Marina defendeu que uma "convenção nacional" do PV, a ser convocada em até 15 dias, decida sobre o segundo turno.

PSDB e PT já articulam cerco a Marina

Fernando Henrique falará com senadora em nome de Serra; do lado de Dilma, interlocutor será Jaques Wagner

Presidenciáveis ligaram para candidata do PV e pediram conversa; ela mantém sinais de que será neutra no 2º turno

Bernardo Mello Franco e Catia Seabra

DE SÃO PAULO - Aliados de José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) começaram o cerco para tentar atrair o apoio de Marina Silva (PV) no segundo turno da eleição. As duas campanhas escalaram emissários para abrir as conversas em nome dos presidenciáveis.

Ontem, a senadora deu novos sinais de que pretende se declarar neutra. Ela trava disputa com a direção do PV para impedir uma adesão imediata da sigla a Serra. Marina recebeu ligações dos dois candidatos, mas não quis marcar reuniões com eles.

O PSDB escalou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para iniciar uma aproximação. Do lado petista, a tarefa caberá ao governador reeleito da Bahia, Jaques Wagner, e aos irmãos Tião e Jorge Viana, do Acre.

Os tucanos contam com o esforço de dois aliados no PV: o candidato derrotado ao governo do Rio, Fernando Gabeira, e o secretário do Meio Ambiente da prefeitura de São Paulo, Eduardo Jorge.

Ontem, Gabeira declarou voto em Serra e disse que conversará com Marina sobre o assunto, mas "sem a intenção de convencê-la". A estratégia tucana é esperar que FHC quebre as resistências da senadora a Serra.

A relação dos dois chegou ao pior momento no debate da TV Globo, quando o tucano a acusou de ter participado do "governo do mensalão".

Em outra frente, o governador eleito Geraldo Alckmin (PSDB) e o prefeito Gilberto Kassab (DEM) foram acionados para negociar com deputados e vereadores do PV.

Eles ajudariam a forçar o apoio institucional da sigla a Serra caso Marina insista em não declarar voto.

O PT escalou amigos da senadora como emissários. Wagner já tentou conciliar verdes e petistas na campanha, quando o ministro Juca Ferreira (Cultura) anunciou apoio à petista. Os irmãos Viana ainda são os principais interlocutores dela no PT, embora tenham apoiado Dilma no primeiro turno.

A petista afirmou em Brasília que não espera atrair o apoio do PV, mas da senadora. "Eu dou muito valor à Marina. Eu respeito a Marina como militante política e acredito que temos mais proximidades do que diferenças. Agora, isso é questão de foro íntimo da Marina", disse.

SEM PROMESSAS

Ao relatar os telefonemas de Dilma e Serra, Marina ressaltou que não prometeu apoio: "Ambos telefonaram para parabenizar pela contribuição que demos ao país e manifestaram o desejo de ter a oportunidade de conversar, caso eu ache oportuno e no momento adequado".

A senadora voltou a indicar que pretende se declarar neutra. Ela repetiu o discurso de que os votos não pertencem a ela, indicando que não dirá a seus eleitores como se comportar: "O cidadão é dono do seu voto. O voto não é da Marina, do Serra ou da Dilma, é do eleitor".

Questionada se poderia apoiar um dos dois após repetir várias vezes que eles são "muito parecidos" e têm uma "visão atrasada" do desenvolvimento, ela sorriu e não respondeu.

O coordenador da campanha verde, João Paulo Capobianco, fez coro ao discurso.

"Se os candidatos quiserem o apoio dos eleitores da Marina, eles têm de convencer os eleitores. A Marina não é dona do voto de ninguém", afirmou Capobianco.

A senadora estuda usar o momento para tentar arrancar promessas de Dilma e Serra em questões sensíveis a ela, como a mudança do Código Florestal e a construção da usina de Belo Monte.


Colaboraram Nancy Dutra , Simone Iglesias e Márcio Falcão , de Brasília

Influência de verde no segundo turno será relativa, afirmam especialistas

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Claudia Antunes

DO RIO - A análise das eleições presidenciais desde 2002 indica que Marina Silva (PV) herdou votos de dissidentes tucanos e petistas e que a ascendência da candidata sobre esse eleitorado no segundo turno deve ser relativa, afirma o cientista político Cesar Romero Jacob, da PUC-RJ.

A influência do PV, que não conseguiu aumentar sua bancada federal (de 14 deputados) apesar da votação de Marina, tende a ser menor ainda, diz Jacob, autor de "A Geografia do Voto nas Eleições Presidenciais: 1989-2006".

"Tirando 1989, quando Leonel Brizola transferiu os votos maciçamente para Lula no segundo turno, não existe outro caso parecido. Em 2002, Ciro Gomes e Anthony Garotinho tiveram juntos cerca de 30% dos votos no primeiro turno e recomendaram voto em Lula, mas metade foi para o Serra", afirma.

Ao analisar as séries históricas, Jacob aponta que Dilma (PT), com 46,9% dos votos, ficou no patamar que Lula teve no primeiro turno em 2002 (46,4%) e também em 2006 (48,6%).

Marina, com 19,3%, atingiu pouco mais do que a soma dos votos dos ex-petistas Heloísa Helena (PSOL) e Cristóvam Buarque (PDT) no primeiro turno de 2006 -9,5%-, com os 9 pontos que separaram a votação de José Serra (PSDB) agora, 32,61%, da do tucano Geraldo Alckmin naquele ano (41,62%).

Isso não significa, pondera o cientista político, que houve uma migração exata desses eleitores. Mas, uma vez que o voto propriamente ambientalista é reduzido, a comparação mostra que o apoio de tucanos e petistas insatisfeitos foi importante para o desempenho da candidata do PV -o presidenciável do PSOL, Plínio de Arruda Sampaio, teve só 0,87%.

OUTROS FATORES

Além dessa confluência, ele aponta mais três possíveis fatores que pesaram na votação de Marina:

1) Os dons pessoais e oratórios da candidata, que é "boa de fala" e livre do "engessamento" imposto a Dilma e Serra pelo marketing político;

2) A ação de oligarquias regionais, nos Estados do Norte e Nordeste onde a verde teve mais votos do que o previsto, interessadas em aumentar o poder de barganha, sobretudo com Dilma;

3) As manifestações nas últimas semanas de bispos católicos e pastores evangélicos contra a petista.

"A Marina não é dona dos seus votos. Um segundo turno foi do interesse de muita gente", diz Jacob.

Alberto Almeida, do instituto Análise, afirma que não há evidência de que fatores morais ou religiosos tenham favorecido Marina em detrimento de Dilma. "É como o boato de que Serra ia acabar com o Bolsa Família."

Ele acredita que as denúncias que derrubaram a ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra tiraram votos da petista em favor de Marina, em especial entre eleitores com renda de 5 a 10 mínimos e que têm de 18 a 30 anos. "Há forte correlação entre essa faixa de idade e o aumento do nível educacional da população", afirma.

Mas Almeida também acha difícil antecipar para onde vão os votos da verde: "Carisma não migra".

Embora acredite que o tucano será o maior beneficiário, ele calcula que, para chegar a mais da metade dos votos válidos, Dilma só teria que ganhar 15% dos votos da verde. "Serra tem que ter 85% e ainda tirar votos de pessoas que votaram em Dilma. Não é trivial", afirma.