quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Reflexão do dia – Alain Touraine

Uma coisa é clara. O Brasil tem um sistema político horrível, corrupto. Fernando Henrique Cardoso, em seus oito anos de governo, construiu as instituições. Fez uma transição perfeita para entregar a Presidência a seu sucessor, Luiz Inácio Lula da Silva.

Lula, por sua vez, realizou transformações sociais, tirando dezenas de milhões de brasileiros da miséria e da exclusão.

Graças aos dois, em igual importância, o Brasil tem os elementos básicos para desenvolver um novo tipo de sociedade. Mas não sou necessariamente otimista. Não sabemos o que acontecerá daqui para a frente.

A nova presidente (Dilma) foi inventada por Lula. O Brasil tem um longo passado de populismo e a ameaça persiste devido ao nível de desigualdade social extremamente elevado. Após 16 anos dos governos FHC e Lula, é impossível questionar o potencial do Brasil.

Mas o perigo de um retrocesso existe, até porque o passado do PT está longe de ser perfeito. Lula não foi autoritário, mas segmentos do PT o são. A ideia de Dilma esquentar a cadeira por quatro anos para Lula também me desagrada. Em uma democracia, não pode haver presidente interino.

A verdade é que não sabemos o que será o governo da nova presidente, porque ela não tem experiência política. Mas eu acredito que o Brasil tem tudo para ser o lugar em que uma nova sociedade surgirá. Não vejo muitos outros países no mundo que tenham chances tão boas quanto o Brasil. José Serra, candidato derrotado do PSDB, deu a entender que fará com seu partido uma oposição mais dura ao governo Dilma, diferente da postura de seu partido frente a Lula.


(Alain Touraine, entrevista, em O Globo, 15/11/2010)

Diferenças emergentes :: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

Discutir a globalização e as diferenças emergentes no mundo multipolar que vem se impondo à antiga ordem estabelecida, especialmente após a crise financeira internacional de setembro de 2008 que ainda espalha suas consequências, principalmente nos Estados Unidos e na Europa, é o objetivo central do XXII Conferência da Academia da Latinidade, que começou ontem no Rio.

Embora entre os participantes estejam também especialistas em América Latina, e as especificidades das experiências políticas no continente venham a ser objeto de debate, sobretudo as chamadas "novas democracias", o que se destacou mesmo no primeiro dia foi a definição do cientista político Candido Mendes, secretário-geral da Academia da Latinidade, de que o Brasil está cada vez mais marcado como parte dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China); dessa maneira, amplia sua importância geopolítica na percepção internacional.

Um dos especialistas em América Latina presentes ao seminário é o professor Javier Sanjinés, da Universidade de Michigan.

Ele desenvolve em seu trabalho a ideia de "descolonização", em que defende a tese de que o tempo histórico do Ocidente "se rompe ao se chocar com a vida de nossos povos".

Considera que, depois de dois longos períodos de projetos de desenvolvimento que eram baseados nos parâmetros predominantes no Ocidente, hoje as regras do jogo estão mudando, "abrindo caminho para que a não contemporaneidade das várias nações rompam com a noção de Estado nação tradicional".

Como representantes dos Brics, participaram da conferência dois scholars chineses. Tong Shijun, vice-presidente da Academia Social de Ciências de Shangai, e Wang Ning, professor das Universidades de Shangai e de Tsinghua, desenvolveram temas complementares envolvendo as múltiplas modernidades e as múltiplas democracias chinesas.

O professor Wang Ning definiu a modernidade na China em três períodos: como um projeto iluminista de 1919 até 1949; como um discurso totalitário de Mao em busca da modernização do país de 1949 a 1976; e, hoje em dia, com a tentativa de ser global, mas agir local (glocal), em busca de uma modernidade com características chinesas.

Ele defende a tese de que a modernidade na China atual desconstruiu a ideia de que seja possível haver apenas uma definição de modernidade.

Na definição de Candido Mendes, o mundo hoje está em um segundo estágio da globalização. Representa uma ruptura com a fase da globalização hegemônica dos Estados Unidos ou, como compara, o surgimento dos Brics em contraposição ao "velho Salão Oval" da era Bush.

Segundo o secretário-geral da Academia, a globalização coloca em discussão hoje uma hegemonia ultrapassada pelo jogo de interações do mundo multipolar, onde os Brics atuam em outra sintonia que não as confrontações "conhecidas e cansadas" dos antigos impérios do Ocidente.

Candido Mendes vê o Brasil como capaz de ser o mediador entre o velho discurso do império e as vozes de estados imensos como a China e a Índia.

Essa certeza não se abala nem mesmo diante do fato recente de que o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, apoiou recentemente uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU tanto para a Índia quanto para o Japão, deixando de lado o Brasil, que sempre tentou uma palavra oficial do governo dos Estados Unidos a favor de nossa pretensão.

A relação do governo brasileiro com a administração Obama, que já foi de lua de mel (quando Obama disse que Lula era "o cara" e parecia encantado com o brasileiro), hoje é pelo menos fria, e a sensação é a de que a Casa Branca aguarda sinais de como serão as relações no futuro governo Dilma.

A especulação de que a embaixadora do Brasil na ONU poderia ser nomeada ministra das Relações Exteriores deve ter suscitado preocupações no governo americano.

Ela fez um discurso recentemente na ONU afirmando que o Brasil estava muito preocupado com o aumento da pobreza nos Estados Unidos, e sugerindo que Obama adotasse algumas medidas que o governo Lula vem promovendo no combate à miséria no Brasil.

Um discurso provocativo que se esperaria de um representante do governo Chávez, e não do Brasil, comentou um diplomata americano, refletindo a percepção do Departamento de Estado.

Mesmo com esses episódios mais recentes e a crise provocada pela tentativa brasileira de intermediar um acordo sobre o programa nuclear do Irã, que acabou deixando o Brasil isolado no Conselho de Segurança da ONU, Candido Mendes considera que o Brasil tem um protagonismo emergente no cenário internacional e sua Realpolitik do Século XXI acabará se impondo.

Candido Mendes considera que o país é um "parceiro natural" no Oriente Médio e um porta-voz da afirmação das nações africanas. Ele ressalta, no entanto, que os quatro países que formam os Brics têm em comum um forte mercado de consumo interno, mas também assimetrias, quando se verifica que o desenvolvimento sustentável tem que ter um equilíbrio nas suas facetas econômica, social, política e cultural.

O Brasil, dentro desse cenário, é o país mais equilibrado entre os Brics, pois tem uma democracia estável, não tem questões de fronteiras, nem de divisões internas da sociedade.

Operação casada :: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Na realidade bem objetiva da divisão de poder no Congresso, PT e PMDB não querem confusão e sabem perfeitamente bem que nenhum dos dois presidirá as duas Casas.

Portanto, petistas ficam com a presidência da Câmara, onde têm a maior bancada, e pemedebistas pelo mesmo motivo ficam com o comando do Senado.

Isso é ponto pacífico, embora o já frustrado movimento do PMDB na montagem do chamado "blocão" junto com PP, PR, PTB e PSC pudesse indicar que a questão esteja em aberto e os pemedebistas pudessem querer brigar pela presidência da Câmara.

Essa possibilidade só existe na cenografia habitual desse período entre o fim da eleição presidencial e o anúncio das escolhas para os principais cargos da República: ministérios e setores estatais estratégicos.

É sempre assim porque a ninguém interessa sentar na sala de espera de mãos vazias. O PMDB faz cara de mau, exibe os músculos, mas sabe que quem tem a força de fato é a dona da cadeira: quando o governo quer desfazer alianças daquele tipo, desfaz literal e rapidamente a golpes de caneta presidencial.

O que uniu PMDB, PP, PTB, PSC e PR no "poderoso" bloco de 202 deputados não foi doutrina nem firmeza ideológica, mas o interesse fisiológico, pois não? Pois, então: com engenhosidade na arte de se dividir espaços essa questão fica resolvida a contento.

Requintado o gesto realmente não foi. Ainda mais partindo de um PMDB que outro dia mesmo assumia a vaga de Vice-Presidência na chapa de Dilma tecendo loas ao caráter programático de tal aliança.

Na ocasião, um dos próceres do partido chegou a invocar a ressurreição "do antigo MDB" - aquele que serviu de abrigo aos resistentes à ditadura pela via político-partidária - materializada na aliança com o PT.

Pois bem, embora peque de maneira mortal no quesito elegância ao partir para cima da presidente recém-eleita rasgando a fantasia antes do início do baile propriamente dito, o PMDB fez o que fazem os políticos quando querem alguma coisa e acumulam forças para conseguir.

Quando Aécio Neves quis romper o acerto existente entre PMDB e PFL no comando do Congresso, formou um bloco e conseguiu se eleger presidente da Câmara. Explodiu a aliança que sustentava o governo Fernando Henrique, mas é outra história que não interessa à conjuntura atual.

No momento o que importa para o PMDB e os integrantes menores da coalizão é assegurar os melhores lugares possíveis na equipe da presidente Dilma Rousseff.

Depois de desenhado e formado o ministério, o comportamento será outro. PT precisa se preocupar com a disputa interna para a presidência da Câmara e PMDB terá de ficar às voltas com a eterna falta de nomes imunes a escândalos e já considerando José Sarney em feitio de reeleição um mal menor.

Fase de crescimento. O PT no governo Dilma poderá muito menos do que supôs em princípio, quando imaginou assumir o lugar de protagonista que por oito anos foi de Lula.

E isso não por causa da presidente, mas por causa do parceiro PMDB, que, diferentemente do que foi o DEM em relação ao PSDB, não se conformará com o papel de agregado.

Quer sair da atual experiência maior do que está entrando para deixar de ser linha auxiliar.

Estilo. Não é sempre que o fisiologismo explícito do líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves, agrada à cúpula do PMDB - Michel Temer à frente -, cujo modelo de fisiologismo implícito é tido como padrão ideal de conduta.

Fila preferencial. Há no PT uma forte impressão de que a presidente eleita defina em primeiro lugar as áreas econômica - Fazenda, Planejamento e Banco Central - e de Comunicação.

Faria isso ainda dentro do mês de novembro a fim de emitir sinais de tranquilidade a dois setores: o mercado e o que os petistas chamam de "grande mídia".

Os finalistas :: Eliane Cantanhêde

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

CARTAGENA - Que Chávez, que nada! Num encontro de 17 acadêmicos e jornalistas latino-americanos e alemães aqui em Cartagena, na Colômbia, só se pergunta e fala sobre o Brasil pós-Lula, a Argentina sem Néstor Kirchner, a Colômbia de Santos e o Chile de Piñera.

Estão aí, nesses quatro países, as grandes expectativas políticas e econômicas sobre a América Latina num mundo que olha com pessimismo o futuro dos Estados Unidos e com um certo temor o da China.

Como disse Celso Amorim à Folha, esse novo mundo não é mais unipolar nem poderá reviver a bipolaridade dos tempos da Guerra Fria. Exatamente porque há muitos fatores e muitos outros jogadores em campo para equilibrar o jogo.

O Brasil está muitíssimo bem colocado, e sob aplausos da plateia, apesar das cicatrizes causadas pelos exageros da reta final dos dois mandatos de Lula.

Uma opinião comum aqui é que Lula e Amorim extrapolaram ao se meterem com a política nuclear do Irã, tão distante da nossa realidade. Como também erraram e erram ao conduzirem uma diplomacia ideológica que vincula o Brasil à Venezuela e a Cuba, irritando, por exemplo, a Colômbia do ex-presidente Uribe. No mínimo, correram um risco desnecessário, já que o Brasil vai tão bem e tem um papel moderador tão natural e desejável.

Agora, uma ressalva: se a Venezuela vive um caos econômico e Chávez perdeu a graça nos debates formais, é diferente no cafezinho e no almoço. Aí, ele continua sendo um papo irresistível. Não há quem não reconheça, entre alemães, colombianos, argentinos e até a brasileira presente, que Chávez, mal ou bem, provocou densas reflexões e jogou luzes sobre a América do Sul no noticiário internacional.

A grande pergunta é o que vai acontecer na Venezuela. Enquanto os outros quatro grandes andam para frente, o risco venezuelano é andar para trás, perigosamente, sem saber onde vai dar.

A encrenca de uma coalizão muito ampla:: Maria Inês Nassif

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Não é bom ter o PMDB como amigo. Pior ainda tê-lo como inimigo. A presidente eleita, Dilma Rousseff, já deve ter percebido o tamanho do barulho que o PMDB faz e a enorme capacidade do partido de desferir golpes rápidos e certeiros em seus aliados, quando o assunto é participação na máquina do governo. Sozinho, o PT, com sua bancada de 88 deputados na Câmara, será incapaz de se contrapor a isso. E não parece ser do perfil da eleita dar nó em pingo d"água, como conseguiu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, à base da estratégia uma no cravo, uma na ferradura.

Pragmático, o presidente Lula, já na formação de seu primeiro governo, acenou para a sociedade como se sua eleição tivesse sido o produto de uma aliança política mais ampla do que realmente foi. A escolha de ministros comprometidos com a política ortodoxa, no campo da economia, teve a compensação que poderia dar naquele momento, diante da grave crise econômica que o Brasil atravessava: a imediata execução do Programa Fome Zero, posteriormente Bolsa Família, que integrou todos os programas de transferência de renda existentes.

O lado mais curioso dessa ampla coalizão (do ponto de vista da diversidade ideológica dos partidos aliados) foi a solução dada por Lula à Agricultura. Lula tomou o agronegócio como prioridade de governo e manteve o Ministério da Agricultura nas mãos de pessoas ligadas aos grupos ruralistas, que deram ao seu governo mais trabalho do que apoio no Congresso. No outro lado da balança, manteve um Ministério do Desenvolvimento Agrário sempre nas mãos de ministros ligados a movimentos sociais pela reforma agrária. A síntese dessa contradição foi um grande apoio ao agronegócio, mas uma política ativa de crédito e transferência de tecnologia voltada para a pequena propriedade e para a agricultura familiar. O Ministério de Desenvolvimento Social trabalhou articuladamente com o MDA junto a essas famílias, que pelo menos no início do governo estavam inseridas nos bolsões de miséria sob a mira das políticas sociais do governo. Agora já devem ter subido um pouco na escala social.

Dilma define políticas públicas antes de escolher nomes

Lula manteve sob permanente conflito o Ministério da Defesa, no segundo mandato sob a batuta de Nelson Jobim, e a Secretaria Especial de Direitos Humanos, primeiro sob Nilmário Miranda, depois sob Paulo Vannucchi, ambos comprometidos com o "direito à memória e à verdade", ou seja, o esclarecimento das mortes, desaparecimentos e torturas ocorridas durante a ditadura militar (1964-1985). Mais do que seus antecessores, Jobim intermediou as pressões dos militares para deixar as coisas como estão.

No segundo governo, Lula levou às pastas da Economia essa lógica do confronto. Caiu Antonio Palocci, que manteve no Ministério da Fazenda os quadros do governo de FHC e a formulação de política ortodoxa, e colocou Guido Mantega, "desenvolvimentista" - mas com o contraponto de Henrique Meirelles no Banco Central. Acabou dando certo durante a crise a política de forte intervenção do Estado na economia, via Mantega, e de curva muito lenta de declínio dos juros, via Meirelles. Mas o câmbio certamente pagou por isso.

No primeiro mandato, o confronto nas posições de política econômica incluiu também a Casa Civil, sob o comando de José Dirceu. A guerra, aí, não era apenas entre posições sobre política econômica diferentes, mas uma disputa pelo poder no governo e no PT. Com a queda de Palocci e a ascensão de Dilma à Casa Civil, esse foco de conflito diluiu-se e mais tarde, no auge da crise, houve um grande movimento de consenso entre Fazenda, Casa Civil e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em torno de medidas anticíclicas que se mostraram mais eficientes do que a política ortodoxa adotada no governo anterior como resposta a sucessivas crises internacionais.

O bloco que está sendo articulado pelo PMDB com os pequenos partidos de direita na Câmara pretende puxar o governo para um ministério não apenas com muitos pemedebistas, mas mais conservador e menos progressista, em relação à dosagem feita por Lula. Para o PT, existe a opção de fazer também um bloco à esquerda, com os pequenos partidos de esquerda, mas ainda assim organizaria um bloco menor do que o conseguido pelo PMDB.

Resta saber como Dilma reage a esse tipo de pressão. Até o momento, pelas notícias saídas da equipe de transição, ela parece não ser partidária da lógica do conflito, que definiram, ao fim e ao cabo, os resultados do governo Lula. Dilma tem feito primeiro as formulações de políticas públicas. Os nomes, ao que tudo indica, virão depois de definido o rumo que ela quer para cada área. Na política econômica, já deixou claro que não trabalhará com a contradição entre política econômica heterodoxa e política financeira ortodoxa. É certo que o Brasil é outro - e Lula assumiu sob um quase default -, mas a presidente eleita declarou, com todas as letras, que perseguirá uma política de juros menores. O presidente do BC terá de se adequar a isso. Tem expressado também que aprofundará as políticas sociais de transferência de renda. Agora, é ver com adequa as políticas à escolha dos nomes.

A articulação de setores do DEM para incorporar o partido ao PMDB é assunto que, nesse momento, voltou para a gaveta. A avaliação feita pelo partido, na reunião da Executiva ocorrida na terça-feira, é a de que a articulação foi comprometida pela precipitação de alguns setores. Isso teria de ser articulado com muita habilidade, sob pena de provocar grandes resistências de diretórios regionais. E foi o que acabou acontecendo.

O interesse mais imediato na história é do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. E a quem a maioria atribui a culpa de ter levado o partido a apoiar José Serra, contra a convicção de quadros políticos importantes, de que o tucano paulista teria poucas chances de vitória. O filme do prefeito está um pouco queimado. E a discussão do que fazer com o partido foi adiada para depois da posse do novo Congresso.


Maria Inês Nassif é repórter especial de Política. Escreve às quintas-feiras

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Desafios à política econômica pós Lula :: Paulo Paiva

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A primeira declaração da presidente eleita, ainda no calor da vitória, foi muito bem recebida. Ela afirmou seu compromisso com os pilares da política macroeconômica, enfatizando a manutenção do câmbio flutuante, a importância do controle da inflação e o respeito aos contratos. Compromissos semelhantes ao assumido por Lula na Carta ao Povo Brasileiro, na campanha de 2002.

À primeira vista parece ser a sinalização perfeita para a continuidade da política econômica que sobreviveu à administração de três presidentes e que foi um dos principais fatores responsáveis pela resistência da economia brasileira à crise financeira internacional. Mas isso não é tudo. Há razões para apreensões em relação aos rumos da política econômica a partir do próximo ano.

O contexto internacional agora é bem diferente de quando Lula assumiu a Presidência pela primeira vez - determinado, desta vez, por grandes desequilíbrios e incertezas. O desempenho das economias dos países industrializados, os riscos decorrentes das diferentes reações às desvalorizações do dólar, o recrudescimento do protecionismo e a certeza de inflação no futuro impõem cuidados muito mais complexos do que há oito anos. Ademais, a expansão monetária e fiscal nos países avançados é um ingrediente a sugerir flexibilidade nos fundamentos macroeconômicos. Perigo à vista.

Internamente, deve-se olhar com atenção as relações entre a economia e a política. De um lado, a condução das políticas monetária e cambial é de responsabilidade exclusiva do Poder Executivo. De outro lado, todavia, a política fiscal é afetada por decisões do Congresso Nacional, pelas composições partidárias na formação do governo e pelas relações da União com os Estados que, por sua parte, condicionam os limites daquelas políticas. Enfim, as decisões de política macroeconômica não são apenas resultado de opções "técnicas", mas frutos de relações políticas.

Nas experiências dos governos FHC e Lula, por exemplo, o Banco Central gozou de certa autonomia e pôde executar com independência seu mandato, cujos resultados foram fundamentais para o desempenho da economia brasileira. Será que a presidente eleita terá condições para seguir o mesmo comportamento?

Apreensões são grandes também no que concerne à política fiscal. Mais do que nunca, há necessidade de restabelecer o equilíbrio fiscal, reduzindo a velocidade de crescimento dos gastos correntes e ampliando o superávit primário. Nesse setor, torna-se urgente a adoção de medidas que melhorem a eficiência do gasto público, eliminando desperdícios e respeitando as restrições orçamentárias. Deveriam ser aproveitadas pelo governo federal experiências exitosas de gestão pública voltada para resultados com a utilização de princípios gerenciais da iniciativa privada ajustados ao ambiente da administração pública. Infelizmente, as evidências aparecem no sentido contrário - a possibilidade de ressuscitar a CPMF, a concessão de aumentos salariais e outras decisões que irão onerar mais ainda o contribuinte brasileiro, hoje e no futuro.

Os receios também são crescentes em relação à valorização do real e suas relações com a economia em geral. Como observou recentemente o economista Stanley Fischer, "economia forte é incompatível com moeda fraca". Vale dizer, parte da valorização do real é resultado do sucesso do desempenho da economia brasileira. Nesse sentido, em vez da busca por medidas simplistas e com efeitos incertos de desvalorização da moeda, valeria a pena retomar a agenda abandonada referente ao chamado "custo Brasil". Torna-se urgente aumentar a competitividade da economia, reduzindo custos como de logística e transporte e de contratação de mão de obra, para citar alguns exemplos.

Enfim, o êxito da política econômica pós Lula exige da nova presidente mais do que boas intenções para não perder a "herança bendita" que vem dos governos Itamar Franco, FHC e Lula.

Presidente do BDMG, foi Vice-Presidente de Administração e Planejamento do BID e Ministro do Planejamento e Orçamento e do Trabalho

Restrições internas e externas podem forçar mesmo controle de gastos em 2011:: Jarbas de Holanda

O impetuoso desenvolvimentismo de Dilma Rousseff – da formação como economista de esquerda e das posturas como ministra-chefe da Casa Civil do governo Lula – por si só e somado à retórica populista da condução de sua campanha pelo presidente Lula e pelo PT apontavam para um próximo governo com uma escala de gastos públicos (com destaque para as despesas correntes) até maior do que a da última fase do atual. O que reduzia a credibilidade do papel de tranqüilizador do mercado atribuído na campanha a Antonio Palocci e sugeria um esvaziamento, na gestão Dilma, da função de contrapeso da gastança exercida pelo Banco Central. Recorde-se que o deslocamento de Luciano Coutinho, da presidência do BNDES para a do BC, chegou a ser ventilado várias vezes.

Este cenário, altamente preocupante, sofreu uma primeira mudança com o “discurso da vitória”, proferido pela presidente eleita logo após concluída a apuração do 2º turno. No qual, surpreendendo e gerando expectativas favoráveis dos agentes econômicos, da mídia, da própria oposição, ela deixou de lado a retórica do embate eleitoral assumindo posições explícitas de defesa do chamado tripé da estabilidade e da melhoria dos gastos governamentais, de par com afirmações de respeito aos contratos, à livre concorrência, à autonomia das agências reguladoras. E a essas manifestações da presidente eleita se têm seguido sucessivas entrevistas do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo - decerto fortalecido para dizer o que tem dito – anunciando diretivas e medidas no mesmo sentido.

Quais as razões básicas das posições agora assumidas por Dilma Rousseff? De um lado, certamente, a percepção de uma explosão à vista dos gastos correntes da máquina federal e de que isso poderá inviabilizar a sequência e a expansão dos investimentos na infraestrutura e em outras políticas relevantes para o crescimento da economia. Explosão decorrente da soma de compromissos já assumidos no governo Lula para os próximos anos com os custos bilionários de projetos em discussão no Congresso. De outro lado, com a emergência da “guerra cambial”, a previsão de forte agravamento dos problemas das exportações brasileiras, num contexto em que uma indispensável desvalorização do Real dependerá de expressiva redução da elevadíssima taxa de juros - só possível com uma queda da dívida pública acentuada por tais gastos. É que a supervalorização de nossa moeda (combinada com as fragilidades de infraestrutura e logística e os altos custos fiscais e trabalhistas das empresas) rebaixa dramaticamente a competitividade externa, e até a doméstica, de nossos produtos industriais.

Assim, essas novas posições se devem, num primeiro plano, ao esgotamento das mudanças internas propiciadas pelas reformas macro e microeconômicas dos governos FHC e do primeiro de Lula até 2005, com a deterioração das contas públicas nos últimos anos e o simultâneo bloqueio à retomada de reforma. E, num plano paralelo, à piora do cenário global. Diante desse quadro, a presidente eleita deve estar se sentindo compelida a trocar seu desenvolvimentismo “a qualquer preço”, para usar um qualificativo de Marina Silva, e piorado por forte viés estatizante, pela compreensão do imperativo de um controle dos gastos governamentais e do respeito a outros fundamentos da estabilidade da economia. Nova compreensão que, embora ainda seja considerada bem duvidosa e possa não se traduzir em ações concretas, tem recebido amplo estímulo da imprensa. Entre as várias matérias jornalísticas com essas características, destaco a seguir trechos de editorial de ontem do Valor, intitulado “Uma inflexão histórica na política fiscal brasileira”: “Não deixa de ser curioso que os ministros da Fazenda e do Planejamento tenham sugerido à presidente eleita controlar os gastos correntes para elevar os investimentos públicos necessários à sustentação do crescimento econômico”. “É animador que os dois tenham concluído ser indispensável reduzir o ritmo de crescimento desses gastos para abrir espaço no Orçamento da União para os investimentos.

A bem da verdade, o ministro Paulo Bernardo chegou a defender a mesma fórmula no fim de 2005, junto com o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci. Na época, a proposta foi considerada “rudimentar” pela ex-ministra da Casa Civil Dilma Roussef. Mas essa percepção de Dilma pode ter sido provocada por algum problema de comunicação, pois o plano, é bastante engenhoso e, se adotado, poderá efetivamente colocar as contas públicas em um caminho sustentável. A fórmula é bastante simples e parte do pressuposto de que a carga tributária brasileira, a mais elevada entre os países emergentes,chegou ao seu limite, pois a sociedade não aceita mais aumento de impostos. A proposta de Palocci prevê que as despesas correntes continuarão crescendo mas em ritmo menor do que o do PIB”. “Essa estratégia, se for colocada em prática pelo governo Dilma, representará uma inflexão histórica da política fiscal, pois as despesas correntes primárias crescem continuamente como proporção do PIB desde o início da década de 90. Para executar a nova política, o governo terá que controlar as despesas com o pagamento do funcionalismo e com os benefícios previdenciários e assistenciais, que representam perto de 70% dos gastos primários do Orçamento”.

Jarbas de Holanda é jornalista

Para a oposição, começar de novo::Editorial- O Globo

O presidente nacional do PSDB, senador Sérgio Guerra, dá entrevista ao GLOBO em que fala da necessidade de a oposição se recompor, se reestruturar. Diz coisas sensatas: que o partido precisa ganhar um caráter nacional (sutil referência à hegemonia paulista que tem vigorado até agora). "A impressão é que o partido é comandado por um pequeno grupo", ele acrescenta, tomando o cuidado de elogiar a qualidade desse grupo. "Há clara falta de sintonia entre o partido e setores sociais emergentes." Ele exemplifica dizendo que o partido ganhou as eleições nos grandes centros, mas perdeu nos grotões. E, nos grotões, a derrota foi acachapante.

É justo dizer - como faz o senador - que, na campanha recém-finda, a máquina pública foi usada sem a menor cerimônia contra a oposição. Ele também se refere à popularidade ímpar do presidente - assim como o sociólogo Alain Touraine, que, numa outra entrevista, classificou de "impossível" derrotar Lula no contexto de agora. Mas nada disso deve servir de biombo à necessidade urgente de uma reorganização que não fique só na superfície.

É verdade que a oposição conseguiu 40 milhões de votos, e a vitória em dez estados, incluindo Minas e São Paulo. Mas as deficiências da campanha ficaram por demais evidentes.

Faltaram definições básicas - inclusive sobre o papel que cabe a uma oposição no regime democrático. A impressão que se tinha, na primeira fase da campanha, era de que os partidos de oposição concordavam com a tese de que o Brasil começou em 2002. O medo de criticar o governo passava exatamente essa mensagem: de que, por um passe de mágica, o lulismo tinha resolvido os nossos principais problemas, e que só restava agora descobrir o que fazer "depois de Lula", para dar continuidade ao Grande Timoneiro.

Assim pôde prosperar uma imensa injustiça: o esquecimento do que representaram, para o Brasil, os dois mandatos de Fernando Henrique, em que se derrubou, finalmente, o monstro inflacionário, em que se acertaram as finanças dos estados, em que se fez uma Lei de Responsabilidade Fiscal e - last but not least - em que se ensinou o país a viver sem sobressaltos, sem crises políticas inventadas artificialmente, sem ameaças de golpe.

Foi esse Brasil novo que o presidente Lula herdou. Sobre essas bases ele pôde investir numa redistribuição de renda que seria impossível se ele tivesse recebido uma "herança maldita" - o pavoroso mantra que ele acaba de repetir em Seul.

Nada disso apareceu na campanha da oposição. O que se viu foi uma campanha errática, que só mais para o final deu sinais de crítica a atos ou posturas do governo. E, já no desespero da derrota que se aproximava, o candidato oposicionista adotou um discurso que tinha sinais inequívocos de demagogia.

São essas incongruências que precisam ser resolvidas; e, sobretudo, a definição do que seja um estado moderno. Até agora, deixou-se prosperar a ideia de que o Estado é o grande benfeitor, de quem se espera a resolução de todos os problemas. É um modo de criar uma sociedade infantilizada, e, um pouco adiante, o tipo de desastre financeiro que põe no vermelho países ditos desenvolvidos, como os da Europa.

O "bode" do PMDB :: Editorial – Folha de S. Paulo

Formação de bloco partidário, que exclui o PT, explicita clima de mal-estar na base do futuro governo e acirra disputa por cargos

O PT e a presidente eleita, Dilma Rousseff, não esconderam sua contrariedade diante do anúncio do "blocão". É como está sendo chamado o agrupamento partidário, na Câmara, articulado pelo PMDB com PP, PR, PTB e PSC. Juntas, as cinco legendas de centro-direita formariam uma bancada com 202 parlamentares na próxima legislatura.

O PT elegeu 87 deputados, contra 79 do PMDB. Se vingar, o "blocão" será a maior força da Casa, o que obrigaria Dilma a negociar projetos de interesse do governo e eventuais emendas constitucionais com esse conglomerado.

Convém lembrar, antes de tudo, que a maior concentração de poder está nas mãos da chefe do Poder Executivo, sobretudo agora, que acaba de ser eleita. A pressão que o PMDB, associado ao "blocão" fisiológico, poderá exercer sobre Dilma precisa ser relativizada à luz do poder maior da cadeira e da caneta presidenciais.

A movimentação, como não poderia deixar de ser, foi recebida por petistas como um "golpe" do PMDB. Não podem dizer, porém, que tenham sido apanhados de surpresa pelo aliado, como deram a entender. Na quinta-feira da semana passada, a Folha noticiou a articulação. A reportagem apontava duas ordens de interesses na origem do "blocão".

Primeiro, trata-se de usar a força parlamentar para ganhar terreno na composição do futuro governo. O PP e o PR, que hoje controlam dois dos ministérios mais visados (Cidades e Transportes), ganhariam musculatura para preservar sua cota do assédio petista. O mesmo vale para o PMDB, que hoje controla seis pastas e não está disposto a perdê-las.

Segundo, o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves, pretende que o "blocão" seja um instrumento de sua candidatura à presidência da Câmara -contra as intenções do PT de indicar o nome por ter eleito a maior bancada. Depois de manifestar descontentamento com especulações sobre nomes de outras legendas cogitados para ministérios hoje ocupados pelo PMDB, o deputado potiguar explicou: "Só mexem com os nossos. Queremos evitar problemas para Dilma".

Não se sabe, ainda, qual será o destino do "blocão" nem qual o desfecho das negociações partidárias pelo rateio dos ministérios e pelo comando da Câmara.

Sabe-se, isso sim, que o PMDB colocou o "bode na sala" -para usar a imagem popular de quem cria dificuldades para vender facilidades.

O líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), classificou a iniciativa de "deselegante" e advertiu: "Não existe hipótese de a presidente ser tutelada por qualquer bloco".

Apesar dos esforços, ao longo do dia de ontem, para aparar arestas, o anúncio do "blocão" explicitou o clima azedo que envolve as relações entre os dois maiores partidos da base governista. A disputa saiu dos gabinetes.

O PMDB fez um gesto para enfrentar o PT e mandou um aviso. O que está em jogo é a capacidade de Dilma Rousseff de resistir a pressões e ao mesmo tempo acomodar tantos interesses.

PMDB joga pesado:: Editorial- O Estado de S. Paulo

Insatisfeito por não ser tratado como corresponsável pela eleição de Dilma Rousseff, cujo candidato a vice foi o deputado Michel Temer, seu presidente, o PMDB acaba de demonstrar que está disposto a jogar pesado na partilha dos cargos do futuro governo e na disputa pelos comandos do Congresso Nacional.

Pouco importa ao partido que não tenha sido ele, assim como não foi o PT nem tampouco a coligação dilmista, mas, sim, o presidente Lula quem levou a sua escolhida à vitória em 31 de outubro. Na visão dos calejados profissionais da sigla, o fato é que, apesar de todo o seu prestígio, patrimônio político e ascendência sobre a sucessora, Lula será um ex daqui a um mês e meio - e, sem ele, o jogo desde logo é outro.

Dizia o então deputado Roberto Jefferson, ao denunciar o mensalão, que o PT olhava os aliados de cima para baixo. Podia até premiá-los, mas não os chamava para participar das decisões. Servia-lhes pratos feitos.

O PMDB teria motivos para dizer o mesmo agora. Temer mal apareceu no horário eleitoral. Depois, foi preciso que a legenda reclamasse para ele ganhar um lugar, e ainda assim um tanto pro forma, à mesa na qual se prepara o governo Dilma. Ela designou o presidente petista José Eduardo Dutra coordenador político da transição e seu representante na interlocução com os partidos da base. Foi ele, decerto falando em nome da chefe, quem rejeitou a ideia peemedebista de que - no mínimo - cada sigla conservaria a sua cota de ministros.

Ao mesmo tempo, tendo o PT feito a maior bancada na Câmara dos Deputados (88 cadeiras ante 79 do aliado), o PMDB procurou negociar a manutenção de um esquema de rodízio na presidência da Casa entre as duas siglas: o posto seria ocupado por um petista no primeiro biênio da legislatura a se instalar em fevereiro próximo, e por um peemedebista no segundo biênio. O PT dispôs-se a aceitar desde que o arranjo fosse estendido à presidência do Senado, onde o PMDB tem 20 senadores e o PT, 14. Mas, sendo o Senado um feudo tradicional do PMDB e do oligarca José Sarney em particular, esse toma lá dá cá pareceu demais para a autoestima, digamos assim, peemedebista. O PMDB procurou, portanto, dizer ao rival, à sua maneira, que ele não sabia com quem estava falando. Discretamente, deu-lhe o troco.

Na terça-feira anunciou a constituição, na Câmara, de um bloco parlamentar com o PR, o PP, o PTB e o PSC, totalizando 202 deputados. Para todos os efeitos, essas coalizões funcionam como uma bancada única; sendo a maior, como poderia ser, o chamado "blocão do PMDB" se credenciaria para assumir o comando não só da Casa, mas das suas principais comissões, começando pela de Constituição e Justiça, instância primeira de tramitação de todos os projetos e emendas constitucionais. Ao explicar a iniciativa, o líder peemedebista, Henrique Alves, deu o seu recado. "Esse bloco não é para confrontar, mas para organizar (sic) o trabalho nesta Casa e, fora dela, na composição do governo", avisou.

A vinculação declarada entre as duas esferas é uma notícia ominosa para a presidente eleita, pois estaria indicando que o PMDB quer mais do que alterar a relação de forças na Câmara, passando uma rasteira no PT que nas urnas o suplantou em votos e assentos, e mais até, talvez, do que as vagas que demanda no primeiro escalão do Planalto. Juntamente com isso, pretenderia sociedade na definição de políticas de governo. Afinal, uma superbancada de 200 integrantes (em 513) pode não aprovar o que lhe aprouver, mas pode complicar a aprovação do que a contrariar. É certo que Dilma não está desde já rendida. No que já foi interpretado como fogo de encontro, horas depois da notícia do lançamento do "blocão", o líder da bancada de 42 membros do PP na Câmara, João Pizzolatti, negou que sua adesão ao bloco fosse fato consumado. E vem mais, por aí.

Dê no que der, o bote, ou ensaio de bote do PMDB, é o primeiro dos desafios políticos que os aliados deixarão na soleira da presidente - o que não ousaram ou não precisaram, diante de Lula. Dilma terá razões de sobra para se lembrar do aforismo "Deus me proteja dos meus amigos, que dos inimigos cuido eu."

Lula intervém para barrar a criação de 'blocão'

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Menos de cinco horas após o anúncio da criação de um blocão formado por 202 deputados de PMDB, PR, PP, PSC e PTB, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva começou a trabalhar para abortar o movimento de pressão sobre Dilma Rousseff liderado por peemedebistas. Ainda na noite de terça-feira, ele orientou a presidente eleita e o deputado Antonio Palocci a não cederem espaço no futuro governo ao bloco. Em entrevista coletiva ontem, Lula advertiu o PMDB: "Se as pessoas tentam de forma conturbada mexer na política pode não ser muito bom”. Logo depois, o PP procurou se esquivar de maiores compromissos com o bloco. "Não seremos massa de manobra de nenhum partido", disse o ex-líder Mário Negromonte. Já o presidente do PR, Alfredo Nascimento, ex-ministro de Lula, avisou a seus comandados que a legenda não fará nada em "desacordo com o governo".

Lula reage para barrar ‘blocão’ do PMDB e faz advertência aos aliados

Entre reuniões com a presidente eleita, Dilma Rousseff, petista articula nos bastidores retirada de PR e PP do bloco de partidos aliados no Congresso, que seria formado com peemedebistas para pressionar o futuro governo por mais espaço no ministério

João Domingos e Leonencio Nossa

BRASÍLIA - Foi rápida e forte a reação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à montagem de um "blocão" na Câmara dos Deputados liderado pelo PMDB, com 202 deputados, do qual participariam também o PR, PP, PSC e PTB. Menos de cinco horas depois do anúncio do bloco, o presidente Lula deu o troco. E arrancou de lá o PR e o PP.

Primeiro, Lula convocou ainda na noite de terça-feira ao Palácio da Alvorada a presidente eleita, Dilma Rousseff, e o ex-ministro Antonio Palocci, para orientá-los a não ceder espaço no futuro governo aos partidos que formaram o bloco. Depois, foi deflagrada uma operação nos partidos médios para desfazer o que havia sido montado pelo PMDB.

"O PR é aliado do governo e da presidente Dilma. Faz parte do governo. Não faremos nada em desacordo com o governo", declarou a seus comandados o senador Alfredo Nascimento (AM), presidente da legenda e ex-ministro de Lula. Ele disse que qualquer decisão terá de passar pela Executiva e não está nos planos a formação de um bloco.

Nascimento teve o cuidado de não desautorizar publicamente o líder do partido na Câmara, Sandro Mabel (GO), que participara da formação do bloco na terça-feira, ao lado do líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN). Mas deixou claro que não haverá nenhuma decisão agora, taxando a hora de "inoportuna".

De acordo com um interlocutor de Lula, o presidente falou a Dilma das armadilhas que são preparadas pelos aliados no Congresso - como a da formação do blocão - e a orientou a evitar reação mais forte, pois ele trabalharia para abortar o movimento.

Ao receber o futuro vice-presidente e presidente do PMDB, Michel Temer, na Granja do Torto, ontem, para um café da manhã, Dilma ouviu as justificativas para a criação do bloco, mas minimizou a importância da notícia.

O próprio Lula aproveitou uma entrevista coletiva para advertir o PMDB. Indagado sobre o bloco, ele afirmou: "Primeiro que não aconteceu. Parecia que ia acontecer, mas não aconteceu". E emendou: "A política é como um leito de um rio. Se a gente não for um desmancha-ambiente, se a gente deixa a água correr tranquilamente, tudo vai se colocando de acordo com que é mais importante. Se as pessoas tentam de forma conturbada mexer na política pode não ser muito bom". Soou como um alerta.

Após as declarações de Lula, o PP também esquivou-se de maiores compromissos com o bloco. O líder do partido, João Pizzolatti (SC), disse que há muito tempo PR, PP e PTB falavam na criação de um bloco na Câmara, não para influir no governo. "Não seremos massa de manobra de nenhum partido", disse o ex-líder Mário Negromonte (PP-BA).

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, atacou a tentativa de formação do bloco: "Se alguém pensa que com ameaças vai conquistar seus interesses, vai perder. Não é um, nem serão dois partidos que vão definir a composição das mesas da Câmara e do Senado"

Na primeira crise, ''sombra'' já se impõe sobre Dilma

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Marcelo de Moraes

Antes mesmo de tomar posse, a presidente eleita, Dilma Rousseff, já precisou ser socorrida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para conter a primeira crise de relacionamento com sua futura base de sustentação dentro do Congresso.

No momento em que o PMDB apresentou suas armas costumeiras para pressionar o novo governo a ceder mais cargos, foi Lula quem saiu a campo para desmontar o ataque, que já contava com a adesão de PTB, PR e PP.

Acostumado com as pressões sofridas durante os oito anos de sua passagem pela Presidência, Lula precisou de menos de 24 horas para operar nos bastidores e implodir a cobrança por espaços dentro do governo.

O problema é que o movimento de Lula aponta para a possibilidade de ele vir a atuar como sombra da futura presidente.

Não é surpresa para ninguém que os partidos aliados iriam usar todos os expedientes possíveis para tentar arrancar o maior número de cargos do governo.

A novidade é a pouca mobilidade demonstrada por Dilma nessa situação. Se Lula precisou sair em seu socorro numa crise que poderia ser resolvida com a simples ameaça de corte de cargos, nada impede que se imagine a presença do ex-presidente em outras questões importantes.

Isso pode significar que num momento, por exemplo, de dificuldade econômica será o ex-presidente quem apontará o rumo a seguir. Ou que indicará prioridades para determinadas políticas públicas. Em suma, um ex-presidente com assento cativo no Palácio do Planalto.

Não foi à toa que poucas horas depois de ter jogado suas cartas para conter o apetite dos partidos da base, Lula tenha dado declarações públicas afirmando que não iria fazer qualquer indicação para o novo ministério ou para outros cargos.

A declaração só faz sentido porque Lula sabe que poucos acreditam na sua veracidade. Sua movimentação na crise aberta pelo PMDB foi tão forte que ele precisa repetir o máximo de vezes possível que não terá participação na montagem do novo governo para ver se a versão funciona.

Para espantar a impressão de que Lula terá mais participação no seu governo do que deveria, Dilma tem agora um caminho claro a seguir. Precisa assumir claramente as articulações de seu governo. Terá de acostumar seus aliados com a ideia de que as decisões são tomadas por ela. Sob pena de permitir que o poder que lhe foi entregue nas urnas escorregue de suas mãos.

Ministério deve ser anunciado até 15 de dezembro

DEU EM O GLOBO

Nomes da equipe econômica podem ser divulgados antes

Eliane Oliveira e Maria Lima

BRASÍLIA. O vice-presidente eleito, Michel Temer, informou ontem - após encontro com a presidente eleita, Dilma Rousseff - que a expectativa é que o primeiro escalão do futuro governo esteja definido até 15 de dezembro. No entorno de Dilma, chegou-se a cogitar que ela anteciparia as escolhas para a área econômica, mas, até o momento, não há decisão sobre quando será anunciada a composição da equipe econômica.

É praticamente certo que esse grupo poderá ser anunciado antes. Embora sejam grandes as chances de o ministro Guido Mantega permanecer no governo, não é certo que ele continuará na Fazenda.

- Conversamos sobre a formação de governo, mas é a longo prazo. Até dia 15 estará tudo acertado - disse Temer.

Apesar da pressão para que Dilma anuncie antes pelo menos os nomes do ministro da Fazenda e do presidente do Banco Central, há uma avaliação interna de que hoje o cenário é bem diferente do de 2002 e que não há motivo para pressa. Na época, a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva causou desconfiança e fez com que o país sofresse ataques especulativos.

Uma fonte da equipe de transição contou que Dilma está debruçada sobre questões econômicas desde que voltou de Seul, onde participou, com Lula, da reunião do G-20, que reúne as 20 maiores economias do mundo. Ela deixou claro que, nesse terreno, sua grande preocupação é com a guerra cambial protagonizada por Estados Unidos e China, que vem afetando as exportações brasileiras com o real valorizado frente ao dólar.

Sobre o perfil de seu Ministério, Dilma comentou com auxiliares que está mesmo disposta a montar uma equipe com forte presença de mulheres.

Eleita pede que Temer abafe blocão criado pelo PMDB

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

A presidente eleita, Dilma Rousseff, pediu que seu vice, Michel Temer (PMDBSP), abafe o blocão anunciado pelos peemedebistas.

Formado por PMDB, PR, PTB, PSC e PP, com 202 deputados, o grupo tem por objetivo pressionar o governo. Temer solicitou a lideres partidários o fim do "tiroteio" e convidou o PT a fazer parte do blocão.

Dilma pede para Temer evitar blocão

Sem sucesso, vice-presidente eleito convida PT a se juntar ao grupo e solicita fim do "tiroteio" entre os partidos

Líder do governo na Câmara recusou convite e atacou a coalizão, dizendo que ofensiva do PMDB foi "tiro no pé"


Maria Clara Cabral e Márcio Falcão

BRASÍLIA - A presidente eleita, Dilma Rousseff (PT), pediu ontem para que seu vice, Michel Temer (PMDB-SP), abafe o blocão anunciado pelo PMDB.

Após o encontro, Temer seguiu para reunião na Câmara com os líderes do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), e do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP).

Pediu que ambos acabem com "o tiroteio entre as legendas" e convidou oficialmente o PT a se juntar ao grupo. Em vão.

Vaccarezza não só negou o convite como atacou o bloco. A avaliação de petistas é a de que a ofensiva do PMDB foi "um tiro no pé" que não vai surtir efeitos concretos.

O bloco, formado por PR, PTB, PSC e PP (que anteontem chegou a anunciar que estava fora da coalizão, para depois recuar), terá 202 deputados e tem como objetivo ganhar espaço na composição do governo e força nas decisões do Congresso.

"Vocês sabem que esse bloco não existe. Existe apenas uma intenção e apenas isso já deu problema. O PT não vai entrar nisso", afirmou Vaccarezza.

A frase é semelhante à do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que ontem mostrou contrariedade ao comentar o assunto.

"Não aconteceu [a criação do bloco]. Parecia que ia acontecer, mas não aconteceu", afirmou o presidente.

"Se as pessoas tentam, de forma conturbada, mexer na política, pode não ser muito bom. Acho que é hora de os partidos começarem a discutir. Tem 48% de renovação na Câmara, no Senado. Quem vai ser presidente da Câmara, do Senado.

O papel dos partidos é conversar."

O problema citado por Vaccarezza se refere ao PP, cujo líder, João Pizzolatti (SC), fez ressalvas para ingressar no bloco.

"Essa união não significa nenhum tipo de comprometimento com a eleição da Câmara. O nosso objetivo é apenas fortalecer o espaço dos partidos. Não tem nenhuma relação com pedido de cargos, até porque somos da base do governo", afirmou.

Anteontem, após pressão do Planalto, Pizzolatti chegou a negar que estivesse já acertado para colocar seu partido no blocão. Ontem, no entanto, após encontro com Henrique Alves e Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ele mudou de ideia.

O ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e José Eduardo Cardozo (PT-SP) também falaram com líderes da Câmara durante todo o dia de ontem, com pedidos para que o bloco não fosse para frente.

E a resposta dos líderes foi a de que o governo não teria motivo para se preocupar caso todas as promessas com relação à montagem de governo fossem atendidas.

A ofensiva do PMDB ocorre porque a sigla tem se sentido preterida no processo de transição conduzido por Dilma. A sigla também não conseguiu dobrar o PT a respeito de um possível rodízio na presidência da Câmara, que exige o mesmo no Senado.

Dilma convida Mantega a ficar

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Presidente eleita atende a sugestão de Lula, que defendia manter titular da Fazenda, e cogita nomear mulher para Itamaraty

A presidente eleita, Dilma Rousseff (PT), decidiu convidar Guido Mantega a permanecer no Ministério da Fazenda em seu governo.

O convite seria feito ontem a noite, em jantar entre os dois na Granja do Torto - casa de campo da Presidência, cedida a eleita na transição. Anteontem a noite, em reunião com Dilma no Alvorada, o presidente Lula voltou a defender que Mantega continue no cargo.

Segundo a Folha apurou, Lula e Dilma discutiram uma lista de nomes que a presidente eleita quer convidar para montar o primeiro escalão. Dilma planeja anunciar sua equipe econômica na próxima semana.

A eleita disse a interlocutores que gostaria de nomear uma mulher para o Itamaraty. A avaliação, porém, é que não há muitas opções para o posto hoje ocupado por Celso Amorim.


Dilma convida Mantega a permanecer na Fazenda

Manutenção do atual ministro é um dos pedidos de Lula à presidente eleita

Dilma cogita manter Henrique Meirelles no BC até fevereiro; ele não descarta discutir sua permanência no banco

Kennedy Alencar e Valdo Cruz

BRASÍLIA - A presidente eleita, Dilma Rousseff, decidiu convidar Guido Mantega a permanecer no Ministério da Fazenda em seu futuro governo.

O convite estava programado para ser feito ontem à noite, em jantar entre os dois na Granja do Torto -residência de campo da Presidência, cedida à eleita na transição.

Em reunião anteontem à noite no Palácio da Alvorada, Lula voltou a defender a manutenção de Mantega no comando da Fazenda.

Segundo a Folha apurou, Lula e Dilma discutiram uma lista de nomes que a presidente eleita pretende convidar para montar o seu primeiro escalão.

Dilma planeja anunciar sua equipe econômica na próxima semana. Pode divulgar também nomes de ministros com gabinetes no Palácio do Planalto.

Além da permanência de Mantega, ela passou a cogitar a hipótese de manter Henrique Meirelles no Banco Central ao menos até fevereiro do próximo ano, aguardando a posse do novo Congresso Nacional.

Segundo a Folha apurou, Dilma preferia trocar a presidência do BC, mas diminuiu sua resistência em manter Meirelles porque está preocupada com uma piora da economia mundial e seus efeitos no Brasil no começo de seu governo.

Ela voltou de Seul, onde participou de reunião do G20 (grupo que reúne as maiores economias do mundo), disposta a reavaliar a sugestão de Lula para manter Meirelles no BC.

A presidente eleita pediu à sua equipe para sondar Henrique Meirelles sobre a possibilidade. O problema é que Dilma deseja mantê-lo temporariamente.

O presidente do BC respondeu que não descarta discutir sua permanência no banco, mas não numa condição provisória. Ele também gostaria de manter a mesma autonomia que a instituição tem no governo Lula.

DESENHO

Nas discussões para formar o novo ministério, a Folha apurou que a tendência é Antonio Palocci Filho chefiar uma pasta do Palácio do Planalto. Também cresceu a cotação de Paulo Bernardo (Planejamento) para ocupar a Casa Civil, posto já aventado para Palocci.

Nas conversas, discute-se a ida de Palocci para o comando de uma Secretaria-Geral da Presidência remodelada. Gilberto Carvalho, atual chefe de gabinete, também é cotado para a pasta.

Se Bernardo for para a Casa Civil, cresce a possibilidade de Miriam Belchior chefiar o Planejamento, levando para esse ministério a coordenação do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). Belchior se reuniu nos últimos dias com Dilma.

O PMDB já decidiu apresentar os nomes de Wagner Rossi, Edison Lobão e Moreira Franco para integrar a equipe de Dilma. Rossi continuaria na Agricultura.

O PMDB quer retomar Minas e Energia para Lobão, que se reelegeu senador pelo Maranhão. Moreira é o nome para o Ministério das Cidades, hoje na cota do PP.

Governo barra convocação de Erenice

DEU EM O GLOBO

A base governista impediu, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, a convocação da ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra para prestar esclarecimentos sobre tráfico de influência.

Base aliada impede ida de Erenice ao Senado

Já requerimento que pedia a convocação de Dilma Rousseff à Casa foi retirado antes mesmo de ser votado

Adriana Vasconcelos

BRASÍLIA. O governo barrou ontem na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado requerimento que a oposição pretendia aprovar para que a ex-ministra Erenice Guerra comparecesse à Casa, para esclarecer denúncias de tráfico de influência na Casa Civil. Convencido de que seria derrotado em outro requerimento para também convocar a presidente eleita, Dilma Rousseff, o autor da proposta, senador Álvaro Dias (PSDB-PR), atendeu a apelo do líder do PT, senador Aloizio Mercadante (SP). Dias retirou o requerimento sobre a convocação de Dilma, que não chegou a ser votado:

- Não há nenhuma razão para manter esse requerimento, pois não há possibilidade de sucesso - disse o tucano.

Na votação simbólica, a maioria governista derrotou o requerimento para convocar Erenice. Dias disse que a ideia da oposição era dar chance para que as ex-titulares da Casa Civil - Erenice e Dilma - dessem suas versões sobre as denúncias.

- Quando encaminhamos os requerimentos, estávamos em plena campanha. Muitos imaginaram que o nosso objetivo era eleitoral, mas não era. Tanto é que insistimos no convite, valoriza o Senado - explicou Dias.

Para o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), o objetivo principal da oposição continua sendo político. Jucá lembrou que a ex-ministra já havia sido demitida e que as denúncias estão sendo investigadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público:

- Trazê-la aqui seria só tentativa de criar um fato político.

A PF enviou ontem à Justiça Federal os autos do inquérito sobre o suposto envolvimento de Erenice em tráfico de influência. A PF pede mais prazo para as investigações. O delegado Roberval Vicalvi interrogou 20 pessoas; na segunda fase da investigação, a polícia deverá intensificar a análise dos e-mails dos computadores de Erenice e outros envolvidos.

Conclusão de sindicância do caso Erenice ficará para abril de 2011

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

DE BRASÍLIA - A conclusão da apuração interna da Casa Civil sobre o suposto tráfico de influência praticado pela ex-ministra Erenice Guerra e por ex-assessores da pasta, e a eventual punição aos envolvidos, não acontecerá antes de abril do ano que vem.

Desde 17 de setembro, a ex-braço direito da presidente eleita, Dilma Rousseff, e dois ex-assessores da pasta são investigados em uma sindicância instaurada pelo ministro Carlos Eduardo Esteves Lima.

A comissão responsável pela sindicância, porém, não tem poder punitivo. O que o grupo pode fazer é "sugerir" a abertura de um PAD (Processo Administrativo Disciplinar), este de caráter punitivo.

No entanto, esse processo, de acordo com as regras do estatuto do servidor, pode durar até cinco meses.

A decisão sobre a abertura de um PAD -uma réplica de um processo judicial- cabe ao ministro-chefe da Casa Civil. Há a possibilidade de que essa decisão fique para 2011.

Caso o PAD seja instaurado, novos prazos começam a contar, todos eles mais amplos que os da sindicância, que já sofreu duas prorrogações -a última não tinha amparo na lei que baseou a abertura da sindicância. Segundo um integrante da comissão, a prorrogação partiu de uma "interpretação jurisprudencial".

A maior punição administrativa possível para Erenice e os assessores é o impedimento de ocupar qualquer cargo na administração federal.

Ontem, o Senado rejeitou o convite para que Dilma e Erenice prestassem depoimento na Comissão de Constituição e Justiça sobre as denúncias.

Governo quer parcelar as perdas do Rio com pré-sal em 10 anos

DEU EM O GLOBO

O governo federal está concluindo a elaboração de uma proposta para reduzir, gradualmente, o dinheiro que é repassado de royalties e participações especiais aos estados e municípios produtores de petróleo, principalmente o Rio de Janeiro, que é o maior produtor. Prejudicado pelo novo marco regulatório do pré-sal aprovado no Congresso este ano, o Rio teria direito a uma fórmula de transição em que a arrecadação com o petróleo seria reduzida gradualmente pelos próximos 10 anos. Ainda assim, a conta de especialistas mostra que a perda pode chegar a R$ 93,5 bilhões até 2020.

Corte de royalties lento e gradual

Proposta do governo federal muda distribuição do pré-sal em dez anos. Rio perderia R$93 bi

Gustavo Paul

O governo está finalizando uma proposta alternativa para a distribuição de royalties e participações especiais de petróleo, que reduz gradualmente o percentual de receita destinada aos estados e municípios produtores - principalmente o Rio de Janeiro e suas cidades -, mas mantém para cada um deles uma porção diferenciada desses recursos. Ao mesmo tempo, os demais estados e municípios brasileiros vão ter elevação gradativa em sua arrecadação, garantindo maior participação no bolo.

Discutida no âmbito do Comitê de Articulação Federativa (CAF), ligado à Presidência da República, a proposta prevê um período de transição de dez anos - haveria o convívio de duas formas de remuneração por uma década. Os estados receberiam, desta forma, parte da compensação pelo modelo atual e parte pelo novo. Os entes com compensação diferenciada perderiam um décimo de sua participação atual por ano.

Isso significa que, no primeiro ano de vigência do acordo, a participação do Rio seria formada por 90% do que recebe atualmente e 10% pelos novos cálculos. Esta proporção vai se invertendo ao longo da década, de forma que no décimo ano o Rio receberia apenas 10% pelo método atual e 90% pelo novo. No ano 11º, apenas a nova fórmula estaria em vigor - incluindo um tratamento diferenciado, conforme a Constituição determina.

Vantagem a cidades populosas e pobres

Estudo que observa as projeções de arrecadação do Estado do Rio de Janeiro e seus municípios entre 2011 e 2020 dá uma ideia da magnitude da perda imposta pelo modelo. A arrecadação fluminense, que chegaria a R$168,7 bilhões apenas com as áreas já licitadas do pós e do pré-sal, ao fim de dez anos cairia a R$75,2 bilhões - uma redução de R$93,5 bilhões, se for aplicada a redução escalonada conforme a proposta. Apenas uma parte desta garfada seria compensada pela nova fórmula e pela arrecadação com novas áreas.

O modelo, que está sendo elaborado por técnicos de vários ministérios, sob a supervisão do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, e o acompanhamento de entidades municipais, prevê a aplicação da nova metodologia nos casos de royalties destinados aos estados e municípios confrontantes e cidades com operações de embarque e desembarque; e da Participação Especial (PE) para os estados e municípios.

Os demais estados e municípios que não têm receita alguma hoje passarão, de acordo com a proposta, a receber recursos. A distribuição não seguirá os critérios dos Fundos de Participação dos Estados e dos Municípios (FPE) e (FPM), mas um índice que mensura a relação entre a renda e a população municipal: cidades mais populosas e mais pobres receberiam mais do que as demais.

Para neutralizar reclamações de queda abrupta de receitas, os idealizadores lembram que os governos do Rio, do Espírito Santo e de São Paulo e seus municípios também serão compensados pelo aumento da produção de petróleo nos próximos anos. Os megacampos do pré-sal já licitados, como Tupi, devem ter volume consistente de produção a partir de 2014.

Também para evitar questionamentos jurídicos - já que a Constituição garante compensações sobre a exploração do petróleo na plataforma continental - ficam mantidas alíquotas específicas para os estados e municípios confrontantes e os municípios com operações de embarque e desembarque.

Será criada ainda uma terceira categoria: a dos "municípios confrontantes por estado", ou seja, cidades dos estados produtores. Essa remuneração valerá tanto para municípios que produzem quanto para os que não produzem. Seria uma compensação pela não cobrança de ICMS sobre a produção de petróleo, determinada pela Constituição de 1988.

A diferença da proposta em elaboração é que o percentual a ser destinado aos produtores será menor do que atual. Ela salienta que todos os estados e municípios, inclusive os confrontantes, participarão do rateio dos recursos destinados aos entes da federação pelo critério de população e renda. Pelo novo índice, apenas nesta divisão, o Estado do Rio vai ganhar cerca de 5% dos recursos totais: mais do que os 3% de acordo com o critério do FPE.

- A Constituição garante recursos para os confrontantes, mas não especifica quanto. A parcela será reduzida, mas mantém o diferencial. No agregado, os municípios do Rio até ganham mais - argumenta uma fonte com acesso às discussões.

Alta da produção manteria receita

Pelas projeções feitas, a receita do Estado do Rio, que recebe hoje a maior fatia de royalties e participações especiais, se manteria estável em razão do aumento da produção. Em 2009, a receita chegou a R$5,3 bilhões. Já o município do Rio, que arrecadou R$44,7 milhões em 2009, deverá dobrar sua renda.

- Esses cálculos não incluem a variação do dólar, nem do preço do barril, o que significa que a receita estimada pode até ser maior - afirma a fonte.

Depois de concluído, o texto será apresentado ao líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), que deverá incorporá-lo ao projeto que trata da divisão dos royalties, que permaneceu na Casa e só deve ser apreciado em 2011. Ontem, na reunião do Conselho Político no Palácio do Planalto, Jucá disse que ouvirá a Câmara:

- Como já veio da Câmara, e vamos ter de mexer no Senado e voltar para a Câmara, temos de ajustar o texto para que a Câmara também tenha sua opinião.

O líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), avaliou que um acordo no Senado facilitará a aprovação pelos deputados do projeto que estabelece o regime de partilha e cria o Fundo Social, que vai administrar os recursos do pré-sal. Segundo Vaccarezza, a meta é tentar aprovar o texto até meados de dezembro.

A proposta em discussão evita desgastes políticos para o atual e o futuro governo, já que é dada como certa a aprovação pelos deputados da Emenda Pedro Simon (PMDB-SP), que redistribui todos os atuais recursos do petróleo meio a meio entre os estados e municípios. O governo se comprometeu a vetar a medida, mas sabe que precisa de uma contraproposta.

- Querendo ou não, o parlamento já disse duas vezes que não quer o atual modelo - diz um técnico ligado às discussões.

Colaborou Chico de Gois

Mantega descarta mexer no câmbio já

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Para ministro, queda do dólar ante o real é insignificante e por isso não haveria necessidade de novas medidas cambiais ""no momento""

Adriana Fernandes e Fabio Graner

Na contramão das expectativas do mercado financeiro, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, avaliou ontem que a queda do dólar ante o real é "insignificante" e não vê necessidade, "no momento", de novas medidas cambiais.

Com um discurso menos alarmante do que o utilizado na reunião do G-20, quando defendeu o controle de capitais, Mantega disse que as medidas já adotadas pelo governo brasileiro para combater a guerra cambial estão dando certo e agora é o momento de "avaliar" e deixar a taxa de câmbio se acomodar.

"Vamos observar. Também não é bom ficar mexendo toda hora no câmbio", disse o ministro. Para ele, a cotação do dólar está se mantendo num patamar "razoável" e o real foi a moeda que menos se valorizou em relação ao dólar.

As declarações do ministro, dadas no final da manhã, repercutiram negativamente no mercado financeiro. Em reação, a cotação do dólar, que já estava em queda, rapidamente acentuou o movimento de baixa. É que o mercado estava contando com medidas mais fortes do Brasil depois da reunião do G-20, realizada na semana passada em Seul, na Coreia do Sul.

Água fria. A percepção dos analistas de que o governo lançaria mão de mais um arsenal de medidas aumentou depois que Mantega fez uma enfática defesa do controle de capitais como arma para os países enfrentarem a guerra cambial.

A expectativa do mercado era a de que as medidas seriam tomadas imediatamente. Por isso, a fala do ministro funcionou como um verdadeiro balde de água fria para o mercado, que estava à espera das medidas.

Cauteloso, o ministro não descartou, porém, novas medidas cambiais no futuro. "Não vejo necessidade de novas medidas nesse momento, mas a qualquer momento sabe como é que é."

Segundo fontes, o agravamento da crise na Irlanda, que provocou incertezas no cenário internacional e fez a cotação do dólar subir a um nível acima do R$ 1,70 (que funciona como uma espécie de piso informal para a taxa de câmbio) acabou ajudando o governo, dando mais tempo para avaliar as condições do mercado. Não foi à toa que o ministro ontem fez uma referência ao fato de a cotação do dólar no Brasil estar sendo influenciada pela crise na Irlanda.

"Está num patamar razoável. É claro que influenciado pelo problema da Irlanda, problema europeu, mas de qualquer forma mostra que as medidas que temos tomado são eficazes e o real é uma das moedas que menos têm se valorizado em relação ao dólar, portanto, está dando certo", ponderou .

Medidas. Mas, se vier a precisar, o governo conta com algumas medidas para tentar reverter a valorização do real, entre elas a retomada da cobrança do Imposto de Renda sobre os ganhos dos investidores estrangeiros que aplicam em títulos públicos. A cobrança do tributo foi suspensa em 2006, quando a alíquota era de 15%. O uso do Fundo Soberano do Brasil (FSB) na compra de dólares no mercado de câmbio local é outra medida guardada na prateleira.

Para ampliar o poder de fogo do Fundo, no entanto, o governo terá de editar uma medida provisória permitindo ao Tesouro emitir títulos para a carteira do FSB. Com isso, o volume de compra de moeda estrangeira pelo Fundo seria praticamente ilimitado, já que tudo dependeria da disponibilidade do Tesouro em emitir novos papéis. Até mesmo a quarentena para entrada de capital no mercado financeiro não é descartada pela equipe econômica, caso a desvalorização do dólar volte a se acentuar.

Chorinho pra você - Paulo Moura na Estudantina

Ouvindo apenas ::Ferreira Gullar

e gato e passarinho
e gato
e passarinho (na manhã
veloz
e azul
de ventania e ar
vores
voando)
e cão
latindo e gato e passarinho (só
rumores
de cão
de gato
e passarinho
ouço
deitado
no quarto
às dez da manhã
de um novembro
no Brasil)