segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

O começo da história:: Ricardo Melo

Colocado contra a parede, o egípcio Hosni Mubarak recorre ao receituário tradicional dos ditadores. Manda os tanques para as ruas, fuzila manifestantes e "nomeia" títeres da camarilha dirigente para que tudo mude, desde que fique como está.

Tarde demais. Como nas revoluções clássicas, o povo do Egito saiu às ruas sem saber exatamente o que quer ou o que virá. No entanto, sabe muito bem o que definitivamente não quer mais. O relato de correspondentes sobre a força dos protestos mostra que só com um banho de sangue o déspota do Cairo conseguirá ficar de pé.

O pânico entre os donos do mundo é generalizado. Motivos há de sobra.

Desde a Segunda Grande Guerra, o equilíbrio no Oriente Médio repousa em bases frágeis. De um lado, um país como Israel militarizado até os dentes e financiado a fundo perdido pelas potências ocidentais. De outro, autocracias árabes coniventes com a manutenção da pobreza, a subserviência diante da plutocracia ocidental e o esmagamento do povo palestino.

Não é à toa que, não mais que de repente, os EUA fazem apelos para uma "transição para a democracia" no Egito. Por que demoraram pelo menos 30 anos? O governo Mubarak não começou no mês passado, tampouco há alguns anos. Há três décadas vem sendo exemplo de absoluta falta de democracia combinada com a perpetuação, e ampliação, de bolsões de miseráveis.

Mas, aos olhos de Washington, cumpria o papel de guardião de uma área estratégica no fornecimento de petróleo. Agora tudo tende a ficar fora de lugar. Sem partidos representativos e deixado à deriva por tanto tempo, o povo egípcio pode tanto virar presa de mais uma teocracia retrógrada como de uma safra de oportunistas. Pode também surgir uma liderança acidental - o futuro é uma incógnita.

Porém já é possível contabilizar vários perdedores. Entre eles, os que apostavam no fim da história após a queda do Muro de Berlim.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

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