terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Governo e oposição no prazo de carência:: Wilson Figueiredo

Na metade do prazo concedido ao novo governo para confirmar a que efetivamente veio, quem está devendo ao eleitorado dizer como pretende não apenas se situar, mas se haver com a responsabilidade e demonstrar que a democracia só tem a ganhar com a alternância dos governantes, é a oposição. Há um vazio à disposição.

Os dois mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva não vão multiplicar o efeito político da operação de vender como classe média a primeira safra de cidadãos que passaram a fazer três refeições por dia. Ainda falta muito a percorrer no longo caminho para a democracia com características universais, sem os vícios tradicionais.

A classe média foi a última parcela social a se constituir com características que não se limitam a um item ou dois. Nada a ver com a versão lulista. Não é produto da economia e, com a industrialização, apenas se anunciou. Veio para ficar e se multiplicar. É ela que explica melhor o Brasil do que qualquer outra forma de entender o que se passou desde 1930 até hoje. Não foi por acidente que lhe coube o peso político de ser o lastro da democracia que se aperfeiçoa a cada eleição presidencial. A classe média que aí está cresceu e se multiplicou sob os efeitos periódicos da liberdade que não trabalha com exclusividades.

Quem deve reparações à opinião pública de um país que já voltou, mais de uma vez, aos princípios mínimos para retomar do começo a democracia abandonada pelo caminho, é esta oposição que apostou na fatalidade fictícia e deixou de fazer sua parte na ilusão de que o PT e Lula, sozinhos, se dariam mal. Esperou em vão que o tempo se encarregasse de reduzir o efeito e o proveito do lulismo sobre os que se curvaram à incerteza de ter outra refeição no mesmo dia em que fizessem a primeira.

Os papeis não se inverteram na nova situação. A oposição continuou do lado de fora da realidade e nem se dá conta de que têm agora apenas a metade do prazo de carência - aqueles cem dias inventados pelos americanos - tanto a nova governante quanto a velha oposição, que não se mostrou à altura da responsabilidade de espelhar o pensamento crítico dos brasileiros no Século 21. No mensalão, não apenas a situação (que já foi a designação eufemística do governismo) se feriu. A oposição também teve baixas e ficou sem voz para repreender o presidente e sua gente. E acabou incapaz de repelir a afronta de ser tratada de neoliberal, com que o PT a carimbou.

Pois é aproveitar os próximos 50 dias, com disposição de relacionar tanto as diferenças quanto as semelhanças, estas mais que aquelas, entre a palavra dada em campanha pela dupla Dilma-Lula e as ações encaminhadas no governo (deles ou dela). Em matéria de oposicionismo, os brasileiros não têm de que se queixar. Dia virá, mas ainda esta longe, em que a qualidade histórica das nações será avaliada pelo teor de competência oposicionista.

De pouco adianta a oposição insinuar que os governos do PT se fizeram com o exibicionismo lulista, pois não chegaram a praticar um corpo de idéias em torno de princípios, mas trabalharam exatamente a falta de idéias sem princípios. A social-democracia acabou se prestando a ser a caricatura neoliberal com que o petismo se fartou, politicamente, de depreciá-la, até a indigestão provocada pelo mensalão, ainda no primeiro mandato.O efeito perverso foi que a oposição saiu dos dois mandatos consecutivos de Lula devendo satisfações ao eleitorado, que mesmo assim retribuiu _ ao que já se entende por social democracia brasileira _ com uma votação que ainda não está sendo honrada.

Nos primeiros cinqüenta dos cem dias reservados, pela gentileza republicana, a quem chega ao poder, a presidente já disse o suficiente para deixar clara a diferença entre o que pretende e o pouco que ofereceu à sombra do presidente Lula na campanha. E, principalmente, o modo ponderado de desempenhar o mandato, nele ja implícito - tentações à parte - o direito a outro.

É jornalista

FONTE: JORNAL DO BRASIL

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