sábado, 19 de março de 2011

Antes tarde do que nunca:: Wilson Figueiredo

Um dia, antes tarde do que nunca, teria de acontecer e, quanto mais cedo, melhor para todos, em especial os interessados no voto do cidadão que se preocupa com as idéias liberais que não mais encontram espaço.Teria chegado a vez de se retraírem ao confronto das idéias? Ou será apenas para o liberalismo de barbas brancas pagar a conta? Os liberais são a minoria declinante que compete com o uso da gravata para ver quem será o último a dar o fora. Talvez seja a maneira prática (e não teórica) de se aferir pela aparência (ou idéias) um liberal. Se bem que ainda se esbarre, eventualmente, com aquela frase de Líbero Badaró que, ao se despedir, declarou que morria um liberal, mas não a liberdade. O princípio continua de pé e as frases duram mais do que os homens.

Segundo os repórteres da Folha - Uirá Machado e Maurício Puls, que levantaram a questão subjacente no pluripartidarismo brasileiro - das legendas eleitorais portadoras do adjetivo liberal, surgidas desde o fim da última ditadura, sobrou para o PFL (Partido da Frente Liberal) a entrega das chaves ao novo inquilino da herança, o DEM, e nem assim o pseudônimo foi capaz de dar conta da missão. Mesmo correndo por fora, não foi suficiente. As outras legendas que se deram mal ao se declararem liberais desistiram enquanto era tempo de mudar sem chamar a atenção. O adjetivo não se compromete com o substantivo que as tendências políticas dizem representar. As últimas tentativas debandaram.

Depois que o Estado Novo fez reserva de mercado eleitoralmente rentável no social, as dificuldades para os partidos que apostaram as ultimas fichas no liberalismo mostraram que - independente de ditadura ou democracia - os governos não abririam mão do privilégio de administrar responsabilidades sociais. E, para arrematar a questão, Lula passou como um furacão e equalizou por baixo a maneira brasileira de mostrar que a teoria continua diferente na prática. Poucos foram capazes de separar o que é direita do que seja esquerda e, sem esta distinção, não é pertinente a consideração ideológica do que se passou (e ainda não acabou de passar) desde o último recomeço democrático há mais de vinte anos.

Liberais, velhos ou moços, entenderam afinal que o liberalismo dá sinais de eleitoralmente esgotado como crédito político, e tratam de aproveitar a oportunidade para continuarem em cena. Reduziram-se a uma única legenda e as demais se compuseram da melhor maneira de simular o que são com aparência do que não são.

A outra maneira menos vulgar de contornar a situação está sem saída depois que Lula passou por aqui e, à direita e à esquerda, enganou mais do que podia e o eleitorado facilitava . Em pesquisas de opinião, no ano passado, mais de metade dos brasileiros ouvidos nada sabia nem percebia das diferenças entre esquerda e direita, ao passo que Lula se serviu e robusteceu a tese de que não existe mais uma nem a outra: é a preliminar que o Brasil não resolveu a tempo e tem embutido um sobre-preço de risco.

O dia em que não houver mais esquerda nem direita, o mundo perderá o rumo.

O ex-presidente enganou o mais que podia nas circunstâncias em que deu as cartas, e é provável que ele próprio não soubesse onde pisava, nem aonde iria levá-lo a barafunda ideológica em que se meteu. Há uma direita aparente e outra que se disfarça de esquerda, por ter traços genéticos que a ascensão do fascismo mostrou por onde passou, enquanto vamos perdendo tempo na ilusão de ganhá-lo.

Trata-se de um filão valioso, com indícios que estão aflorando de maneira reincidente, mas ainda há tempo de se aprender a distingui-los: a história não se repete em proveito dos que não aprendem com seu curso natural. E a água dos rios não passa duas vezes pelo mesmo lugar.

FONTE: JORNAL DO BRASIL

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