sexta-feira, 4 de março de 2011

O Rio – Final::João Cabral de Melo Neto

Ou
relação da viagem
que faz o Capibaribe
de sua nascente
à cidade do Recife

Os dois mares

A um rio sempre espera
um mais vasto e ancho mar.
Para a agente que desce
é que nem sempre existe esse mar,
pois eles não encontram
na cidade que imaginavam mar
senão outro deserto
de pântanos perto do mar.
Por entre esta cidade
ainda mais lenta é minha pisada;
retardo enquanto posso
os últimos dias da jornada.
Não há talhas que ver,
muito menos o que tombar:
há apenas esta gente
e minha simpatia calada.

Oferenda

Já deixando o Recife
entro pelos caminhos comuns do mar:
entre barcos de longe,
sábios de muito viajar;
junto desta barcaça
que vai no rumo de Itamaracá;
lado a lado com rios
que chegam do Pina com Jiquiá.
Ao partir companhia
desta gente dos alagados
que lhe posso deixar,
que conselho, que recado?
Somente a relação
de nosso comum retirar;
só esta relação
tecida em grosso tear.

Fim de "O Rio"

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