terça-feira, 26 de abril de 2011

Bancos desafiam BC e abrem guerra por crédito a servidor

Bancos públicos, entre eles o Banco do Brasil, e instituições privadas estão desrespeitando circular do Banco Central que proíbe a exclusividade na concessão do crédito consignado (com desconto em folha) para servidores. Esses bancos efetuam o pagamento dos salários, mas têm que garantir a liberdade para que os funcionários públicos possam tomar empréstimo onde encontrarem melhores condições. De olho num mercado de quase R$ 140 bilhões, os bancos estão exigindo exclusividade desses servidores. A disputa já foi parar na Justiça e envolve o funcionalismo em nove estados, incluindo três capitais (São Paulo, Manaus e Natal) e outras 40 cidades. O Banco do Brasil, que controla um terço desse mercado de consignado, é um dos maiores interessados em manter a exclusividade, contrariando o BC. O caso já foi parar no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Um milhão sem alternativa

Bancos descumprem determinação do BC e mantêm na Justiça exclusividade no crédito consignado a servidores

Ronaldo D"Ercole

Cem dias depois da publicação de circular pelo Banco Central proibindo contratos de exclusividade entre bancos e órgãos da administração pública para a concessão de empréstimos consignados, muitos acordos ainda estão em vigor: no total, são nove estados, três capitais (São Paulo, Manaus e Natal) e outras 40 cidades, impedindo cerca de um milhão de servidores de buscar no mercado as melhores condições para a contratação de crédito com desconto no contracheque. A maioria desses contratos envolve o Banco do Brasil, que é líder no mercado de consignado e que, com os governos estaduais e prefeituras, tornou-se alvo de ações na Justiça. A Associação Brasileira de Bancos Comerciais (ABBC, que reúne instituições de pequeno e médio portes) e entidades ligadas ao funcionalismo são os grandes opositores da exclusividade. E, depois de algumas idas e vindas, decisões recentes da Justiça indicam uma mudança na disputa.

No último dia 13, o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Ari Pargendler, negou recurso do governo do Pará contra liminar do Tribunal de Justiça (TJ) do estado que suspendia a exclusividade do Banco do Estado do Pará (Banpará). Até então, em demandas envolvendo esses casos o STJ vinha se posicionando a favor dos governos. No caso do Rio Grande do Norte, o TJ estadual chegou a julgar o mérito de ação da ABBC, suspendendo a exclusividade do BB no consignado, mas uma liminar do STJ manteve o contrato. Na próxima semana o TJ da Bahia deve julgar ação semelhante, que questiona o contrato do governo baiano e o BB.

BB: novos contratos não terão cláusula

Com uma carteira de R$45 bilhões em financiamentos consignados, o que lhe dá 32,7% de participação num mercado de R$141 bilhões, o BB defende a legalidade dos contratos em vigor, firmados antes da edição da circular 3.522, do BC, mas informa que não incluirá mais essas cláusulas em novas negociações.

- Não podemos abrir mão de algo pelo qual pagamos, mas tomamos a decisão de não mais incluir essa cláusula em novos contratos. O BB não precisa disso para continuar líder - disse o vice-presidente de negócios de varejo do BB, Paulo Rogério Caffarelli, lembrando que apenas 12 de um total de 12 mil contratos de administração de folha do banco com órgãos públicos têm cláusula de exclusividade no consignado.

Questionado sobre a disputa jurídica em torno de sua circular, o BC informou entender que sua medida aplica-se apenas a acordos posteriores à data de sua publicação, 14 de janeiro. O advogado Marcelo Angélico, que representa a ABBC, contesta tal interpretação.

- A natureza da circular é de cunho declaratório, reafirmando uma ilegalidade que sempre existiu, não constitui nenhum direito novo - diz Angélico, referindo-se ao fato de a medida do BC ter por fundamentos constitucionais a livre concorrência e os direitos do consumidor. - Não temos nada contra a compra de folhas de salários pelos bancos. O consignado, por outro lado, não é direito do estado nem do banco, mas do servidor de escolher o que fazer.

O BB evoca também, em defesa de seus contratos, um parecer do STJ, emitido em resposta a um dos muitos recursos contra julgamentos em primeira instância favoráveis ao fim da exclusividade, que reconhece como prerrogativa do poder público autorizar ou não o empréstimo consignado "na forma que lhe for mais oportuna e conveniente". Pargendler, presidente do STJ, justificava seu parecer alegando que os acordos implicam custos às administrações estaduais e municipais e que, por isso, os contratos firmados são os que trazem "maior vantagem ao erário público".

- Ao negar recurso na ação do Pará, o presidente do STJ mudou sua posição em relação à exclusividade. Seu argumento anterior não era jurídico, mas econômico, embora a ele coubesse defender a lei - diz Rafael Matos, advogado que representa a Federação Interestadual dos Servidores Públicos (Fesempre).

Com duração média de cinco anos, muitos dos contratos de exclusividade do BB já têm parte do prazo transcorrido. Outros, como o com o governo baiano, foram renegociados ano passado. O Bradesco é um dos poucos bancos privados com contrato de exclusividade, no caso com a prefeitura de Manaus. O banco não entra no mérito da discussão e, em comunicado, afirmou que tal contrato foi "celebrado antes da publicação da circular do BC" e "em processo de livre concorrência entre os participantes do mercado".

- A única coisa que os contratos de gestão de folha (com governos e prefeituras) asseguram é a prioridade de relacionamento com os sevidores. Mas os bancos incluíram a exclusividade no consignado para aumentar o retorno desses contratos - diz Renato Oliva, presidente da ABBC.

FONTE: O GLOBO

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