quinta-feira, 7 de abril de 2011

Fome, vontade de comer e angu:: Vinicius Torres Freire

Por que os economistas de Dilma Rousseff se agitam como doidos na tentativa de barrar parte da torrente de dólares que inunda o Brasil?

1) Porque a enchente é perigosa mesmo, pode causar endividamentos excessivos de empresas e especulações potencialmente daninhas;

2) Porque o governo quer evitar que o capital externo ajude a encher ainda mais a piscina de crédito oferecida ao brasileiro no auge do calor de gastar e se endividar, o que é mau num momento de inflação em alta;

3) Porque o governo não quer valorização extra do real;

Por que o dinheiro de fora é despejado aos montes no Brasil (quase US$ 36 bilhões, no saldo do entrou e saiu neste ano, até março, 44% mais que o tutu externo que veio no ano inteiro de 2010)?

1) Porque sobra capital barato no mundo. EUA, Europa etc. baixaram os juros a zero ou quase; ainda "imprimiram" dinheiro a fim de reflacionar (ou evitar a deflação) em suas economias hecatombadas pela vaga da Grande Recessão. Parte dessa "reflação" veio dar aqui. Não há investimento rentável o bastante no mundo rico, o dinheiro procura economias que crescem e juros altos. Como a do Brasil;

2) Porque os empresários daqui e de fora estão animados com a perspectiva de pelo menos meia década de bom crescimento. Porque haverá um ciclo bom de investimento: infraestrutura, Copa, Olimpíada, pré-sal, fábricas e serviços novos para o povo que recente e ineditamente começou a consumir;

3) Porque, além do mais, numa economia já aquecida, o governo põe lenha na fogueira. Contratou muito gasto em 2010, não vai conseguir contê-lo em 2011 e dá indício de que vai acelerá-lo em 2012. Além do mais, injeta capital em banco público, o que estimula ainda mais o paciente febril, com o termômetro marcando IPCA a 6% e subindo.

Ou seja, há fome e vontade de comer. Sobram capital no mundo (ao menos até o fim do ano, mais ou menos) e vontade de consumir no Brasil.

Problema: as ações do governo para minorar o problema dos excessos da economia são incoerentes.

O governo acredita, talvez com razão, que pode reduzir a inflação sem elevar demais os juros (que, no entanto, subirão) -uma alta de juros tornaria ainda pior o problema de influxo excessivo de capital e o do real forte.

Ok. Em vez de esfriar a economia com juros, pode-se, alternativa ou complementarmente, resfriá-la com redução de gasto público.

Mas o governo não toma medidas convincentes de redução do próprio gasto, agora e daqui a três anos, o que reduziria o excesso inflacionário de consumo sem que fosse necessário apelar a juros altos demais ou a cortes demasiados no consumo das famílias ou no investimento "produtivo".

Mas Dilma Rousseff e seus economistas parecem acreditar que não haveria bem incoerência. Haveria providências alternativas capazes de dar liga a esse angu. Ou seja, barragem direta à entrada de capital para Bolsa, para investimento de curto prazo em renda fixa, ao endividamento de curto prazo de empresas e, quiçá, medidas para machucar o mercado de derivativos.

Algumas dessas medidas são úteis e prudentes. Mas não parecem resolver a incoerência de base da política econômica, nem são capazes de barrar a maré de capital sobrante no mundo. Talvez sirvam de remendo e de refresco.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

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