segunda-feira, 18 de abril de 2011

Jabuticabas:: Ricardo Noblat

“Ele [Lula] se esquece que eu o derrotei duas vezes. Quem sabe ele queira uma terceira. Eu topo.” (Fernando Henrique)

Somente no país da jabuticaba, fruta genuinamente nacional, deputados podem fundar um novo partido sem deixar antes os partidos pelos quais se elegeram. Os partidos relegados não emitiram um único “ai”. E a Justiça Eleitoral sequer indagou: “Mas o que é que é isso?” A favor da Justiça, diga-se que ela só age quando provocada. E não foi.

A esdrúxula situação se estabeleceu na semana passada, quando o prefeito Gilberto Kassab, de São Paulo, visitou o Congresso para anunciar a criação de um novo/velho partido — o Partido Social Democrático (PSD). Velho porque o PSD existiu em meados do século passado e acabou extinto pelo regime militar de 1964.

A ata de fundação do PSD foi assinada por 11 deputados do DEM, o ex-partido de Kassab, e por mais 21 de outros partidos da oposição e da situação.

Ao PSD serão bemvindos políticos de direita, de esquerda e de centro “interessados na construção de um Brasil melhor”. Podem apoiar o governo. Ou a ele se opor. À vontade.

O PSD do “pode tudo” é tão brasileiro quanto a jabuticaba.

O que desde já lhe permitiu produzir uma esquisita jabuticabazinha: pelos próximos três a seis meses, seus fundadores deverão permanecer nos partidos que os abrigam hoje. É o tempo necessário para que o PSD passe a existir de fato e de direito.

Mandato de deputado pertence a partido — não ao seu titular, conforme a lei.

Se o titular do mandato abandona o partido pelo qual foi eleito, perde o mandato.

A não ser que prove ter sido perseguido enquanto esteve no antigo partido. Ou prove que o partido mudou de orientação depois de sua eleição.

Ou então prefira fundar um novo partido.

Como o PSD existe de fato, mas ainda não de direito, se seus fundadores largassem seus atuais partidos poderiam perder os mandatos.

Daí... Daí porque o líder do PMN, que é um dos fundadores do PSD, seguirá falando como líder do PMN. Ele comanda uma bancada de cinco deputados — três deles de saída para o PSD.

No país em que se plantando tudo dá, há jabuticabas de longa vida e outras ocasionais.

Marco Maia (PT-RS), presidente da Câmara dos Deputados, passará à História como o inventor da viagem oficial destinada a assistir a um jogo de futebol. Convenhamos: uma baita jabuticaba.

No caso, novinha em folha. E singularíssima.

Maia anunciou que viajaria à Espanha na companhia de dois colegas para uma série de compromissos. Nada mais natural, pois, que a Câmara arcasse com os custos da viagem. Descobriu-se, depois, que os compromissos careciam de qualquer importância. E que haviam sido marcados para que ele pudesse assistir ao vivo Real Madri x Barcelona.

Então um dos acompanhantes de Maia, o deputado Romário (PSB-RJ), desistiu de viajar. O outro disse que pagaria as despesas do seu próprio bolso. E, por fim, Maia afirmou que faria a mesma coisa. Se a viagem era oficial, a Câmara que pagasse. Se não era, por que Maia & cia.

requisitaram passagens e diárias à Câmara?

Tem jabuticaba mais sem gosto do que o cargo de vice- presidente da República? Onde há vice, ele exerce alguma função. Tipo: presidir o Congresso. Aqui, o vice serve para substituir o presidente quando ele viaja.

Ou para sucedê-lo se ele morrer, renunciar ou for derrubado. Presidentes de outros países não transferem o cargo ao viajar.

Nosso jabuticabal é frondoso e perene. No final dos anos 70, um decreto acabou com a necessidade de se reconhecer firma. Não pegou. E os cartórios? Como sobreviveriam? Entre as exigências para a abertura de uma empresa, está um alvará do Corpo de Bombeiros.

Se o prédio onde ela funcionará já tem o “habitese”, para que alvará?

Correção monetária era tão jabuticaba que não tinha tradução para o inglês. E a CPMF? Jamais se ouviu falar de contribuição provisória tão duradoura. O ex-deputado Márcio Moreira Alves estava coberto de razão ao proclamar: “Tudo aquilo que só tem no Brasil e não é jabuticaba, é besteira”.
FONTE: O GLOBO

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