sexta-feira, 15 de abril de 2011

Mitos do jornalismo:: Merval Pereira

Dando sequência à discussão sobre o papel das novas mídias em contraposição à mídia tradicional, tema que abordei na coluna de quarta-feira com base no seminário do Instituto de Estudos Empresariais (IEE) realizado em Porto Alegre, recebo um artigo do jornalista americano Tom Rosenstiel, atualmente dirigindo o projeto para excelência do jornalismo do Centro de Pesquisas Pew, um dos mais importantes dos Estados Unidos.

Ele aponta o que considera serem os cinco mitos sobre o futuro do jornalismo, dando a opinião de quem está no mercado jornalístico há muitos anos, com relevantes serviços prestados à causa da liberdade de expressão e da qualidade da informação.

A partir de 1997, um grupo de jornalistas, liderado por Bill Kovach e Tom Rosenstiel, organizou seminários, entrevistas e pesquisas pelo país para fazer uma análise da imprensa americana.

O trabalho, sobre o qual já escrevi aqui na coluna, resultou no livro canônico "Os elementos do jornalismo - O que os jornalistas devem saber e o público exigir". No livro, Kovach e Rosenstiel classificam quais seriam os princípios do bom jornalismo.

Além de coisas óbvias e indefinidas como cobrir assuntos "de forma interessante e relevante" ou dar espaço "abrangente e proporcional" aos diversos assuntos, há a reafirmação da necessidade de o jornalista ter compromisso com a verdade e ser independente, além de trabalhar "livre com sua consciência".

A lealdade com os cidadãos e a necessidade de ser "monitor independente do poder" são também ressaltados.

Rosenstiel agora se debruça sobre as questões que afligem o mercado jornalístico, tratando de colocar em perspectivas algumas questões que ele considera "mitos".

Primeiro mito: a mídia tradicional está perdendo sua audiência.

Rosenstiel garante que não se trata de uma crise de audiência, mas sim de lucratividade.

Apesar da migração para a internet, as tradicionais organizações jornalísticas não perderam leitores nem espectadores.

Dos 25 mais populares sites de notícias, todos, com exceção de dois, pertencem à mídia tradicional, como o "New York Times" ou CNN, ou a agregadores da mídia tradicional como Google ou Yahoo.

Segundo mito: o noticiário on-line ficará em boa situação assim que os lucros da publicidade aparecerem.

Para Rosenstiel, essa questão está mal colocada. No ano passado, a publicidade na internet ultrapassou a na mídia impressa, atingindo US$26 bilhões.

Mas apenas uma pequena parcela, talvez menos de um quinto, foi para organizações jornalísticas.

A indústria jornalística ficou com US$22,8 bilhões, mas apenas US$3 bilhões vieram da internet.

Terceiro mito: conteúdo será sempre o mais importante.

Para Tom Rosenstiel, essa afirmação não corresponde à verdade atualmente. A chave para a mídia do século XXI é ter o maior conhecimento do comportamento da audiência, não produzir o conteúdo mais popular.

Entender que sites estão sendo visitados, que conteúdos eles querem, que produtos eles compram e até suas coordenadas geográficas permitirá aos anunciantes atingir melhor os consumidores.

Segundo Rosenstiel, são as companhias de tecnologia que terão a maior parte desse conhecimento, e não as produtoras de conteúdo.

Quarto mito: jornais estão em declínio em todo o mundo.

Ao contrário, nos últimos cinco anos, diz Rosenstiel, a circulação dos jornais impressos tem crescido 5%, e o número de jornais vem crescendo em todo o mundo.

Isso acontece especialmente nos países em desenvolvimento, enquanto os problemas se concentram nos países ricos.

As razões para a melhoria nos países emergentes são a redução do analfabetismo, o crescimento da população, desenvolvimento econômico e pequena penetração da banda larga.

Rosenstiel cita que na Índia, por exemplo, a população está crescendo e ficando mais alfabetizada, mas apenas uma pequena parte está conectada.

Quinto mito: a solução é focar nas notícias locais na internet.

Tom Rosenstiel diz que o problema do conteúdo muito focado em noticiário local é o seu apelo limitado. Não haveria mercado de massa, haveria poucos anunciantes, e o lucro seria pequeno. Como produzir conteúdo local on-line com lucratividade permanece um mistério para as empresas americanas.

Continua provocando grandes polêmicas o artigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso que está sendo publicado na revista "Interesse Nacional", que foi para as bancas ontem.

O extenso artigo tem uma infinidade de análises e conceitos, é uma espécie de roteiro de ação para as oposições, escrito mais pelo sociólogo do que pelo político FH.

E os políticos, tanto da oposição quanto governistas, apegaram-se em uma frase para criticar o todo.

Talvez o ex-presidente pudesse ter mais cautela ao abordar a questão da perda de contato das oposições com o "povão", mas ele simplesmente faz uma constatação óbvia: sem os instrumentos de que dispõe o governo para cooptar esse eleitorado mais carente e menos informado, cabe à oposição trabalhar aquele eleitor que está mais propenso a mudar de governo, as diversas classes médias do país.

A mesma classe média que já foi eleitora do PT e que o abandonou pela oposição nas grandes cidades e capitais do país, ao mesmo tempo em que o "povão", especialmente no Nordeste, que já foi eleitorado cativo do antigo PFL, passou-se para o governo com os programas assistencialistas.

FONTE: O GLOBO

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