terça-feira, 26 de abril de 2011

O dragão da inflação contra a ex-guerrilheira

Dilma diz que todas as atenções do governo estão voltadas ao combate à inflação. Mas até agora nenhuma medida se mostrou eficaz para segurar os preços

No Distrito Federal, o preço da gasolina pega fogo. Depois de seguidas altas, já passou dos R$ 3. Ovo, tomate, cebola, pimentão, carne… Tudo está mais caro. E, pouco a pouco, um monstro que parecia banido do país voltou a por as garras de fora e desafia o governo.

Em guarda, a presidente Dilma expressou preocupação com a fera. “Todas as nossas atenções estão voltadas para o combate acirrado à inflação”, disse, ontem, após tomar vacina contra a gripe. Para 2011, o governo estabeleceu como teto da inflação um IPCA — índice oficial que mede o custo de vida — de 6,5%. Pelas projeções do mercado, a mais de oito meses do fim do ano, o indicador já bate nos 6,34%. E caminha célere para superar a meta.

Inflação, o maior desafio de Dilma

Preocupada, a presidente diz que o governo não se curvará à escalada dos preços. Mercado já vê alta de 6,34%

Victor Martins, Sílvio Ribas e Fábio Monteiro

Nada do que o governo fez até o momento foi suficiente para salvar as expectativas de inflação do pessimismo de especialistas e consumidores. Até mesmo as projeções para 2012 foram contaminadas e já superam o centro da meta (4,5%) — por enquanto, estão em torno de 5%. A situação se agravou a tal ponto que a presidente Dilma Rousseff foi obrigada a se manifestar. Em uma tentativa de afugentar a descrença que se abateu sobre o combate à carestia, ontem ela admitiu que a escalada de preços não é mais tolerável e ainda classificou o fenômeno como algo impossível de ser ignorado.

“Nós (o governo) temos imensa preocupação com a inflação. Não haverá hipótese alguma que o governo se desmobilize diante dela. Todas as nossas atenções estão voltadas para seu combate acirrado”, disse Dilma, antes de se reunir com o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Mas, questionada se haveria o anúncio de novas medidas com o intuito de conter a alta de preços, ela preferiu não se pronunciar. O tema dominou a agenda com o auxiliar. Na pauta, discutiu-se a continuidade da estratégia das ações alternativas aos juros — o que já vem ocorrendo — para conter o encarecimento do custo de vida.

A moderação do Banco Central, depois de ter reduzido a alta dos juros durante a última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) na semana passada, foi o que colocou lenha na fogueira da descrença do mercado em relação ao BC. Foi também o que forçou Dilma a entrar em campo. Enquanto a autoridade monetária promoveu um ajuste de 0,25 ponto percentual na taxa básica de juros (Selic), o mercado pedia 0,50, como sinal do compromisso para frear a carestia. Como o aperto maior não veio, especialistas avaliaram que a crise entre os analistas financeiros e a instituição deve se acirrar.

“O BC colocou em xeque sua própria credibilidade. Está jogando toda responsabilidade para as medidas macroprudenciais, que não têm histórico de eficiência”, avaliou Rossano Oltramari, analista-chefe da corretora XP Investimento.

Cenário ruim

A publicação semanal do Boletim Focus, do Banco Central, que divulga a média das estimativas de aproximadamente 100 instituições financeiras para a economia brasileira, evidencia a crise de credibilidade. Pela sétima vez seguida, o levantamento elevou a previsão para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 2011. Em 12 meses até 15 de abril, o índice oficial já acumula alta de 6,44%. E caminha a passos largos para o limite estabelecido como teto da meta de inflação (6,5%): registrou 6,34% na semana passada e, na visão de economistas, vai piorar depois de a Selic não ter sido elevada no patamar esperado pelo mercado.

Especialistas alertam que o resultado do Focus ainda não captou a última decisão do Copom, já que a coleta de informações terminou antes de o BC anunciar a taxa de juros básica de 12% na semana passada. “Por isso, a tendência é piorar”, explicou Elson Teles, economista-chefe da Máxima Asset Management. A inflação real também continua pressionada. Enquanto o governo enfrenta dificuldades para contê-la e convencer os analistas, os consumidores amargam uma mesa menos farta.

Frustração

A dona de casa Mara Almeida, 33 anos, é um exemplo. Esposa de servidor público, ela conta que tem realizado cortes severos no orçamento familiar. “Normalmente, gasto cerca de R$ 700 em compras no mercado, mas neste mês estou levando apenas R$ 400”, contou. Na avaliação dela, alimentação e limpeza foram as principais vilãs para as contas de sua família. “Os legumes subiram bastante, mas são itens que não faltam na mesa de ninguém. O preço das carnes também está muito salgado. Lá em casa, a gente gosta muito de fazer um churrasco no fim de semana, mas se mantivermos isso, vamos acabar estourando o orçamento”, disse.

Apesar da insatisfação, Mara tem esperança de que o cenário de alta dos preços se reverta. “Tomara que mude. Eu me sinto um pouco frustrada, porque votei na Dilma e achava que os preços de várias coisas, como o dos combustíveis, se manteriam parados por um bom tempo, mas até agora só vi subida”, reclamou. A esperança da dona de casa, entretanto, deve demorar um pouco para se confirmar. Para Teles, o IPCA fechado de abril, com anúncio aguardado para 6 de maio, vai mostrar que o custo de vida encareceu 0,80%. “O número é bastante alto. Está pressionado pelos preços de combustível, alimentação, vestuário e saúde, por conta de reajuste de remédios”, disse.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

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