domingo, 31 de julho de 2011

Corrupção - cortar o mal pela raiz :: Suely Caldas


Quanto custa uma obra pública? A limpeza em andamento no Ministério dos Transportes tem revelado custos disparatados, que extrapolam a racionalidade dos números, transitam pela ilegalidade e terminam em cifras que agridem o contribuinte. Grosso modo, a obra deveria seguir o modelo do orçamento de um cidadão que planeja reformar a sua casa. Mas não. Afinal, por que é tão complicado?

Ao contrário da obra privada, a pública costuma incorporar custos extravagantes - doações de campanha eleitoral, a parcela do partido político do ministro, o lucro da turma intermediária do governo - ao valor do contrato com a empreiteira, quando ela é escolhida sem licitação ou em obscuros adendos que triplicam o preço inicial que a empresa apresentou para vencer concorrentes. Há, ainda, custos decorrentes da duração da obra - propositadamente longa para absorver dinheiro público por mais tempo. Ao longo de sua existência, o Tribunal de Contas da União e a Controladoria-Geral da União colecionam milhares de casos estapafúrdios. Punições? Raríssimas, dá para contar nos dedos.

Há solução? Um caminho para impedir a corrupção? A presidente Dilma tem tentado, nomeando gestores técnicos para o lugar de suspeitos. É um caminho pouco seguro, pois depende da vontade política do governante de enfrentar a corrupção. Dilma a tem enfrentado, Lula deixou correr frouxo e até a incentivou. Resolver de forma institucional seria tirar da classe política a gestão de setores do governo que absorvem muita verba pública. Não é o que tem ocorrido e a governabilidade virou palavra mágica para justificar o mal feito.

A mera substituição nada garante. Nem de pessoas nem de siglas. Desmoralizado diante da opinião pública, tal o histórico de corrupção, o antigo Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (Dner) mudou de nome para Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Mudou a sigla, mas não a roubalheira. Também a Valec nada mais é que a continuidade de práticas desonestas que destruíram a antiga Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA).

No âmbito da reforma do Estado, FHC privatizou muitas estatais que, administradas por políticos, eram sugadoras de dinheiro público, com crônicos e eternos prejuízos, causados justamente pelo seu uso político. Ferrovias da RFFSA, usinas siderúrgicas, telefônicas, distribuidoras elétricas e bancos estaduais se tornaram empresas privadas lucrativas e bem-sucedidas. Com exceção de algumas telefônicas estaduais, todas só acumulavam rombos que o contribuinte era chamado a cobrir.

A privatização atraiu protestos, sindicatos contestavam na Justiça - era a reação ao desconhecido, num país que passou um século inteiro vivendo sob a proteção do Estado provedor. O mundo mudou, o papel do Estado ficou mais bem definido após a queda do Muro de Berlim e a privatização ensinou aos brasileiros que se desfazer de estatais deficitárias foi um bom caminho para desenvolver o País e eliminar a corrupção, pelo menos onde o estatal virou privado.

Além do reconhecimento da incompetência do Estado em concluir obras antes da Copa, a privatização de três dos maiores aeroportos do País vai evitar o que aconteceu com os chamados "puxadinhos" construídos pela Infraero. Só no Aeroporto de Guarulhos (SP) foram desviados R$ 254 milhões.

Dos 37 Ministérios (Lula criou 12, para abrigar partidos aliados), há dois que merecem permanente vigilância de Dilma, se ela realmente quer afastar e punir corruptos. Minas e Energia, responsável pela construção de hidrelétricas, e Transportes, com suas estradas e ferrovias, são os que mais concentram obras gigantes, caras e vulneráveis a fraudes. Não só porque lidam com contratos de valores elevados, mas também pelas dificuldades de a fiscalização mensurar com exatidão certos custos, como o volume de cimento usado numa barragem ou de asfalto numa estrada. Justamente pelo poder de camuflar fraudes e de canalizar recursos públicos para fins político-privados, são Ministérios cobiçadíssimos por partidos e que Lula generosamente entregou ao PMDB e ao PR.

Jornalista, é professora da PUC-Rio

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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