quinta-feira, 21 de julho de 2011

A débil articulação política do governo e a defesa das prerrogativas do Congresso::Jarbas de Holanda

Reportagem do Estadão, de anteontem – “Governo trava pauta da Câmara no semestre” – mostra a que nível deplorável chegou a dependência ou subordinação institucional dos deputados federais ao Executivo. Subtítulo e texto de legenda da reportagem: “Pela primeira vez, deputados não tiveram um dia de votação livre de imposições do Executivo”. “Hegemonia – MPs e projetos enviados pelo governo com urgência impediram votação de praticamente todas as demais matérias”. Abertura: “O governo conseguiu um recorde no controle do trabalho da Câmara neste ano. Pela primeira vez na história do Legislativo, a pauta do plenário da Casa esteve trancada todos os dias do primeiro semestre. Ou seja, os deputados entraram em recesso, na sexta-feira (dia 14), sem ter tido a possibilidade de conduzir uma pauta livre da imposição do governo”. A matéria foi desdobrada em reportagem adicional – “Maia e Planalto se esmeram nos truques” - com o seguinte lead: “Além de segurar as votações, o governo tem outro instrumento para controlar a pauta e (só) liberá-la quando for conveniente. O Executivo pode retirar o regime de urgência ou revogar uma MP. Quando há interesse, o governo e o presidente da Câmara, Marco Maia (PTRS), têm uma série de medidas “criativas” para furar o bloqueio da pauta” (como a utilizada para uma resposta à crise dos bombeiros amotinados do Rio apenas com o parecer da Comissão de Constituição e Justiça, não submetido ao plenário). E ontem o jornal voltou ao tema com o editorial “Ditadura do Executivo”.

Este quadro de subordinação da Câmara – também dominante nas relações do Palácio do Planalto com o Senado (embora em escala menor e, por isto, o empenho do governo em nivelá-las) constitui o principal fator de aviltamento do papel do Congresso, a partir da usurpação das funções legislativos dos parlamentares, cuja erosão favorece a ampla predominância daquelas voltadas à disputa de verbas e outros benefícios para suas clientelas eleitorais e a uma atuação centrada na defesa de interesses corporativistas, quando não orientada basicamente para objetivos ilícitos. Perda de autonomia e desvio de funções que são os maiores responsáveis pela imagem muito negativa do Congresso na opinião pública, estreitamente associada à inoperância e ao fisiologismo, com um potencial de perigosas implicações políticas. Tudo isso reforçado e facilitado por uma amplíssima base governista.

A percepção da gravidade dessas anomalias institucionais e o propósito de enfrentá-las animam diversos parlamentares das duas Casas. Sobretudo vinculados aos partidos de oposição, mas também à base de apoio do governo, inclusive parte da cúpula do PMDB. Entre os primeiros destaca-se Aécio Neves que, com apoio de colegas de outras legendas, busca no Senado restringir o uso abusivo das Medidas Provisórias por meio de substitutivo (já aprovado na CCI – Comissão de Constituição e Justiça) a uma emenda do presidente José Sarney à proposta do Executivo que mantém as distorções do uso dessas Medidas. Trecho de artigo recente de Aécio, no Globo, sobre a votação do substitutivo. “Estaremos diante de uma escolha crucial entre o caminho da necessária recuperação dos princípios básicos que regem as prerrogativas essenciais do Congresso ou o adensamento de uma subserviência que não serve ao país”.

 Mas tal propósito e as restrições do substitutivo de Aécio às MPs – já limitadas por pressão do Palácio do Planalto sobre o peemedebista Romero Jucá que as apoiara na CCJ – só terão espaço para afirmar-se num efetivo processo de retomada da autonomia do Congresso Nacional que se situe acima da dicotomia e da enorme desigualdade de forças entre as atuais bancadas de oposição e dos partidos governistas, a partir de uma postura independente das lideranças do PMDB. Processo que, ainda aparentemente inviável, poderá ganhar corpo do segundo semestre em diante com a configuração de três variáveis políticas. Primeira – a persistência e o agravamento da precariedade da base parlamentar da presidente Dilma Rousseff, manifestada já na fase inicial do seu governo e sem maiores pressões da economia, que vão acentuar-se muito em 2012. Segunda – o aumento dos conflitos na base governista, especialmente entre o PMDB e o PT com a precipitação da disputa entre em torno do comando da mesa da Câmara no começo de 2010 e, sobretudo, dos distintos objetivos nas eleições municipais do final desse ano por meio de candidatos contrapostos a na maioria das cidades, entre elas capitais como Porto Alegre, São Paulo, Salvador. E terceira – um tratamento eleitoral correto do tema pelas lideranças da oposição, apontando as principais causas do aviltamento institucional e ético do Legislativo, bem como os verdadeiros responsáveis por ele, o governo e o petismo.

Jarbas de Holanda é jornalista

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