terça-feira, 27 de setembro de 2011

BC radicalizará corte de juros, apesar da inflação

Com o agravamento da crise europeia, a equipe econômica não descarta uma redução mais ousada dos juros já na próxima reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central, em outubro. O governo, por determinação da presidente Dilma, não considera a possibilidade de abrir mão do crescimento econômico este ano. A avaliação do Palácio do Planalto, contrariando expectativas do mercado, é que o Brasil já vive um cenário de inflação menor, assim como o resto do mundo, o que permitiria uma decisão mais arrojada de cortar os juros, hoje em 12%. Pela primeira vez, no entanto, analistas ouvidos pelo próprio BC já apostam que a taxa vai estourar o teto da meta deste ano, de 6,5%. A previsão é que o IPCA encerre 2011 em 6,52%. Ontem, o dólar recuou 0,38%, a R$ 1,822, e a Bovespa subiu 0,97%

Corte mais ousado nos juros

Apesar de mercado prever estouro da meta da inflação pela 1ª vez, BC deve baixar mais a Selic

Vivian Oswald, Gabriela Valente e Henrique Gomes Batista

Diante de um cenário internacional de crise, que tende a piorar, a equipe econômica não descarta uma redução mais ousada da taxa de juros (Selic) já na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em 18 e 19 de outubro, como arma contra os efeitos da turbulência lá fora. A avaliação do Palácio do Planalto é de que o Brasil já vive um cenário de queda da inflação, assim como o resto do mundo, o que permitiria uma decisão mais arrojada no que se refere às taxas de juros, hoje em 12% ao ano. Essa percepção, porém, vai no sentido inverso à dos economistas ouvidos pelo Banco Central (BC) em sua pesquisa semanal do Boletim Focus, que, pela primeira vez, preveem um estouro do teto da meta de inflação este ano, fixado em 6,5%, justamente pelo afrouxamento da política monetária. Segundo o boletim, o IPCA, índice usado pelo governo, encerrará o ano em 6,52%. Foi a sexta previsão seguida de alta da inflação.

De volta de uma rodada de conversas com autoridades monetárias e o setor financeiro na Europa e nos EUA, o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, estão ainda mais preocupados com a situação internacional. Segundo interlocutores, preveem uma deterioração grave no cenário europeu já nos próximos dias.

Dilma não quer abrir mão de crescimento

A percepção é que o cenário descrito na ata da última reunião do Copom, divulgada há duas semanas, e descrito como "catastrófico" por alguns economistas, vem se confirmando. O governo, por determinação da presidente da República, Dilma Rousseff, não considera a possibilidade de abrir mão do crescimento econômico este ano. Daí o cuidado de agir depressa, antecipando-se ao agravamento da crise, para não repetir 2008, quando o BC errou na mão ao esperar tempo demais para começar a cortar os juros após o estouro das hipotecas americanas.

Em Nova York, na semana passada, a presidente afirmou que não se sai de uma crise profunda por meio de políticas recessivas:

- É importante procurar respostas novas a problemas novos. Não acredito que se saia da crise produzindo recessão. Temos a experiência de duas décadas perdidas.

Ontem, após uma semana no exterior, a presidente recebeu Mantega logo pela manhã e a pauta incluiu a situação econômica nacional tendo por base todos os cenários discutidos lá fora. O presidente do BC também voltou ontem ao país. A avaliação da autoridade monetária é de que o dia nos mercados foi mais calmo. Nenhuma nova medida para dar liquidez está descartada, sobretudo no mercado futuro, foco das turbulências da semana passada.

A decisão de mudar o Imposto Sobre Operações Financeiras (IOF), segundo uma fonte da equipe econômica, ainda não foi tomada. Para os especialistas, a alta do tributo travou o mercado porque pegou todo mundo no contrapé com apostas na queda do dólar e na alta da Selic, o que não aconteceu. A preocupação é evitar que as turbulências internacionais, o sobe e desce do dólar, as previsões maiores de inflação venham contaminar as expectativas da população.

Para se defender, o governo tem de arsenal R$420 bilhões de depósitos compulsórios (recursos que os bancos são obrigados a manter no BC) que podem ser usados na eventualidade de faltar crédito no mercado. Ou seja, a qualquer momento o BC pode injetar mais recursos na economia. Além disso, a autoridade monetária tem cerca de US$350 bilhões em reservas, que podem ser usados em caso de um ataque especulativo. O Tesouro Nacional tem em caixa recursos suficientes para honrar todos os vencimentos da dívida pública nos próximos seis meses e já comprou todos os dólares necessário para quitar seus compromissos atrelados à moeda americana até o início do ano que vem.

O governo não indicou um percentual de corte dos juros pelo Copom, mas considerando que a leitura feita pelo mercado no Boletim Focus previa uma redução de 0,5 ponto percentual, a aposta de alguns analistas do mercado é de que o corte na reunião de outubro poderá ser o dobro disso.

Mercado prevê que dólar voltará a cair

A previsão do Boletim Focus para a inflação no ano que vem também não pára de crescer há quatro semanas e chegou a 5,52%. Com relação ao dólar, mesmo com a moeda americana beirando os R$2 na semana passada, a maioria dos analistas diz acreditar que o dólar deve retornar ao seu patamar anterior e fechar 2011 em R$1,68: apenas três centavos a mais que o previsto na semana passada. E preveem o mesmo valor para o ano que vem.

Já a projeção de crescimento do país segue em queda. Nessa semana, houve apenas um pequeno ajuste de 0,01 ponto percentual: foi a oitava vez seguida que os analistas diminuíram a previsão que já está em 3,51%.

A incerteza sobre o comportamento futuro da cotação do dólar e seu impacto na inflação foi o principal motor do aumento das expectativas de inflação para ano, furando o teto da meta. Para Elson Teles, economista-chefe da Máxima Asset, uma eventual queda no preço das commodities (produtos básicos com cotação mundial, como trigo e petróleo), pode ser anulado pela alta da cotação da moeda americana.

Luiz Roberto Cunha, professor da PUC-Rio, afirma que falta uma clareza da atuação do BC, que na semana passada atuou vendendo papéis para conter a valorização da moeda americana. Para ele, mesmo assim, a variação do IPCA do ano tende a cair a partir de outubro.

A economista Cornélia Nogueira Porto, do Dieese, diz que a alta do dólar afetará setores industriais que dependem de insumos importados e que estão com margens reduzidas, como remédios, medicamentos e químicos, além de alimentos. Ela lembra que até o fim do ano ainda haverá importantes aumentos de tarifas públicas em importantes regiões metropolitanas.

FONTE: O GLOBO

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