domingo, 25 de setembro de 2011

Exportadoras podem perder 2 bi com dólar

A disparada do dólar pode elevar em R$ 2 bi encargos de oito grandes empresas exportadoras do país. O valor considera aumento da dívida em moeda estrangeira e operações no mercado futuro.

Um risco que vem do dólar

Oito grandes exportadores podem perder R$2 bilhões com disparada da moeda

Bruno Villas Bôas

A escalada na cotação do dólar nas últimas semanas - a moeda americana avançou 14,81% desde 31 de agosto, para R$1,829 na sexta-feira passada, após bater R$1,963 na máxima de quinta-feira - pegou exportadores brasileiros mais expostos ao risco cambial. Os balanços de oito das maiores exportadoras mostram que o avanço do câmbio para uma faixa de R$1,95 a R$2,08 cria um risco de perdas cambiais das companhias de R$2,15 bilhões. O valor considera operações com derivativos cambiais (contratos da moeda no mercado futuro), dívidas em moeda estrangeira e outras exposições. Num cenário mais dramático, com a moeda cotada entre R$2,40 e R$2,50 frente ao real, o retrato ficaria mais preocupante, com perdas possíveis de R$4,2 bihões. As simulações levantadas pelo GLOBO, com auxílio de especialistas em contabilidade, são das próprias empresas e foram informadas na chamada "análise de sensibilidade" de seus balanços do segundo trimestre deste ano.

Especialistas acreditam, no entanto, que as companhias brasileiras não devem repetir os episódios de Aracruz, Sadia e Votorantim, que, juntas, perderam R$5 bilhões e quase quebraram na crise financeira de 2008 por causa de apostas erradas no mercado de derivativos (câmbio no mercado futuro). E lembram que desde a publicação dos balanços em 30 de junho as empresas podem ter percebido a mudança de tendência da moeda e buscado mais proteção contra o câmbio, evitando as perdas. Todos temem, no entanto, impactos nos lucros.

A JBS, por exemplo, tinha uma necessidade de proteção cambial de US$3,8 bilhões contra a alta do dólar em 30 de junho - data do último balanço divulgado. Essa exposição tinha origem principalmente na dívida da empresa em moeda estrangeira. Cerca de US$1 bilhão desse valor estava "blindado" contra a alta da moeda por meio de contratos de hedge (proteção) no mercado futuro. Como outra parte estava exposta ao risco cambial, a maior exportadora de carnes do mundo teria perda de R$315,1 milhões no cenário de valorização de 25% da moeda americana, a R$1,951. Se o dólar subisse para a R$2,34, as perdas dobrariam para R$630,17 milhões.

- A empresa pode ter um impacto neste trimestre. Seria um efeito contábil, já que as dívidas não necessariamente precisariam ser pagas agora, com o câmbio alto - explica Ivan Nacsa, sócio do Grupo FBM, especializado em auditoria e contabilidade de hedge.

Empresas correm para se proteger

Como a JBS, as empresas se endividaram em moeda estrangeira este ano aproveitando o dólar barato e a farta oferta de crédito no mercado externo. Segundo dados da Economatica, a dívida em moeda estrangeira de 242 empresas brasileiras de capital aberto subiu R$21,96 bilhões com a alta do dólar desde 30 de junho até a terça-feira passada, numa escalada de R$151,8 bilhões a R$173,7 bilhões. E muitas dessas empresas não protegeram essa dívida do câmbio.

- Ninguém esperava uma alta do dólar com tamanha intensidade em tão pouco tempo e não se cobriram. Vi seis a sete empresas correrem ao mercado para tentar conter seus prejuízos - disse João Ferreira, da corretora Futura. - No mercado não há sinais de empresa com risco forte. O que preocupa é o mercado de balcão, onde exportadores e bancos fazem contratos que não são transparentes. Só saberemos ao certo se existe problema nos próximos balanços.

Segundo especialistas, as empresas podem ter iniciado setembro mais expostas ao câmbio não apenas pela "surpreendente" virada do dólar. Mas também por causa de medidas anteriores do governo para impedir a valorização do real. O Ministério da Fazenda criou, em 27 de julho, um Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para posições líquidas vendidas (apostas contra o dólar) acima de US$10 milhões no mercado futuro.

Para Wolfgang Walter, analista da Global Hedging, especializada em risco e instrumentos derivativos, isso encareceu o custo de proteção contra a flutuação do câmbio. Empresas então podem ter passado a cobrir uma parte menor de suas dívidas em moeda estrangeira.

- Esse movimento também pegou empresas que não são exportadores de surpresa, como importadoras de insumos - acredita.

Companhias minimizam impacto

Um dos casos que mais chama a atenção é o da Marfrig. Um avanço de 25% da moeda americana (para R$1,95) poderia provocar uma perda R$528,70 milhões na empresa. Segundo Cauê Pinheiro, analista da SLW Corretora, a Marfrig pode registar neste trimestre um prejuízo por causa das perdas contábeis com o câmbio:

- A Marfrig tem algo como 70% da sua dívida líquida em dólar. Ela vai ter que registrar essa variação no próximo balanço - disse Pinheiro, para quem o temor do câmbio é um dos fatores do tombo de 17,3% nas ações da empresa na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) na semana passada.

O Banco Central (BC) tem monitorado mais de perto as empresas após os casos de Sadia, Aracruz e Votorantim. O presidente do BC, Alexandre Tombini, alertou diversas vezes que o câmbio "flutua para os dois lados" quando a moeda americana estava em tendência de desvalorização - o dólar chegou a ser vendido a R$1,537 em 26 de julho, menor cotação desde a maxidesvalorização do real, em 1999.

O GLOBO procurou as oito exportadoras avaliadas no levantamento. Quatro delas responderam. A JBS informou que fez uma captação de US$2,06 bilhões na subsidiária americana, para pagar dívidas tomadas em dólar aqui no Brasil. Como a captação foi nos EUA, isso eliminaria efeitos das oscilações e reduziria a exposição em moeda estrangeira. A Fibria informou que possui "sólida política de proteção de seu fluxo de caixa" e que o impacto teria efeito "apenas contábil". A Embraer se disse segura sobre a exposição cambial e que "controla no dia a dia as operações". Para a Marfrig, sua posição de caixa e de aplicações financeiras era de R$4 bilhões em junho, "com uma folga de 71% em relação aos compromissos de endividamento financeiro dos próximos 12 meses".

FONTE: O GLOBO

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