quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Fervura no caldeirão nas semanas finais:: Raquel Ulhôa

Dilma Rousseff chega a menos de três meses do fim do primeiro ano de mandato com uma agenda legislativa sem reformas estruturais e com prioridades pendentes de votação. Até o fim do ano o calendário é apertado e há projetos de interesse do governo na pauta do Congresso. São dez semanas até o encerramento da sessão legislativa (22 de dezembro), com feriados em 2 e 15 de novembro, respectivamente quarta e terça-feira, o que deve esvaziar duas semanas.

A coordenação política do governo vai ter trabalho. O ambiente de votações está contaminado pela polêmica da repartição dos royalties do petróleo, que divide Estados produtores dos demais. A votação no Senado está prevista para 19 de outubro, porém sem acordo que afaste o risco de confronto federativo - com consequências para a União.

O debate em torno dos royalties deixou em segundo plano a reforma do Código Florestal, em análise por comissões do Senado, e a lei de acesso à informação, com regime de urgência para ser votada em plenário, após um bom tempo emperrada por ações do senador Fernando Collor.

Com a ameaça do Senado de retomar a proposta original de fixar em 10% de sua receita o mínimo que a União deve gastar em Saúde, o governo tenta evitar a votação da regulamentação da Emenda Constitucional 29 (define percentuais mínimos a serem aplicados em saúde por União, Estados e municípios). Mas há pressão de municípios e setores ligados à saúde pela aprovação.

Na reta final de 2011, Dilma faz questão mesmo é da prorrogação da Desvinculação das Receitas da União (DRU), que permite ao governo aplicar livremente 20% de suas receitas. A DRU expira em 31 de dezembro e tramita na Câmara uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para mantê-la até 2015. Para ser aprovada, uma PEC precisa dos votos de três quintos de deputados e senadores, em dois turnos de votação em cada Casa.

Deputados querem uma prorrogação menor. O Palácio do Planalto não vai fazer cavalo-de-batalha para garantir os quatro anos. A preocupação é com 2012. O assunto foi discutido na reunião da coordenação política de segunda-feira. Num cenário econômico internacional adverso, o governo quer mobilidade para investir nos planos que considerar prioritários. Para continuar em vigor em 2012, a PEC precisa estar promulgada até 31 de dezembro deste ano.

Correndo por fora, estão o Orçamento Geral da União para 2012 e o Plano Plurianual (PPA), que estabelece medidas, gastos e objetivos a serem seguidos pelos governos federal, estaduais e municipais durante quatro anos. Os dois projetos estão na Comissão Mista de Orçamento e têm que ser votados em sessão do Congresso Nacional (deputados e senadores reunidos). A rigor, o governo não precisa da aprovação do Orçamento, porque pode ir executando no ano seguinte um doze avos da proposta original a cada mês.

Ameaçando as votações da DRU e do Orçamento está a insatisfação da base aliada com a lentidão no pagamento de emendas parlamentares. A falta do PPA também não causaria transtornos para o governo, segundo o próprio relator, senador Walter Pinheiro (PT-BA). O problema, diz ele, seria do Congresso, que estaria abrindo mão da prerrogativa de deliberar sobre prioridades para o país. "O governo vai dizer: vocês não aprovaram, vou tocar meu PAC (Programa de Aceleração do Crescimento)."

Uma das marcas que Dilma quer deixar no primeiro ano de gestão é o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), cuja criação aguarda votação no Senado. Na Câmara, o governo considera prioritária a criação da previdência complementar do servidor público, por causa do grande déficit anual produzido pelo setor (cerca de R$ 57 bilhões).

Os dois antecessores de Dilma aproveitaram o capital político obtido nas urnas para propor reformas constitucionais no primeiro ano de governo. Na gestão de Fernando Henrique Cardoso, em 1995 o Congresso promulgou cinco emendas constitucionais da ordem econômica. E na de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003, duas emendas constitucionais fizeram, ainda que parcialmente, reformas tributária e da previdência.

A única PEC enviada por Dilma ao Congresso foi a da DRU. Para a oposição, um desperdício. "A presidente não utilizou o capital político de início de governo em favor da diminuição da carga tributária e do custo Brasil e da garantia de segurança jurídica e tranquilidade previdenciária", diz o líder do DEM, senador Demóstenes Torres (GO).

Aliados da presidente têm outra opinião. "No Brasil, existe uma febre para alterar a Constituição. Neste momento, não há grande necessidade de reformas estruturais. Lula fez algumas por necessidade, era um governo diferente do anterior. O governo Dilma é de continuidade", afirma o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE). Ele cita como marcas do início da gestão os projetos de valorização da pequena e média empresa e o programa de combate à miséria.

Mas ele próprio diz que o governo terá de enfrentar a discussão da reforma tributária no ano que vem, junto com outras questões federativas. "Há várias propostas discutidas, como critérios do FPE e do FPM, cobrança do ICMS na origem ou no destino, dívida dos Estados, etc. Temos que pensar tudo isso globalmente", diz. Pinheiro aponta outro problema, que também demanda mudança constitucional: o vencimento das concessões do setor elétrico em 2015.

Para o analista político Antônio Augusto de Queiroz, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), foi opção de Dilma não enviar propostas polêmicas ao Congresso, por não ter capital político próprio e dispor de base parlamentar heterogênea. Para ele, se ela não fez isso ao assumir o governo, não fará em outro momento.

Com a polêmica dos royalties e a insatisfação de aliados com a lentidão na liberação das emendas parlamentares, o caldeirão de pressões ainda deve ferver neste ano. Mas há sempre a solução do esforço concentrado, quando as propostas são aprovadas de roldão.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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