domingo, 25 de dezembro de 2011

OPINIÃO DO DIA – Marco Aurélio Nogueira: o simbolismo do Natal

O Natal é predominantemente uma festa cristã. O dia 25 de dezembro, porém, nem sempre foi uma data dos cristãos, pois até o século 3.º esteve associado ao nascimento anual do "deus Sol" na abertura do inverno. A Igreja Católica, interessada na conversão dos povos pagãos, apropriou-se da data para nela acomodar o nascimento de Jesus. Mesmo assim, o Natal continuou a ser maior do que a cristandade e permaneceu sendo comemorado por muitos não cristãos em diversas partes do mundo. Tornou-se o centro das festividades que celebram o fim do ano. Aos poucos, com o avanço do capitalismo e a preponderância crescente do mercado na vida das sociedades, converteu-se no grande momento econômico de cada ano, período em que indústria, comércio e consumidores são dominados por um afã produtivista e consumista sem paralelo.

A dimensão econômica do Natal passou a concorrer com a força simbólica da data, concentrada na confraternização e na solidariedade. A pressão comercial tornou-se tão intensa que transfigurou algumas belas tradições populares - a troca de presentes, a refeição especial, as árvores enfeitadas, o bom velhinho -, reduzindo-as a caricaturas esvaziadas do simbolismo mais substantivo da data.

Marco Aurélio Nogueira, professor titular de Teoria Política e Diretor do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais da UNESP. Em busca do simbolismo profundo. O Estado de S. Paulo, 24/12/2011.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Ações penais desaparecem no Supremo
Executivos poderão ter até 10 salários de bônus, apesar da crise
Maria Helena Santana

FOLHA DE S. PAULO
Oposição encolhe e é a menor desde a Constituição de 88

O ESTADO DE S. PAULO
Supremo vê crise como a mais grave do Judiciário desde 1999
Empresas estrangeiras são adquiridas por brasileiros

CORREIO BRAZILIENSE
Presidente do STF mantém limites ao CNJ
Consumidor: só pague 50% das taxas do 1º imóvel

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Presidente quer aproximar TCE da sociedade

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Oposição encolhe e é a menor desde a Constituição de 88

A presidente Dilma Rousseff chega ao fim de seu primeiro ano de governo com a menos oposição na Câmara desde a Constituição de 1988.

PSDB, DEM, PPS e PSOL, as siglas adversárias do governo, somam 91 cadeiras (17,5% da Casa). Lula no segundo mandato, enfrentou 30,5% de oposição

Governo Dilma enfrenta a menor oposição desde 1988

Partidos que não apoiam petista só controlam 17,5% da Câmara dos Deputados

PSD, que esvaziou o DEM, atua como aliado em votações mesmo sem fazer parte da coalizão governista

Silvio Navarro, Uirá Machado

SÃO PAULO - A presidente Dilma Rousseff (PT) chega ao final de seu primeiro ano no poder com a menor oposição na Câmara desde a Constituição de 1988.

Os quatro partidos que hoje se opõem sistematicamente ao governo -PSDB, DEM, PPS e PSOL- somam hoje 91 cadeiras, o equivalente a 17,5% da Casa. O percentual representa quase a metade da oposição que Lula enfrentou após sua reeleição (30,5%).

Herdeira da coalizão formada por Lula, Dilma se beneficiou da popularidade do ex-presidente, que ajudou a eleger um grande número de deputados federais aliados.

Em 2010, PSDB, DEM e PPS elegeram juntos 109 deputados. Quatro anos antes, quando Lula foi reeleito, foram 153. O PSOL teve três deputados em ambos os períodos.

O cenário se repete no Senado, onde Lula teve dificuldades. Foi lá que o governo perdeu a votação que extinguiu a CPMF, deixando de arrecadar R$ 40 bilhões ao ano.

Durante a campanha de Dilma, o ex-presidente enfatizou a importância de aumentar a maioria no Senado.

A estratégia deu certo. Hoje os quatro partidos oposicionistas têm 17 senadores, número que era 50% maior no segundo governo Lula.

Desidratação

Para piorar a vida da oposição, a criação do PSD neste ano desidratou o DEM. Em fevereiro, o partido somava 43 deputados. Hoje tem 27.

Segundo o Banco de Dados Legislativos do Cebrap, um centro de estudos, o PSD, embora não faça parte da coalizão de Dilma, atua na Câmara como seu aliado e sempre vota a favor do governo.

O partido chefiado pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, pode entrar no governo na reforma ministerial prevista para janeiro.

Dilma conta ainda com o apoio de outras legendas independentes, como o PTB e o PR, que deixou formalmente a coalizão, mas continua votando a favor do governo.

"Isso é comum sobretudo em regimes parlamentaristas. No Brasil pós-Lula, os independentes às vezes nem estão do mesmo lado na escala ideológica, mas votam com o governo", afirma o cientista político Fabiano Santos, da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro).

Luxo

A taxa de disciplina dos deputados dos sete partidos que têm ministérios no governo Dilma foi de 87% neste ano. Em 2003, primeiro ano de Lula, o índice chegou a 92%.

Para Danilo Buscatto Medeiros, pesquisador do Cebrap, a oposição ficou tão pequena que Dilma pode até se dar ao luxo de liberar a base em determinadas votações.

"Isso era algo que ocorria com [o ex-presidente] Fernando Henrique Cardoso em seu primeiro mandato, quando ele tinha maioria folgada", lembra Medeiros.

Eleito em 1994 após o sucesso do Plano Real, FHC enfrentava uma oposição equivalente a 24,5% da Câmara ao tomar posse.

Atualmente, o maior partido oposicionista na Câmara é o PSDB (50 deputados), derrotado pelo PT nas três últimas eleições presidenciais. O PPS tem 11 deputados.

Para o senador José Agripino Maia (RN), presidente do DEM, o enxugamento da oposição traz prejuízo claro.

"Graças à qualidade de seus quadros, a oposição não viu minguar sua capacidade de fiscalizar o governo e arredondar projetos no Congresso. Agora, nós perdemos as condições de instalar CPIs. Isso é um fato, é um grande prejuízo", afirma Agripino.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

DEM aposta em eleição nas capitais para recuperar força política em 2012

Daniela Lima

SÃO PAULO - Nos últimos dois anos o DEM perdeu suas duas maiores estrelas: José Roberto Arruda caiu do governo do Distrito Federal acusado de corrupção e o prefeito Gilberto Kassab abandonou a sigla para criar o próprio partido.

Ao sair, o prefeito arrastou consigo um de cada cinco deputados federais da oposição e promoveu baixas consideráveis nas bancadas de vereadores e prefeitos do DEM.

Mesmo desidratada, a legenda ainda tem direito a uma fatia expressiva do tempo reservado para a propaganda dos partidos na TV e acha que pode se recuperar nas próximas duas eleições.

No ano que vem, mira as capitais e os municípios com mais de 200 mil habitantes para remontar a base. Acredita ter candidatos competitivos em cidades como Aracaju, Fortaleza e Campo Grande e tenta viabilizar aliança para lançar o deputado ACM Neto em Salvador.

De resto, trabalhará para fazer coligações. Em São Paulo, por exemplo, mantém conversas com o PMDB e o PSDB e espera, numa conta otimista, chegar a cinco vereadores -tinha sete, mas perdeu quatro para o PSD de Kassab.

Em 2014, o partido pretende relançar líderes históricos para a Câmara. O ex-vice-presidente Marco Maciel (PE) e o ex-senador Heráclito Fortes (PI), por exemplo, concorreriam a deputado federal.

Com a votação deles, o DEM espera puxar mais deputados e ampliar a bancada. "Ficaram no DEM os que têm compromisso. E as próximas eleições nos dirão se isso ainda rende votos no Brasil", provoca o presidente da sigla, senador José Agripino Maia (RN).

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Entrevista - Beto Richa: PSDB precisa de 'juízo', afirma governador

Paranaense critica disputa interna entre Serra e Aécio e diz que partido tem de parar de brigar para não encolher mais

Tucano se defende por nomear parentes e diz que primeiras-damas ganham cargos "desde que o Brasil é o Brasil"

Estelita Hass Carazzai

CURITIBA - O governador do Paraná, o tucano Beto Richa, disse em entrevista à Folha que o PSDB deve "ter juízo" e "parar com essa bobagem de briga".

"O partido encolheu nessa última eleição", afirmou Richa. "Se não tiverem juízo, a coisa tende a se agravar."

Ele elogiou o senador Aécio Neves (MG) e o ex-governador José Serra (SP), que disputam a indicação de candidato do PSDB à Presidência em 2014, mas afirmou que o partido "tem um espectro enorme de pré-candidatos".

Folha - No último dia 19, o senador Aécio Neves esteve no Paraná. Vocês conversaram sobre o futuro do PSDB?

Beto Richa - Ele sempre me cobra de estarmos juntos, [diz] que eu seria importante nesse processo de reestruturação, como uma liderança nova. Vive me convidando para eventos. Mas estou me dedicando, pelo menos esse ano, a recuperar o Estado. Ele [Aécio] é uma grande liderança do partido e tem tudo para se consolidar como candidato à Presidência da República. Isso vai depender do tempo, do trabalho interno dele. O [José] Serra já foi candidato, não sei se tem aspiração de novo, é um bom nome também.
O Geraldo [Alckmin], que governa o Estado mais populoso do país, é muito competente. O Marconi [Perillo, governador de Goiás] é uma liderança nova... Enfim, tem um espectro enorme de pré-candidatos.

E entre Aécio e Serra, qual é o melhor nome para disputar a Presidência em 2014?

O melhor é o PSDB parar com essa bobagem de briga, grupos disputando... O partido encolheu na última eleição. Se não tiverem juízo, a coisa tende a se agravar. Ou existe uma união, um desprendimento de todas as partes pensando no fortalecimento do partido, ou a situação tende a piorar. Existem grupos que querem o Aécio, que querem o Serra... Tem que ter um grupo só. No momento oportuno, vamos discutir candidatura. Mas não é agora.

O Aécio está querendo te chamar para a turma dele?

Não, ele sabe que eu não sou afeito com esse troço de turma. Me dou bem com todos, sei do quanto cada um é importante para o nosso partido. Se não estivermos unidos, o projeto de cada um, pode jogar no lixo.

O sr. defende a refundação do partido?

Acho que temos que repensar o PSDB. O partido [precisa] se atualizar com as demandas da sociedade, se aproximar mais de movimentos sociais, sindicatos. O PSDB não tem por que esconder o seu passado. Tudo que o PSDB fez pelo Brasil afora é motivo de orgulho. Claro, o problema grave do partido é a comunicação. A gente não soube se comunicar com a sociedade.

É um raciocínio semelhante ao do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Esse é o comentário geral do partido, há anos já. Esses anos todos: comunicação, comunicação é o nosso problema. E não conseguem achar o caminho.

O sr. tem recebido críticas por ter nomeado sua mulher e sua irmão como secretários, ao mesmo tempo que acusava o ex-governador Roberto Requião (PMDB) de nepotismo.

Ele empregou a família inteira. Até por conta do abuso cometido por ele é que veio a cobrança do nepotismo, depois. No meu caso, é diferente. É de praxe, histórico nesse país, que as primeiras-damas cuidem da área social do governo. Desde que o Brasil é o Brasil. E meu irmão tem aptidão para a gestão pública. Ele é um engenheiro, desempenha bem sua função na Secretaria de Infraestrutura e Logística.

Raio-X - Beto Richa, 46

Carreira

Engenheiro civil (PUC-PR), é governador do Paraná. Foi deputado estadual (95-00) e prefeito de Curitiba (05-10)

Família 

É filho de José Richa, que foi governador do Paraná e um dos fundadores do PSDB

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Serra no labirinto

Sob pressão para disputar a Prefeitura, ex-governador teme sepultar as chances de tentar a Presidência de novo em 2014

Vera Magalhães

SÃO PAULO - Para José Serra, a campanha presidencial de 2014 começou na noite de 31 de outubro de 2010, quando, no discurso em que admitiu sua derrota para a presidente Dilma Rousseff, despediu-se dizendo que voltaria em breve. "A luta continua", previu.

Talvez não imaginasse que ela se iniciaria imediatamente e se daria sobretudo no front interno de seu partido, o PSDB. Hoje, ele resiste à pressão tucana para se candidatar a prefeito de São Paulo no ano que vem, algo que vê como um golpe contra suas ambições presidenciais.

Ele calcula que, se for eleito prefeito, terá dificuldade em deixar o cargo um ano depois, como fez em 2006. Se perder, será o fim de sua carreira, ponderam aliados.

Com 43,6 milhões de votos no segundo turno de 2010, Serra viu nesse capital o ponto de largada para pleitear nova chance em 2014. Mas foi pego de surpresa pela rapidez com que seu espaço no PSDB se estreitou neste ano.

De cara, Geraldo Alckmin, seu sucessor no governo de São Paulo, promoveu um desmonte de áreas estratégicas de sua gestão e ocupou espaços na máquina partidária local, de modo a escanteá-lo.

Alckmin recusou pedidos diretos de Serra para manter secretários como Paulo Renato (Educação), morto em junho, e Mauro Ricardo (Fazenda). O governador alojou pessoas de sua confiança nos diretórios do PSDB e forçou vereadores que eram seus desafetos a deixar o partido.

Após esse primeiro embate, Serra enfrentou o momento mais agudo de crise partidária em maio, quando o presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE), e o senador Aécio Neves, seu oponente na disputa pela candidatura presidencial em 2014, se aliaram para dominar a cúpula do partido.

Diante da evidência de que aliados de Aécio seriam colocados nos principais postos da Executiva, Serra pleiteou a presidência do Instituto Teotônio Vilela, mas foi vetado por Aécio e Guerra, que deram a vaga a Tasso Jereissati.

A Serra coube a presidência do novo Conselho Político do partido, instância de caráter não deliberativo que fez apenas três reuniões em 2011.

Isolado, o ex-governador lançou uma estratégia para ter canais próprios para manifestar suas ideias e se comunicar com os filiados tucanos. Lançou um site, estreou uma coluna quinzenal no jornal "O Estado de S. Paulo" e passou a percorrer os Estados de forma autônoma para reuniões partidárias.

Paralelamente, os embates com o grupo aecista continuaram e chegaram perto de um rompimento neste fim de ano. Serra tem dito a aliados que vê "digitais mineiras" no lançamento do livro "A Privataria Tucana", do jornalista Amaury Ribeiro Jr., que ataca Serra e seus familiares.

Diante de tal grau de acirramento, Serra e Aécio têm evitado se encontrar. Estiveram em horários diferentes no Congresso da Juventude do partido em Goiânia, há algumas semanas. Aécio não foi à última reunião da Executiva do PSDB, na qual houve um desagravo a Serra por conta do livro de Ribeiro Jr.

Serra critica a forma como a sucessão foi antecipada, com a criação de uma estrutura de comunicação para tornar Aécio mais conhecido.

Aliados seus, como o senador Aloysio Nunes Ferreira (SP), protestaram contra a tentativa de isolar Serra -que foi excluído da propaganda partidária em São Paulo e depois enfrentou uma queda de braço pelo conteúdo de seu discurso no programa nacional de TV dos tucanos.

Trunfos e obstáculos

Em 2012, o desafio de Serra será resistir à pressão de Alckmin e de Gilberto Kassab para concorrer a prefeito.

Além disso, terá de se articular para quebrar a força aecista na cúpula tucana. "O Serra terá chances caso o Aécio não consiga se firmar, nem dizer a que veio", diz um tucano simpático ao mineiro. "Em 2011 ele se fortaleceu internamente, mas foi nulo no Senado e não se mostrou capaz de liderar a oposição".

No QG do senador, o risco de que ele não "decole" é tratado com preocupação. Apesar do lastro que obteve na máquina, Aécio não fez nenhum discurso marcante -mesmo quando anunciou com estardalhaço que o faria-, não lançou uma marca forte -a que tentou, da regulamentação das medidas provisórias, naufragou- e foi tímido nos ataques a Dilma.

Partidários de Serra acham que a consistência na crítica a Dilma e o recall de duas eleições presidenciais são ativos que podem fazer a balança pender em favor do paulista.

Para que isso ocorra, avaliam, ele terá de manter a aliança com o PSD de Kassab e obter o apoio de Alckmin e do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o que poderia fazer com que o peso de São Paulo novamente fizesse a diferença para o PSDB, como em todas as eleições presidenciais até aqui.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O árduo exercício de se afastar do poder

Lula passou o seu primeiro ano como ex-presidente da República prometendo reiteradamente que iria se manter distante das negociações políticas. E também a lamentar sua dificuldade para cumprir a promessa

Erich Decat

Quantos não ouviram — seja nos corredores do Congresso ou em eventos do Planalto — o ato falho de várias pessoas, incluindo autoridades, ao chamar a dona da cadeira da presidência da República, Dilma Rousseff, de "a Lula"?

A troca dos nomes, comum nos primeiros meses do ano, era certamente obra do costume, e talvez também fosse o prenúncio de que o ex-presidente permaneceria bem próximo daquela que ajudou a eleger para o mais alto posto da República. Antes mesmo da posse de Dilma, em 1º de janeiro, Lula disse — talvez num exercício de autoconvencimento — que precisava se "mancar" porque ao deixar o posto seria a vez de Dilma comandar o país. Menos de um mês após deixar a cadeira, Lula voltou a dar declarações nessa linha, ao dizer que precisava "desencarnar da Presidência" e "reencarnar como cidadão brasileiro".

Ele até que tentou, ao colocar na agenda de ex-presidente uma série de viagens que o levaram para longe do país. Foram pelo menos 30. Ocasiões em que faturou com palestras para empresas renomadas, recebeu diversos prêmios internacionais e foi recebido por autoridades, do presidente da França, Nicolas Sarkozy, ao ex-presidente da Polônia e prêmio Nobel da Paz, Lech Walesa. Também não faltaram encontros com velhos "companheiros" como o ex-presidente Fidel Castro e o presidente da Venezuela, Hugo Chávez.

Entre uma viagem e outra, Lula foi reconduzido à presidência do PT durante comemoração do aniversário de 31 anos do partido, em Brasília. Apesar da turnê internacional, a proximidade de Lula com Dilma pôde ser notada dentro e fora do governo principalmente nos momentos em que a Esplanada foi abalroada com uma série de denúncias de corrupção que culminaram na queda de seis ministros, um recorde "nunca antes visto no país", para usar um dos bordões favoritos do ex-presidente.

A primeira "movimentação" de Lula pôde ser vista no episódio em que o ex-ministro da Casa Civil Antônio Palocci, considerado o "homem forte" do governo, pediu demissão sem conseguir explicar como o patrimônio se multiplicou 20 vezes entre 2006 e 2010.

"Os conselhos foram escolhidos pela presidente Dilma. Nunca o ex-presidente Lula procurou dar conselhos que não fossem solicitados pela presidente Dilma. Notadamente, no ápice de algumas crises em especial com o Palocci, algumas questões pontuais sobre ministros foram colocadas, porque envolviam pessoas do nosso convívio", ressalta o deputado petista André Vargas (PR), secretário nacional de Comunicação do partido. "Acho que não houve interferência administrativa de gestão, de estilo. Foi algo adequado. Se merecia notas inicialmente nos jornais depois passou a não merecer. Entrou na normalidade", acrescenta.

A avaliação de Vargas também é dividida com outros integrantes da base aliada. "Esquisito seria o Lula desaparecer do Brasil. Ele não teve uma atuação de constrangimento. Ele sabe o peso e o tamanho que tem. É um agente político", considerou o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP). "Sei que a Dilma conversa com ele toda semana, no que faz muito bem. Eu no lugar dela faria a mesma coisa. É de imaginar que todos os assuntos entram em pauta. Acho que ele tem dado uma contribuição, às vezes até invisível, mas importante para esse êxito do governo Dilma, sem a menor dúvida disso", avalia o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN).

Carona em inauguração

Além de atuar nos momentos de crise no Executivo, Lula também aproveitou para pegar carona em inauguração de obras. Nem a nova Embaixada da Argentina em Brasília escapou, em 2 de agosto. Em 29 de outubro, quando ficou pronta a ponte sobre o Rio Negro, ele foi a Manaus com Dilma. As viagens do ex-presidente foram suspensas apenas quando foi diagnosticado um tumor na laringe, poucos depois, no dia 29. Mesmo em tratamento, porém, ele não parou de articular. Conseguiu emplacar dentro do PT o nome do ministro da Educação, Fernando Haddad, na disputa pela prefeitura de São Paulo do próximo ano. Teve que tirar do páreo a senadora Marta Suplicy, líder nas pesquisas.

As idas e vindas para Brasília e as articulações políticas nos bastidores foram suspensas, mas não a de Lula influência. Exceto por alguns dias de descanso próximos a momentos cruciais do tratamento, o ex-presidente passou a receber políticos com frequência em seu apartamento, em São Bernardo, ou no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. Os resultados da primeira fase do tratamento, por quimioterapia, surpreenderam os médicos positivamente. O tumor reduziu-se 75% em relação ao tamanho inicial. No início do próximo ano, será a vez da segunda fase, da radioterapia. A avaliação, por ora, é de que não será necessário submeter o ex-presidente a uma cirurgia, o que poderia deixá-lo com a voz comprometida.

Em meio a esse otimismo, Lula voltou a seu auto-plagiar no início deste mês, bem-humorado: "Estou desencarnando ainda". Para aqueles que acham que em 2012 será diferente, trecho da mensagem de Natal feita por ele dá o tom: "Vamos continuar juntos em 2012 com a presidenta Dilma, construindo um Brasil e um mundo cada vez melhor".

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Dilma vai fazer mudanças pontuais na reforma ministerial de janeiro

Para evitar guerra entre partidos, ela deve trocar só quem vai disputar eleições

Dilma deve substituir Fernando Haddad, que vai disputar prefeitura de São Paulo, por Aloizio Mercadante

Maria Lima

BRASÍLIA. Para evitar que seja aberta uma guerra entre partidos aliados por cargos de primeiro escalão, a presidente Dilma Rousseff está decidida a fazer apenas mudanças pontuais na tão falada reforma ministerial de janeiro. Fará trocas só em pastas cujos titulares sairão para disputar a eleição municipal de 2012 e já descartou fusões e extinções de ministérios. Os dirigentes de PT e PMDB, principais partidos governistas, já foram avisados por interlocutores de Dilma dessa determinação.

Após trocar sete ministros em menos de um ano, seis deles por suspeitas de irregularidades, Dilma quer evitar mais conflitos com os partidos aliados. Embora as mudanças na Esplanada sejam poucas, ela faz mistério sobre o que pretende fazer.

O que está ficando cada dia mais certo é a possível ida do ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante (PT), para o lugar de Fernando Haddad (PT) no Ministério da Educação. Dilma não escondeu nos últimos meses sua admiração pelo trabalho e comportamento de Mercadante no ministério.

Extraoficialmente, os dois já estariam fazendo uma transição para a troca, que se daria em 15 de janeiro, com a saída de Haddad para iniciar a campanha pela prefeitura de São Paulo.

Pasta de Política para Mulheres deve ficar com PT

Além de Haddad, sai para disputar a eleição a ministra da Secretaria Especial de Política para Mulheres, Iriny Lopes(PT). Ela disputará a prefeitura de Vitória. Para o cargo dela não há sequer especulação de substituto, mas é certo que continuará com o mesmo grupo do PT.

Em encontro de confraternização de Dilma com líderes aliados, no Palácio da Alvorada, quarta-feira, todos tentaram informações sobre as mudanças de janeiro. Mas Dilma não deixou escapar nada. Ela deve viajar antes do réveillon para férias de dez dias, e, só depois, tomará alguma decisão.

- Para as pessoas que perguntei no Palácio sobre isso, a resposta que tive é que a presidente Dilma está guardando tudo a sete chaves - disse um dos líderes desses dois partidos.

- No jantar com a presidente no Alvorada, essa semana, estavam lá os dois (Haddad e Mercadante). O que vi foi o pessoal querendo saber das mudanças . Essa troca no MEC, por enquanto, está no nível das sinalizações, mas ainda não tem nada oficial - disse o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).

Ao vice-presidente Michel Temer, semana passada, Dilma só adiantou sua decisão de reduzir a reforma, sem extinção de pastas e fusões. Mas o PMDB acredita que tem espaço para crescer no Ministério das Cidades, com a iminente queda de Mário Negromonte (PP), ou no Ministério dos Transportes, já que o PR está fora da base.

- Nossa esperança é pegar aí um Transportes, ou um Cidades. A presidente disse para Michel (Temer) que não vai mexer numa engenharia que está dando certo para abrir um flanco de disputa entre PT e PMDB. Vai deixar cada um com seu espaço, porque quando for mexer com um, o outro esperneia - disse um interlocutor do vice.

Os peemedebistas contam também que - com a ida de Mercadante para o Ministério da Educação - a vaga do Ministério da Ciência e Tecnologia poderá entrar nesse remanejamento entre os aliados.

PMDB está satisfeito só no discurso oficial

O discurso oficial do PMDB é que o partido está satisfeito. Mas, nos bastidores, os seus dirigentes avaliam que a representação da legenda na Esplanada é muito menor do que a força do partido no Congresso. E apostam que a maior aproximação de Dilma e Temer nos últimos meses poderá favorecer o partido.

FONTE: O GLOBO

O preço dos escândalos

Denúncias de corrupção envolvendo importantes personagens da Esplanada afetam gastos dos ministérios. Algumas pastas executaram menos de um terço do valor autorizado para este ano

Marcelo da Fonseca

Mais do que o desgaste político entre partidos da base aliada e a dor de cabeça para a presidente Dilma Rousseff (PT), os escândalos de corrupção que resultaram na demissão de seis ministros logo no primeiro ano do governo afetaram diretamente a execução orçamentária prevista para 2011. Desde o congelamento das licitações de obras nas estradas geridas pelo Ministério dos Transportes até as denúncias de contratos e convênios irregulares firmados com organizações não governamentais (ONGs) pelos ministérios do Turismo e do Esporte, passando pelos problemas nos programas de escoamento da produção agrícola do Ministério da Agricultura, os prejuízos e atrasos ficam claros nos números da Esplanada a uma semana do fim do ano. O balanço registrado no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) do governo federal mostra que quatro das pastas que tiveram chefes substituídos – Agricultura, Turismo, Esporte e Pesca – executaram menos de um terço do previsto para todo o ano.

O Ministério do Turismo foi o que teve índices mais baixos de execução em relação ao previsto para 2011, investindo 18,9% do total liberado pela União até a última semana de dezembro. Entre os motivos que dificultaram a aplicação dos recursos está a crise deflagrada em agosto, que apontou supostos desvios de verbas públicas por meio de emendas parlamentares e convênios irregulares. A Operação Voucher, coordenada pela Polícia Federal, resultou na prisão de 35 pessoas, entre elas o secretário-executivo da pasta, Frederico Costa. As denúncias levaram o próprio ministério a bloquear cerca de R$ 20 milhões referentes às emendas parlamentares e suspender por 45 dias os convênios com ONGs. Além do congelamento dos recursos motivado pelos escândalos de corrupção, a pasta foi atingida com os cortes previstos pelo Planalto, para enxugar gastos do orçamento.

Na Agricultura, as denúncias de pagamento de propinas e ações de lobistas em órgãos ligados ao ministério foram confirmadas no relatório da Controladoria Geral da União (CGU) divulgado em 30 de novembro. As fraudes foram apontadas no gerenciamento dos programas de escoamento da produção agrícola e resultaram na demissão do ministro Wagner Rossi (PMDB). O ministério foi o terceiro com o menor percentual de investimentos em 2011, com 31% do total autorizado pelo governo federal.

Na contramão

Já nos ministérios do Trabalho e da Defesa – pastas que também perderam seus chefes – as crises não se refletiram em baixas execuções orçamentárias. A demissão de Carlos Lupi (PDT) no início do mês, denunciado por envolvimento em esquema de cobrança de propina que revertia recursos para seu partido, não foi acompanhada por cancelamento de investimentos ou bloqueio de recursos. O Ministério do Trabalho manteve o planejamento inicial à risca, com 93% executados.

Na Defesa, a substituição não se deu por denúncias de irregularidades ou desvios de conduta por parte do ministro, mas por uma crise institucional. A queda de Nelson Jobim (PMDB) foi decretada após desavenças com Dilma e declarações de que ele havia votado em José Serra nas eleições presidenciais. Jobim ainda criticou publicamente outros integrantes do governo antes de ser demitido em agosto. A pasta investiu 88,5% dos valores previstos pela União e não teve nenhuma ação bloqueada.

Segundo a Consultoria de Orçamento do Senado, o orçamento não prevê gastos impositivos e isso faz com que a programação dos valores nem sempre seja seguida à risca ao longo do ano. Em caso de restrições ou bloqueios de verbas que apareçam por motivos de irregularidades detectadas pelo Palácio do Planalto, é comum que os recursos fiquem congelados até que se resolva o problema ou que se criem opções para aplicar os recursos.

A equipe técnica, que acompanha a execução financeira do governo federal, explica também que a atualização dos gastos e divulgação de novos compromissos financeiros assumidos pelos ministérios podem ser feitas até o início de janeiro, quando os recursos previstos inicialmente deixam de existir e as ações programadas não são mais consideradas.

Enquanto isso...

...Esvaziados, mas nem tanto

Para o orçamento de 2012, os ministérios combalidos por crises políticas foram esvaziados pela presidente Dilma Rousseff, no entanto, acabaram turbinados com mais recursos pelo Congresso Nacional, superando a previsão de repasses definida pela União. Na prática, deputados e senadores reabilitaram – por meio de vultosas emendas parlamentares – pastas que foram alvo de denúncias de corrupção e mau uso de dinheiro público ao longo do ano. No mesmo dia em que a Controladoria Geral da União apresentou relatório mostrando possíveis prejuízos de R$ 67 milhões em programas do Turismo, a pasta recebeu um generoso agrado do Congresso. O relatório do orçamento diz que os recursos para o ministério serão ampliados dos R$ 795,8 milhões previstos pelo governo para R$ 2,5 bilhões. O projeto de Lei Orçamentária Anual (LOA) para 2012 foi aprovado no Congresso na quinta-feira .

FONTE: ESTADO DE MINAS

Quando a voz do eleitor fala bem mais alto

Em duas décadas, só quatro projetos de iniciativa popular viraram leis, mas todas marcantes para o país. Expectativa é de que a internet alavanque mais propostas nos próximos anos

Amanda Almeida

O Congresso tem 594 parlamentares, mas, para aprovar causas inquestionavelmente populares e que vão contra o corporativismo da Casa, tem sido necessário acionar efetivo muito maior. O fim de 2011 marca os 20 anos da apresentação do primeiro projeto de iniciativa popular, que, a exemplo do Ficha Limpa, só passou no Legislativo graças à pressão de milhões de brasileiros, engajados em abaixo-assinados. Embora previstos na Constituição de 1988 e capazes de produzir mudanças importantes no país, trata-se de recursos ainda pouquíssimo empregados. De lá para cá, só quatro viraram leis. A expectativa é de que a internet se torne canal para alavancar mais iniciativas.

Entidades que atuam na área de habitação, como a União Nacional por Moradia Popular (UNMP), entregaram nas mãos do então presidente da Câmara dos Deputados, Ibsen Pinheiro, o primeiro projeto de iniciativa popular em 1991. A proposta criava o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social e, apesar do apelo expresso por mais de 1 milhão de assinaturas de brasileiros, tramitou por 13 anos até virar lei. "Foi uma luta, mas ficou uma lição: quando a sociedade se organiza, é capaz de interferir na gestão pública. Quando entregamos as assinaturas, o Ibsen quase pulou da cadeira. Emplacar nossas vontades foi um susto para os parlamentares", lembra o presidente da UNMP, Donizete Fernandes de Oliveira.

A força dos projetos de iniciativa popular, no entanto, foi testada poucas vezes. Apenas cinco propostas foram encaminhadas ao Congresso, sendo quatro aprovadas e uma em tramitação. Quem já conseguiu emplacar uma matéria atribui o pouco uso do instrumento à dificuldade de recolher mais de 1,3 milhão de assinaturas, como prevê a Constituição Federal, em prol do mesmo tema. "É necessário ter uma instituição forte para alcançar as assinaturas necessárias. Na época, a Campanha da Fraternidade, promovida pela Igreja Católica, tinha o título Onde moras, que tratava sobre a necessidade de moradia. E apoiaram o movimento, montando bancas para assinaturas nas próprias igrejas", relata Donizete.

Para ele, o segredo das outras propostas que se tornaram lei é o mesmo. Uma delas, a primeira a ser aprovada pelo Congresso, é a Lei 8.930/1994, que caracteriza chacina liderada por esquadrão da morte como crime hediondo. A norma é resultado da pressão de um movimento criado pela escritora Glória Perez, amplamente divulgado pela mídia. Outro exemplo é a Lei 9.840/99, que prevê a cassação do candidato que tentar comprar votos de eleitores. A proposta teve o apoio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que também fez campanha pela aprovação da Lei da Ficha Limpa, no ano passado.

Desvio

Apesar da comemoração pelos 20 anos de sua apresentação, o primeiro texto carrega um "desvio de propósito" que, apesar do tempo, se manteve nas outras propostas: ele teve de ser adotado por um parlamentar, que o protocolou em janeiro de 1992, já que a Secretaria-Geral da Câmara dos Deputados não tem instrumentos para conferir os milhões de assinaturas exigidas pela Constituição Federal. As outras três leis com origem popular também têm parlamentares ou presidente da República como "autores". A forma "torta" foi negociada entre população e Congresso para evitar a paralisação da tramitação das propostas pela inviabilidade de aceitar as assinaturas apresentadas.

Para os "verdadeiros" autores das propostas, assinadas ou não por parlamentares, o que importa é se ficou no papel ou não. Segundo Donizete, o programa federal Minha casa, minha vida acabou ocupando o papel da Lei 11.124, sancionada em 2005, ao receber os recursos para habitação. "Mas não há derrota. O mais importante é que conseguimos colocar o tema na pauta das prioridades da sociedade brasileira. Valeu a pena esperar 13 anos para virar lei", comenta o presidente da UNMP.

FONTE: ESTADO DE MINAS

Ações penais desaparecem no Supremo

Sob a justificativa de proteger a intimidade dos réus, o Supremo Tribunal Federal (STF) apagou de seus registros 89 de 330 ações penais contra autoridades, propostas desde 1990.

Tribunal alega evitar violação de intimidade

No CNJ, Peluso editou resolução com regra diferente

BRASÍLIA. Após o Supremo Tribunal Federal (STF) receber do GLOBO a lista da ações desaparecidas, e admitir que houve erro de interpretação da resolução, 31 das 89 ações expurgadas voltaram a aparecer no site do tribunal para consulta. A maioria era de ações que deixaram de tramitar no STF porque o acusado não era mais ocupante do cargo público que tinha dado direito ao foro privilegiado. Outras tinham sido novamente autuadas como inquérito.

Mas 58 ações penais continuam sem constar no sistema de registro de processos do STF. A assessoria de imprensa do tribunal informou que elas não aparecem justamente por conta da interpretação que foi feita da resolução 356.

"Não é razoável que as consultas por meio eletrônico revelem dados que nem sequer por certidão se poderia obter. Haveria, de outro modo, violação à intimidade. Como se vê, a impossibilidade de visualização de processos na internet, nesses casos, decorre de interpretação lógica, pois não há sentido em que sejam disponibilizados dados que o STF não está autorizado a fornecer oficialmente, porque não passíveis de valoração jurídica", informou a assessoria, em resposta a perguntas enviadas pelo jornal.

- Lutamos por transparência e o Supremo vai na contramão. Assim fica mais difícil exercer o controle social - contestou Jovita Rosa, uma das dirigentes do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), que idealizou a Lei da Ficha Limpa.

Ação contra deputado permanece de fora

Para Jovita, esses processos envolvem pessoas públicas e, portanto, o registro deles não pode ser suprimido. A direção do STF alega que pessoas inocentadas poderiam ser prejudicadas pelo uso indevido da informação de que já foram processadas.

Na lista dos casos que permanecem de fora está, por exemplo, a AP 527. Motivo: o réu, um deputado federal, foi absolvido e o registro desta ação não é mais passível de consulta pública pelo sistema de acompanhamento processual.

Na presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) - instância à qual o STF não está subordinado -, Cezar Peluso editou no ano passado uma outra resolução, a 121, que estabelece regra diferente. Processos que deram em absolvição devem, sim, estar disponíveis para consulta pública. Mas essa consulta só pode ser feita pelo número da ação. No caso da AP 527, nem isso é possível. A assessoria do STF informou que Peluso pretende discutir com os demais ministros uma adequação entre as resoluções do CNJ e do Supremo, e que as duas instâncias são colegiados diferentes, com atribuições diferentes. (Francisco Leali)

FONTE: O GLOBO

Supremo vê crise como a mais grave do Judiciário desde 1999

Juristas consideram o embate atual um divisor de águas para a magistratura

A atual crise do Judiciário brasileiro já é reconhecida entre ministros do Supremo Tribunal Federal como a mais grave desde a CPI que investigou Nicolau dos Santos Neto, o "juiz Lalau", em 1999. Historicamente reconhecida como uma cidadela fechada, o Judiciário foi fraturado em decorrência da ação do Conselho Nacional de Justiça de mexer na "caixa preta" dos tribunais, ao inspecionar as folhas de pagamento e declarações de bens de juízes. Estudiosos e juristas vêem na crise um divisor de águas para a magistratura – exposta ao risco de perecer avessa à transparência e defenda de privilégios.

Ao atingir STF, crise do Judiciário põe em xeque cúpula do Poder e divide Corte

Provocado pelos magistrados, Supremo até agora se posicionou contra investigações nos tribunais e acabou se colocando no centro da polêmica que ameaça sua credibilidade

Mariângela Galluci, Gabriel Manzano e Lucas de Abreu Maia

BRASÍLIA, SÃO PAULO - A crise do Judiciário brasileiro, escancarada na semana passada pela liminar do ministro Ricardo Lewandowski que paralisou as investigações da Corregedoria Nacional de Justiça, já é reconhecida nos bastidores desse Poder como uma das maiores da história, pelos efeitos que terá na vida do Supremo Tribunal Federal (STF). Estudiosos veem nela, também, um divisor de águas. Ela expõe a magistratura, daqui para a frente, ao risco de consolidar a imagem de instituição avessa à transparência e defensora de privilégios.

Ministros do STF ouvidos pelo Estado dizem não se lembrar de uma situação tão grave desde a instalação da CPI do Judiciário, em 1999. Mas agora há também suspeitas pairando sobre integrantes do Supremo, que teriam recebido altas quantias por atrasados. "Pode-se dizer que chegamos a um ponto de ruptura, porque muitos no Supremo se sentem incomodados", resume o jurista Carlos Ari Sundfeld.

Na outra ponta do cabo de guerra em que se transformou o Judiciário, Eliana Calmon, a corregedora nacional de Justiça, resume o cenário: "Meu trabalho é importante porque estou certa de que é a partir da transparência que vamos ser mais respeitados pelo povo."

O que tirou do sossego o Poder Judiciário foi a decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de mexer na "caixa preta" dos tribunais, ao inspecionar as folhas de pagamento e declarações de bens de juízes, em especial os de São Paulo. A forte reação dos investigados leva o advogado e professor de Direito Constitucional Luiz Tarcísio Ferreira, da PUC-SP, a perguntar: "Se há uma rigorosa vigilância da sociedade sobre o Executivo e o Legislativo, por que o Judiciário ficaria fora disso? Se esse Poder nada deve, o que estaria temendo?" Ferreira arremata: "Os juízes sabem que quem paga os seus salários é o povo."

Interpretações. O ponto nervoso do episódio, para o jurista Carlos Sundfeld, são as vantagens remuneratórias desses magistrados. "Antes do CNJ, esse assunto sempre ficou a cargo dos tribunais e eles foram construindo suas interpretações da lei. Montou-se então um sistema vulnerável. A atual rebelião nasce dessas circunstâncias - o medo dos juízes, que são conscientes dessa vulnerabilidade."

Ao longo da semana, a temperatura da crise cresceu com novos episódios, como a concessão de liminares para suspender investigações do CNJ e a revelação de que ministros do STF poderiam estar entre os investigados por supostamente terem recebido altos valores relativos a passivos trabalhistas.

Um duelo de notas de ministros e associações de juízes se seguiu e integrantes do Supremo se dividiram entre o CNJ e seus críticos. Integrantes e ex-integrantes do CNJ observaram que esse tipo de inspeção do Judiciário não é novidade, mas ganhou intensidade porque desta vez está voltada para o maior e mais poderoso Tribunal de Justiça do País, o de São Paulo. Dizendo-se indignada "em relação às matérias jornalísticas" que implicavam o ministro Lewandowski, a Associação Paulista de Magistrados contra-atacou no ato, avisando: "A direção do TJ-SP franqueou à equipe do CNJ todas as informações pertinentes".

Eliana Calmon ressalva que o temor de muitos magistrados pode resultar de um desconhecimento da situação. "O Judiciário, como um todo, desconhece a gravidade da situação (de corrupção). Quem conhece? A corregedoria, porque a ela são encaminhados todos os males. Tanto que os corregedores (locais) estão, em sua grande maioria, ao meu lado e sabem que existem denúncias muito graves. A magistratura desconhece. Por quê? Porque a gente não fala. As investigações são todas sigilosas."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Sissel - Hymne à l`amour (If You Love Me)

O partido no poder:: Merval Pereira

Um grande diferencial entre os governos Fernando Henrique e Lula, detectado pelo estudo da cientista política Maria Celina D"Araujo, professora do Departamento de Sociologia e Política da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, está relacionado ao tema partidário.

Com base em análise da composição dos ocupantes de cargos de Direção e Assessoramento Superiores (DAS) níveis 5 e 6 e de Natureza Especial (NES), ela constatou que o índice de partidarização dobrou entre um e outro governo: 6,5% de todos os ocupantes dos cargos no governo FH eram filiados a algum partido político, número que subiu para 12,6% no governo Lula.

"Os percentuais em si não seriam tão importantes, não fora o fato de que a concentração de filiados ao partido do governo sobe conforme os níveis de DAS são mais altos", ressalta Maria Celina.

Nesse caso, a diferença entre os dois governos é significativa: nos DAS 6, sobe de 17,1% no governo FH para 38% no governo Lula. De imediato, chama a atenção a grande concentração de filiados ao PT no governo Lula, cerca de 40% de todos os integrantes dos cargos de DAS filiados a algum partido.

Durante o governo Fernando Henrique, o partido do governo, o PSDB, acumulou 20% desses cargos, mesma proporção de seu principal aliado, o Partido do Movimento Democrático Brasileiro, PMDB.

De maneira explícita nota-se, ressalta o estudo, uma distribuição mais equilibrada entre os partidos da base no governo FH.

Nesse governo, o PT na oposição teve uma fatia de cargos de confiança semelhante à de partidos da base, como o DEM e o PP.

O dado acima confirma nossa hipótese, diz Maria Celina, de que, no governo do PSDB, não houve uma política de exclusão partidária, pelo menos entre os partidos eleitoralmente mais expressivos naquela ocasião. Contrariamente, no governo Lula, a concentração de filiados ao PT foi alta entre as nomeações para os cargos de dirigentes públicos ou para o Ministério.

Essa concentração de nomeações em filiados ao partido do governo fica mais explícita quando se toma os ocupantes dos níveis mais elevados de DAS, de 4 a 6, nos dois governos.

A concentração de filiados ao PSDB no governo Fernando Henrique está um pouco abaixo de 40%, enquanto a dos filiados ao PT no governo Lula chega a 60%.

"Ou seja, nos níveis mais altos, a partidarização do governo vai ficando maior e as diferenças entre os dois governos vão se acentuando".

Agrupando os níveis 5 e 6 dos DAS e os NES, objeto de análise mais apurada em termos de perfis sociopolíticos, Maria Celina diz que os dados mostram que 11% deles no governo Fernando Henrique e 24% no governo Lula eram filiados a partidos políticos.

Desses filiados a partido, no governo Fernando Henrique, 42% eram filiados ao PSDB e, no governo Lula, 77% eram filiados ao PT.

Para Maria Celina, "o Ministério é um espaço privilegiado para aferir os compromissos partidários do presidente no presidencialismo de coalizão".

A sintonia entre o número de cadeiras obtidas por um partido no Congresso e o percentual de pastas ocupadas no Ministério, que prevalecia desde a República de 1946, foi quebrada no governo Lula, destaca Maria Celina, "embora a academia brasileira não tenha se dedicado devidamente ao tema".

A concentração de pastas em mãos de petistas chegou a 50% no governo Lula, embora o PT tivesse em torno de 17% das cadeiras na Câmara dos Deputados e reunisse 29% das cadeiras da coalizão governamental.

O estudo da cientista política mostra, no entanto, que a tese da coalizão em sua versão clássica aplica-se ao governo FH "quando se vê um equilíbrio na distribuição das pastas entre os partidos aliados, havendo até a participação de um petista histórico, Francisco Weffort, amigo pessoal do presidente".

Da mesma forma, é sintomática, ressalta a professora da PUC, a maior participação de pessoas sem filiação partidária no governo Fernando Henrique.

A grande concentração de cargos em mãos do partido do governo é uma característica do governo Lula da Silva e este fenômeno ainda não foi analisado com rigor.

Na prática, significou a ruptura de um padrão de compromisso no plano ministerial, o que não impediu, surpreendentemente, a estabilidade do governo ou a governabilidade, termos recorrentemente usados para justificar a necessidade de distribuição de cargos em função dos votos recebidos para cada agremiação da base aliada ao governo.

Essa é a principal inovação do governo Lula. O PT concentrou cargos e posições e entregou algumas áreas da administração pública a aliados como PMDB, PR e PTB num patamar que não os satisfez, levando à grande pressão que se observou quando da formação do governo Dilma.

Segundo o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em entrevista à autora, o PSDB não se caracteriza como um "partido demandante", ou como um partido de militância, o que permitiu ao seu governo ter mais margem de ação para empreender uma administração cooperativa com os demais partidos.

Assim, a maior concentração de petistas no governo de Lula da Silva, em comparação à participação de tucanos no governo Fernando Henrique, derivaria desse aspecto militante e mobilizador do PT, que historicamente foi bem-sucedido na aproximação com os movimentos sociais e com os servidores públicos.

Governos partidários são parte das regras da democracia moderna e da social¬-democracia. O que é novo no caso do PT foi ter rompido com a lógica da conciliação e da partilha quando se trata de ocupar os mais altos cargos do Executivo.

Essa concentração, associada a sua aproximação com movimentos sociais e com sindicatos, despertou teses sobre o aparelhamento do Estado e sobre a cooptação da sociedade civil pelo Estado.

Feliz Natal e próspero Ano Novo a todos. A coluna volta a ser publicada no dia 3 de janeiro.

FONTE: O GLOBO

Um ano para ser esquecido :: Marco Antônio Villa

O governo Dilma Rousseff é absolutamente previsível. Não passa um mês sem uma crise no ministério. Dilma obteve um triste feito: é a administração que mais colecionou denúncias de corrupção no seu primeiro ano de gestão. Passou semanas e semanas escondendo os "malfeitos" dos seus ministros. Perdeu um tempo precioso tentado a todo custo sustentar no governo os acusados de corrupção. Nunca tomou a iniciativa de apurar um escândalo - e foram tantos. Muito menos de demitir imediatamente um ministro corrupto. Pelo contrário, defendeu o quanto pôde os acusados e só demitiu quando não era mais possível mantê-los nos cargos.

A história - até o momento - não deve reservar à presidente Dilma um bom lugar. É um governo anódino, sem identidade própria, que sempre anuncia que vai, finalmente, iniciar, para logo esquecer a promessa. Não há registro de nenhuma realização administrativa de monta. Desde d. Pedro I, é possível afirmar, sem medo de errar, que formou um dos piores ministérios da história. O leitor teria coragem de discutir algum assunto de energia com o ministro Lobão?

É um governo sem agenda. Administra o varejo. Vê o futuro do Brasil, no máximo, até o mês seguinte. Não consegue planejar nada, mesmo tendo um Ministério do Planejamento e uma Secretaria de Assuntos Estratégicos. Inexiste uma política industrial. Ignora que o agronegócio dá demostrações evidentes de que o modelo montado nos últimos 20 anos precisa ser remodelado. Proclama que a crise internacional não atingirá o Brasil. Em suma: é um governo sem ideias, irresponsável e que não pensa. Ou melhor, tem um só pensamento: manter-se, a qualquer custo, indefinidamente no poder.

Até agora, o crescimento econômico, mesmo com taxas muito inferiores às nossas possibilidades, deu ao governo apoio popular. Contudo, esse ciclo está terminando. Basta ver os péssimos resultados do último trimestre. Na inexistência de um projeto para o País, a solução foi a adoção de medidas pontuais que só devem agravar, no futuro, os problemas econômicos. Em outras palavras: o governo (entenda-se, as presidências Lula-Dilma) não soube aproveitar os ventos favoráveis da economia internacional e realizar as reformas e os investimentos necessários para uma nova etapa de crescimento.

Se a economia não vai bem, a política vai ainda pior. Excetuando o esforço solitário de alguns deputados e senadores - não mais que uma dúzia -, o governo age como se o Congresso fosse uma extensão do Palácio do Planalto. Aprova o que quer. Desde projetos de pouca relevância, até questões importantes, como a Desvinculação de Receitas da União (DRU). A maioria congressual age como no regime militar. A base governamental é uma versão moderna da Arena. Não é acidental que, hoje, a figura mais expressiva é o senador José Sarney, o mesmo que presidiu o partido do regime militar.

Nenhuma discussão relevante prospera no Parlamento. As grandes questões nacionais, a crise econômica internacional, o papel do Brasil no mundo. Nada. Silêncio absoluto no plenário e nas comissões. A desmoralização do Congresso chegou ao ponto de não podermos sequer confiar nas atas das suas reuniões. Daqui a meio século, um historiador, ao consultar a documentação sobre a sessão do último dia 6, lá não encontrará a altercação entre os senadores José Sarney e Demóstenes Torres. Tudo porque Sarney determinou, sem consultar nenhum dos seus pares, que a expressão "torpe" fosse retirada dos anais. Ou seja, alterou a ata como mudou o seu próprio nome, sem nenhum pudor. Desta forma, naquela Casa, até as atas são falsas.

Para demonstrar o alheamento do Congresso dos temas nacionais, basta recordar as recentes reportagens do Estadão sobre a paralisação das obras da transposição das águas do Rio São Francisco. O Nordeste tem 27 senadores e mais de uma centena de deputados federais. Nenhum deles, antes das reportagens, tinha denunciado o abandono e o desperdício de milhões de reais. Inclusive o presidente do PSDB, deputado Sérgio Guerra, que representa o Estado de Pernambuco. Guerra, presumo, deve estar preocupado com questões mais importantes. Quais?

Falando em oposição, vale destacar o PSDB. Governou o Brasil por oito anos vencendo por duas vezes a eleição presidencial no primeiro turno. Nas últimas três eleições chegou ao segundo turno. Hoje governa importantes Estados. Porém, o partido inexiste. Inexiste como partido, no sentido moderno. O PSDB é um agrupamento, quase um ajuntamento. Não se sabe o que pensa sobre absolutamente nada. Um ou outro líder emite uma opinião crítica - mas não é secundado pelos companheiros. Bem, chamar de companheiros é um tremendo exagero. Mas, deixando de lado a pequena política, o que interessa é que o partido passou o ano inteiro sem ter uma oposição firme, clara, propositiva sobre os rumos do Brasil. E não pode ser dito que o governo Dilma tenha obtido tal êxito, que não deixou espaço para a ação oposicionista. Muito pelo contrário.

A paralisia do PSDB é de tal ordem que o Conselho Político - que deveria pautar o partido no debate nacional - simplesmente sumiu. Ninguém sabe onde está. Fez uma reunião e ponto final. Morreu. Alguém reclamou? A grande realização da direção nacional foi organizar um seminário sobre economia num hotel cinco estrelas do Rio de Janeiro, algo bem popular, diga-se. E de um dia. Afinal, discutir as alternativas para o nosso país deve ser algo muito cansativo.

Para o Brasil, 2011 é um ano para ser esquecido. Foi marcado pela irrelevância no debate dos grandes temas, pela desmoralização das instituições republicanas e por uma absoluta incapacidade governamental para gerir o presente, pensar e construir o futuro do País.

Historiador, é professor da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar)

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Guerrilhas estatais, calma popular:: Vinicius Torres Freire

Crise em ministérios, nos partidos, no Judiciário, no CNJ, aversão do mercado etc.; governo resiste a tudo

O povo assiste a tudo distraído, não muito bestificado, mas esquecido de morder, como abstrato ao luar, tal qual as serpentes de Drummond. Os nativos estão quietos. Não há tumulto no Brasil que vive à margem dos conflitos "estatais". Que não foram poucos. Mas a casa está quieta, e o mundo está calmo.

A medida mais comum e ampla de satisfação do cliente eleitoral, o prestígio da presidente, está nas alturas, maior que o da largada presidencial de Lula. Há briga de facas, mas apenas nas casas do governo.

Caiu meia dúzia de ministros, em parte devido a conflitos pela divisão do butim estatal. Não causou muita sensação na rua -onde andam os "indignados" brasileiros?

A gente esqueceu, mas houve facadas semelhantes na divisão dos cargos das estatais elétricas. Tipos parecidos agora se estranham na Caixa Econômica Federal.

Aliás, o governo precisa tolerar essa gente até em banco? Se por mais não fosse, é dar chance para o "azar" de outro escândalo. Note-se que, até agora, saiu barata (para o governo) a quebra cabeluda do PanAmericano, no colo da CEF.

Dilma Rousseff, porém, com o auxílio de Michel Temer, conseguiu conter o motim que o PMDB ameaçava no início do ano. Por ora.

Houve ainda mais conflito político-partidário, com repercussão social também mínima. O PSD de Gilberto Kassab sangrou quase metade da oposição já moribunda.

O PSDB se suicida lentamente -o conflito entre serrismo e aecismo é apenas uma das feridas abertas.

Tribunais e juízes estão em campanha contra o Conselho Nacional de Justiça e críticos em geral a fim de manter prerrogativas indevidas.

Fazem ainda campanha salarial nos corredores do Congresso, que olhará com ainda mais carinho as demandas do Judiciário quando estiver em vigor a lei da "ficha limpa".

O governo bateu-se com alguns setores sociais organizados. Levou a melhor. Não houve repercussão maior. A presidente conteve demandas de reajuste do funcionalismo, derrubou o aumento da verba para a saúde, enrolou o piso salarial dos policiais, viu o caso do Código Florestal enrolar-se em si mesmo.

Dilma mudou a política econômica. Seu governo tenta controlar a inflação com um mix de medidas administrativas de contenção de crédito e contenção de gastos, em vez de usar apenas juros.

A presidente e seus economistas ainda por cima se deram poderes de intervenção na Bolsa (derivativos) e controlaram a entrada de capital financeiro do exterior.

A mudança, relevante, mas a anos-luz de revolucionária, causou reação amarga, mas limitada a uma fímbria microscópica da elite e a economistas de bancos e consultorias, que erraram tanto sobre a economia neste ano que viram suas críticas desmoralizadas.

No mais, o governo não teve nenhuma ideia ou projeto novo muito relevante além do "Brasil sem Miséria". A presidente privatizou um tico aqui (aeroportos) e interveio um tico a mais ali nas empresas do complexo "estatal-oligopólio privado". Não fez nada de relevante para tentar mudar escolas, universidade e ciência no país. Nem discurso.

Os barões assinalados se engalfinharam; o povo parece distraído, contente com o crescimento ainda lento por falta de mudança institucional séria. Até quando isso dura?

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Transposição emperrada :: Alberto Dines

Se 2011 entrou para a história carimbado com o nome de Dilma Rousseff, o ano seguinte, 2012, deverá repetir a dose com outra mulher, Eliana Calmon Alves. De qualquer forma, o cidadão brasileiro já garantiu sua quota na magnífica prenda de Natal oferecida pelo imbróglio entre a destemida corregedora nacional de justiça e as entidades que representam os magistrados.

A bateria de holofotes acesa pela juíza desde setembro quando assumiu o cargo é tão luminosa e promissora como a galáxia de esperanças acesa pelos fogos de artifício nos festejos do início de cada ano novo. Pela primeira vez em seus 511 anos de história e 189 de vida institucional, a nação brasileira tem a oportunidade de assistir à espetacular tomografia do edifício de privilégios e regalias no qual vivemos, construído com a argamassa da injustiça.

O confronto de Eliana Calmon com a AMB, a Ajufe e a Anamatra transcende às questões clássicas identificadas por antropólogos e sociólogos do "sabe com quem está falando?" e "quem manda aqui sou eu". Sua quixotesca investida é contra o corporativismo e o clientelismo que tanto desfiguram o conceito prevalecente do estado de direito.

A guerreira baiana não está apenas enfrentando o autoritarismo enrustido em instituições e entidades anquilosadas pelo tempo, está garantindo a produção e sobrevivência dos indispensáveis contra-poderes (caso do Conselho Nacional de Justiça) sem os quais nossa democracia será formal, retórica e claudicante.

Sua desassombrada cruzada dirige-se na realidade contra um sistema de abafamentos e silêncios herdados da colonização ibérica e o surpreendente apoio que vem recebendo de setores expressivos da nossa imprensa coloca-a em posições de vanguarda que há muito não freqüenta.

Este talvez seja o grande mérito da polêmica acionada pela Corregedora Nacional de Justiça. Ao retirar da penumbra dos tribunais e do hermetismo das sentenças questões fundamentais da vivência democrática é possível alterá-las sem necessariamente recorrer a intervenções drásticas.

Em outras palavras: a mera observação – ou exposição – de um fenômeno constitui uma forma de atuar sobre ele. A humanidade só avança quando percebe que há avanços a fazer. A consumação é consequente, mesmo quando não imediata.

Eliana Calmon tirou o trombone da estante, tocou-o e, magicamente, do ruído fez-se a luz. Mesmo solitária, sua indignação espalhou-se porque ao examinar posturas e procedimentos de alguns magistrados, movimentou os desconfortos engolidos e tormentos camuflados na alma de milhões de brasileiros que o dia inteiro resmungam e remoem queixas contra a impunidade.

As retrospectivas do ano não contemplaram a façanha da Ouvidora das nossa mágoas, Ombudsman do Judiciário. Ainda há tempo.

Alberto Dines é jornalista

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

As rebeliões do efêmero :: Olgária Chain Feres Matos

A ideologia dominante é a do novo-rico, que conhece o preço de todas as coisas, mas desconhece o seu valor

O movimento pela descriminalização do uso da maconha, a luta contra a corrupção, a dos estudantes na USP pela retirada da Polícia Militar do câmpus universitário, dos homossexuais contra a homofobia no Brasil, correspondem à tendência neoliberal global de ocupação do espaço público - mas em um país que não responde pela qualidade da formação educacional que garantiria o fortalecimento da “vida intelectual” e do debate político. Que se pense, em particular, no movimento pela liberação da maconha, que não desenvolve reflexões sobre o sentido da disseminação de narcotizantes na sociedade de massa e do consumo, a questão da cultura do excesso, cuja exemplaridade são as festas rave e a música techno. Nos anos 80, Salvador Dalí, com todo seu surrealismo, interpelado sobre o uso de drogas, respondeu que se deveria consumi-las no máximo cinco vezes durante toda a vida. Ser Baudelaire ou Michaud, Omar Khayyam ou Benjamin não é dado a muitos.

Já as mobilizações estudantis no Chile, ao contrário das contestações no Brasil, têm sido contra a flexibilização dos currículos escolares e a redução da carga horária nas disciplinas humanistas e formadoras, como literatura, línguas estrangeiras, história, etc., a fim de barrar a desigualdade no acesso aos bens culturais e a proliferação dos privilégios educacionais. O que manifesta a consciência de que a educação não é um serviço do qual se é consumidor, cliente, porque ela não é uma mercadoria.

Já o movimento dos homossexuais, mais politizado porque em luta contra preconceitos de que decorrem sofrimentos, não se interroga sobre a tendência pós-moderna a indiferenciações do que é por natureza assimétrico, no que diz respeito àquelas que existem entre as gerações, entre pais e filhos, professores e alunos, masculino e feminino, isto é, o mal-estar identitário no mundo contemporâneo. Quanto ao movimento pela “transparência”, tem a força da indignação, mas não questiona a corrosão do sistema parlamentar, consequência, hoje, da falência da escolaridade e da ética que a ela se vinculava quando a educação, ao menos em seus princípios fundadores, humanistas e republicanos, propunha, primordialmente, formar as crianças para fazer delas adultos mais felizes e melhores.

Auspiciada pelo dinheiro como valor hegemônico, a ideologia dominante é a do novo-rico, que conhece o preço das coisas, mas desconhece seu valor. Se, em seu primeiro espírito, o capitalismo se baseou na parcimônia e no não contraimento de dívidas e no segundo valorizou o mérito e o trabalho como “dignificante” do homem, seu estágio atual é “sem espírito”, entronizando o dinheiro como supremo valor, dinheiro que, na aceleração do tempo, induz à pressa, os indivíduos perdendo o gosto do pensamento, nada desejando aprofundar.

O próprio amálgama de diversos delitos entendidos como corrupção (favorecimentos ilícitos, informações privilegiadas, tráfico de influência, gratificações indevidas, desvio de verbas públicas, suborno, omissões por interesses próprios ou partidários, formação de cartéis), malgrado pontos em comum, atesta sua fraca conceituação. E porque é mais fácil “derrubar o tirano do que as causas da tirania”, a vigilância cidadã fica sujeita à demagogia, quando a opinião pública é direcionada por interesses dissimulados, a defesa do bem público transgredindo seus limites e invadindo a esfera privada e a da intimidade. Tais movimentos, quanto mais conceitualmente confusos, mais vulneráveis à apropriação oportunista.

Além disso, as mobilizações contemporâneas se fazem com as novas tecnologias de informação, nas quais tudo se passa “aqui e agora”. Essa temporalidade é a do efêmero, mas em sentido pós-moderno, uma vez que ele se reduz ao episódico, compensado pela visibilidade promovida pelas mídias. Sua lógica é a do espetáculo que não se vincula a qualquer fundamentação teórica, adquirindo a forma do “evento”. No passado, a vida se organizava no tempo longo e nos laços duradouros, cuja “metafísica” subjacente dizia respeito à percepção da impermanência de tudo, da lei do efêmero, da vanidade das coisas e da grandeza do instante. As manifestações públicas e ocasionais contemporâneas se constituem no âmbito de um vazio ideológico e no quadro do anti-intelectualismo do mundo moderno, o que se expressa na pseudoparticipação popular e em governos que se fazem através das mídias, pela televisão e pela propaganda.

Com reivindicações particulares voltadas para si mesmas, esses movimentos não se vinculam uns aos outros, resultando em particularismos. Há algum tempo, as manifestações públicas repercutiam em toda a sociedade, chamada assim a delas participar, ativamente ou por consentimento, ao que correspondia a lei entendida como universal, pelo reconhecimento das diferenças das demandas sociais, unificadas, justamente, na lei universalizadora. As mobilizações contemporâneas têm seguidores que se reúnem em comunidades virtuais com sua solidariedade pós-moderna, sem valores comuns admirados e compartilhados por todos.Walter Benjamin caracterizou a modernidade capitalista como “pobreza da experiência” e “experiência da pobreza”, mas nela identificou o novo. Pois essa pobreza “leva a começar do começo, a retomar as coisas desde o princípio, a dar um jeito com pouco, a construir com o pouco que se tem”.

Recorde-se que o movimento que paralisou a França em 1968, de que decorreram desde o movimento de emancipação feminina até a própria democratização das esquerdas autoritárias e de seus partidos centralizadores - encontrando-se na base até mesmo da queda do Muro de Berlim -, teve seu início com estudantes que reivindicavam o direito de visita a suas colegas e namoradas em seus quartos de estudantes.

Razão pela qual os recentes movimentos no Brasil podem constituir o “princípio esperança” do aprimoramento da vida política e do bem-viver em nosso cotidiano.

* Professora titular de Filosofia da USP e autora, entre outros, de Benjaminianas: cultura capitalista e fetichismo contemporâneo (UNESP)

FONTE: ALIÁS/O ESTADO DE S. PAULO

A política como lugar :: Saskia Sassen

Ocupar significa enfrentar a lógica antidemocrática do poder, redefinindo o papel do cidadão na ‘rua global’

Ocupar não é o mesmo que demonstrar. Muitos dos protestos do ano passado - Praça Tahrir, os indignados, Ocupe Wall Street (OWS) e outros - deixam nítido o fato de que ocupar significa estabelecer um novo território. Transformar o que era visto meramente como um espaço num território. Nesse processo, ocupar também cria um pouco de história.

Território é um vetor estratégico em todos esses tão diversos processos de ocupação. No sentido em que estou usando o termo, território é uma condição complexa na qual se insere a lógica do poder e da reivindicação, algo que implica muito trabalho para criar e não pode ser reduzido apenas à factibilidade elementar do espaço ou da terra. Assim, ocupar é um processo que reelabora, mesmo temporariamente, a frequentemente antidemocrática lógica do poder incrustada no território. E com frequência também redefine o papel dos cidadãos, na maior parte debilitados e fatigados depois de décadas de injustiças e desigualdades crescentes.

Na verdade, as ocupações têm revelado até que ponto a realidade do território vai além de seu significado predominante em todo o século 20: o do território de soberania nacional. Dependendo da região do mundo, durante um século ou mais a complexa categoria que é o território ficou restrita a um único significado: território de soberania nacional.

O movimento Ocupe Wall Street entrou num dos territórios estratégicos das finanças globais e, durante dois meses de trabalho duro e muita deliberação coletiva, estabeleceu um novo território - físico e conceitual - com sua própria lógica de organismo e representação descentralizados. O movimento Ocupe Oakland se inseriu num território estratégico do comércio global em novembro, quando temporariamente fechou o porto da cidade, o quarto maior dos Estados Unidos.

A maneira como a Praça Tahrir foi usada durante a revolução egípcia - o trabalho de erigir um acampamento e mantê-lo habitável e pacífico durante vários meses - da mesma maneira transformou a praça num outro tipo de território. Los Indignados, na Espanha, não realizaram apenas manifestações: eles estabeleceram um acampamento com múltiplas funções.

Os estudantes que ocuparam a Universidade de Porto Rico um ano atrás durante dois meses, cercados pelo Exército, criaram algo parecido a uma sociedade e economia alternativas, cuidando do seu próprio sustento, ensinando várias habilidades um ao outro.

Essas e tantas outras ocupações exigiram trabalho e estratégia. Diria que é um movimento social multilocalizado, criado a partir do cruzamento de um modo político global e das especificidades e história locais. Cada um desses lugares tem a própria genealogia de ações, histórico de violência e libertação e geografia do poder. Mas nesta atual era global algumas condições estruturais estão presentes em mais e mais países: em todos eles observamos o crescimento das desigualdades e a expulsão das jovens gerações da classe média de um projeto de vida de classe média.

No seu início, a criação do território nacional envolveu conquistar autonomia de uma potência dominante - como ocorreu com os Estados Unidos no princípio e também no caso dos movimentos de independência na África e muitas outras lutas em todo o mundo. Esses foram momentos importantes, quando a lógica do poder e da outorga de poder coincidiram numa tentativa de se criar sistemas políticos e socioeconômicos mais igualitários. Como resultado, surgiram governos de certa maneira receptivos às demandas das classes médias emergentes.

Com mais frequência, contudo, essas primeiras lutas para criar território próprio foram frustradas por elites que se apoderaram abusivamente do poder, deixando os cidadãos empobrecidos e sem nenhum direito de representação. Essa decadência não seria apenas interna, contudo. Estabelecer o próprio território também pode levar à colonização dos antigos habitantes do lugar ou, no decorrer do tempo, significou entrar furtivamente no território de outros. O que nos leva de volta às contradições do território nacional: alguns Estados-nação foram criados no rastro de vastas geografias imperiais de exploração e dominação. Num sentido importante, contudo, territórios colonizados são constituídos por meio de uma lógica distinta daquela do território feito nação, que é impulsionado, pelo menos no início, pela lógica da autodeterminação. Hoje, era em que vemos a decadência do Estado liberal, a lógica do poder não coexiste com a lógica da outorga de poder - ela coexiste com o empobrecimento crescente da classe média e a perda dos direitos do cidadão.

A decadência do “projeto nacional” em parte decorre da emergência de vetores territoriais diferentes. Observamos a ascensão de novos agrupamentos de uma miscelânea de território, autoridade e direitos outrora firmemente assentados nas estruturas nacionais. O espaço operacional das empresas globais é um agrupamento de uma miscelânea de múltiplos territórios nacionais. Assim também é a rede das cidades globais. Esses agrupamentos emergentes na maior parte atravessam o binário do “nacional versus global”. Os movimentos “Ocupe” também são agrupamentos emergentes de uma miscelânea de vários territórios nacionais (e globais). Sua reivindicação do espaço público é uma resposta às deficiências cada vez mais palpáveis da lógica do Estado-nação.

Esses movimentos lançaram um processo emergente que considero como da “rua global”, um lugar para se criar o social. Esse modo de formação do público é bem diferente da tradição europeia do espaço público, que é o lugar para implementar práticas que já se tornaram um ritual. O movimento “rua global” liberta o território, como categoria e como capacidade; ele transforma a rua num espaço para reformular o social e o político por aqueles que não têm acesso aos instrumentos de poder estabelecidos dentro dos limites do território de soberania nacional. É por isso que os acampamentos no Cairo, Nova York e em todos os outros locais são um elemento crucial em meio às mudanças mais profundas que estão desestabilizando a territorialização nacional da vida política e social. E é por isso que as tentativas para fazer acampamentos na Síria e no Bahrein são importantes, mesmo se fracassarem.

O espaço mais amplo permitindo essa ocupação em múltiplos lugares é a rede das cidades globais em todo o mundo, cujo número vem aumentando, em parte como resultado das necessidades territoriais maiores do capital global e das finanças globais. E aqui reside uma interessante dialética entre o crescimento das cidades globais e o crescimento dos movimentos de ocupação. A cidade surge como um espaço em que os impotentes podem fazer história; não é o único espaço, mas é um espaço crucial. Seja no Egito, nos Estados Unidos ou qualquer outro lugar, é importante que o objetivo dos ocupantes não seja o de arrebatar o poder.

Inversamente, eles estiveram e estão engajados em trabalhar para a cidadania, expor as falhas e os erros da política e da sociedade. No meu livro Territory, Authority, Rights (Território, Autoridade, Direitos - 2006), abordei essa questão de como os impotentes podem fazer história e, se o conseguirem, como poderão fazer isso sem se tornar necessariamente pessoas com o poder nas mãos. Isso nos mostra que a impotência não é simplesmente uma condição absoluta que pode ser nivelada para se tornar ausência de poder. O fato de as pessoas se tornarem presentes e, importante, se tornarem visíveis umas para as outras, pode alterar a natureza da sua impotência. Com base em certas condições, a impotência pode se tornar algo complexo, e com isso quero dizer que ela pode conter a possibilidade de criar o político, o cívico, ou a história.

A violência com que várias dessas ocupações pacíficas têm sido confrontadas pela polícia e pelos soldados do Exército é indicação de quão ameaçadora é a ocupação. E o quão difícil e desordenado tem sido neutralizar o projeto dos ocupantes nos mostra que o Estado tem que trabalhar para restaurar o território no seu antigo formato e se reinserir na lógica mais antiga.

Tradução de Terezinha Martino este texto é parte de um ensaio da autora para a revista Artforum

FONTE: ALIÁS/O ESTADO DE S. PAULO