domingo, 15 de janeiro de 2012

Lindbergh Farias: 'Não vamos aceitar apontarem arma contra nós'

Lindbergh Farias (PT) reage a declarações de cacique do PMDB-RJ e admite a possibilidade de, se tensão se acirrar, o deputado Alessandro Molon disputar com Paes

RIO - O senador Lindbergh Farias, PT, está certo de que o governador Sérgio Cabral e o prefeito Eduardo Paes, ambos do PMDB, estão firmes na parceria para as eleições municipais de outubro — uma prévia do xadrez para a sucessão estadual, em 2014. Tanto é assim que, na capital, ao menos por enquanto, a chapa é Eduardo Paes na cabeça e o vereador petista Adilson Pires como vice. Tudo ia muito bem até o presidente do PMDB-RJ, Jorge Picciani, afirmar, na edição de O DIA de 8 de janeiro, que o apoio aos petistas não estava automaticamente garantido em outros municípios. O tempo fechou, muitos políticos fluminenses passaram a semana no telefone, e o presidente nacional do PT, Rui Falcão, foi acionado para lidar com o que Lindbergh chama de “fato político novo”. Agora, o PT quer recomeçar a falar de alianças com o PMDB, e o senador petista manda recado claro:

“Não vamos aceitar tratarmos o PMDB como grande aliado e apontarem uma arma contra nós.” Ele admite a possibilidade de, se a tensão chegar a um nível intolerável, o deputado estadual Alessandro Molon (PT) sair candidato contra Paes. E, para quem não entender de pronto, resume: “Alto lá, nos respeite.”

O DIA: Jorge Picciani descartou apoio do PMDB a candidatos do PT em municípios importantes. O que o senhor tem a dizer?

LINDBERGH: A gente colocou o PMDB como o grande aliado (no Rio). O presidente do PMDB-RJ coloca o PT como o grande inimigo. Essa entrevista do jornal O DIA reabre as discussões, traz um fato político novo. Nós queremos envolver a direção nacional, sentar com o PMDB e discutir o quadro do Estado inteiro. O ministro da Pesca, Luiz Sérgio, me ligou pedindo pra chamar uma reunião com o governador, ele e o presidente do PT, Rui Falcão. Achei muito boa a iniciativa.

Esta discussão passa também pela capital, onde o PT indicou o vereador Adilson Pires como vice na chapa do prefeito Eduardo Paes?

Claro. Na capital temos um grande apreço pelo prefeito Eduardo Paes. Só não dá para o PT apoiar os candidatos do PMDB e sermos atacados, não termos aliança em outros municípios importantes.

Tudo isso tem relação com o senhor disputar o governo do Estado em 2014?

Temos uma candidatura a governador e o PMDB outra, do (vice-governador Luiz Fernando) Pezão. Apostamos que até o final de 2013 pode haver uma solução. Espero que seja o meu nome. Vamos trabalhar nessa aliança e ver o mais competitivo.

O senhor aceitaria ser vice do Pezão?

Não.

Picciani diz que defende o interesse do partido.

O Picciani é bom na política com deputados, na Assembleia Legislativa, mas de eleição, com o povo, entende pouco — Picciani presidiu Alerj quatro vezes. As pessoas não gostam de agressividade. Querem humildade. Acho que esse foi o motivo da derrota dele (na eleição para o Senado em 2010, quando Lindbergh se elegeu). (Agressividade) pode ser bom para os deputados. Tem deputado que tem medo dele, mas Assembleia é uma coisa, povo outra.

O ex-governador Anthony Garotinho (PR) diz que ele quer o filho (deputado federal Leonardo Picciani) como vice do Paes.

Tem gente que fala isso, eu não sei.

Essa tensão pode levar ao rompimento da aliança em torno do Paes?

Não. O prefeito e o governador Sérgio Cabral, nas conversas com o PT indicam que o caminho é outro. Falei com o Eduardo Paes, o clima é de consolidar a aliança. O que surgiu de bombeiro do PMDB para dizer que não era bem aquilo... Talvez a entrevista tenha servido para organizar uma unidade no PT, para dizermos: ‘alto lá, nos respeite’! Não vamos aceitar tratarmos o PMDB como grande aliado e apontarem uma arma contra nós, antecipando 2014. Está aqui um candidato a governador pelo PT que diz que não é hora de antecipar 2014.

O senhor colocaria o Picciani como inimigo?

Não. Com todo o respeito, ele não tem essa força toda. Quem tem a força é o governador. Nós fazemos pesquisa também, sabemos que nessas eleições o que importa é a unidade. As pessoas querem ver no mesmo palanque Cabral, (o ex-presidente) Lula, (a presidenta) Dilma, eu e os senadores (Marcelo) Crivella (PRB) e (Francisco) Dornelles (PP).

E se não houver nenhuma contrapartida ao apoio do PT à reeleição do Paes?

O PMDB perderia totalmente a autoridade de exigir apoio em cidades importantes do Estado, no próprio Rio. Mas, se o objetivo era arrumar uma briga entre PT, governador e prefeito, só consolidou esta unidade.

Aqui no Rio o deputado federal Alessandro Molon é contra o PT como vice do Paes. Essa linha sai fortalecida?

Ganha espaço. O Molon é um grande nome, vai chegar o momento de ser candidato a prefeito. Mas só imagino a candidatura dele (este ano) num quadro de acirramento da crise. Só na hipótese de o PMDB declarar guerra a todos os principais candidatos do PT é que ganha força a hipótese de candidatura na capital.

Como o senhor vê a sinalização do PMDB de apoio à reeleição do prefeito Jorge Roberto Silveira (PDT) em Niterói?

Niterói é muito importante. Temos um candidato favorito, o (secretário estadual de Assistência Social) Rodrigo Neves, com apoio do Lula, da Dilma e do Cabral; caminha para uma definição. Atualmente há um desgaste do Jorge Roberto. Ele não ganha.

Onde mais o PT tem candidatos competitivos?

Em Mesquita, não entendemos o motivo de o PMDB não nos apoiar. Em Teresópolis, o deputado (estadual) Nilton Salomão é viável. Em Angra (dos Reis), temos uma candidata forte (Conceição Rabha), mas é natural que o PMDB não apoie, porque tem a prefeitura. Tem lugares onde tem disputa, a gente entende. Temos candidatos fortes em Barra Mansa, Silva Jardim, Maricá, Conceição de Macabu, Santa Maria Madalena, Paracambi, Japeri.

Em Nova Iguaçu, onde o senhor foi prefeito, qual é o caminho? É a prefeita Sheila Gama (PDT), que foi sua vice, ou o Rogério Lisboa (DEM), que foi seu secretário de Obras?

Eu propus ao governador o nome do subsecretário de Obras, Vicente Loureiro (PPS), para unificar várias candidaturas. E ele me disse numa reunião com 15 deputados: “Vamos nesse caminho do Vicente Loureiro.” E eu estou costurando esse caminho para o Vicente lá em Nova Iguaçu. O (deputado federal Nelson) Bornier (PMDB), do outro lado, é um candidato que de noite vai dormir com o Garotinho e de manhã acorda com o Picciani.

Como que está a situação das ações do Ministério Público movidas contra o senhor durante sua gestão?

Todo prefeito responde a muita ação do MP. Quando você é deputado, governador ou senador, só pode ser processado pelo procurador-geral de Justiça. Quando é prefeito e assina qualquer documento, o (promotor do) MP pode pedir ação. Estou tranquilo, eu nunca tive denúncia aceita (na Justiça), condenação e nunca vou ter.

A Justiça determinou o bloqueio dos seus bens. Isso causa algum transtorno?

Nada, nada. Eu não tenho bem próprio, só o que tenho de herança do meu pai, e que está parada. Eu sou diferente dessa política do Rio, que tem uma lógica patrimonialista, de acumulação de patrimônio. Não podem dizer um ‘ai’ de mim.

E se a presidenta não vetar a nova divisão dos royalties do petróleo?

Nós vamos conseguir vencer essa batalha. A presidenta viu os abusos que foram cometidos no projeto aprovado pelo Senado. Aquele projeto tinha números falsos. Trazia um prejuízo direto ao Estado e aos municípios do Rio de Janeiro de R$ 50 bilhões até 2020. Significaria fechamento de postos de saúde e de escolas, e acho que isso a gente conseguiu mostrar. A atitude de parar o projeto na Câmara partiu da presidenta Dilma. As informações que eu tenho é que ela foi atrás e percebeu que esses números levantados eram absurdos. Mas, se ela não vetasse, nós iríamos lutar até as últimas consequências, até o Supremo Tribunal Federal (STF).

Qual foi o erro na conta?

Eles aumentaram a projeção de royalties e de participação especial em 2020. Isso escondeu a realidade dos números que o Estado, e os municípios perderiam recurso já este ano. Então a presidenta, ao olhar aquilo tudo, pediu à liderança para parar e rediscutir aquilo tudo, o que é um tempo importante para o Rio. Toda essa discussão é porque não dá para mexer naquilo que já está licitado e que é direito constitucional nosso. A sensação que eu tenho é a seguinte: se nós perdermos essa batalha dos royalties, perderemos uma geração de jovens, que são o futuro do Rio.

Tem gente defendendo moratória se passar no STF. Vai comprometer as contas a esse ponto?

Acho que sim. Principalmente porque uma parte dos royalties é para pagar dívidas do Estado. É uma parte que foi comprometida no governo Garotinho. Se retiram recursos disso, o STF está comprometendo o pagamento de recursos dessa dívida. Tem outras formas de compensar os estados.

O senhor iria às ruas em protesto com a cara pintada, como antigamente? (Lindbergh liderou as manifestações de jovens no governo de Fernando Collor de Mello, que sofreu impeachment)

Não precisa pintar a cara. Acho que o papel dos movimentos estudantis e especialmente o dos caras-pintadas foi muito importante na História para discutir se esse País está ou não dando certo. A ida às ruas é um caminho muito legítimo. As manifestações como aquela que ocorreu no Rio de Janeiro em novembro (em defesa dos royalties do Rio) têm um papel muito grande. A representação do Rio e do Sudeste no Congresso é muito inferior à relevância nacional. Por exemplo, somos apenas três senadores. Mas, quando falamos em população, são 15 milhões de pessoas. Temos uma participação muito importante nas eleições. Então, irmos às ruas significa dizer: “Tudo bem, passaram por cima da gente no Senado, porque vocês têm maioria, mas vão passar por cima de uma população de 15 milhões de pessoas, que representa muito no País?” Acho que tem esse sentido.

Como está sua relação com o senador Fernando Collor de Mello (PTB)?

No primeiro dia, ficou todo mundo esperando, a imprensa toda. Passei a manhã querendo fugir da foto. Teve uma hora que ele estava na minha frente, não teve jeito. Ali, é o convívio de 81 senadores, tem de falar, tem de ser educado com todo mundo, tem de ter uma relação cordial e ele, nesse sentido, é muito cordial, muito educado. Pessoalmente falou lá comigo e foi à porta dos jornais no outro dia. Mas é isso, faz parte. Chama “Vossa Excelência” e aí ‘bate’ na pessoa, “Vossa Excelência”... Eu sou de uma geração um pouco diferente. Ali eu, o Randolfe (Rodrigues), que é do PSOL (AP). Essa diferença nossa é também geracional. Então...

Então?

Não sou um cara completamente adaptado àquela Casa, mas tem horas que faz parte do jogo ser mais duro, enfrentá-lo com mais força e isso faz parte um pouco do processo.

O que fazer para as chuvas não matarem tanta gente todos os anos?

A legislação brasileira é muito atrasada em tudo que diz respeito ao sistema nacional de defesa civil. Apresentei alguns projetos que criam uma força nacional de defesa civil que dá mais velocidade nessas áreas de socorro, mas a coisa mais grave é que não existe um cadastro nacional das áreas de risco que funcione. Ninguém sabe o tamanho do problema, o tamanho da encrenca. Isso está ocorrendo agora, a partir das chuvas na Região Serrana, e é preciso admitir a completa incompetência na política nacional, de estados e de municípios, na construção de um sistema integrado.

O senhor não acha que pouca coisa foi feita após o maior desastre natural do País? (Mais de 900 pessoas morreram na Região Serrana em 2011)

Acho que foi muito pouco. Nessas horas, as obras têm que acontecer com muito mais velocidade. Neste caso, não foi a velocidade com que deveria ter sido feito.

O senhor hoje é aliado do Cabral, mas ele já foi aliado dos ex-governadores Marcello Alencar (PSDB) e Garotinho, e rompeu. Acha que pode acontecer isso agora também?

Uma coisa que nos aproxima definitivamente é a relação com Lula. A relação dele com Lula é de fato muito sincera, afetuosa. Nesse sentido, o Lula pode ter ensinado muito a fazer primeiro pelos que mais precisam, mas os dois criaram uma relação que serve como base inclusive para essa nossa aliança. Se você me perguntasse se eu e o Cabral estaríamos do mesmo jeito se não fosse o Lula, eu diria ‘não sei’. Acho que não.

A ‘Folha de S. Paulo’ lhe atribui uma declaração que, segundo o jornal, refere-se a um período em que o senhor teve problemas com drogas. É verdade?

Não falei isso nem vou falar isso com vocês. Eu já conversei com ela (a jornalista) depois sobre isso.

'Quando um filho teu sofre preconceito é f...'

Quando falou da filha, Beatriz, de um ano e sete meses, que tem síndrome de Down, na sexta-feira, o senador Lindbergh Farias acabou se emocionando. A voz ficou embargada, os olhos se encheram de lágrimas: “Quando um filho teu sofre preconceito é f...”

Segundo o senador, uma das maiores dificuldades para milhares de famílias brasileiras que têm filhos com alguma deficiência é o acesso à educação. Embora a lei determine a aceitação da matrícula dessas crianças e adolescentes , a realidade é outra. Os pais “enfrentam uma luta muito grande para conseguir vagas nas escolas públicas e privadas”, relata, referindo-se às escolas de baixa e de alta renda.

Na luta pela igualdade de oportunidades, conquistou dois aliados de peso: o ex-jogador e deputado federal Romário (PSB) — pai de Ivy, 6 anos, também com Down — e a presidenta Dilma Rousseff.

“Romário tem feito um trabalho que é até mais importante que as leis. Está assumindo uma postura que ajuda as pessoas a caminharem para a inclusão”, avalia.

Lindbergh comemora o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, que foi lançado em novembro por Dilma e facilita o acesso ao mercado de trabalho.

O senador, que também é pai de Luiz, 16, agora espera Marina, que deve chegar em junho. “Três filhos, família grande. Uma das coisas que mais pesam na questão da deficiência... Toda família se questiona: E quando eu morrer?”

Reportagem de André Zahar e Rozane Monteiro

FONTE: O DIA

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