quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Oposição terceiriza seu projeto de poder

Cristian Klein

Que a oposição está perdida não é novidade. A última evidência é a confusão no PSDB sobre qual avaliação o partido faz sobre o primeiro ano de governo da presidente Dilma Rousseff. Um diagnóstico mais virulento, produzido pelo ex-governador de São Paulo, Alberto Goldman, foi desautorizado e substituído por uma versão bem mais amena da direção nacional. Há tempos, os tucanos não sabem para onde apontar o bico.

A diferença agora é que fica mais claro o vácuo de poder. O PSDB parece acéfalo. O senador mineiro Aécio Neves frustrou as previsões de que seria a voz da oposição e teve uma atuação apagada em sua volta ao Congresso. Não deu outra. Com o ex-governador de São Paulo, José Serra, no ostracismo depois da derrota à Presidência em 2010, e o atual, Geraldo Alckmin, voltado para defender seu território contra uma eventual e forte aliança entre o PT e o PSD que ameaça seus planos para 2014, até o senador Alvaro Dias (PR) apresenta-se como pré-candidato da sigla à corrida presidencial.

A doença por que passa a oposição é a de não criar expectativa de poder. Sua estratégia agora é se misturar ao grande condomínio da coalizão liderada pelo PT, e tentar se infiltrar e abrir fissuras no bloco. A criação do PSD pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, e sua "sociedade" com o governador de Pernambuco e presidenciável, Eduardo Campos, líder do PSB, é um exemplo desse movimento.

Em Campos deságua expectativa de voltar ao governo

A resistência do PSDB em bater no governo Dilma e o flerte de Alckmin com a presidente - visitante assídua de cerimônias no Palácio dos Bandeirantes - são outras evidências. Dilma, espertamente, encostou na oposição. E a oposição mantém o contato, que segue o plano de embolar com o adversário.

A ideia de que parcerias com programas federais ajudam na solução dos problemas da população é só uma mal disfarçada forma de mascarar a realidade. Quanto maior é a proximidade da oposição com o governo, mais ela revela a perda de sua força como alternativa. Não sem razão, o movimento foi intensificado depois de 2010.

O fracasso de Serra renovou a perspectiva de um governo petista pelo menos até 2018. A reeleição no Brasil, como nos Estados Unidos, criou um sistema em que o mandato praticamente é de oito anos, confirmado em sua metade, salvo um desastre. Hoje, a única esperança para a oposição é o agravamento da crise europeia a ponto de abalar seriamente a economia brasileira. Quanto pior, melhor. Mas a administração petista soube contornar, com destreza, até a crise de 2008. Então, haja paciência. E nem todos estão dispostos a esperar.

A perspectiva pessimista deixa a oposição muito mais longe de seu objetivo e exposta ao processo de definhamento. O DEM já passava por ele, antes da debandada para o PSD. O PSDB teme a mesma desidratação. Os rumores de que Serra pode sair para o PPS ou para o PSD (com menos probabilidade) para disputar a Presidência em 2014 é um retrato do desencanto.

A aproximação da oposição com o governo se dá, não por coincidência, no momento em que ela já percebe que está mais longe de ser a primeira via, o primeiro colocado, e mais perto de ser alcançada por quem vem atrás. Sua preocupação hoje é a de não ceder esse lugar ou minimizar a perda de espaço, negociando-o com a terceira via.

Por isso evitou agredir o ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra (PSB), acusado de privilegiar seu Estado, Pernambuco, com verbas de combate a enchentes. Tudo para não melindrar Eduardo Campos, fiador de Bezerra.

Em Campos deságua hoje a principal expectativa de poder, fora do PT. Ele está na base do governo federal, mas habilmente constrói inúmeras pontes com a oposição, em alianças estaduais (São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Alagoas, Paraíba). A ida do deputado Márcio França para o governo Alckmin teve entre seus objetivos ajudar os tucanos e evitar que os petistas dominem São Paulo.

"O único foco real de oposição é São Paulo, Estado que impõe muito respeito e sozinho já assusta. Se o PT ganhar a capital e o governo, acabou o PSDB. O PT vira partido único, hegemônico", diz um dirigente do PSB.

Há quem aponte que o destino da oposição (PSDB, DEM, PPS) passe por Campos, como garantia de um período de estancagem da hemorragia, para só então haver uma volta ao poder, em 2023. É um exercício de futurologia, ainda que autointeressado. "A oposição vai ficar no pé do Eduardo. Ele vai ser a salvação", defende outro dirigente do PSB.

Eduardo Campos, no entanto, também tem suas dificuldades. Em primeiro lugar, precisa defender o que conquistou. Reelegeu-se com 83% dos votos, é o governador mais bem avaliado do país, mas, diante do fim do ciclo de dois mandatos, precisa fazer bem a transição. Tem o PT em seu calcanhar, no comando de Recife, e enfrenta o desafio da sucessão - sempre uma operação de risco, pela possibilidade de traição do apadrinhado. Sair do governo e eleger-se ao Senado é entrar numa trajetória declinante, como a de Aécio. Daí sua pressa de mostrar poder de fogo enquanto tem condições - como governador. Esforço evidente foi a força-tarefa montada na Câmara para eleger sua mãe, Ana Arraes, ministra do Tribunal de Contas da União.

Eduardo Campos quer influir como ator de peso em 2014. Seja como vice numa chapa de situação ou na cabeça de uma candidatura própria tendo Kassab como vice e/ou com apoio da oposição. Nos acordos para a eleição municipal, não quer discutir 2012 sem negociar 2014. A transferência do título eleitoral de Fernando Bezerra, de Petrolina para Recife, como ameaça ao PT, faz parte do jogo.

Em segundo lugar, Eduardo Campos carece de maior inserção no empresariado. Sem o mesmo enraizamento social e nacional, como os petistas, ou o poder econômico que mantém em São Paulo o polo da oposição, Campos procura abrir canais com o eixo Sul-Sudeste.

Pelo Brasil, o PSB já tem filiado nomes como Mauro Mendes, dono da Bimetal, no Mato Grosso, e José Batista Júnior, o Júnior Friboi, proprietário do grupo JBS, em Goiás. Mas em São Paulo, o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, entrou na legenda e saiu para o PMDB. A aliança com Kassab, conhecedor do patronato paulista, pode ter, neste sentido, mais utilidade do que parece à primeira vista.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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