domingo, 11 de março de 2012

Desvalorização cambial disfarçada:: Vinicius Torres Freire

Empresas brasileiras no PS vão ser tratadas com proteção comercial e menos impostos, confirma governo

Na sexta-feira, o governo abriu um pronto-socorro para a indústria.

Primeiro, foram abertas as inscrições de pedidos de aumento do Imposto de Importação para até cem produtos. As empresas podem apresentar seus pleitos até 2 de abril, demonstrando que são afetadas por concorrência desleal, grosso modo.

Na prática, isso significa que os atendidos no PS vão poder aumentar preços. Com a concorrência, desleal ou não, as empresas que se dizem afetadas perdiam mercado (não vendem) ou rentabilidade.

Segundo, o governo anunciou que vai oferecer mais reduções de impostos para setores que se dizem prejudicados. O governo deve reduzir tributos sobre salários, como a contribuição patronal para o INSS. Pode reduzir o Imposto sobre Produtos Industrializados.

Na prática, isso significa que o governo vai abrir mão de receita tributária para compensar a perda de rentabilidade das empresas.

Terceiro, o governo vai emprestar mais dinheiro via BNDES.

Na prática, isso significa gastar algum dinheiro público extra para bancar empréstimos mais baratos, subsidiados, para as empresas.

As promessas, ainda que vagas, foram feitas em público pelos ministros Guido Mantega, da Fazenda, e Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio.

Tamanho rebuliço parece se dever ao resultado fraco da indústria no primeiro bimestre. Novo tropeço industrial em 2012 ameaça a meta dilmiana de crescimento de 4%.

O governo atribui o mal-estar da desindustrialização ao real forte e à sobra de mercadorias no restante da economia mundial. A valorização do real é, em primeiro lugar, atribuída ao excesso de dinheiro despejado pelo mundo euro-americano em suas economias letárgicas.

Em suma, o governo faz o que faz, desde 2009, porque não consegue desvalorizar o real a ponto de barrar a concorrência externa, desleal ou resultado da liquidação de mercadorias num mundo em crise.

No final da semana, nas internas do governo havia a conversa de que o câmbio variando entre R$ 1,70 e R$ 1,80 é bastante para evitar maiores danos à indústria.

É conversa mesmo. Em 2009, quando o governo enfim se sentiu à vontade na heterodoxia e começou a taxar a entrada de capital externo, o dólar médio foi de R$ 1,99. No final daquele ano, a conversa no governo era que o piso adequado do dólar era R$ 2,10, por aí.

Em 2010, o dólar médio foi de R$ 1,76. Em 2011, de R$ 1,67. Enfim, o governo se mexia quando o dólar passava pela barreira de R$ 1,70, embora a moeda americana tenha chegado a R$ 1,54 em julho do ano passado. Com a contribuição de crises, paniquitos do mercado e intervenções, o governo conseguiu deixar o dólar em torno de R$ 1,70.

Mas R$ 1,70 em 2010 não é a mesma coisa que em 2012. Já se trata de um câmbio nominal baixo, em si. Mas houve inflação no período. Isto é, o câmbio real ficou ainda pior para a indústria nacional.

O mundo está mesmo todo heterodoxo. O Brasil padece com isso-no curto prazo, alguma revanche é aceitável. Mas a única reação do governo tem sido a de promover "desvalorizações do câmbio" para alguns setores (proteção comercial, redução de tributos), na impossibilidade de desvalorizar a moeda, sem aspas. É simples assim. Só.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

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