quinta-feira, 19 de abril de 2012

De uma CPI seletiva contra a oposiçãoa outra ampla e temida pelo governo :: Jarbas de Holanda

Longo encontro no início de abril, entre Lula e seu ex-chefe da Casa Civil José Dirceu – do qual a imprensa deu notícia – teve como conclusão que uma CPMI sobre as relações do contraventor Carlos Cachoeira com políticos e algumas autoridades cumpriria importante papel para o ex-presidente e seu partido: esvaziar ou propiciar o adiamento da decisão do STF sobre o mensalão, às vésperas de julgamento. Desviando a indignação da sociedade para outro escândalo, inclusive com o bloqueio das mobilizações populares que começam a ser feitas de cobrança dessa decisão, ou ao menos servindo para diluir os crimes dos seus réus (assim tipificados pela Procuradoria Geral da República), nivelando-
os, pluripartidariamente, aos de integrantes de várias legendas, sobretudo de oposicionistas.

Tal conclusão foi articulada a instruções com dois objetivos: a garantia de seletividade da CPMI por meio da restrição dela às relações de Cachoeira no Congresso e no estado de Goiás (no máximo com a extensão ao Distrito Federal), e a capitalização política da iniciativa pelas lideranças petistas no Senado e na Câmara. Instruções postas em prática logo nos dias seguintes – sem necessidade de acerto prévio com a presidente Dilma Rousseff, em viagem ao exterior – para surpresa da direção do PMDB e demais partidos da base governista.

Eis, porém, que o desencadeamento das diretivas lulopetistas coincidiu com novas e mais significativas revelações públicas a respeito de negociatas, tráfico de influência e fortes vinculações empresariais do esquema de Cachoeira. Revelações que puseram em xeque a seletividade antioposicionista do inquérito legislativo a ser instaurado. A principal delas indicando que a maior fonte das receitas ilegais do esquema teria sido a construtora Delta, que no governo Dilma passou a concentrar os contratos mais vultosos de obras do PAC.

O conjunto da mídia reflete a mudança do tratamento e da percepção social do escândalo protagonizado por Carlos Cachoeira, com o deslocamento para plano menor do senador Demóstenes Torres. Seguem-se manchetes e abertura de reportagens de ontem de alguns jornais. Da Folha de S. Paulo – “PT agora tenta
adiar CPI do caso Cachoeira”. “O temor de que as investigações... passem a respingar em membros do partido ou do Palácio do Planalto fez integrantes do PT começarem a trabalhar pelo adiamento da CPI no Congresso”. Do Estadão: “Diante do alerta do Palácio do Planalto sobre os riscos de desgaste do governo, tomou corpo no Congresso, com ajuda base governista, uma ‘operação abafa’ na CPI a ser instalada nos próximos dias”. Mais adiante: “A ‘operação abafa’ é resultado de pressão da presidente Dilma Rousseff para que setores do PT defensores da CPI do Cachoeira tenham calma e não usem a Comissão como palco de vingança, o que poderia causar danos políticos ao Palácio do Planalto”. Por seu turno, o Globo divulgou gravação, que não consta do inquérito da Polícia Federal sobre o caso Cachoeira, de um diálogo com um ex-sócio no qual o presidente da Delta, Fernando Cavendish, “fala dos milhões necessários para se ter abertas as portas políticas” para contratos. E o Jornal Nacional da Globo, de anteontem, levou ao grande público informação de outro ex-sócio da Delta vinculando um salto das receitas da construtoras com obras federais à contratação do ex-ministro José Dirceu como consultor.

Com a avaliação, predominante, de que não há mais como impedir sua convocação, essa CPMI – com o sucesso ou não da ‘operação abafa’ – provavelmente frustrará o grande objetivo do lulopetismo de usá-la para esvaziar o mensalão, podendo ao invés disso ensejar ao Congresso um significativo papel de combate à corrupção (com o que, como assinalou ontem a coluna de Raymundo Costa, no Valor “Dilma perderia a exclusividade da faxina moral”, trabalhada para denegrir e debilitar o Legislativo diante do Executivo). Mas a tentativa de manipulação da CPMI com tal objetivo (ainda não inteiramente afastado) foi, ou é, apenas um dos vários estratagemas que o lulopetismo está pondo em prática para neutralizar ou inviabilizar o julgamento este ano das ações do mensalão (segundo os dois últimos Procuradores Gerais da República, a “organização criminosa” denunciada e interrompida no primeiro governo Lula. Estratagema objeto da reportagem de capa da Veja desta semana: “Mensalão. A cortina de fumaça do PT para encobrir o maior escândalo de corrupção da história do país. Do qual a peça-chave são as pressões que estão sendo feitas sobre os membros do STF para protelação do julgamento e, sobre alguns, para absolvição dos mensaleiros, ou pelo menos de parte deles.

Jarbas de Holanda é jornalista

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