domingo, 22 de abril de 2012

Os múltiplos braços da CPI


Ao contrário das comissões parlamentares anteriores, a apuração no Congresso dos negócios de Cachoeira começará com uma bagagem maior de depoimentos e escutas telefônicas da Polícia Federal e do Ministério Público

Paulo de Tarso Lyra, Erich Decat

Um grupo de parlamentares que integrará a CPI mista para investigar o bicheiro Carlinhos Cachoeira vai iniciar uma peregrinação pelo Ministério Público Federal, Ministério da Justiça, Ministério da Fazenda e Tribunal de Contas da União (TCU) em busca de novos dados que possam contribuir nos trabalhos da comissão. Eles vão conversar com servidores que atuaram nas Operações Vega e Monte Carlos, deflagradas pela Polícia Federal, que culminaram na prisão do bicheiro em 29 de fevereiro.

A ação do grupo foi motivada por uma questão inusitada: diferente de outras comissões parlamentares de inquérito, a CPI mista do Cachoeira inicia após uma exaustiva investigação feita pela Polícia Federal e pelo Ministério Público desde 2009. Os principais envolvidos no episódio — que provavelmente serão ouvidos pela CPI ao longo dos próximos 180 dias — foram flagrados em conversas telefônicas autorizadas pela Justiça.

É a partir desse escopo de informações que a comissão vai trabalhar. "Como já há investigações realizadas, queremos que a CPI avance onde puder avançar", disse o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ). Ele afirmou que a ideia de formar a comissão de parlamentares surgiu no dia em que o requerimento para a criação da CPI foi lido em plenário, na última quinta-feira.

Segundo ele, ainda deve haver uma reunião administrativa para definir como esse trabalho será desenvolvido. "Queremos ser informados das dificuldades que foram encontradas ao longo das investigações ou mesmo se não conseguiram concluir alguma apuração", completou Miro. Ele acrescentou que outros prováveis parlamentares que deverão fazer parte desse grupo são os senadores Randolfe Rodrigues (PSol-AP) e Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE). Curiosamente, esses dois últimos participarão da CPI na condição de suplentes, com vagas cedidas pelo bloco de oposição do Senado. O pedetista fluminense, até o momento, é o único titular que fará parte desse grupo.

O líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA), reconhece que a CPI começa com um longo espectro de investigações e depoimentos. Mas, ainda assim, defende que a investigação no Congresso é importante. "Se não criássemos essa CPI, provavelmente o caso ficaria restrito à quebra de decoro do Demóstenes (Torres, sem partido-GO)", observou. "Não é uma comissão qualquer. Ela pode desvendar como o crime organizado está tentando dominar o Estado brasileiro em diversos níveis", completou o líder do PT na Câmara, Jilmar Tatto (SP).

Cassação

A preocupação procede. As investigações realizadas até o momento pela Polícia Federal e pelo Ministério Público mostram que os tentáculos da organização criminosa comandada por Carlinhos Cachoeira são longos e esparramados em diversas instâncias. A CPI terá diante de si a tarefa de analisar a relação do bicheiro com oito parlamentares. A principal personagem, até o momento, é o senador Demóstenes, que enfrenta um processo de cassação no Conselho de Ética. Além disso, outros seis deputados e um suplente de senador também estão na mira da comissão.

Não para por aí. Nos planos estadual e municipal, estão na mira autoridades de quatro estados e quatro prefeitos, todos de cidades goianas (leia quadro ao lado). Órgãos públicos federais e locais também deverão ter que dar explicações, como o Incra, a Terracap e o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram). Segundo matéria publicada pelo Correio, os três primeiros estão envolvidos em uma operação suspeita de compra de terras próximo à Base Aérea de Brasília.

Grampos

Já no caso da Infraero, existe a suspeita de envolvimento de Cachoeira em um contrato para serviços de informática. Outro que virou alvo da CPI foi o Ministério Público de Goiás, a partir de grampos revelados pelo Correio ligando Cachoeira, Demóstenes e o irmão do senador, Benedito Torres, procurador-geral de Justiça do MP goiano.

A Construtora Delta — citada no inquérito da PF — já começa a sentir os efeitos do escândalo. A construtora que mais cresceu nos últimos cinco anos está sofrendo uma devassa do governo federal. Na última sexta-feira, o Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre (Dnit) publicou em seu site todos os contratos mantidos com a Delta. Ao todo, são 21 contratos de duplicação/construção/adequação de rodovias públicas federais, que somam R$ 359,05 milhões. Oito deles estão ativos, 11 foram concluídos e outros dois, paralisados.

Os valores são bem mais vultuosos nos casos de manutenção de rodovias: 91 contratos estão ativos; 155, concluídos; e outros 17, paralisados. Todos somam R$ 2,831 bilhões. A empresa também anunciou que deixará o consórcio de reforma do Maracanã, uma obra que se aproxima do R$ 1 bilhão. A presidente Dilma Rousseff ordenou um pente-fino em todos os contratos da Delta, a principal construtora do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

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