domingo, 6 de maio de 2012

Os riscos da ousadia de Dilma na poupança

Para analistas, popularidade alta e oposição fraca permitiram à presidente mudar caderneta. Volta da inflação seria ameaça

Clarice Spitz

Ainda é cedo para dizer que a presidente Dilma Rousseff está construindo um legado de seu governo com a recente cruzada pelos juros baixos, avaliam cientistas políticos e economistas consultados pelo GLOBO. No entanto, eles são unânimes em afirmar que o governo foi ousado com a mudança na remuneração da caderneta de poupança. A combinação de popularidade recorde e oposição sem poder de fogo, além de uma boa dose do estilo pessoal de Dilma, foi fundamental para alterar as regras do investimento mais tradicional do brasileiro. Mas, alertam, o risco pode ser pagar um preço alto sobre a popularidade se a inflação voltar a subir.

- Há uma boa dose de voluntarismo da presidente e o fato de ser uma cruzada popular. Dilma tinha a convicção que os juros têm que baixar mesmo antes de ser presidente - diz o cientista político Sergio Abranches.

Para o diretor do Instituto Análise, Alberto Almeida, Dilma repete com os juros o estilo ousado de Luiz Inácio Lula da Silva no primeiro mandato, quando aumentou o superávit primário, pois crê que o aumento do consumo vá sustentar sua popularidade.

- Obviamente a sociedade aprova a redução dos juros, mas não está claro como isso vai evoluir. Toda a popularidade dela está baseada na perspectiva de que o consumo das famílias se mantenha alto.

O economista Luiz Carlos Prado, da UFRJ, considera que o governo Dilma soube ser habilidoso ao demonstrar a preocupação com a manutenção de contratos.

- Um presidente fraco não teria credibilidade para mexer na poupança. Ao contrário do governo Collor, seja na mexida na aposentadoria de funcionários públicos seja na poupança, eles valem apenas para os novos. É uma consolidação institucional e é bastante diferente dos nossos vizinhos na América Latina - avalia.

Analista vê viés populista em atitudes da presidente

Para Abranches, no entanto, a mudança da poupança é "temerária", já que a inflação pode voltar a ganhar fôlego com os juros menores.
- A forte queda dos juros pode reaquecer a inflação, e esse é o maior inimigo da popularidade - afirma. - Por um lado, a poupança está muito forte no imaginário popular como significado de segurança e, por outro, ainda está vivo o trauma da expropriação da caderneta de poupança pelo governo Collor.

Para o cientista político Francisco Fonseca, da FGV-SP, ainda é preciso cautela para classificar o esforço de Dilma como uma política pública de combate aos juros.

- O governo Dilma mostra uma visão de Estado em relação ao desenvolvimento como forma de contemplar várias classes sociais. Se a economia está estável, crescendo, os juros estão caindo, por que isso não chega aos juros? - indaga Fonseca.

Especialistas divergem, no entanto, sobre a estratégia de utilizar bancos públicos para forçar os privados a baixar juros. Abranches nota um viés populista no sentido de intervir na condução da política de juros, em detrimento do Banco Central.

- É um uso do aparelho de Estado como há muito não era feito. Existe um aspecto intervencionista com o uso do Banco do Brasil e da Caixa para forçar os outros bancos a baixar juros - diz Abranches.

Já Prado considera as recentes reduções de juros da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil como uma maneira eficaz de trazer competitividade ao mercado financeiro.

- Os bancos operavam como se fosse legítimo para eles ter um retorno acima daquele da sociedade - diz Prado.

FONTE: O GLOBO

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