segunda-feira, 14 de maio de 2012

Serra diz que sua campanha influencia Dilma

O pré-candidato José Serra (PSDB) disse ao Estadão que o motivo de disputar a eleição é "impedir uma descontinuidade dramática" nos rumos de SP. Para ele, sua campanha presidencial influenciou Dilma.

"Muitas das coisas que o governo faz foram resultado da minha campanha".

"Sou candidato para impedir descontinuidade dramática em São Paulo"

Tucano diz que "gosto" e "necessidade política" motivaram sua décima candidatura

Alberto Bombig, Bruno Boghossian

A cinco semanas da convenção que vai oficializar sua candidatura à Prefeitura de São Paulo pelo PSDB, o economista José Serra, de 70 anos, ainda seca as feridas de sua última disputa nas urnas, quando foi derrotado por Dilma Rousseff (PT) na eleição presidencial. Ele reconhece o peso do ex-presidente Lula no processo e assume a frustração: "Eu entrei efetivamente com a expectativa de vencer e perdi".

O tucano ainda dispara uma infinidade de dados sobre "problemas nacionais", mas passou a coletar números sobre a capital paulista e diz estar pronto para sua décima disputa em 26 anos. "Eu não sou dependente químico de eleição, mas eu gosto de campanha." Na quinta-feira, Serra recebeu o Estado em sua casa para uma entrevista exclusiva, na qual defende a gestão de Gilberto Kassab (PSD), e diz que sua campanha de 2010 influencia decisões do governo Dilma. "Cópia, se bem feita, é uma virtude." Segundo ele, voltar a disputar a Presidência em 2014 não está nos planos.

Depois de ser prefeito, governador, senador e ministro, por que tentar voltar à Prefeitura agora?

Criou-se uma necessidade política, no âmbito do partido e de aliados, de ter uma opção forte para a Prefeitura. E por gosto, porque é algo que me agrada bastante. São Paulo é uma cidade com receitas de município e problemas nacionais. É sempre um grande desafio.

Que motivação política foi essa?

É importante ter uma opção com grande chance de vitória e impedir uma descontinuidade dramática nos rumos da cidade. Levo em conta que, nos últimos oito anos, nós arrumamos São Paulo do ponto de vista fiscal. É claro que os problemas continuam, mas o fato é que é muito importante manter São Paulo no rumo, e numa articulação estreita com outra prefeitura, que é o governo do Estado.

A solução para o trânsito de São Paulo está apenas no transporte sobre trilhos?

O problema da mobilidade na cidade jamais será equacionado, o que não significa que a gente não possa melhorar. São Paulo tem que ter uma teia de aranha de trilhos por baixo da cidade. Isso não desmerece a importância de obras viárias e corredores de ônibus, mas sempre tendo em mente que o ônibus tem, em última análise, que servir ao transporte de trilhos.

A Prefeitura pode resolver o problema da cracolândia no centro da cidade?

São duas questões. Uma é o fenômeno da droga, que está relacionado ao contrabando. As fronteiras abertas para o tráfico levam a uma capacidade de oferta da droga a preços baixos, o que é desastroso. Isso está fora do âmbito da cidade e mesmo do Estado, até certo ponto. É uma tarefa federal, onde não se teve avanço nenhum nos últimos anos. As outras dimensões são a educação e o tratamento. É preciso desenvolver com relação ao crack uma campanha educacional mais intensa da que fizemos contra o cigarro. O governo federal é hesitante.

O senhor pretende aplicar o modelo das organizações sociais (OS)?

A OS não é um modelo para toda a saúde. É um modelo para certas unidades e funciona bem. A saúde continua sendo o assunto número um e o aspecto mais chocante é o encolhimento relativo do governo federal, que chegava a cobrir 60% das despesas com fontes federais e hoje se aproxima de 40%. Em São Paulo, de 2004 a 2012, o orçamento mais que triplicou. Do ponto de vista quantitativo, a saúde deu saltos.

A pesquisa Ibope desta semana mostra alta rejeição do prefeito Gilberto Kassab. Qual a sua avaliação da gestão?

Acho que é uma boa gestão e que o fato de ele ter se envolvido na criação de um partido criou para alguns a sensação de que ele estava desligado da cidade. Digamos: você está num engarrafamento de trânsito e liga o rádio, que diz: "Gilberto Kassab esteve em Alagoas vendo a questão do PSD e tal". Você fala: "Eu aqui no trânsito e o prefeito cuidando de partido". Mas é uma sensação, porque, de fato, o Kassab trabalha muito na administração da cidade. Ele deu continuidade à nossa gestão e tem realizações positivas.

Sua própria rejeição (35%, segundo pesquisa do Ibope) o preocupa?

Não. Eu avalio que minha rejeição é normal. Eu sou o mais conhecido e as pessoas têm uma posição mais definida. Eu acabei de disputar uma eleição presidencial: todo mundo me conhece, eu ganhei aqui no 1.º e no 2.º turnos, mas foi uma eleição dividida.

O sr. acredita que já ganhou a eleição?

Não, de forma nenhuma. Todo político que disputa eleição tem de ser um pouco paranoico. Se não for, perde. Todo político tem que olhar a eleição com humildade e achar que não é fácil. Eu me lembro de uma história do Juscelino (Kubitschek), que é verdadeira. Ele era capaz de parar numa estrada para ver um eleitor. Eu faço isso. Eu às vezes paro por causa de uma pessoa. Cada voto é um voto. Além do que, eu tenho gosto também nisso. Eu vou dizer a vocês: eu não sou dependente químico de eleição, mas eu gosto de campanha eleitoral, principalmente do contato com as pessoas.

Padrinhos políticos como a presidente Dilma entrarão na campanha?

Eu acho que os políticos nacionais vão procurar influenciar a campanha em São Paulo, principalmente do lado do PT. Mas outra coisa é a influência que isso possa ter. A influência eleitoral é sempre menor quando é fora do âmbito da esfera de governo da personalidade política. Se você é presidente, influencia mais na eleição para presidente. Se você é governador, idem, e, se você é prefeito, idem. Mas essa influência vai ser exercida, eu não tenho dúvida nenhuma. Se for dentro de certos padrões de decoro, é normal.

O sr. acha que o debate sobre costumes (religião, aborto, casamento gay) deve fazer parte da campanha?

A minha questão não é se deve ou não deve. A minha questão é que a própria imprensa e os próprios setores da sociedade interessados nessas questões as introduzem na campanha. E você não vai proibir. São questões de valores espirituais ou de ética que são postos. Não se trata de misturar religião com política. São coisas diferentes. Religião é opção individual, não é uma opção partidária.

Como o sr. reagirá, caso seja eleito prefeito, se em 2014 surgir um clamor para que o sr. se candidate à Presidência? Já pensou sobre isso?

Eu não pensei nisso porque eu estou com o propósito de me eleger prefeito e governar os quatro anos. Não creio que vá haver (um clamor).

Que avaliação o sr. faz de 2010?

É pouco tempo para avaliar. Eu entrei efetivamente com a expectativa de vencer e perdi. Tem eleições que eu não tinha uma expectativa tão forte de ganhar. O porquê, isso ainda vai ser debatido por muitos anos.

O partido se dividiu na disputa?

(Isso) não teve nenhuma importância. Pode ter tido uma ou outra frouxidão regional com relação à campanha, mas não teve dimensão para afetar o resultado. Efetivamente, quando começou o 2.º turno, havia um empate. No fim, eu acredito que o peso da popularidade do Lula foi decisivo. Isso é opinião mais superficial, que precisa ser analisada.

O senhor tem boa relação com o senador Aécio Neves (PSDB-MG)?

Com o Aécio? Tenho. Relação cordial. Eu não sou de conviver em situações de atrito, de levar uma relação na base do atrito. Boa parte das coisas que existem, aliás, é folclore.

O sr. ficou com alguma mágoa da campanha de 2010?

Não. Eu preferia ter ganhado, mas... Em eleição, você tem que ter um mínimo de preparação para assimilar resultados, porque a decisão não é você que toma. A decisão é das pessoas, milhões de pessoas. Pode parecer frase feita, mas faz parte. A derrota é um ingrediente importantíssimo de uma eleição quando você vai para a disputa. Por outro lado, eu acredito que, nas duas eleições (presidenciais), a minha campanha condicionou muito o próprio desempenho do governo posterior. Agora, muitas das coisas que o governo faz, sem dúvida nenhuma, foram resultado da minha campanha.

O sr. fala especificamente da política de juros do governo Dilma?

Juros, infraestrutura, mesmo a defesa da liberdade de imprensa... Uma série de questões variadas. Dar exemplos sempre é ruim. Sem dúvida nenhuma, o grosso das teses que nós defendemos em 2010 eram corretas e o governo incorporou muitas delas. É normal que isso aconteça. Eu não acho que, na vida pública, cópia seja plágio. Cópia, se bem feita, de maneira honesta e não eleitoreira, é uma virtude.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO, 13/5/2012.

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