segunda-feira, 28 de maio de 2012

Sobre fumaça e fogo:: Wilson Figueiredo

Do maltraçado projeto de se criar uma comissão parlamentar de inquérito para desconversar, e mista ainda por cima, não se pode descartar o ditado popular, segundo o qual, onde há fumaça, tem de haver fogo. O ex-presidente Lula se deu conta de que a CPI era o meio mais adequado para reduzir a cinzas a oposição, que se comporta como pinto no lixo em tais oportunidades. Mas aumentou a distância do ex-presidente em relação à presidente Dilma Rousseff. Lula não demorou a ficar sozinho com seu instinto de riscar fósforo para ver se o tanque tem gasolina. A presidente já estava noutra.

Soprar fumaça nos olhos dos cidadãos foi o que se propôs Luiz Inácio Lula da Silva, quando ia sendo esquecido como ex-presidente dotado de inesgotável capacidade de não fazer e, sobretudo, não reconhecer que, cada vez mais, este país não está à sua disposição. Assim que ouviu falar de CPI, Lula vislumbrou a oportunidade de liquidar a oposição, nem sempre ao seu alcance. Graças à lei do menor esforço, o brasileiro se acostumou a admitir que Lula seja o que ele pensa que é, quando não passa de agente provocador de confusão desde que sobreviveu ao mensalão e tomou as rédeas da oportunidade nas mãos.

A esta altura da expectativa geral, não adianta pretender algum controle sobre o que já está latente nos fatos acumulados num delta republicano por onde se escoa a infeliz idéia de governar sem oposição, em nome da democracia digna de coisa melhor e, até agora, nivelada por baixo.

No encaminhamento da CPI, para filtrar impurezas políticas do lixo administrativo (ou seriam impurezas administrativas do lixo político?), o ex-presidente foi mais longe em veemência e trincou o PT. O que se ouve e se lê é a continuação do mensalão por outra gente, e nada impede, e até facilita, a fusão das águas turvas ao chegarem ao delta.

Para o ministro (Casa Civil) Gilberto Carvalho, um dos poucos que seguraram a coerência do petismo em três mandatos consecutivos (os dois de Lula e o primeiro de Dilma), foi alto demais o preço pago por fora da ética e da moral: “O erro foi ter adquirido o vício da corrupção”, dizia o mais autêntico porta-voz de Lula, numa entrevista em fevereiro de 2010 em O Globo, na qual lamentava que “o vício da corrupção, infelizmente, entrou no nosso partido”, e o presidente de plantão não reconheceu.

Lula não renuncia ao hábito de esconder insucessos e sair à galega (seja lá o que isto queira dizer) para confundir, como preferia o Chacrinha, o que se passou e o que ainda se passará. Enquanto se processa a apuração do Delta que aponta para o que ainda se esconde sob a rubrica de mensalão, Lula guardava silêncio. Atrás da desculpa de que nada sabia - antes de informado por três políticos que sabiam de tudo, Miro Teixeira, Marcondes Perilo e Roberto Jefferson - o então presidente da República se considerou traído e passou a ser o último a saber do que se passava ao redor. A saída de José Dirceu da chefia da Casa Civil foi o recibo de quitação presidencial para os fatos tidos como inexistentes. Foi um salve-se quem puder. Dirceu veio a ser o avalista e ainda está pagando a despesa deixada por Lula.

O tempo levou de cambulhada as contas sem recibo que sustentavam a maioria parlamentar ao redor do governo. Mas Lula confirmou,
aos procuradores da República que foram ter com ele, que soubera desde o começo, e mais do que disse não veio a público. Logo voltou ao refrão de que nada soubera antes.

Ao primeiro sucedeu o segundo mandato e Lula, cuja loquacidade para emitir subterfúgios republicanos lhe desatou a língua , voltou a falar pelos cotovelos. Cuidou então de identificar e eleger a sucessora e, daí em diante, passou a ser perseguido pela certeza de que tinha se esgotado o prazo útil. Ainda lhe coube o privilégio de não ver seus erros aproveitados pela oposição, que ficou com o papel de condenada ao purgatório, qual seja, a sala de espera da eternidade.

Lula, que já não cabia em si, retroagiu na maneia de ser e sentiu a oportunidade de atear fogo à CPI, ajuda dos deuses no momento em que o oposicionismo de salão alcançava seu mais alto ponto no governo Dilma Rousseff . Então, abriu-se a janela por onde se vê mais do que está à vista. Onde há fumaça, é certo que há fogo. É só procurar.

Wilson Figueiredo é jornalista

FONTE: JORNAL DO BRASIL

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