domingo, 12 de agosto de 2012

Ainda há tempo - Amir Khair

Neste artigo trato do impacto da crise na atividade econômica, a decisão para enfrentá-la, com propostas e considerações sobre o superávit primário (receitas menos despesas excluídas as financeiras) e o uso indevido da Petrobrás.

1. Evolução Econômica - A crise iniciada em 15 de setembro de 2008 nos Estados Unidos, com a quebra do banco Lehman Brothers vai completar quatro anos. Embora atenuada em 2010, volta a se acentuar a partir de 2011, agora puxada pela Europa, sem perspectivas de refluir nos próximos anos.

O quadro acima compara o crescimento médio anual nos seis anos (2003/2007) que antecederam a crise com os três anos (2009/2011) após seu início. No período 2003/2007 os países desenvolvidos vinham crescendo 2,5% ao ano, os países emergentes 7,2%, o mundo 4,7% e o Brasil 4,0% (coluna2). No período 2009/2011 os desenvolvidos cresceram apenas 0,2%, os emergentes baixaram para 5,3%, o mundo cresceu 2,7% e o Brasil 3,3% (coluna3).

O Brasil sentiu em termos absolutos e relativos queda menos pronunciada que os emergentes e desenvolvidos conforme as duas últimas colunas do quadro. Os desenvolvidos foram atingidos mais duramente com queda no crescimento de 2,3 pontos (2,5 menos 0,2) ou 91% (2,3 dividido por 2,5), os emergentes recuaram 1,9 pontos ou 27% e o Brasil perdeu 0,7 ponto ou 18%.

Esse resultado favorável ao Brasil teve repercussão internacional. Isso se deveu: a) a menor dependência do País em relação ao comércio internacional, com suporte no mercado interno; b) aos bons fundamentos macroeconômicos, com reservas de U$ 207 bilhões em setembro de 2008 e; c) a decisão do governo de ativar a economia puxada pela ampliação do consumo.

Neste ano os emergentes devem crescer cerca de 5%, os desenvolvidos 1%, o mundo 3% e o Brasil tende para 2%, ou seja, corre-se o risco de registrar crescimento inferior ao do ano passado (2,7%) e a média mundial, o que estaria invertendo os resultados alcançados no período 2009/2011.

É importante registrar que entre o início da crise e agora ocorreu melhora substancial nos fundamentos macroeconômicos, com reservas internacionais atingindo US$ 380 bilhões, aumentando 83% em relação ao início da crise, redução da dependência do mercado internacional medida pela corrente de comércio (exportação mais importação dividido pelo PIB), que em 2008 foi de 22,5% do PIB e neste ano deve se situar em 21,6% do PIB.

O que então poderia explicar essa previsão de resultados de crescimento para esse ano? O poderoso freio imposto pelo governo ao editar as medidas macroprudenciais que encareceram o crédito, vigorando desde o início de 2011 e só afrouxadas a partir do último trimestre do ano passado.

2. Decisão - O governo parece não mais cair na armadilha das análises equivocadas do mercado financeiro, que defendem que a prioridade é o combate à inflação, que seria gerada pelo crescimento econômico, e como remédio a elevação da Selic, que engorda seus ganhos de tesouraria em títulos do governo.

Frustrado com o fraco crescimento em 2011, com reflexos neste primeiro semestre, o governo vem procurando estimular o consumo, pela pressão para redução dos juros bancários, e a produção, com desonerações pontuais e oferta de financiamentos pelo BNDES.

Precisa, no entanto, resistir à pressão das análises que vislumbram crescimento da inflação, sempre causada pelo exterior, no caso a seca nos Estados Unidos, que reduziu a oferta de alimentos, encarecendo-os no mundo. Assim, não deve interromper a queda da Selic nem esmorecer na pressão para reduzir os escorchantes juros e tarifas bancárias.

3. Propostas - Para retomar o crescimento de forma mais rápida e eficaz, o governo deve baixar a Selic para 5% até o final do ano e ampliar a liquidez da economia liberando uma parcela dos depósitos compulsórios dos bancos junto ao Banco Central de forma diferenciada conforme a taxa de juros cobrada pelo banco a seus clientes. O porcentual de retenção do compulsório do banco deveria ser tanto menor quanto menor a taxa de juro por ele praticada.

Com essas medidas o governo ativa a economia, pois afrouxa o freio imposto à produção e ao consumo devido ao custo elevado do dinheiro causado pela baixa liquidez e elevado juro. A redução da Selic abre espaço fiscal significativo para as desonerações tributárias.

Outras medidas de menor impacto se impõem. São elas a redução do superávit primário e o reajuste dos preços dos combustíveis.

4. Superávit Primário - É necessário reduzi-lo, pois isso permite liberar recursos para ativar a economia e não irá afetar os resultados fiscais, pois a queda da Selic vai reduzir as despesas com juros do governo, permitindo que o déficit fiscal se aproxime de 2% do PIB neste ano e seja zerado em 2013, caso a Selic fique em 5%.

5. Petrobrás - No dia 2 de fevereiro, portanto, há seis meses, afirmei em artigo no Estado: "Segundo o diretor financeiro da Petrobrás, Almir Barbassa, a defasagem de preços foi responsável por cerca de 50% da queda do lucro no quarto trimestre (de 2011) que ficou em R$ 5 bilhões, contra R$ 10,6 bi em igual trimestre de 2010. Isso maculou a imagem da Petrobrás e suas ações sofreram forte queda. Se não ocorrer com urgência o reajuste da gasolina, a Petrobrás pode correr o risco de operar com prejuízo!"

É, dava para prever. O governo continuou e continua sacrificando sua principal empresa. É necessário e urgente o reajuste nos preços dos combustíveis, que se encontram defasados em cerca de 20% em relação aos preços internacionais. Quanto mais demorar para o reajuste, maior ele terá que ser.

O reajuste necessário vai permitir o deslanche dos investimentos da Petrobrás, reduzindo os riscos de atraso nas metas da empresa, com importantes reflexos na economia e nas contas externas do País.

É importante frisar, que a estatal deve ter seus preços definidos e respeitados pelo governo segundo regras que permitam o cumprimento do seu plano estratégico de longo prazo aprovado pelo governo. Usá-la como biombo da inflação dá no que deu, com prejuízo após 13 anos. São políticas desse tipo, que podem inviabilizar a empresa estatal, conduzindo-a ao encerramento de atividades, à dependência do Tesouro ou à privatização. Certamente não será o caso da Petrobrás.

Finalmente, não faltam armas potentes para o governo virar a favor o desafio do crescimento. Por enquanto sinto o desgosto da perda de oportunidades. Mas, ainda tenho esperança, pois ainda há tempo.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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