segunda-feira, 15 de outubro de 2012

A administração do perigo - Fernando Gabeira


Com a ocupação de Manguinhos e Jacarezinho neste fim de semana, o governo vai completando o cinturão de segurança que estendeu sobre a cidade.

Ou pelo menos sobre a parte que tem importância nos grandes eventos que ela vai sediar. Esse cinturão certamente será reforçado na Maré para garantir acesso ao aeroporto internacional.

As UPPs reduziram a violência nas áreas onde atuam, valorizaram imóveis e turbinaram campanhas do PMDB, inclusive a de Dilma, que prometeu nacionalizá-las. Dilma ainda não teve tempo de pensar de novo no assunto. Mas, o Rio de Janeiro como estado, ou pelo menos como região metropolitana, precisa dar um balanço preciso no resultado das UPPs. A Baixada Fluminense e alguma cidades médias, como Macaé, Petrópolis e Volta Redonda sentiram o impacto da concentração de esforços na capital. O cobertor é curto e elas, em muitos momentos, se consideraram desprotegidas diante do crescimento da criminalidade e da migração de bandidos.

Outro efeito colateral são as milícias. Elas andam silenciosas, sobretudo num período eleitoral. Mas recente pesquisa, organizada pelo sociólogo Ignácio Cano, revela apenas que mudaram de tática. As milícias tornaram-se mais discretas e hoje seus rastros podem ser encontrados principalmente no aumento do número de desaparecidos.

A saída para combater este tipo de crime é melhorar a inteligência policial. O sucesso das UPPs levou as pessoas a pensarem que são uma solução para todas as comunidades. Mas ocupar com UPPS todas as comunidades é tarefa para o exército chinês. Não temos tanta gente e tanto dinheiro. Seríamos uma espécie de estado policial. Por causa disso, é importante saudar as UPPs mas perguntar sempre: e as outras comunidades, como serão protegidas e as áreas que não interessam aos grandes eventos nem ao comércio imobiliário, o que faremos com elas?

Mesmo supondo que as UPPs foram objeto de um plano calculado para trazer paz às áreas de repercussão e ao circuito dos jogos, faltam elementos no quebra cabeça. O que fazer com a migração
de bandidos para outras áreas? Como protegê-las? Como quebrar a hegemonia das milícias nos pontos mais remotos, onde os crimes não repercutem nos jornais?

O julgamento do mensalão no STF trouxe esperança aos que não têm acesso à justiça, pois viram ser condenados gente poderosa, que gastou fortunas com advogados. É preciso levar esperança para os que não têm acesso à proteção policial.

Uma esperança verdadeira. Hoje, há uma expectativa de que cada comunidade será ocupada por uma UPP. Só um plano estadual de segurança pode responder às aspirações da Baixada Fluminense e das cidades médias do estado. No momento, vivemos o que o sociólogo Ulrich Beck chama de administração do risco: jogar o
perigo para as áreas mais pobres.

Eu acrescentaria não só perigo mas tudo que incomoda às regiões mais ricas. Para onde vão os aterros sanitários, os presídios e os manicômios? Por coincidência, para áreas dominadas pelas milícias.

Fonte: Jornal Metro/Rio

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