domingo, 25 de novembro de 2012

Pobre Hermano - Míriam Leitão

A lista de disfunções econômicas da Argentina é enorme: há baixo crescimento, a inflação é alta, mas maquiada pelo governo, faltam dólares e as reservas do Banco Central foram usadas para financiar o Tesouro. Os investimentos estão em queda, a exportação está concentrada em poucos produtos agrícolas e há barreiras para a importação. O governo não tem acesso a crédito externo.

Os empresários não gostam de dar entrevistas porque podem sofrer retaliações do ministro Guillermo Moreno. O economista argentino Juan Barboza, que trabalha no banco brasileiro Itaú BBA, conversou com a coluna sobre os problemas econômicos do país. Ele calcula que a inflação fechará o ano em 25%. Em 2013, deve ficar ainda mais alta.

Para o governo de Cristina Kirchner, a inflação acumulada em 12 meses está em 10,2%. A taxa, na verdade, é manipulada pelo Indec, o instituto oficial de estatísticas, e a melhor maneira de perceber isso é quando olhamos para os aumentos salariais, na casa de 20% a 30%. Os trabalhadores estão repondo o poder de compra que perderam, e não ganhando reajustes exorbitantes.

Em abril, o governo argentino expropriou a petrolífera YPF, da espanhola Repsol. Os investimentos estrangeiros diretos, que já eram poucos, ficaram escassos. Na semana passada, um juiz americano determinou que o governo argentino pagasse US$ 1,3 bilhão a credores que levaram o calote em 2001 e não aceitaram renegociar a dívida. Em Gana, uma fragata argentina ficou retida pela Justiça, como forma de indenização.

Ainda hoje os argentinos pagam o preço da moratória. O governo tem dificuldade para se financiar. Os bancos e fundos internacionais não emprestam e esse é um dos motivos para a falta de dólares. O Banco Central foi obrigado a repassar reservas para o Tesouro. Esses recursos são instrumentos de política monetária, servem para proteger a moeda, e não para financiar gastos públicos.

A alta concentração de exportações em poucos produtos agrícolas agrava a crise cambial. Soja, milho e trigo representam um terço de tudo que se exporta. Se há problemas de safra, as vendas caem e entra menos moeda estrangeira. Para piorar a situação, continua em vigor a esquisita medida que taxa em 35% os agricultores que exportam.

"Para compreender a Argentina de hoje, é preciso entender mais Freud do que Adam Smith", resumiu o economista Fabio Giambiagi.

A "solução" para a corrida ao dólar. Temendo uma desvalorização do peso, os argentinos compraram dólares para se proteger: em 2011, foram US$ 20 bi. Para se ter uma ideia desse montante, o saldo comercial em 2012 deve ser de US$ 12 bi. Para resolver o problema, o governo fez um remendo: restringiu a compra. Uma jornalista argentina contou à coluna que tentou comprar dólares e reais, antes de viajar ao Brasil, sem sucesso. A solução foi fazer saques em caixas eletrônicos do Rio, de uma conta com economias em dólares. Uma semana depois, segundo ela, um grupo de amigos conseguiu comprar dólares na Argentina. "O panorama muda toda semana, é imprevisível".

Gasto público em alta e PIB fraco. O governo argentino tem de resolver outra difícil equação: a arrecadação cresce, mas menos do que o gasto público. Segundo o economista Juan Barboza, enquanto o primeiro aumenta 28%, o segundo sobe 30%. Ele estima que a economia de seu país crescerá este ano apenas 0,5%, com queda forte dos investimentos. Já Mariano Lamothe, economista da consultoria argentina Abeceb, é mais otimista: acha que o país crescerá 1,3%, bem menos do que em 2011 (8,9%). A política econômica do governo, segundo ele, gera incertezas e ainda há a crise externa jogando contra. O segundo trimestre foi de recessão de 2% em relação ao mesmo período de 2011, segundo as consultorias independentes.

Fonte: O Globo

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