segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Na margem de surpresas - Wilson Figueiredo

Certamente estava escrito em algum lugar, e ninguém deve ter lido, que a próxima sucessão presidencial, já a caminho, como quem não quer nada mas de olho em tudo, e como as anteriores, teria também contribuição a oferecer na margem de surpresa desagradável. O mensalão já se considera dispensado de pesar na balança, manter relação direta com o momento e reativar questão de que o Brasil já se livrou. Nem na prévia municipal constou a assinatura do mensalão.

A impaciência por fatos históricos, porém, não se fez de rogada e, à falta de melhor, adiantou o relógio e acertou o ponteiro da cidadania com a rotina democrática. sem levar a sério o que pode escapar às intenções. Lá atrás, quando quis expelir essa partícula que restringe o valor do título, o ex-presidente Lula deu curso ao seu desagrado com a Constituição, à qual recusou seu voto como constituinte, mandou às favas o escrúpulo e, também sem explicação, ele e os demais petistas se eriçam como porco espinho diante de imprevisível. Lula, antes que o poder o amansasse, avaliou o Congresso Nacional como a caverna dos 300 picaretas à espreita de oportunidade. Dizem que sabe o preço de cada um e o desvalor de todos.

Depois do segundo mandato, e por falta de condições legais para se habilitar ao terceiro, Lula se sentiu cerceado e, sem ir direto ao ponto, ocorreu-lhe o subterfúgio de surpreender, em primeiro lugar, o PT e deixar a nocaute a oposição - menos ativa que ele - com a candidatura Dilma Rousseff, que se deixou agradavelmente surpreender. Ficou subentendido que a candidatura dela seria apenas para um mandato, a ser devolvido a Lula, a quem de direito e de esquerda, lato senso, o poder como prêmio político está acima de qualquer objeção. Quando necessário, sua candidatura se reveste do teor de ameaça para quem tiver algo a perder.

Na metade do mandato da presidente, enquadrada num acintoso gênero masculino pelo antecessor, a candidatura natural de Dilma Rousseff ao segundo mandato exprime, antes de tudo, simpatia da classe média. Desde o começo do ciclo político em curso, já está claro que se vale de uma tabela de valores políticos e éticos em que aposta. Até agora. Os governos Dilma e Lula não têm obras públicas de encher os olhos, mas a ética – até pelo contraste com o que não se vê e se avalia pelas conseqüências - os separa (ou separava) aos olhos das pesquisas de opinião. O eleitor reserva a ela a preferência, mesmo em consultas de rotina.

Na campanha eleitoral em curso subterrâneo, nada indica que venha a ser diferente. A presidente tem preferência firmada. Cada dia que passa, o terceiro mandato fica mais longe de Lula e, por força do estilo morde/sopra com que o ex presidente passa o tempo, ela se aproxima do segundo. E, de quebra, ainda não considera quem quer que se apresente pela oposição. Pernambuco abriu espaço entre os pretendentes em que Minas tem um ex-governador e senador a oferecer, mas com o cuidado de sempre, até demais, para não desequilibrar o espetáculo num trapézio sem rede em baixo. Em sucessões políticas pelo voto direto não há prazo estabelecido. Não é por outra razão que a História só pode ser escrita depois, jamais antes que os fatos se imponham às conjecturas políticas. A margem de imprevistos é mais larga do que parece a quem vê de longe.

A sucessão presidencial (daqui a dois anos) até agora não excedeu os dois personagens que fazem o pas de deux em que os dançarinos Dilma & Lula garantem o espetáculo: ele pisa nos pés dela, que sorri e desculpa e, por falta de programa, o público sabe por instinto que ainda não é o quadro principal do espetáculo. Pelo menos, até aqui o ex-presidente em baixa não convence e a presidente em alta padece de vacilação: cada qual deixa seguir em frente a oportunidade que não passa duas vezes pelo mesmo personagem.

A vitória de Luiz Inácio Lula da Silva, depois de três derrotas deglutidas como tratamento prévio, foi o saldo de uma longa evolução, e a derrota dele à própria candidatura, nesta etapa decisiva, teria – e terá - o significado ético deferido à pré-candidatura de Dilma Rousseff à reeleição. Claro, se ela não ceder na questão ética. O resto pode esperar. Outras eleições virão no devido tempo.

Fonte: Jornal do Brasil

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