quinta-feira, 14 de março de 2013

Flanco na agenda - Tereza Cruvinel

Toda eleição presidencial tem seu tema dominante. A presidente Dilma elegeu a questão social e seu foco, neste momento, está nos pobres e nas mulheres. O tema do pacto federativo, entretanto, conseguiu impor-se na agenda, brandido por concorrentes como Aécio Neves e Eduardo Campos, e também por governadores aliados, como se viu ontem, na reunião promovida pelos presidentes da Câmara e do Senado. O assunto, aparentemente, não dá voto nem comove eleitores mas, embora sensibilize apenas o empresariado e a elite política, pode afetar as alianças e alinhamentos partidários. Dilma agora terá de enfrentá-lo.

O Congresso lavrou um tento com a iniciativa de Henrique Alves e Renan Calheiros, fortalecendo-se como arena da pactuação federativa. O encontro permitiu que governadores dos mais diferentes partidos explicitassem o descontentamento com o centralismo financeiro da União. O governo federal tem feito grandes investimentos nos estados, é verdade, mas eles reclamam da falta de dinheiro para o custeio: pessoal, máquina, despesas gerais. Denunciam a partilha desigual dos recursos arrecadados. O Executivo, que em fevereiro ignorou o tema no encontro de prefeitos que realizou, ficou a reboque e agora tenta tomar a dianteira. Mas a pauta que a ministra Ideli Salvatti discutiu com os líderes está longe de atender. Ela acenou com a regulamentação da cobrança de ICMS no comércio eletrônico, a unificação das alíquotas deste imposto, criação do fundo de compensação para os que perderam com a unificação e com mudança no indicador que corrige as dívidas dos estados.

O que eles propuseram ontem vai muito além. Como demonstrou Cid Gomes, do Ceará, em 1990 o ICMS e o Imposto de Renda, que são repartidos através dos fundos de participação dos estados (FPE) e dos municípios (FPM), representavam 77% da arrecadação federal. Contribuições como PIS, Cofins e CSLL, não compartilhados, respondiam por 23%. Hoje a situação é inversa. A parte dividida caiu para 45% e o bolo exclusivo da União subiu para 55%. Obra da criação de novas contribuições e das elevações de alíquotas. O que eles querem é destinar também aos dois fundos 13% da Cofins e 13,5% da CSLL, de forma gradual, sem tomar nada da União este ano. Parece razoável.

Em paralelo, trafega a crise dos royalties do pré-sal, para a qual o governador Eduardo Campos (olha ele aí se afirmando como conciliador!) está propondo um acordo entre produtores e não produtores. Melhor teria feito Dilma se, ao invés de vetar a lei de royalties, tivesse chamado os governadores para uma ampla repactuação envolvendo tudo isso: fundos, royalties, unificação do ICMS etc. Mas seu governo, como esta coluna vem dizendo desde o ano passado, subestimou as tensões federativas. Agora, terá que enfrentá-las, se quiser tirar da agenda o assunto que tentou contornar.

PTB na mira

Uma evidência de que o tema federativo contamina as alianças está na reunião que haverá na terça-feira próxima, um almoço, entre o governador Eduardo Campos e o bloco liderado pelo PTB no Senado, composto ainda por PR e PPL. Tema oficial do encontro, unificação do ICMS. Mas Eduardo, como ele mesmo já disse, conversa sobre tudo e com todos. Seu negócio é se apresentar, angariar simpatias que poderão se transformar em apoios eleitorais. O líder do bloco no Senado é Gim Argello, um dilmista que trabalha para manter o partido na coalizão governista. “Inicialmente fui contra mas cedi à maioria da bancada”, diz ele. O porta-voz do convite, aprovado anteontem, será o senador Armando Monteiro, pernambucano que deve disputar o governo do estado com o apoio de Campos. Trabalha para levar o PTB a apoiá-lo.

Dedo de Cachoeira (II)

A revelação da coluna de ontem, de que o esquema Cachoeira-Demóstenes armou a denúncia de que Renan Calheiros montara esquema de “arapongagem” contra colegas, foi recebida pelas vítimas como redenção. Renan foi contido: “A verdade, ainda que tarde, sempre prevalecerá. Nunca duvidei disso”. O deputado Francisco Escórcio, que na época foi demitido, depois de apontado como chefe do esquema, abriu o baú da mágoa: “Fui demitido injustamente, fui humilhado e caluniado e agora se vê que eu sempre disse a verdade. Eles sim, espionaram meus passos e a partir de um encontro banal criaram uma ficção monstruosa. O crimes mais grave, entretanto, foi contra as instituições democráticas, a tentativa de desestabilizar o Senado”. Este episódio deixa uma pergunta inquietante. Quantas e quais outros escândalos dos tempos recentes tiveram o dedo de Cachoeira?

As crianças e a TV

A classificação indicativa de programas de televisão foi adotada em 2007 para proteger crianças e adolescentes da exposição a conteúdos que veiculam mensagens e valores inadequados a cada faixa etária. Em 2011, o STF começou a julgar uma ação de inconstitucionalidade apoiada pelas emissoras através da Abert. O julgamento parou com quatro votos a favor do fim da classificação. Sua manutenção é defendida pela AGU, PGR, instituições da sociedade civil, como ANDI, Inesc e organizações internacionais. O tema dominou o seminário Infância e Domunicação: Direitos, Democracia e Desenvolvimento, ocorrido aqui em Brasília na semana passada. Um de seus participantes, o relator da ONU para a liberdade de expressão, Frank de La Rue, visitou o presidente do STF, Joaquim Barbosa, tentando sensibilizá-lo para a importância da classificação. O STF não tem data para voltar ao assunto. E todos nós, que temos filhos, o que desejamos que eles vejam nas telinhas?

Fonte: Correio Braziliense

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