domingo, 2 de junho de 2013

O bode expiatório - Denise Rothenburg

Numa base de mais de 400 deputados, o PMDB, que tem 80 deles, não pode ficar com a culpa pelas dificuldades do governo. Por isso, as conversas de amanhã da presidente com o partido tendem a não resolver os problemas

Você deve conhecer algum menino levado que, ao menor sinal de confusão na escola, todos os orientadores apontam os indicadores para ele, sem pestanejar. É mais ou menos isso que ocorre agora com a base governista. São mais de 400 deputados, mas a culpa quando algo dá errado é sempre atribuída ao PMDB — leia-se o líder do partido na Câmara, Eduardo Cunha, o presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves, e o do Senado, Renan Calheiros.

Na verdade, o PMDB pode ser comparado a um menino “treloso”. Gosta de brinquedos caros (cargos com capacidade de investimentos) e, se não fazem o que ele deseja, logo fica de cara feia. Invariavelmente, arrasta sessões. Mas nem por isso cabe atribuir aos peemedebistas a derrubada de medidas provisórias, como a que reduziria a tarifa de energia elétrica. Afinal, vale repetir, se o governo estivesse bem, teria votado tudo, prescindindo do PMDB. Mas não é bem assim.

A falta de diálogo atinge todos os partidos. Ninguém se sente prestigiado perante a presidente Dilma Rousseff. Os gestos de apreço só vêm quando o político adota medidas extremas, caso da votação da MP dos Portos, faltando menos de 24 horas para o vencimento. Ela estendeu o tapete vermelho para Renan Calheiros, mas o preço disso foi o presidente do Senado achincalhado entre os colegas, porque colocou para votar uma medida sem dar tempo para que os senadores estudassem o assunto. Prometeu que isso não se repetiria. Não havia condições de colocar para votar.

Se Renan tivesse colocado as medidas provisórias em votação, mais uma vez jogaria um biombo sobre as falhas de articulação política do governo com a Câmara dos Deputados, deixando à presidente Dilma a sensação de vitória. Afinal, foi exatamente isso que ocorreu depois da votação da MP dos Portos. Dilma agradeceu a vitória, afagou Renan, mas não passou disso. Não chamou os partidos para conversar, não marcou reunião do Conselho Político. Ok, ela tem que cuidar da economia, área mais sensível, mas então que delegue poderes aos ministros de falar por ela e acolha os acordos que os ministros e líderes fecham.

A confusão na base, aliás, vem desde a formação do governo. Naquele período, o PMDB, por exemplo, achou que iria dividiria o poder meio a meio com o PT. Logo percebeu que não seria bem assim. Afinal, era preciso reservar espaços para os demais partidos da base aliada — que também não ficaram contentes — e as tendências petistas, que invariavelmente funcionam como partidos autônomos. Pacientemente, o PMDB, por exemplo, aguardou a virada de 2011, o primeiro ano de governo Dilma, marcado pela queda de ministros. Veio ainda 2012, quando todos perceberam que o PT, mesmo com o julgamento do mensalão, saiu vitorioso nas urnas.

O resultado eleitoral ajudou a deixar todos alarmados e com a certeza de que, se nem na eleição municipal o PT soube ser generoso com os aliados, também não o será nas eleições estaduais. Essa desconfiança se somou à insatisfação pela não divisão de poder, dos louros dos programas governamentais nem das conversas e viagens presidenciais. E o resultado está aí: o governo fechou o quinto mês do ano com elevação de juros, economia sem aquela recuperação toda no primeiro trimestre e uma lambança congressual, sem clima para votar projetos importantes.

Enquanto isso, no Congresso…

Nada garante que a conversa de amanhã da presidente Dilma Rousseff com a cúpula do PMDB resolverá os problemas. Isso porque a solução está nas mãos de Dilma. Ou ela dá poderes aos responsáveis pela sua articulação política, para fazer acordos que serão cumpridos, ou tudo ficará igualzinho. E quanto mais perto da eleição, pior. A situação da presidente em relação ao Congresso pode ser comparada ao labirinto do Minotauro. E esse Minotauro não é o PMDB, e sim a base aliada formada por partidos díspares entre si sob diversos aspectos, porém idênticos no que se refere ao desejo de participação no governo. Lula criou um monstrengo para apoiar a eleição de Dilma e desidratar a oposição. Conseguiu a vitória. Mas, se na mitologia aparece Teseu para matar o Minotauro, na vida do governo, não surgiu ninguém para domá-lo. Esse é o próximo capítulo dessa novela, que ainda promete muitas emoções.

Fonte: Correio Braziliense

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