segunda-feira, 10 de junho de 2013

Para especialistas, inflação reduziu aprovação de Dilma

O governo considerou "oscilação normal" a queda de oito pontos percentuais na aprovação da presidente Dilma, mas especialistas avaliam que a pesquisa Datafolha mostra efeitos do aumento da desconfiança da população com problemas como a inflação. Oposicionistas afirmaram que já esperavam a queda e que o governo está se desmantelando.

Analistas atribuem queda na aprovação de Dilma à inflação

Mercadante diz considerar "oscilação normal" a redução de 8 pontos na popularidade da presidente no Datafolha

Deborah Berlinck*, Fernanda Krakovics e Thiago Herdy

LISBOA, BRASÍLIA e SÃO PAULO - O governo minimizou ontem a pesquisa do instituto Datafolha que mostrou uma queda de oito pontos percentuais na popularidade da presidente Dilma Rousseff, de 65% para 57%, mas especialistas disseram que o resultado é relevante por mostrar os efeitos do aumento da desconfiança da população com indicadores da economia.

Horas depois de desembarcar em Portugal acompanhando a presidente numa visita oficial de dois dias, Aloizio Mercadante, ministro da Educação e um dos principais conselheiros, reagiu assim:

- A pesquisa mostra uma oscilação normal. Mantém a presidente no melhor patamar de apoio popular e de intenções de voto para 2014, quando a gente compara com qualquer outro presidente neste momento de governo (dois anos e meio).

Marco Aurélio Garcia, assessor para assuntos internacionais da Presidência, relutou em falar, mas terminou dizendo:

- Sinceramente, não sei qual é a margem de erro, não acho que... Não acho que seja relevante.

A ministra da Secretaria de Comunicação Social da Presidência, Helena Chagas, lembrou que a presidente "nunca comenta pesquisas de opinião". Mas deixou claro que Mercadante falou em nome de Dilma:

- O Mercadante falou com vocês (jornalistas), não?

O vilão da queda de popularidade de Dilma, segundo Mercadante, foi a inflação do tomate:

- É um episódio totalmente superado. Já está na mesa de todo o povo brasileiro e vai estar na mesa até o final do ano.

"Excelentes perspectivas"

Apesar do baixo crescimento e do aumento da inflação, Mercadante pintou um quadro de sonho para a economia. Falou em "excelentes perspectivas", com o Brasil "caminhando para uma supersafra" agrícola este ano, o "emprego crescendo", a "indústria forte" e a inflação já "apontando na direção da meta", além de dívida pública resolvida.

Justificando a queda na pesquisa, ele citou o boato de que o Bolsa Família acabaria, que provocou um corre-corre de beneficiários às agências da Caixa Econômica Federal. O episódio está "totalmente superado", garantiu.

O ministro disse que não vê problema no fato de a agência de classificação de risco Standard & Poor ter colocado a economia em perspectiva negativa:

- Uma agência de rating (de classificação de risco) fez uma sinalização. Vamos aguardar. As contas do Brasil são um diferencial. Somos um dos poucos países que conseguiu reduzir o nível de endividamento ao longo dos últimos anos.

Na visão de especialistas, porém, a piora no cenário econômico foi o fator-chave para a queda da popularidade de Dilma, porque a população está sentindo "na pele" a alta dos preços. Eles avaliam que o desequilíbrio na economia pode afetar o projeto de reeleição.

- A população está preocupada. As mulheres, que geralmente lidam com o orçamento familiar, estão sentindo na pele (a inflação), principalmente as de renda mais baixa - observou o cientista político David Fleischer, professor da Universidade de Brasília (UnB).

O cientista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria, destacou que a oposição, já com o olhar em 2014, também trouxe o aumento dos preços para o debate. E o próprio governo demonstra preocupação com a popularidade, ao adotar discurso menos ambicioso sobre juros e metas de crescimento.

- Parte do movimento (na comunicação) ocorreu, porque o governo percebeu que o país estava com desequilíbrio na economia e isso poderia afetar o projeto de reeleição da presidente Dilma - disse ele.

Para o mestre em Ciências Políticas Rudá Ricci, a popularidade do governo não decorre, desde o segundo mandato de Lula, de fatores ideológicos, mas da melhoria da qualidade de vida.

- A população mais pobre percebe que tem algo de inconsistente na economia, o que gera insegurança em relação ao futuro. A baixa inflação e o alto consumo (são conceitos que) estão começando a ser corroídos, do ponto de vista político e da percepção popular - diz Ricci, para quem esta é a pior notícia que o governo poderia receber no momento.

O cientista político Cláudio Couto, da Fundação Getúlio Vargas, concorda que a insegurança na economia é o fator fundamental para explicar a perda de popularidade:

- Não estou dizendo que este governo não tenha responsabilidade, mas quando a avaliação econômica fica negativa, é natural que o mesmo ocorra do ponto de vista político.

Braço-direito do pré-candidato à Presidência Eduardo Campos, o deputado Márcio França (PSB-SP) afirmou que a queda da popularidade era prevista:

- Era quase um consenso em Brasília que ela começaria a cair por causa da inflação, da MP dos Portos e de problemas de articulação política.

Para o presidente do Mobilização Democrática (MD), Roberto Freire, a pesquisa Datafolha sinalizaria o fim de um ciclo:

- O governo está se desmantelando por seus próprios erros. É um sinal de que o ciclo do lulo-petismo está se esgotando.

Para o líder do PT na Câmara, deputado José Guimarães (CE), porém, o cenário de inflação alta e preocupação com o desemprego não é real e esse "artificialismo" é um problema de comunicação do governo.

- Os dados na verdade são muito positivos. Isso (cenário negativo) é mais uma sensação criada do que a realidade. Estamos quase com pleno emprego e o IPCA caiu. Temos que desmistificar isso

(* Enviada especial a Lisboa)

Fonte: O Globo

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