terça-feira, 9 de julho de 2013

Semana crucial - Tereza Cruvinel

A tensão e o descompasso entre a presidente Dilma Rousseff e sua coalizão parlamentar terá, esta semana, algum tipo de desenlace, especialmente no que diz respeito ao plebiscito sobre a reforma política, que a Câmara deve sepultar sem deliberação, aprovando mudanças tópicas, como já vem fazendo o Senado. Depois, o ex-presidente Lula está de volta ao país e começará a se movimentar. Numa tarde de palácio cheio e aplausos às medidas ousada que ela anunciou para a saúde, Dilma exibia a desenvoltura anterior aos protestos e à queda na popularidade, aparentemente alheia ao fosso que vem se ampliando entre ela e sua base de sustentação. "A ficha ainda não caiu", dizia um petista preocupado.

Sim, porque boa parte da bancada petista também está agastada com essa espécie de voo solo da presidente, empreendido a partir do momento em que ela precisou responder aos protestos que tomaram as ruas e ainda não silenciaram totalmente. Agora, veremos uma manifestação "profissional", a de quinta-feira, dia 11, chamada pelas centrais sindicais e outros movimentos sociais da chamada sociedade organizada.

Algumas passagens da reunião entre Dilma e a bancada petista, na sexta-feira passada, agora começam a circular, revelando o nível real do estresse. Foram especialmente duros os deputados Ricardo Berzoini e André Vargas, além do líder José Guimarães, embora este tenha modos mais suaves. Eles espancaram a coordenação política e a comunicação do governo, e disseram textualmente a Dilma que sua articulação parlamentar "ruiu complemente". Quando um aviso dessa gravidade vem do partido do governante, a situação é mesmo preocupante. Dilma ainda foi lembrada de que está no comando de um projeto político que custou mais de 30 anos de luta, desde a fundação do partido. Um recado sutil de que o PT não aceitará passivamente ações que possam comprometer a conquista da Presidência com Lula, em 2002.

Entretanto, ela não deu nenhum sinal de que pretenda mudar o esquema da coordenação política nem fazer gestos pacificadores em relação ao PMDB. Pelo contrário: excluiu o vice-presidente Temer da reunião de sábado com ministros e divulgou nota negando qualquer mudança na equipe. A esperança dos aliados, agora, é a de que Lula, ainda que discretamente, entre em campo e, com sua capacidade de agregar, junte os cacos da coalizão que montou para eleger Dilma.

Flertando com as ruas

Dilma tem também seus defensores na bancada petista. O deputado Henrique Fontana preferiu relatar a resposta que ela deu às críticas ao mau relacionamento com os aliados: "Somos uma coalizão, todos participam do governo, e os pleitos possíveis são atendidos. Algumas coisas, entretanto, a gente não pode fazer". Coisas que, segundo ele, não foram especificadas. O presidencialismo de coalizão que temos é assim: a governabilidade tem seu preço e impõe dilemas de toda ordem aos governantes. E isso tem tudo a ver com a reforma política.

Frases como essas, e a resistência a fazer ajustes no governo e no relacionamento com o Congresso, suscitam especulações sobre a conduta recente de Dilma. Desde o início, ela foi, por assim dizer, receptiva aos protestos. Revelada a corrosão em sua popularidade, intensificou os contatos com movimentos sociais, ao tempo em que se atritava com o Congresso, propondo a constituinte exclusiva e, depois, o plebiscito. Agora, começou a responder aos principais reclamos, discutindo projetos de mobilidade com governadores e prefeitos, que ajudará a financiar, lançando uma medida ousada como a de ontem, para ampliar a oferta de médicos aos brasileiros.

Flertando com as ruas, estaria deliberadamente esticando a corda com os partidos aliados. Essa é uma leitura especulativa, pois o jogo é de alto risco. Os votos estão nas ruas, mas a estabilidade política é garantida pelos partidos.

Fita amarela

Na próxima semana, votada a LDO, o Congresso entra em recesso. Por isso, deve liquidar esta semana com a pauta do plebiscito. Hoje mesmo, a comissão de oito deputados dos maiores partidos, indicada pela Mesa para examinar a proposta, fará sua primeira — e talvez última — reunião. Provavelmente, apontará a falta de tempo hábil para a realização da consulta, de modo a produzir resultados já em 2014, sugerindo a aprovação de algumas mudanças na linha do que vem fazendo o Senado, que hoje tentará alterar as regras para a escolha dos suplentes de senador. Este Correio vem apontando, há alguns dias, essa estratégia do Parlamento para esvaziar a proposta da presidente.

Henrique Alves, presidente da Câmara, encontrou-se com Dilma, ontem, depois da solenidade no Planalto, e pode ter antecipado que a proposta dela será sepultada sem choro nem vela. Ou seja, sem que o plenário delibere sobre um projeto de decreto legislativo convocando a consulta. Seria uma derrota inequívoca da presidente, mas, para ela, seria melhor assim. Poderia dizer, de forma eloquente, que ela bem que tentou viabilizar a reforma política com a participação do povo, mas o Congresso não quis.

Virão agora os paliativos. Ou, como dizia o príncipe Falconeri em Il Gatopardo, clássico de Tomaso di Lampedusa, virão mudanças, para que tudo continue como está.

Com a proximidade do recesso e a volta de Lula ao cenário, algum desenlace haverá esta semana na tensão entre a presidente e sua base parlamentar. O plebiscito tende a ser trocado pelas mudanças tópicas no sistema político

Fonte: Correio Braziliense

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