terça-feira, 29 de outubro de 2013

Segundo turno - Almir Pazzianotto Pinto

Teremos eleições no primeiro domingo de outubro de 2014. É o que prescreve o art. 77 da Constituição, cujo texto, para ciência de quem não o conhece, transcrevo: "A eleição do presidente e do vice-presidente da República realizar-se-á, simultaneamente, no primeiro domingo de outubro, em primeiro turno, e no último domingo de outubro, em segundo turno, se houver, do ano anterior ao do término do mandato presidencial vigente".

O primeiro turno pertence, portanto, ao círculo dos fatos políticos concretos; o segundo não passa de mera hipótese, que se concretizará se "nenhum candidato alcançar maioria absoluta na primeira votação", "não computados os em branco e os nulos", conforme reza o citado dispositivo nos parágrafos 2° e 3°.

Excluídos proprietários de legendas minúsculas, que concorrem para marcar presença e arrecadar dinheiro, teremos, a prevalecer o quadro atual, três candidatos se digladiando: do PT, que tudo fará a fim de eliminar o segundo turno; do PSDB e do PSB, empenhados em gozar da segunda oportunidade.

Salvo inesperado cataclismo econômico, Dilma Rousseff será vitoriosa na rodada inicial. Confiante, mas não negligente, S. Exa. deflagrou campanha, e lança mão das melhores armas de que dispõe: atrair parcerias para aumentar minutos na televisão, distribuir benefícios e alimentar esperanças de participação em próximo mandato. Espera, ainda, contar com a ajuda de candidatos postiços, que avançarão, como matilha, sobre os dois adversários. Marina Silva, a sonhadora que pensava ter chances de se eleger, passou pelo processo de defenestração, e procurou ajeitar-se entre socialistas.

Para Aécio Neves e Eduardo Campos, resta tentar atingir o segundo turno. Ambos não dispõem de cacife para impor derrota a Dilma. Disputam, vamos ser objetivos, a segunda colocação, e isso significa que alguém será relegado à terceira, e afastado na semifinal.

Parece-me fantasioso supor que unirão forças contra o PT. Política é, acima de tudo, conduta pragmática, ou uso da inteligência na busca de resultados práticos. Ambos sabem que combaterão em duas frentes: de um lado, Dilma e aliados; do outro, o terceiro pretendente.

Aécio Neves e Eduardo Campos exibem perfis semelhantes. São netos de astros de primeira grandeza no cenário nacional, cujo falecimento não os tomou esquecidos. Tancredo e Arrais permanecem em nossa memória como lideranças que fizeram da luta contra o autoritarismo ponto alto de espinhosa carreira a serviço da democracia.

Aécio foi governador de Minas Gerais e tem a respaldá-lo o PSDB, nascido do ventre do PMDB, sucessor do MDB. Reside aqui, creio eu, a força e a fraqueza da candidatura. Os tucanos não conseguem se harmonizar, como demonstra conflito em andamento. É visível a presença de duas correntes: o grupo concentrado em torno de Aécio; outro que insiste em lançar José Serra.

As chances de Aécio dependem da capacidade de elevar o tom das críticas, ao falar sobre 12 anos de governo petista. Deverá demonstrar que, com novo mandato, Dilma Rousseff provocará catástrofe, na qual o desastre econômico se somará à tragédia social. Cabe-lhe estimular o renascimento das esperanças dos desiludidos, atrair idosos e jovens, mostrar como os brasileiros padecem da ilusão do consumo fácil, e que a extinção da miséria não passou de propaganda, terreno em que o PT é criativo.

Eduardo Campos surge como oponente inesperado. Demonstra habilidade ao cooptar Marina Silva para o redil do PSB. Não incorpora, todavia, imagem de oposição. Permaneceu todo o tempo ao lado do governo, na procura legítima de benefícios para Pernambuco. Trata-se, porém, de cristão novo na cidadela oposicionista. Entra na disputa para correr por fora, como se diz na linguagem turfística. Se vencer, ótimo; se derrotado, marca presença para ressurgir em 2018, caso antes não consiga emplacar alguns ministérios.

A prudência recomenda não descartar a hipótese de reeleição de S.Exa, a presidente Dilma, logo no primeiro turno. Se tal acontecer, o PSDB corre o risco de enfrentar destino semelhante ao DEM: ser abandonado por dirigentes e filiados que migrarão em busca de legenda mais promissora. Os poucos que se mantiverem fiéis terão a ingrata tarefa de juntar cacos, na tentativa desesperada de sobreviver politicamente. Durante muito tempo, então, viveremos sob despótico regime do partido único, como sucede em Cuba, conforme sempre aspirou o PT.

Advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST)

Fonte: Correio Braziliense

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