sábado, 23 de novembro de 2013

China para 100 anos - Merval Pereira

Fazendo um balanço dos últimos cem anos na História da França, a revista econômica “L’Expansion” mostra que já em 1913 os países então chamados de “novos”, e não de “emergentes” como hoje, eram considerados os eldorados, a ponto de Guillaume Appolinaire ser autor de uma poesia sobre os que esperam ganhar dinheiro na Argentina e retomar a seu país depois de terem feito fortuna.

Já naquela época as raízes dos Brics estavam lançadas com China, Rússia, Brasil, ao lado da Argentina, os países plenos de matérias-primas, em que tudo é possível, que os bancos e as grandes fortunas buscavam para investimentos. Em 1917, quando a revolução comunista estourou, 44% dos bancos russos eram de propriedade de estrangeiros, a maior parte franceses.

Curiosamente, as seis principais economias do mundo cem anos atrás eram as mesmas de hoje, em lugares ligeiramente trocados, com exceção dos Estados Unidos, já a primeira, e a França, que continua como a quinta. A Alemanha era a segunda economia e hoje é a quarta; a China era a terceira e hoje é a segunda; a Inglaterra era a quarta economia do mundo e hoje é a sexta, e o Japão, que era a sexta, hoje é a terceira maior economia do mundo.

A Argentina era a 11ª. economia do mundo e hoje cai pelas tabelas, podendo ser a 25ª. se os números oficiais estiverem corretos. O Brasil já foi a 6ª. economia, ultrapassando a Inglaterra, mas, com o crescimento pífio dos últimos anos, pode estar na 10ª. posição. Conta a lenda que, perguntado sobre como avaliava a Revolução Francesa, o premier chinês Zhou Enlai teria respondido que ainda era muito cedo para fazer uma avaliação. A resposta seria típica de uma cultura milenar, com uma marcação de tempo mais cautelosa que a ocidental.

Ao anunciar no último dia 15 o mais ambicioso plano de reformas sociais e econômicas desde as reformas colocadas em prática por Deng Xiaoping entre o fim dos anos 70 e o início dos 80 do século passado, que transformaram a China no líder econômico entre os mercados emergentes, o presidente Xi Jinping e o premier Li Keqiang preparam o país para os próximos cem anos. Segundo especialistas, é mais que um plano.

É uma reforma de tal envergadura que altera completamente as atuais crenças e valores de todo um sistema de governo. Já comparável a situações que ocorrem poucas vezes na História das nações, como a Revolução Industrial na Inglaterra do século XVIII, ou a arrancada tecnológica - — aço, estradas de ferro, petróleo e rede bancária — que fez a América se tornar a nação mais industrializada do mundo no primeiro quarto do século XX.

Das nada menos que 60 medidas tomadas pelos chineses para transformar sua economia em competitiva no mundo moderno, para sair do “capitalismo de Estado” para o capitalismo realmente de mercado, cinco são as mais importantes segundo os analistas. A mais emblemática delas éo afrouxamento da política de um bebê por família. Agora podem ter dois, desde que um dos pais seja fflho único. A controversa política do filho único introduzida em 1979 contribuiu para a queda da taxa de nascimentos, mas agora a população está envelhecendo rapidamente.

A consequência imediata foi a valorização das ações na bolsa de Hong Kong de indústrias ligadas ao consumo infantil, de brinquedos a laticínios. O consumo desses produtos cresce rapidamente na China, mas ainda é apenas 25% dos níveis dos Estados Unidos e da Europa. Também vão mudar as regras da migração: antes os migrantes tinham que desistir dos serviços públicos quando se transferiam para grandes cidades, agora não mais.

Resultado: libera-se o mercado de trabalho, permitindo a livre circulação de mão de obra. A política de registro de famílias por residência, conhecida como sistema “hukou”, dificultava a mudança das áreas rurais para os centros urbanos. Apesar disso, a China hoje já tem mais habitantes nos centros urbanos do que nas áreas rurais. Para alguns, esta é a maior reforma na política de urbanização desde 1958. No entanto, as maiores ci- dades como Pequim, Xangai, Cantão e Shenzhen vão manter as restrições.

Fonte: O Globo

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